19 - Luz
A rainha Syka acordou assustada. Tinha sonhado com seu amado Melkor.
Saindo da cama, foi até a janela e olhou para o céu. As luas estavam tão belas e tudo parecia tão lindo que era difícil imaginar que Payre estava, aos poucos, sendo destruída.
Mas havia esperança. Melkor havia lhe sussurrado no sonho. O Predestinado estava voltando.
Sorrindo ela se afastou, não ia voltar a dormir. Precisava avisar a todos. A profecia estava para ser testada e muito precisava ser preparado até a chegada dos escolhidos de Ashy e daquele que era de Erow.
Seu filho, aquele que foi tirado de seus braços ainda bebê, estava voltando para casa.
***
Angel sentiu um desconforto dominá-la, era tão generalizado que não conseguiu definir sua origem. Não conseguia mexer seus membros e mal era capaz de pensar. Seus olhos estavam pesados demais para serem abertos, estava muito cansada para conseguir fazer tanto esforço. Era capaz apenas de perceber que estava deitada em algo macio, talvez uma cama, e que não se encontrava sozinha ali. Alguém falava coisas que ela não conseguia entender, com voz cada vez mais alta, deixando-a enjoada. Sentiu chacoalharem seus ombros e aquilo lhe causou ainda mais dor, para evitar isso ela tentou com todas as forças abrir os olhos. Conseguiu, mas tudo que viu foram borrões coloridos. Então um rosto familiar começou a criar forma, bem em frente ao seu. Tão próximo que ela era capaz de sentir a respiração rápida em sua face. Fazendo um esforço maior, foi capaz de descobrir quem era aquela pessoa. A surpresa a tomou, pois era seu primo, Leonard.
As palavras, que antes não compreendia, passaram a penetrar na nevoa em que parecia se encontrar. Eram palavras tão dolorosas quanto o mal estar que castigava seu corpo.
― Você não disse, quando era criança, que queria pedir desculpas a eles? Acha que seus pais vão perdoá-la se simplesmente ficar vivendo a sua vida tranquilamente, como se não tivesse causado a morte deles? Como se não fosse a culpada por estarem todos mortos?
Angel sentiu lágrimas quentes correrem por seus olhos, tornado a imagem do primo novamente um borrão. Mas ela não se importou dessa vez. Gostaria que as palavras também pudessem ser caladas como antes. Mas não era capaz nem mesmo de erguer as mãos para tampar os ouvidos, como uma criança que não quer ouvir coisas que machucavam.
― Realmente, pensar que sua babá é mais importante que toda a família que matou, só mostra o quanto é egoísta e merece ser odiada por todos. – A voz se afastou um pouco, mas não lhe trouxe alívio. – Acha mesmo que vovô vai aceitá-la algum dia? – Leonard mostrou certo divertimento nas palavras seguintes - Eu tentei ajudá-la. Tentei mesmo. A quantidade de drogas era para ter causado uma overdose, mas desde ontem a noite, nada aconteceu. Então fiz uma pequena mudança de planos.
Angel ouviu o barulho de algo metálico, em seguida uma imprecação, quando o som da porta se abrindo soou pelo quarto.
― Leonard? O que esta fazendo aqui? – Angel reconheceu a voz de Hye Kyo, que parecia chocada. – Meu Deus! O que fez com ela?!
―Não se aproxime!
Angel tentou ver o que estava acontecendo. Por entre os cílios molhados, viu Leonard com uma arma na mão, apontada para Hye Kyo. Em pânico procurou se mover, mas novamente não foi capaz. E quanto mais se esforçava, apenas aumentava seu enjoo, dificultando a sua tentativa de focar a atenção no que acontecia ali.
― Você enlouqueceu, Leonard? O que está fazendo? – Hye Kyo parecia em pânico.
O rapaz riu, antes de responder, de forma muito tranquila:
― Estou muito bem. Ao contrário dessa vagabunda, que mancha o nome dos Lancasters apenas por existir. Mas isso acabará hoje.
― Não! Não faça algo precipitado, se a machucar eu não permitirei que escape ileso!
Novas risadas foram ouvidas, ainda mais altas dessa vez, e certo descontrole parecia tê-lo dominado. Era estranho para era, pois Leonard sempre havia sido um sujeito desprezível, mas calculista e discreto. Angel não era capaz de reconhecer aquele garoto. Afinal, parecia não ser ela a única maluca da família.
― Que mulher ridícula!
Angel viu Leonard virar a arma na sua direção, quase ao mesmo tempo, Hey Kyo se jogou contra ele. Os dois caíram e ela não foi capaz de descobrir o que acontecia. Apenas ouvia os sons de corpos se chocando e quebrando coisas ao redor. Seu coração disparou e ela tentou se mover, dessa vez com maior desespero. Com esperança, percebeu que era capaz de mover a mão e já começava a sentir seus pés. Mas também notou algo morno escorrer do seu nariz, o cheiro metálico de sangue invadiu seus sentidos, como se estivesse respirando o próprio líquido viscoso. O mesmo líquido que começava a sentir tomar sua garganta. Seriam as tais drogas mencionadas pelo primo, finalmente fazendo seu efeito?
Quando tentou virar a cabeça, para não se afogar no próprio sangue, ouviu um estampido abafado e, então, o silêncio. Lágrimas grossas e constantes se juntaram as outras ao ver Leonard se aproximando com a arma na mão. Não por receio a sua vida, mas sim porque já não via Hye Kyo, nem ouvia sua voz. O primo parou ao vê-la, um sorriso doentio se formando em seu rosto vermelho e suado.
―Ora, vejam só. Ao que parece não vou precisar atirar em você também. Menos mal. Assim a história vai ficar muito mais interessante e menos problemática. Suicida se droga, mata a empregada que foi visitá-la e acaba morrendo por overdose. Vovô não vai deixar isso sair daqui, pode ficar tranquila. Partira sem nos causar mais danos! – Risadas arrepiantes saíram daquele Leonard irreconhecível.
Calmamente, o rapaz colocou a arma entre seus dedos frios e rígidos. Depois de dar uma ultima olhada na cena, parecendo muito satisfeito com seu trabalho por ali, saiu do quarto, cantarolando.
Angel fechou os olhos com força. Queria morrer logo. Queria que aquilo tudo acabasse, aquela dor, todo o pesadelo que tinha sido sua vida até então. Hye Kyo estava morta, qual era o sentido de lutar? Desistiu de tentar se mexer, relaxou o corpo e aguardou pela benção do fim, que há algum tempo, já havia procurado com as próprias mãos. A morte, afinal, viria pelas mãos de outro, mas dane-se, ainda era bem vinda.
Sua cabeça pareceu prestes a explodir, uma escuridão percorreu sua mente e fez seus membros ficarem duros e frios. Então a escuridão a tomou por completo. A abençoada escuridão. Como orou para que fosse para sempre.
***
Angel acordou trêmula e coberta de suor. Gelada. Desorientada, girou a cabeça em todas as direções, procurando descobrir onde estava. Mas bastou ver Alexis adormecido ao seu lado para lembrar que estava no quarto dele. Ele a havia carregado até lá e, com uma paciência infinita, a acalmara até que ela adormeceu. Não tinha feito perguntas, nem acusações. Apenas queria que ela descansasse.
Suspirando aliviada, fechou os olhos, mas assim que o fez, subitamente, imagens do sonho recente a assaltaram. Seu primo a drogando. Dizendo que ela deveria morrer. Deixando-a para morrer. Matando Hye Kyo.
Angel saiu da cama e começou a andar pelo quarto, as mãos apertando sua cabeça dolorida e confusa. Aquilo não tinha sido um sonho. Foram lembranças. Lembranças que ela havia apagado de sua memória, talvez pelo choque, ou pelas drogas, mas que voltaram depois de ter visto aquelas imagens na festa. As imagens de Hye Kyo morta.
Assassinada pelo primo.
Com a cabeça girando, ela foi até a porta. Precisava encontrar Leonard, aquele filho da puta que tinha matado sua amiga! Quando chegou no corredor se deu conta de que não sabia qual era o quarto daquele assassino. Desesperada, voltou para o quarto e olhou a sua volta. Seus olhos pousaram em Alexis adormecido. Não poderia pedir a ajuda dele. Era algo que precisava resolver sozinha. Ele já tinha feito muito por ela. Ao notar o celular do príncipe sobre uma bancada, sem pensar muito, o pegou. O que fazer? O que fazer? Subitamente lhe ocorreu. Choi!
― Oi Ale...
― É Angel. Qual é o quarto do Leonard?
― O quê?...
― O quarto, Choi!
― 37008. Mas...
Angel desligou o aparelho e saiu correndo. Eram apenas três andares abaixo. Descalça, vestindo apenas a camisa de Alexis, desceu os lances de escada e disparou pelo corredor até chegar ao número indicado por Choi. Sem se importar com o barulho causado, bateu com força na porta, e continuou a bater até um enraivecido Leonard aparecer.
― O que pensa que está fazendo? Eu não...
Ignorando o arroubo de raiva do rapaz, Angel o empurrou para dentro do quarto, com tanta força, que Leonard foi jogado para trás e sem equilíbrio, desabou no chão.
― Ficou louca?!
― Cale essa boca! Cale essa maldita boca antes que eu te mate, seu desgraçado!
Ela viu que já não havia raiva naqueles olhos azuis. Apenas medo. Assim era melhor. Caminhou até ficar a apenas alguns passos do sujeito no chão, então falou:
― Foi você que me drogou naquele dia. Você tentou me matar, mas acabou matando Hye Kyo.
Leonard arregalou os olhos e sem fala, começou a negar com a cabeça, mas Angel lhe desferiu um chute no rosto, fazendo com que ele caisse para o lado, com o nariz e a boca sangrando. Ele tentou se erguer, mas parecia muito atordoado para isso, então apenas se apoiou contra o sofá às suas costas, em posição defensiva.
― Não tente me enganar, seu filho da puta! Eu sei de tudo!
Angel se aproximou e abaixou-se, ficando com o rosto muito próximo do primo. Como ele tinha feito com ela em suas lembranças.
― Eu não estou drogada e vulnerável dessa vez, seu merdinha. Nem preciso de uma arma para acabar com essa sua existência inútil!
Suando e arfando, Leonard começou a falar, entre gemidos de agonia:
― Não foi culpa minha! Minha mãe soube que Hye Kyo tinha achado um médico capaz de fazer uma cirurgia para curá-la. Ela me acusou de não estar fazendo nada pela família! Ela estava preocupada porque você, apesar de tudo, era filha do favorito do vovô. Que ele podia mudar de ideia e aceitá-la como um de nós. A minha mãe me pediu para fazer algo! Eu não... Eu só queria agradar a minha mãe! Se você morresse tudo estaria acabado! – Vendo algo aterrorizante nos olhos violetas, entre soluços, Leonard gritou. – Você queria morrer! Sempre quis! Como pode me acusar, você mesma já tinha tentado fazer isso!
― Você matou a única pessoa que me amava.
Era tudo tão sórdido, tão sem sentido que a única coisa na mente de Angel era a amiga. Estava certa. Hye Kyo, mesmo depois de morta, continuou a protegendo de sua família. E ainda, durante todos aqueles anos, fizeram-na acreditar que ela tinha sido a assassina. Que a própria Angel tinha atirado em Hye Kyo.
Uma nova onda de fúria a tomou. A pessoa que tinha se desdobrado para amá-la, para que ela não se sentisse sozinha, que havia morrido para que ela vivesse, foi arrancada do seu lado, por um pirralho cego pelo poder e orgulho dos malditos Lancasters.
Perdendo totalmente o controle sobre sua ira e sua dor, Angel foi para cima de Leonard.
***
Alexis acordou assustado com o toque do seu celular. Ignorando o som, olhou para o lado e se preocupou quando não viu Angel. Praguejando, levantou e foi até o banheiro. Ela não estava lá. Procurou pelos cômodos e não a encontrou em nenhum deles. Irritado com o telefone que não parava de tocar, o pegou para desligar, mas estranhou quando viu "Choi" no visor. O rapaz era um idiota intrometido, mas não ligaria para ele, não depois do que tinha acontecido na festa, se não fosse por algo importante.
― Alexis falando.
― Alexis! Precisa ir até o quarto do Leonard! Agora!
― O que aconteceu? – Ainda que estivesse perguntando, já abria a porta para o corredor, um pressentimento o tomando.
― É o no 37° andar! Acho que algo pesado está rolando, Angel foi pra lá!
Jogando o aparelho pelo caminho, Alexis correu para as escadas, desceu os andares aos saltos e quando chegou no corredor do andar indicado, entendeu porque Choi não se deu ao trabalho de informar o quarto. A porta estava escancarada e uma pequena multidão já estava aglomerada na entrada. Louco de raiva por estarem assistindo sem tentarem ajudar, empurrou os primeiros que estavam no caminho, os demais logo se afastaram.
Seus olhos arregalaram-se quando encontrou Angel. Ela estava usando apenas a camisa dele, com a qual a tinha vestido na noite anterior, e o tecido branco já estava cheio de manchas de sangue, assim como partes do cabelo prateado, solto. Respingos vermelhos manchavam também sua pele, principalmente no rosto. Seus olhos violetas, embora cheios de raiva, pareciam arrasados, como se ela nem estivesse ciente do que fazia, e no momento era socar um Leonard que mal conseguia reagir. O rapaz estava jogada sobre o chão com Angel sentada em seu peito.
― Angel!
Ela parou com o punho no ar e o quarto ficou em silêncio. Angel virou lentamente a cabeça na sua direção e então ele percebeu, que entre o sangue em seu rosto pálido, também corriam lágrimas. A dor cobriu a raiva que havia nos olhos dela.
― Ele a matou! Ela tentou me proteger e ele a matou! Ele tirou a vida dela!
Alexis foi se aproximando lentamente, como se qualquer movimento mais brusco pudesse assustá-la. Abaixou-se, apoiando um dos joelhos no chão ao lado dela. Com gentileza tocou a face delicada, limpando as lágrimas e o sangue. Com voz baixa disse:
― Ele vai pagar pelo que fez. Mas você não é uma assassina, mon amour.
Mais lágrimas caíram dos olhos violetas.
― Não sou?
― Não é. Nunca foi. Nunca.
― Obrigada. – Ela disse antes de desfalecer sobre o primo.
Preocupado, Alexis a ergueu e correu para fora.
Quando saiu do prédio do Dormitório Masculino, Alexis percebeu que Choi o seguia. Os três entraram em um dos carros parados, os mesmos usados pelos alunos para se deslocarem pelo Campus, Choi pediu que o motorista os levasse o mais rápido possível para o Prédio Central.
Quando chegaram no saguão, uma equipe médica já estava a postos, pois Choi havia ligado avisando. Angel foi colocada em uma cama hospitalar e levada, às pressas, para ser tratada. Alexis correu ao seu lado, sem largar sua mão. O desespero começou a tomá-lo, havia percebido que ela mal respirava no caminho até ali e não sabia o que estava acontecendo.
Angel foi leva para um quarto e a mesma Médica da outra vez em que esteve ali, o impediu de entrar. Ainda que contra sua vontade, ele não insistiu, pois sabia que sua presença poderia atrapalhar o trabalho da equipe médica, e sua prioridade era que Angel fosse atendida.
― Ela vai ficar bem, Alexis. – Choi pousou a mão em seu ombro.
Alexis não respondeu. Recostou-se contra a parede, olhando para os próprios pés. Só então reparou que estava descalço. E não apenas isso, a única coisa que vestia era uma calça jeans preta. Passando as mãos pelos cabelos, bagunçado ainda mais os fios negros, suspirou. Não ligava para nada daquilo. A única coisa que importava era Angel sair daquele lugar, rindo e ironizando o fato de ele, um príncipe todo orgulhoso, estar desfilando pela escola daquela forma. Certamente ela iria adorar fazer isso.
Após alguns minutos, a doutora que o havia barrado saiu do quarto. Ela ia passar por ele, mas Alexis segurou-a pelo braço:
― Como ela está?
― Sinto muito, Alteza, mas tenho orientações da própria família pra não divulgar nada sobre a saúde de Angel Lancaster.
Ele endureceu o rosto, suas palavras saíram em tom baixo e cortante:
― George Lancaster não vai interferir nisso, eu lhe asseguro. Qual a situação da Angel?
A mulher olhou para ele e Choi e hesitou por um segundo, mas logo percebeu que não poderia lidar com o príncipe. Ainda que fosse apenas um aluno, não poderia ser facilmente ignorado, além disso, parecia mostrar franca preocupação pela paciente, bastava ver a forma como estava naquele momento. Respirando fundo, ela respondeu:
― Angel tem uma doença no coração, nenhum médico até hoje conseguiu determinar qual é, pois parece ser um caso único. – Vendo o choque do rapaz, ela continuou da forma mais branda possível. – O coração dela acelera subitamente e então quase para quando é desacelerado naturalmente. O medicamento que ela toma é para mantê-lo lento, sem o risco de parada, por isso precisa dormir por muitas horas logo depois de ingeri-lo.
Alexis balançou a cabeça, entendia a situação, ainda que estivesse muito surpreso. Era difícil de acreditar que Angel, sendo como era, sempre tão ativa, tinha uma doença como a descrita. Mas explicava o cansaço excessivo que ela sempre demonstrava depois de algum esforço físico.
― E ela já está dormindo agora?
A doutora o fitou muito séria. E com pesar evidente. Alexis sentiu um frio tomar seu estômago e começou a ficar difícil respirar. Suas mãos se fecharam em punhos, como forma de controlar suas reações.
― Alteza, Angel foi diagnosticada aos oito anos e desde então foram feitas previsões sobre... Bem, essa doença desgasta seu coração muito rapidamente, então ela não teria como sobreviver por muito tempo...
― Quanto tempo? – Alexis nem reconheceu aquela voz rouca como sendo a sua. Em sua cabeça apenas implorava para que a resposta fosse "muitos anos", ainda que fosse claramente uma esperança vã.
― Ela não chegaria aos vinte anos. – Mesmo notando o desespero do jovem, que colocou as duas mãos sobre a cabeça, enquanto seus olhos azuis brilhavam com lágrimas contidas, ela finalizou. – Os remédios não estão mais fazendo efeito, o coração continua acelerado e nada é capaz de reduzir seus batimentos, não sem que isso acelere sua mor...
Empurrando a doutora para o lado, Alexis invadiu o quarto. Ignorando as outras pessoas em torno da cama, aproximou-se de Angel. Ela estava muito pálida e uma camada de suor cobria sua testa. Precisando tocá-la, Alexis segurou suas mãos. Elas estavam frias.
Depositou um beijo na bochecha macia e quase sorriu quando os lindos olhos violetas se abriram para ele.
― A-Alex...
― Sim, sou eu. Estou aqui, mon Ange. Estou com você.
Lágrimas caíram dos olhos dela.
― Desculpe... Descul...
Alexis a beijou nos lábios, silenciando-a. Pressionou o rosto no dela, sentindo sua maciez, sua fragilidade, mas ainda estava ali, sua vida.
Sua vida estava ali.
Até quando?
***
Mona olhou com raiva para o irmão, deitado sobre a cama, displicentemente jogando no celular. Seu rosto estava inchado e um enorme curativo tinha sido colocado sobre o nariz. Sem dúvida ele precisaria de plástica. Era uma pena que os remédios tinham acabado com a dor dele.
O pai deles dera ordens para que ela ficasse com Ren, até o momento em que mandaria alguém buscá-los. Como ele tinha estado na enfermaria desde a festa, ela não tivera escolha se não ir até lá logo nas primeiras horas da manhã. E os dois ficaram em silêncio por horas intermináveis desde então. Incomodada com a tranquilidade dele, ela não conseguiu se conter por mais tempo:
― Papai vai nos tirar da Alpha, está feliz agora, seu idiota?
Ren nem se deu ao trabalho de olhar para ela, sua atenção ainda no jogo.
― Na verdade estou. Esse lugar sempre foi um saco. E você nem deveria estar não nervosinha, depois do que aconteceu ontem, acha mesmo que tem alguma chance com o babaca real? O cara obviamente não vai largar aquela miniatura de psicopata.
Sim, Mona também pensava o mesmo. Nunca teria imaginado que o plano do irmão seria exibir para todos, imagens confiscadas por George Lancaster, das loucuras cometidas pela neta. Ela sabia que Angel era estranha, mas era assustador ver até que ponto. Uma garota que tinha feito tanto contra si mesma e contra outros. Meu Deus, ela tinha até mesmo matado alguém! E ainda assim, Alexis a tinha protegido.
Mona jamais tinha visto o príncipe daquele jeito. Ele parecia até outra pessoa. Uma pessoa violenta e disposta a tudo para cuidar da garota que estava sendo humilhada. Mesmo que essa garota fosse uma descontrolada assustadora. Isso apenas indicava o quanto o príncipe Alexis estava louco por ela. Mona rangeu os dentes com o pensamento.
Subitamente a porta se abriu e uma garota com uma longa trança escura entrou. Ela olhou para eles, parecendo ansiosa.
― Desculpem-me, entrei no quarto errado. – Já ia saindo, quando se virou novamente. – Sabem onde posso encontrar Angel Lancaster?
― Ora, no quarto de Alexis, talvez? – Ren adiantou-se, parecendo irritado com a menção do nome da outra.
― O Príncipe também está aqui? Claro, ele deve estar com ela. – A desconhecida comentou pensativa. - Eu estava na sala da Diretora quando ela foi avisada sobre a Angel. Parece que ela não estava bem e foi trazida pra cá, estou preocupada com o que pode ter acontecido.
Mona passou pela garota e saiu do quarto. Que menina estupida! Não tinha reparado que Ren era o sujeito que tinha apanhado de Alexis na festa? Logo, ele seria o último a se importar com o quer que tivesse acontecido com eles. Mas, ela por outro lado, estava curiosa.
Olhou para o corredor e notou que estava vazio. Exceto por Choi, encostado na parede. Quando seus olhos se encontraram, o estômago de Mona se encolheu. Havia raiva, muita raiva. E mais, repugnância. Ele a olhou como se ela fosse uma criatura asquerosa que devia ser evitada.
Choi desviou o olhar e foi em direção à porta no final do corredor. Sem pensar, ela foi atrás dele, inconsciente de que era seguida pela desconhecida de trança e por um curioso e incomodado Ren. Apressando os passos, para não perder Choi de vista, aproximou-se mais da porta que estava aberta e estacou, colocando as duas mãos sobre a boca. A garota que a seguia, e Ren, também ficaram paralisados ao seu lado.
Quando deu por si, Mona estava caminhando para dentro da sala, como se não tivesse capacidade de controlar seus membros. Seus olhos estavam presos na cena ali dentro. Choi parado, ao lado da cama, assistindo com lágrimas caindo por sua face, Alexis chorar sobre uma Angel pálida como a morte. Os olhos dos dois não se desviavam e, em ambos, era possível ver o mesmo nível de desespero. Um apito constante em um dos aparelhos ligados a ela mostrava que seu coração estava com batimentos muito acima do normal.
Ninguém falava nada. Os únicos sons vinham das máquinas que monitoravam o que parecia ser os últimos minutos de vida da garota que ela tanto havia detestado. Era surreal. Como aquilo tinha acontecido? Teria sido o choque causado pela ideia idiota do seu irmão? Teria acontecido algum acidente?
Confusa, Mona voltou a observar Choi e viu que ele também a encarava. O ódio estava ainda maior do que antes. Ele a culpava por aquilo. A culpava por ser irmã de Ren, porque ela, Choi devia imaginar, certamente sabia que o que ele ia fazer e não tinha impedido. Sentindo a culpa jogada sobre ela pesar em seus ombros, tentou chegar perto dele. Não sabia o sentido disso, mas precisava explicar que não fazia ideia do que Ren tinha em mente. O que era mais ou menos verdade.
Quando deu o primeiro passo, um gemido fraco veio da cama. Sua cabeça girou na direção de Angel, a tempo de ver Alexis agarrar-se com força a ela, enquanto implorava para que a garota não o deixasse. Mas estava claro que era o fim. Dava para sentir.
Angel suspirou profundamente.
― Alexis...
Sua boca parou de se mexer.
Seus olhos lentamente foram se fechando.
A máquina parou de apitar.
Silêncio.
...
Uma luz intensa envolveu Angel e Alexis, então se espalhou pelo quarto.
Choi olhou para sua mão e ela brilhava.
Mona sentiu que estava sendo também envolvida por essa luz.
Ren deu um passo para trás, mas a luz já o tinha alcançado.
Lali estava parada, apenas chorando, suas lágrimas caiam em forma de pequenas estrelas. Ou gotas de luz.
Depois de segundos, não havia mais nada.
Apenas a luz.
Tanta, tanta, luz.
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