♛CAPÍTULO 9♛
Nem consegui abrir os meus olhos direito, a dor de cabeça veio avassaladora. Quando eu levantei da cama tive que ir correndo até o banheiro, ou eu iria vomitar todo o chão do quarto, e vomitar assim seria a última coisa que eu iria querer fazer. O que eu falaria para o Christopher?
Escovei os dentes, joguei uma água no meu rosto e decidi ir atrás do babaca do rei, porque preciso urgentemente de algo para passar a minha dor de cabeça. Ele deve achar que eu esqueci o que ele fez ontem, mas está muito enganado. Eu jamais irei esquecer que ele me levou para a casa de sua ex peguete, isso não tem perdão.
O bendito estava na cozinha lendo um jornal e tomando café da manhã. Fui até a geladeira e peguei uma garrafa de água antes de me sentar de frente para ele na mesa. Christopher fechou o jornal e o colocou sobre a cadeira ao seu lado.
— Bom dia. — Falou. Eu permaneci calada, porque se eu for falar alguma coisa vai ser para xingá-lo até não aguentar mais. — Ok, ainda não estamos bem. — Concluiu sozinho, mas eu me pergunto, quando nós realmente estivemos bem? Porque ao meu ver, eu sempre o odiei.
Bebi um suco, mas o sabor estava estranho, tinha melancia, melão, no fundo água de coco e pude sentir um gostinho de hortelã também. Fiz uma careta com a mistura de coisas, mas não estava tão ruim, porém, exótico ao meu paladar.
— É um suco para curar a ressaca. — Christopher explica. Dei de ombros.
A dor de cabeça ainda estava bem presente, e a claridade só piorava. Apoiei meus cotovelos na mesa e fiquei massageando as minhas têmporas, em uma falha tentativa de fazer a dor de cabeça melhorar.
— Preciso de um analgésico. — Peço.
— Tudo bem, eu pego para você.
Christopher se levanta e vai até a dispensa da cozinha, que é uma sala bem grande, cheia de prateleiras separadas por categorias. Sei que há uma específica com remédios, porque eu já fucei lá, em busca de alguma coisa para beliscar durante o dia. Por sorte eu sempre tive liberdade de ir e vir aqui dentro, todos os funcionários me respeitam e fazem o que peço, apesar de eu não me sentir muito a vontade com isso.
O rei me trás um comprimido e um efervescente. Tomei os dois e fiquei sentada esperando o enjoo passar para tentar comer algo. Nunca havia bebido na minha vida, e achei o champanhe bem inofensivo, porque ele era bem docinho e cheio de bolhinhas, mas depois de quase 20 taças, porque eu bebi como se fosse refrigerante, eu me senti diferente. Não sei explicar, mas era bom, me dava leveza, me deixou descontraída e talvez, só talvez, um pouco desinibida. Porque na minha mente fica vindo flashes de mim me esfregando no Christopher, sem vergonha alguma, mas não sei se foi real, ou um sonho mesmo.
Empurrei um croissant, apenas para não dizer que estava de estômago vazio. Christopher comia enquanto mexia em seu celular. Na minha cabeça ele estava marcando algum encontro com alguma mulher, por mais que ele fale que nunca mais saiu com ninguém desde que eu vim morar aqui, não me sinto capaz de ter algum tipo de confiança em sua palavra. Ele obviamente deve aproveitar quando está "trabalhando" para ficar transando com alguma modelo em um motel 5 estrelas.
Senti uma coisa muita estranha ontem quando vi Mônica, e foi pior ainda perceber o olhar que ela dava para Christopher, como se ele fosse um pote de ouro. E o olhar dela para mim fez com que eu me sentisse o mais inferior dos seres vivos. Senti uma vontade horrível de chorar quando percebi que algo já havia rolado entre os dois, é bem diferente o olhar de cobiça do olhar de "eu já sei muito bem quantos centímetros esse pênis tem", e Mônica estava com esse olhar. Nem eu sei quantos centímetros tem o pênis do meu digníssimo "namorado", porém metade de Aregan sabe, não que eu tenha vontade de saber, mas cacete!
— Consegui o contrato, Patrick finalmente assinou, e nos chamou para almoçar na casa dele.
— Nem que me pagassem eu ficaria debaixo do mesmo teto que aquela sirigaita.
Pela primeira vez eu consegui reparar bem em Christopher. Ele é lindo, devo admitir. É um crime ele ter que ficar desfilando despreocupadamente sem camisa na minha frente. O rei cruza os braços, e eu demoro tempo demais olhando para o tanquinho definido dele. Obviamente sempre soube que sou hétero, porque fiquei estupidamente apaixonada pelo Leonardo Di Caprio quando era criança. Sempre fui o tipo de menina que não se interessava pelos carinhas da escola, ou da minha rua, por não os achar tão atraentes como o Chris Evans. Porém ficar perto de Christopher é demais para a minha sanidade mental, e o mais difícil é que ele sabe que eu gosto do corpo dele.
Ontem foi apavorante ver Mônica, porque ela é linda, alta, loira, totalmente o tipo de Christopher, e na minha cabeça vinha a imagem dele a beijando, a agarrando, a levando para cama, e foi terrível. Só de me lembrar das coisas que pensei me dá vontade de chorar, de novo. Eu acho que chorei ontem antes de dormir. Eu nem lembro como cheguei, como tomei banho e nem como eu me deitei.
— Ok, você está querendo chorar, o que houve? — Como ele sabe que eu estou com vontade de chorar?
— Você já ficou com a Mônica. — Foi só falar isso bem alto que eu abri as comportas do choro.
Chorei horrores, e Christopher ficou me olhando, sem dizer nada. E eu não conseguia parar de chorar. Meu nariz ficou escorrendo, entupido e eu não conseguia respirar direito. Christopher pegou um copo de água para mim e se ajoelhou do meu lado, e segurou a minha mão. Eu estava tão desesperada que o deixei beijar os nós dos meus dedos.
— Isobel, não fica assim. Olha, eu sei que fui um filho da puta a maior parte da minha vida.
— Bom que você tem total consciência disso.
— O que aconteceu com a Mônica não foi nem um pouco significativo para mim, ok?
— Eu te odeio. — É a única coisa que eu falo.
— Eu sei. — Ele beija novamente a minha mão e se levanta, rindo um pouco. Fiz uma careta para as costas dele e bebi todo o copo de água que ele trouxe.
TPM é uma merda, isso é claro. Eu sempre fiquei muito emotiva nessa época da minha vida. Bebi mais um pouco do suco que ele fez, e coloquei as louças na pia para Christopher lavar. Se eu estivesse com o meu celular na mão, obviamente tiraria uma foto desse momento, porque as meninas simplesmente não acreditam que o rei lava a própria louça. Até eu demorei para me acostumar com esse fato.
Estava saindo da cozinha e lembrei que eu precisava muito de algo que havia acabado e eu esqueci de comprar. Voltei e Christopher estava mexendo no seu celular.
— Eu preciso de um barbeador.
— Barbeador? — Ele me olha confuso. Como eu irei dizer ao rei que eu preciso dar um jeitinho no matagal? Sério, eu já estava ficando com raiva de mim por adiar tanto esse momento.
— É, barbeador descartável, daqueles que você se raspa, sabe? — Christopher me solta um olhar que eu não sei decifrar, e vai diretamente para a minha bichinha. Eu queria socar a cara dele. — Christopher! — Gritei.
— Está na gaveta da pia do meu banheiro. — Responde, e depois sorri daquele jeito sedutor dele.
Subi a escada sentindo minhas pernas molengas, ele sempre tira suas conclusões, ok que eu realmente irei me raspar "lá", mas ele podia disfarçar um pouco o que passou pela sua cabeça, e não olhar diretamente para a minha parte íntima. Fui até a suíte do seu quarto, e é impressionante como o cheiro dele fica impregnado em tudo. Christopher deveria ao menos ter cecê.
Há inúmeras gavetas na pia do banheiro, e não estava em nenhuma da primeira fileira. Para que uma pessoa quer tantas gavetas? Na minha casa se tem duas no banheiro principal já é muito. A segunda tinha alguns produtos de higiene masculino, e eu quase perdi a minha cor ao ver a terceira gaveta.
Para que um único homem precisa de tanto preservativos? Eu nunca nem vi um preservativo na minha vida, e quando a professora levou na escola eu fiquei envergonhada demais para chegar perto da embalagem. Olhei para o lado e peguei uma, só que o pacote de desenrolou todo e ficou uma fileira de camisinhas. Meu coração estava a mil no meu peito, e eu apertei a embalagem, sentindo que era algo fofo por dentro e talvez líquido, não sei.
Pelo visto ele faz uma coleção de vários tipos, tinha extra lubrificação, texturizada, sensitive, retardante...
— Perdeu alguma coisa?
Eu dei um grito tão alto, que meus pais devem ter ouvido da casa deles. Christopher estava em pé na porta, com os braços cruzados e me olhando de forma divertida. Ele literalmente me pegou com a boca na botija. Eu me tremia tanto que o meu corpo poderia sair dançando ragatanga por conta própria.
Me agachei para pegar a camisinha que eu deixei cair no chão, e me sentia tão nervosa com o flagra, que mal conseguia me mover.
— Essa é boa, porque é feita especialmente para dar mais prazer a mulher. — Christopher apontou a embalagem que estava na minha mão, e eu vi que era a texturizada.
— Vi que você tem a retardante também, né? — Eu queria sair por cima também, ele sempre é ótimo em me deixar constrangida, não faz mal dar o troco. — Imaginei que você é realmente rápido na cama. — Minha frase não surtiu o efeito que eu gostaria, já que o rei caminhou para perto de mim todo cheio da malemolência. Não vai dar certo ele perto de mim sem camisa, e eu só de roupão segurando um monte de camisinhas.
— Então vamos fazer o seguinte, você e eu na cama, primeiro usamos uma camisinha normal, e se você aguentar essa primeiro, podemos fazer o teste com a retardante depois. — Christopher estava tão perto, que eu não conseguia respirar. — É só me dizer, Isobel.
Olhei nervosa para o rei, sentindo que meu coração estava pronto para sair na Sapucaí, porque ele estava mais agitado que a bateria de uma escola de samba do Rio de Janeiro. Como esse homem consegue ser cafajeste nesse nível e ainda por cima continuar sendo atraente?
— Só você mesmo, Christopher! — Empurrei-o, deixando as embalagens bater em seu peito e saí andando, tentando manter o pouco de dignidade que me resta.
— Baixinha, acha que não esqueceu nada?
Olho para trás e Christopher está segurando um barbeador em suas mãos. Eu vou com meu rabo entre as pernas até ele para pegar, e saio do seu quarto o mais rápido possível.
Precisei ficar meia hora no chuveiro gelado apenas para tentar recuperar a minha temperatura corporal, porque me sinto bem febril. Sai do banho para tentar fazer o tratamento de pele diário que Loren prescreveu para mim. Primeiro lavar bem o rosto com o gel de limpeza, e fazer isso usando uma esponja elétrica que vibra, pulsa e descobre a cura do câncer. Depois eu usei um algodão para passar o tônico facial e um sérum hidratante diurno. Mas dispensei o uso da maquiagem na pele, porque eu odiei ficar com aquele quilo de coisas no meu rosto ontem, eu mal conseguia abrir meus olhos por conta dos cílios postiços. Loren falou que se eu cuidar bem da minha pele, não irei precisar de usar base e corretivo sempre.
É estranho pensar que eu sempre fui muito relaxada com essas coisas, porém, não gosto que me vejam feia perto de Christopher. Eu já me sinto bem inferiorizada quando estou com ele, me sentir feia é pior ainda. Odeio me sentir assim, por mais que ele tenha dito ontem que eu estava deslumbrante, ainda continuei me sentindo uma criança ao lado dele, foi assim que a Mônica me olhou, e foi desse jeito que Raquel me olhou também. E eu sinto vontade de chorar quando penso nesse tipo de olhar, porque eu sei que será assim que eu serei vista pela maioria das pessoas. Talvez Christopher não me veja dessa forma, até porque ele faz constantes insinuações indecentes sobre nós dois. Também seria estranho ele me ver como criança quando pensa que irá se casar comigo.
Decidi deixar as minhas paranoias para mais tarde, já que agora eu tenho que colocar uma ex peguete de Christopher no chão. Fui até o closet pensando no que seria o ideal para um almoço na casa de um homem rico, um fato é que eu irei usar o mesmo sapato de ontem, porque não tenho outra coisa, a não ser rasteirinhas, sapatilhas e tênis. Uma vez a minha mãe comprou uma calça clochard preta para mim, eu gosto bastante dela porque ela tem o cós alto e marca a minha cintura, e eu tenho um body branco de ombro a ombro estilo cigano. No final eu gostei bastante do resultado. Meu cabelo ainda estava bonito, bem liso e escorrido, eu só penteie e reparti para o lado. Passei um batom matte vermelho e um rímel, e pronto, está ótimo.
— Isobel. — Christopher apareceu na porta do meu closet. — Nossa...
Olhei para ele, que estava parado me olhando também. Eu gosto quando ele fica vestido de forma casual, porém elegante. Christopher usa uma camisa social branca, com os primeiros botões abertos e a manga dobrada até seus cotovelos. A calça jeans escura e um sapatênis preto.
— Eu vou nesse almoço, porque eu preciso fazer uma média e pegar o meu contrato para levar ao gabinete. Prometo estar de volta em no máximo duas horas.
— Eu vou, não irei deixar você ir no mesmo antro que aquela coisa. — Falo. Christopher sorri para mim e eu reviro os olhos.
— Achei que você me odiasse.
— E eu odeio.
— Mas tem ciúmes de mim.
— Não, eu não tenho. — Reviro os olhos. Pego a minha bolsa que também é preta e saio do meu closet.
Christopher me segue, e a todo momento ele está com aquele sorrisinho convencido dele. Meu Deus, me dá um certo enjoo tudo isso. Hoje o rei escolheu uma Mercedes conversível vermelha. Eu que nunca fui de me impressionar com carros, fiquei boba com o modelo, e com o cheiro de carro novo. Olhei meio abobalhada para o veículo que estava com a capota aberta, e eu me perguntei se sairíamos assim.
— Gostou? — Pergunta, enquanto abre a porta para eu entrar.
— É legal. — Respondo, óbvio que eu não daria o meu braço a torcer.
O rei apenas sorri e entra no seu lugar de motorista. Acho que Christopher seria ótimo se fosse apenas um homem normal como todos os outros. Vejo nele uma simplicidade que muitas outras pessoas — mesmo pobres — não têm, e creio que grande parte disso vem de sua mãe, pois Edith é sempre simples e prestativa com todos. Poderia facilmente me render a esse lado dele, esse lado simples, simpático e brincalhão, entretanto, eu lembro de toda bagagem que vem por trás de Christopher, e eu não me sinto preparada nem fisicamente, ou mentalmente para isso, e não estou nem um pouco preparada para assumir um dos maiores cargos do país, que no caso fica apenas atrás de Christopher. Só de pensar sobre isso me dá um belo de um nó na garganta.
O frio na barriga veio quando saímos dos portões do palácio. O caminho até a grande mansão de Patrick Paulson é relativamente curto, pelo que a minha mente embriagada lembra, mas as pessoas logo reconheceram o rei. Fiquei apavorada, para ser sincera, ainda mais quando as pessoas começaram a tirar fotos nossas e eu podia ouvir o meu nome sendo gritado pelos pedestres. Obviamente ninguém iria se aproximar, até porque estávamos cercados por seguranças.
— Por que você fez isso, Christopher? — Pergunto, porque não seria normal e nem sensato fazer isso.
— Porque eu quero aos poucos acostumar você a receber esse tipo de atenção. — Ele diz.
— O quê? Por quê?
— Porque em breve você irá precisar aparecer publicamente comigo, Isobel, eu tenho evitado diversos eventos que devo comparecer como rei, apenas para te preservar, só que não posso fugir por muito tempo, e gostaria de tê-la comigo.
Preferi não dizer nada, porque realmente é algo que eu devo digerir. Talvez eu preciso de algum acompanhamento psicológico para conseguir entender todas essas mudanças. Ainda não encontrei nenhuma brecha para me safar disso, e eu ainda não me sinto pronta para conversar com meus pais.
Na verdade, eu nem estou pronta para sair do palácio, também não adiantaria nada ficar trancafiada como um bicho no quarto, eu já fiz isso e não foi nada legal. Eu sei que tenho liberdade para ir e vir, Christopher já me falou isso diversas vezes, mas para onde eu iria? O que eu faria? Sendo que foi só ir na farmácia que fui fotografada, e me senti invadida. Eu poderia ir no shopping com as minhas amigas? Não, eu não poderia. Então querendo, ou não, eu me encontro em um tipo de cárcere luxuoso.
Não demoramos muito para chegar na casa dos Paulson's, o que me deixou com uma leve dor na nuca. Mônica vai estar aqui, e eu vou ter que afastá-la de Christopher, porque eu vim com esse intuito. Assim que saímos do carro, eu corri para pegar na mão do rei, o bendito riu quando percebeu a minha afobação. A governanta simpática nos cumprimentou, cheia de pompas e fomos andando para dentro da casa. Eu mal me lembrava da decoração luxuosa em tons de cinza. Os ricos gostam dessas coisas minimalistas em casas exorbitantes de grandes. Fica bonito, mas eu ainda sinto falta da minha casa entulhada com móveis sem planejamento, ou decoração que nada combina com nada.
Sônia veio correndo para me agarrar, sei que ficamos conversando durante muito tempo ontem a noite, e ela não é de tão ruim, acordei inclusive com uma foto nossa publicada no Instagram dela, a segui de volta também. Patrick apertou a minha mão, e fomos encaminhados para a área da piscina, onde iriamos aproveitar o tempo levemente ensolarado para almoçar.
Meu pesadelo estava lá, na piscina, usando um biquíni vermelho, saindo da água como se fosse a própria Gisele Bündchen. Soltou seu olhar para Christopher como se fosse uma leoa, e fiquei feliz em notar que o rei sequer havia notado ainda a sua presença. O diabinho começou a aplaudir na minha cabeça, e eu virei o rosto do digníssimo para mim e dei um selinho nele, ainda alisando o seu rosto. Christopher me olhou confuso, mas sorriu.
— O casal feliz voltou. — A cobra de aproximou de nós para destilar veneno.
— Infelizmente não podemos ficar trancados no quarto o dia todo. — Sorri para ela, segurando o braço de Christopher.
— Eu sei como isso é ótimo. — Ela falou. Queria me jogar em cima dela e arrancar cada fio dos cabelos loiros.
Desde quando eu me tornei esse tipo de pessoa? Meu coração só faltou sair pela boca quando Christopher apertou a mão dela, eu iria bater nele também se ele ficasse mais de três segundos a cumprimentando. Fomos até a mesa que já estava posta, e começaram a nos servir. Fiquei feliz porque não houve nenhuma enrolação.
O primeiro prato era estranho. Era um quadradinho de duas camadas, embaixo parecia ser arroz preto e em cima tomate picadinho com aquela folhinha, que ninguém nunca come, de enfeite. Fiquei um pouco indecisa na hora de comer, porque visualmente falando, a comida me deu vontade de vomitar. Olhei nervosa para Christopher, ele notou que eu não queria comer, mas eu devo comer. O pior é que eu não sou muito fã de tomate. O negócio estava horrível, e ainda tinha vinagre balsâmico na decoração do prato. Eu precisei por a mão debaixo da mesa para apertar a minha perna toda vez que eu colocava uma garfada na boca, bebia o suco de laranja para conseguir engolir tudo. Santas aulas de etiqueta que me ensinaram a como se comportar em uma situação dessa.
Christopher conversava com Patrick sobre a noite de ontem, e eu soube por alto que eles conseguiram convencer alguns donos de lojas e restaurantes para abrir uma área de compras e alimentação. Fiquei feliz por Christopher.
Pelo que entendo de economia, me parece que Christopher está tentando abrir novas portas para Aregan com o turismo, o que eu acho sensacional, porque apesar de tecnológico, o nosso país ainda é repleto de construções antigas, parques nacionais, museus e coisas do tipo. Sei que as principais fontes de renda vêm da pesca e do petróleo, mas mais nunca é demais.
Infelizmente, Aregan nem sempre foi tão próspera. O país já sofreu bastante com desemprego, com inflação alta, com algumas dívidas em outros países e a saúde pública já foi uma calamidade, creio que por isso meus pais aceitaram o contrato do antigo rei, na época em que eu nasci as coisas estavam começando a se ajeitar, mas ainda estavam na corda bamba, todavia, nada justifica a traição dos meus pais.
O prato principal era polvo, na verdade, três tentáculos de polvo em cima de um purê com alguns matos coloridos. A visão era terrível, parecia aqueles pratos que são desclassificados do Master Chef. Me deu uma gastura ter que ver aquilo, obviamente eu já comi polvo, o que a minha mãe faz, porém a apresentação do prato é bem mais apetitosa que isso.
Christopher e eu trocamos olhares, estamos acostumados a comer comida normal no nosso dia a dia no palácio, e agora teremos que comer isso em um almoço de domingo. Não havia outra opção, ou eu sairia como a mal educada da história, não queria dar o braço a torcer, ainda mais na frente de Mônica. Estava até bom, devo assumir, mas a cara nada atraente da comida que foi a pior coisa.
De sobremesa tivemos rasmalai, e eu gostei bastante. Nos sentamos perto da piscina, no mesmo banco que eu me lembro de ter sentado ontem a noite. Christopher deixou seu braço em volta dos meus ombros e eu apoiei a minha mão em sua perna, talvez assim nós parecemos um casal de verdade.
— Vocês foram embora tão cedo, ontem. — Sônia dizia, sempre carregando o sorriso bonito nos lábios.
— Queríamos ficar sozinhos. — Respondo, porque foi a única coisa que veio na minha cabeça.
— Inicio de namoro é assim mesmo, um fogo. — Patrick brinca, e eu fico um pouco constrangida. Não há fogo nenhum.
— Vocês estavam bem safadinhos ontem dançando.
Fiquei mais constrangida ainda. Bebi o suco, sentindo meu rosto ficar vermelho de vergonha. Lembro vagamente de ter dançado com Christopher, mas será que foi de maneira indecente? Senti um calor subir pelo meu corpo, e minha respiração acelerou um pouco. O que eu fiz ontem? Jesus.
— Isobel até que tem um pouco de ritmo. — Mônica solta o seu veneno. Ela olha de maneira indiferente para as suas unhas pintadas de vermelho, como se estivesse procurando algum defeito.
— Na verdade eu já tive bastante aulas de dança, eu realmente levo o jeito para a coisa. — Digo. — E Christopher gosta.
— Impossível não gostar. — Ele sorri para mim. É um sorriso enigmático, no fundo eu sei que ele foi bem sincero ao dizer que gosta de mim dançando. Esses sorrisos de Christopher me deixam nervosas.
Com o contrato assinado em mãos, um rei feliz, eu com dor de cabeça, nós partimos. A presença de Mônica de biquíni nos rondando foi o suficiente para me deixar de mau-humor para o resto da semana. Eu que não sou filha de nenhum milionário, sei como é terrível você ficar assim no meio de um almoço, talvez vestir uma saída de praia seria menos pior.
Nunca nem havia chego perto dos prédios do governo, e é tudo muito luxuoso, com a faixada em aspecto antigo, porém por dentro é tudo muito moderno e minimalista. Como é domingo o prédio está vazio, e eu aproveitei para tirar os meus sapatos e me jogar no sofá do escritório de Christopher. A parede é toda de vidro, a janela vai do chão ao teto, dando uma vista panorâmica e perfeita do centro da Capital Bergenthal, que por coincidência é o sobrenome de todos os membros da família real.
Peguei meu celular para passar o tempo, enquanto o rei mexia no seu computador. Parece que está arquivando um arquivo no sistema de gestão do país. Fiquei interessada em saber mais sobre isso, mas no momento estou bem estressada para falar alguma coisa.
Estava vendo as publicações de quem eu costumo seguir no meu Instagram, curti e comentei as fotos das minhas amigas — até mesmo elas ganharam bastantes seguidores, porque as pessoas descobriram que elas são minhas amigas íntimas —. Então um diabinho subiu no meu ombro, e me fez ter aquela curiosidade de procurar pelo Instagram da nojenta da Raquel. Ela deve usar o mesmo sobrenome que o meu, então as pessoas devem ter a seguido também.
Abri o perfil da minha indesejada prima, decidi não ver os Storys dela, pois provavelmente iria aparecer que eu estava a fuxicando, e há coisas que nós devemos fazer apenas no sigilo.
Meu coração veio parar na minha boca quando eu vi uma foto do Christopher com ela, toda sorridente e estonteante. Queria jogar a droga do meu celular pela janela de ódio. Como essa vaca foi pedir para tirar uma foto com o Christopher no aniversário da minha avó? E por que o retardado do Christopher aceitou, sabendo que eu a odeio?
Precisei largar o celular, fechar os olhos, respirar fundo cinco vezes, contar de 10 a 0, rezar um Ave Maria...
— Aconteceu alguma coisa? — Mas ouvir a voz de Christopher foi um gatilho para eu explodir de raiva.
— Primeiro, você me leva na casa da sua ex peguete. — Levanto e pontuo com o dedo. — Segundo, eu abro a merda do meu Instagram e vejo uma foto sua, todo sorridente, com a nojenta da Raquel! — Grito quando termino de falar.
— Isobel, por favor... — Ele se reclina na cadeira e leva a sua mão até o rosto bufando alto. — Eu tinha uma vida, ok? Eu saia, conhecia outras pessoas e transava por aí, não tem como mudar o meu passado.
— Mas isso justifica me levar na casa da Mônica? Ou justifica o fato de você ter tirado uma foto com aquele resto de aborto da minha família? — Me debruço sobre a mesa para olhar nos olhos dele.
— Isobel, a gente ficou só uma vez e estamos tendo essa discussão ridícula e sem sentido. — Ele fala com tranquilidade, o que me deixa com mais raiva ainda.
— Ridículo é o que eu estou passando, tendo que me sujeitar a ficar andando com um galinha como você. As pessoas olham para mim e falam "oh, olha essa interesseira que engravidou do rei". "Ah, ela só quer fama, dinheiro e atenção". Isso que é ridículo!
— Infelizmente, eu não posso controlar o que as outras pessoas falam, Isobel. — Christopher se levanta.
— Mas poderia evitar fazer com que eu me sinta um lixo. — Murmuro.
Sinto raiva, vontade de chorar, medo, tristeza, nervoso, tudo junto. E todos esses sentimentos ficam piores, porque estou menstruada, e eu fico só o pó da rabiola nessa época. Controlei as lágrimas que vieram, e dei as costas para Christopher, olhando toda a bela paisagem do meu país pela janela, o último lugar que eu desejo estar no momento, seria bem mais fácil estar me afogando no meio do oceano agora.
— Isobel, o que eu posso fazer por você?
— Me deixar ir embora, e esquecer que eu existo.
— Não posso fazer isso. — Ele diz.
Cada dia que passa eu sinto o meu surto psicótico vindo, me sinto uma mercadoria vendida, não, na verdade, me sinto como um cachorro vira-lata que é tirado da sua família para ser entregue a um canil. Ninguém se importou momento algum com o que eu sinto, com o meu futuro psicológico, só me jogaram em meio aos lobos e mandaram com que eu me virasse.
Não vai ter quarto gigante, closet recheado com roupas caras e luxuosas, ou um homem bonito que faça com que eu me sinta menos traída.
— Você não me da uma chance, Isobel.
Christopher se aproxima e tenta me abraçar, mas eu o empurro. Não quero ser tocada por ele, não quero ceder, não quero ser fácil, eu não o quero.
— Você está parecendo uma criança mimada. — Ele reclama. Parece que eu o tirei do sério.
— Talvez eu seja assim por culpa sua.
— Por culpa minha? O que eu fiz agora, então?
— Me dava presentinhos, né? Ficava tentando me comprar todos os anos.
— Eu também fui colocado nessa situação, Isobel, estamos no mesmo barco.
Precisei rir bem alto, porque não era possível.
— No mesmo barco? O que você fez durante todos esses anos? Saiu por aí com a metade do país, e ainda vem dizer que estamos no mesmo barco? Você é um velho, Christopher!
— Eu sou um adulto, muito diferente de você, que parece uma criancinha de 5 anos.
— Agora vai me ofender? — Cruzo os braços abaixo do peito.
— Você que começou a me ofender, desde o dia em que me conheceu. — Ele se aproximou de mim, a minha vontade era de sair correndo, mas cravei os pés no chão, não daria o braço a torcer. — Você é uma menininha, mimada, boba e mau educada.
Levantei a mão para dar um tapa na cara dele, mas Christopher segurou meu braço. Fez algo louco, e conseguiu me virar de costas para ele, deixando meus braços dobrados para trás.
— O que você está fazendo, seu louco? — Me debato toda e grito. — Me solta!
— Você quer que eu lhe trate como uma criança, né, Isobel?
— Me solta! — Grito. — Seu idiota!
— Não vou soltar, e se você der mais um grito, eu vou bater na sua bunda. — Um arrepio subiu pela minha espinha, e eu comecei a me debater mais ainda, só que ele me prendia mais forte, mantendo todo meu corpo colado ao dele.
— Você nem é louco.
— Eu sou, não foi disso que você me chamou minutos atrás? Talvez seu pai não tenha feito isso na sua infância e deixou essa função para mim!
— Seu velho! Me solta! — Eu me debati e dei um grito altíssimo. — Lawrence!
Minha boca foi tampada, e eu me senti refém demais. Jesus. O corpo de Christopher se engrandeceu mais ainda quando eu fui forçadamente debruçada sobre a mesa. Estava imóvel, com ele curvado sobre mim, seu peso todo me prendendo sobre o gelado da superfície da mesa.
— Você pediu por isso, Isobel. — Sussurrou em meu ouvido, deixando-me toda arrepiada. Era para eu gostar de estar assim?
Christopher se afastou de mim, mas ainda segurava meus braços e me prendia debruçada sobre a mesa, eu queria gritar, mas me tremia tanto, que até as minhas cordas vocais ficaram incapacitadas. Mas o grito veio, no exato momento que um belo tapa estalou na minha bunda.
Senhor Amado! Não sabia ao certo o que sentir. Estava nervosa, ofegante, tremendo, sem forças, fraca, zonza... Não conseguia nem levantar da mesa, tamanho o impacto do que acabou de acontecer.
Precisei de alguns segundos para pensar, repensar, e pensar de novo. O que o Christopher acabou de fazer? Me senti humilhada, revoltada e molhada...?
Molhada?
Era demais para mim. Sai da sala sem nem olhar para a cara de Christopher e fui em direção ao Lawrence.
— Me leva embora agora! — Peço.
— Senhorita, o rei...
— O rei coisa nenhuma, me leva embora agora! — Peço, com um tom autoritário demais, até desconhecido por mim.
— Tudo bem, senhorita.
Eu entrei no elevador, bufando, Lawrence estava do meu lado, confuso e se comunicando com Christopher, pelo que eu entendi avisando que eu iria embora. Minha cabeça estava tão nublada que eu não conseguia focar em nada.
Só me dei conta de que estava descalça, sem minha bolsa e o celular quando cheguei ao palácio. Christopher ainda não havia chego, e eu não iria pedir meus pertences. Eu só preciso de um calmante para conseguir deitar e dormir pelo resto da minha vida.
❤
Soltei esse capítulo e saí correndo.
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