4 - Minhas motivações
Mona mal prestou atenção na reunião, suas preocupações não lhe davam esse luxo.
Era o planejamento do tradicional Baile da Primavera, promovido anualmente pelo CAA. Apesar do suposto ar de romance que poderia evocar esse tipo de evento, na Alpha era bem mais importante os contatos de negócios que se poderia conseguir. Alguns dos figurões mais poderosos do planeta, parentes dos alunos, recebiam um convite de honra para participar. Quem recebia o convite fazia questão de comparecer, pois se tratava de uma oportunidade inestimável para fazer contatos longe do público e da mídia em um ambiente "descontraído".
O pai a havia informado por e-mail que iria prestigiar o baile daquele ano. Aquilo a deixou um pouco nervosa. Harrison Mason Dewis estaria presente e provavelmente tinha ficado muito contente por ter essa oportunidade justamente durante a sua campanha presidencial.
Mona observou de soslaio Alexis que ouvia algo do rapaz franzino ao seu lado, Louis Derring, filho do atual Primeiro ministro francês e Diretor financeiro do CAA. Ela suspirou inconformada. Aquele garoto, como sempre, iria monopolizar a atenção de Alexis, numa tentativa de mostrar seus vastos conhecimentos na área de finanças.
Ainda fitando atentamente Alexis, Mona refletiu que ele provavelmente iria sozinho ao baile, se é que iria, mesmo recebendo centenas de rosas brancas. Assim como ela. Fora assim no ano passado. E no outro. Para convidar um par, a garota ou o garoto entregava uma rosa branca com uma indicação de quem havia enviado a flor. A pessoa que recebeu, para aceitar, devolvia pessoalmente uma rosa vermelha.
Três coisas sempre ficaram muito claras durante a tradicional festa. Quem não conseguia um par era um tremendo fracassado. Quem não ia era a escória da faculdade, então era preferível ir mesmo que sozinho. E nada disso se aplicava a Alexis. Ninguém tinha certeza se ele iria ou não. No ano passado ele havia comparecido, quase no final, desacompanhado.
A mesma extravagância acontecia com seu pai, o Rei Hamad. Embora recebesse o cobiçado convite todos os anos, só havia comparecido no ano anterior. E fez questão de levar um cortejo que incluía várias princesas de sangue muito azul, para, em pleno baile, apresentar ao filho como candidatas a futuras rainhas. Algo meio Cinderela. Só que sem a coisa da menina pobre e órfã com duas irmãs feiosas, pois todas eram absolutamente belas e ricas.
Mona ouvira comentários de que o Rei estava disposto a comparecer ao baile daquele ano novamente. A garota mordeu o lábio inferior ansiosa. Como poderia convencer o pai de que estava fazendo progresso com Alexis se ele veria com os próprios olhos que não ficara mais íntima do rapaz do que há três anos, quando ingressou na Alpha? Além disso, também estaria presente para ver o desfile de princesas muito sorridentes que dançariam com o Príncipe sob a aprovação do Rei Hamad.
Tinha que ser honesta consigo mesma, sabia que esse plano estava todo na sua cabeça, o pai nunca a empurrou nessa direção, nunca disse que a valorizaria mais se ela se tornasse a futura rainha de Quidar, país do qual Alexis seria o futuro líder. Mas Mona sabia que se fizesse um casamento tão fabuloso como esse, seu pai nem pensaria mais no idiota do seu irmão. Ela seria a favorita. Ela seria o seu orgulho. Seria dela que ele falaria em suas reuniões e para os amigos mais próximos. Então ela poderia esquecer o que um dia soube por descuido de sua avó e de sua mãe.
Mona sempre havia idolatrado o pai. Ele era um homem poderoso e forte que havia se casado com uma mulher como sua mãe, Nayara Borbón-Dos Sicilias, uma deslumbrante condessa espanhola. Todo o país falava das proezas de Harrison Dewis, no estrangeiro todos o respeitavam. Mona queria ser o orgulho de um homem como ele.
Alguns anos antes de ingressar na Faculdade, Mona estudava em uma escola feminina muito famosa. Considerada a melhor aluna do lugar, era o ídolo das colegas. Linda, inteligente e elegante. Todos a elogiavam e falavam do quanto ela era o maior tesouro do seu pai. Mona era feliz. Mas um dia estava de férias em casa, o que era raro, pois geralmente passava as férias viajando com as amigas, quando foi correndo para a sala ao ouvir que sua querida avó os estava visitando. Ao chegar à sala onde sua mãe e sua avó conversavam, parou em choque com as primeiras palavras que ouviu:
― E pensar que a Mona foi um acidente quando estavam tentando ter um menino! - a avó falava em tom baixo. - Ainda bem que eram gêmeos e o outro era um garoto, acho que meu filho teria interrompido a gestação se não fosse assim.
― Sim. Aquele machista teimoso! - Nayara parecia irritada ao lembrar. - Veja como trata uma menina tão maravilhosa como a Mona? Envia para uma escola na Suíça e nem pergunta como ela está! Tantas vezes eu, ou até outras pessoas comentamos como ela é a melhor aluna e tudo o que ele sabe dizer é "melhor em uma escola de garotas? É como dizer que é a melhor formiga do formigueiro!". Como ele pode ser tão conservador? Ele disse que ficaria realmente impressionado se ela conseguisse um excelente casamento! Mio Dios!
― Não vejo como ela vai conseguir um bom casamento estudando só com garotas - resmungou a mais velha.
― Ah não! Você também?
― Muitos homens ainda acham que uma mulher realmente admirável é aquela que fisga o melhor partido. - A velha senhora deu um gole em seu chá. - E meu filho, devo admitir, entra nessa categoria. Ele não vai se importar com o desempenho acadêmico da Mona, mas com o de Ren sim, por isso está sempre em cima do garoto e negligencia a menina. Ao invés de elogiar a própria filha que é tão excelente, prefere listar para todos as proezas do príncipe que estuda com o Ren. Se pudesse Harrison trocaria, como é mesmo o nome dele...?
― Alexis.
― Isso! Trocaria os dois filhos, a Mona e o Ren pelo príncipe Alexis! - A velha senhora soltou um suspiro, indicando quantas vezes já havia falado sobre aquilo.
Nayara disse em tom de pura frustração:
― Se Mona não fosse uma menina ele seria louco por ela.
― Por isso ela tem que fazer um casamento que o deixe extremamente satisfeito! - Riu a avó. - Já imaginou como Harry ficará feliz com um neto que seja tão perfeito quanto ela?
A garota saiu e voltou para o seu quarto sem que ninguém percebesse. Sentada em sua cama a menina pensou sobre tudo o que ouviu. Não era tonta, sempre havia percebido a predileção do pai pelo irmão mesmo ele sendo o imbecil que era. Sabia que o pai não valorizava os seus esforços, nunca havia comparecido a nenhuma das atividades que ela participou, mesmo sendo sempre a melhor. Era a foto do irmão que ele mantinha sobre a mesa em seu gabinete. A dela ficava em uma gaveta qualquer.
Mona, no alto de seus treze anos, tomou uma decisão. Se esforçaria para entrar na Universidade Alpha, pois sabia que seria para lá que Alexis iria após se formar na escola para garotos em que estudava com seu irmão Ren. Ela não seria mais apenas uma formiga. E se casaria com o príncipe Alexis, assim seu pai teria um neto que um dia seria rei! Ele certamente a admiraria muito por isso.
Mas ao entrar na Alpha, com o apoio da mãe e por mérito das próprias notas, percebeu que sua missão não era tão simples. Alexis não permitia a aproximação de ninguém. Por mais simpática que se mostrasse era sempre ignorada e tratada com frieza. Durante um ano mal conseguiu trocar algumas palavras com ele. Então vieram as eleições do Centro Acadêmico Alpha e Alexis foi indicado para a presidência.
Como era uma excelente aluna e muito popular, Mona conseguiu assumir como Diretora de Comunicação, sua área de interesse. Essa nova situação permitiu que tivesse mais contato com ele, mesmo que de forma superficial e sempre sobre assuntos relacionados ao CAA. Mas por outro lado, os colegas passaram a reparar como eles combinavam. Os dois alunos excelentes, tanto em notas quanto nos esportes, bonitos e populares. Alexis com seu jeito frio e sério e Mona com sua doçura e elegância.
Ela sabia que tinha chances de sucesso, precisava apenas usar sua inteligência e mostrar de forma lógica para Alexis que a união dos dois seria um benefício mútuo. Assim que seu pai vencesse as eleições ela poderia colocar as cartas na mesa com maior confiança. A filha do Presidente do país mais poderoso do mundo não seria recusada, mesmo por um Príncipe.
Mona olhou para suas poucas anotações feitas durante a reunião no dispositivo eletrônico a sua frente. Se o pai de Alexis não fosse ao baile tudo seria mais fácil. Poderia até conseguir uma dança e tentar convencê-lo a trocar algumas palavras com o pai dela. Contudo, com um harém de princesas à vista trazidas pelo próprio Rei Hamad, nada seria tão simples. Irritada ela saiu da sala assim que os colegas começaram a se levantar com o término da reunião.
***
Ren olhou seu rosto no espelho. Virou a cabeça de um lado para o outro e sorriu. Estava tudo certo novamente. As marcas do soco mal podiam ser percebidas. Desde o "incidente" ficou totalmente exilado em seu quarto, não tivera nenhuma vontade de expor a cara toda colorida para os colegas zoarem com ele. Então franziu o cenho. Certamente iriam torrar sua paciência de qualquer forma, afinal, não era todo dia que um cara apanhava como ele. E de uma bonequinha.
― Ah, lembrando-se do seu pequeno anjo?
Henrique Baker, mais conhecido por Hank, riu ao ver a expressão do amigo através do espelho. Luca Andreani o acompanhou nas risadas. Os três eram amigos desde a infância. Filhos de famílias poderosas, loucos por aventuras e nenhum senso de responsabilidade. Luca ainda era um pouco mais centrado, mas sempre acabava seguindo os outros dois malucos.
Eles não seguiam as regras, promoviam festas e levavam bebidas e garotas para os dormitórios. Hank aproveitava-se descaradamente do seu status de herdeiro da família que fundou a Alpha.
― Vai se ferrar! - Ren jogou o corpo sobre o sofá branco e macio que os outros dois já ocupavam, enquanto disputavam uma partida de game na tela gigantesca que decorava a parede vermelha.
Aquele era o seu quarto, organizado e limpo graças a eficiente equipe de empregados que a Alpha contratava para manter os mais de quinhentos aposentos particulares em ordem, pois a principal filosofia da instituição era proporcionar o melhor para os poucos privilegiados que podiam usufruir disso.
― Então, está pronto para encarar o mundo novamente? - zombou Luca.
― Sim. Danem-se esses otários! Quero ver tirarem sarro de mim depois que esmagar algumas caras contra o chão!
Hank riu da ameaça do amigo. Os três eram sujeitos altos, Ren e Luca mediam 1,80m, e Hank, o mais alto, 1,90m. Eram também fortes, os músculos adquiridos nas muitas horas que faziam de academia. Aliás, ele e Luca só não estavam presentes na briga com a tal garota porque estavam lutando boxe no clube naquela hora.
Por isso Hank ainda tinha dificuldade em imaginar Ren apanhando de uma garota. E de uma garota muito pequena, pelo que soube. Havia ficado bastante curioso para conhecer a tal Angel, mas todos na escola comentavam que ela mal era vista desde a briga. A novata faltava com frequência às aulas e nem utilizava qualquer dos vários espaços na Alpha. Não passava de um vulto que ia e vinha quando menos se esperava.
― O que vai fazer quando encontrar ela de novo? - Luca perguntou entre divertido e curioso, deixando o jogo de lado por um instante para encarar Ren. - Quer dizer, se conseguir ver ela. Parece que a garota é meio difícil de ser encontrada.
Os olhos negros de Ren brilharam de uma forma que assustou os amigos.
― Bem, eu sei que bater naquela pequena megera não serviria de nada. Só pioraria as coisas. Não, eu pude pensar muito nesses dias e juntar algumas informações sobre ela graças a alguns contatos do meu pai. Eu tenho que bolar um plano que a faça ser humilhada e, com sorte, expulsa da Alpha!
Hank e Luca se entreolharam surpresos com a resposta. Eles só esperavam que o tal plano não terminasse com Ren apanhando ainda mais da garota.
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