Capítulo 18
Um ano depois...
Acordei com a luz forte do sol afetando diretamente meus olhos. Virei o rosto para o lado afim de me livrar do brilho intenso. Minha cabeça doía muito e depois de alguns segundos minha visão ficou nítida, e eu me deparei com um quarto totalmente estranho.
As memórias do acidente demoraram a aparecer na minha cabeça, meus pensamentos estavam confusos, e eu não fazia a menor ideia de onde estava e nem de como vim parar nesse lugar.
Levantei para me escorar na cabeceira da cama, mas senti uma leve dor no corpo, principalmente na perna que estava toda engessada.
Droga!
Esse quarto não parece ser de um hospital.
Logo comecei ficar agitada e ansiosa e só tinha uma coisa que me acalmava nessas situações.
Álcool.
Olhei em volta, tentando encontrar qualquer coisa que fosse similar ao álcool, porque minha boca já estava começando ficar seca. Coloquei a perna no chão devagar e fiz um movimento pra me levantar da cama.
Tudo doía em mim.
Fui me apoiando nos móveis até chegar em um criado mudo, onde encontrei um frasco de perfume.
Sem hesitar, despejei de uma vez na boca, sentindo o líquido amargar e queimar no meu estômago. O gosto era horrível, mas até eu não encontrar nenhuma bebida, isso poderá ser útil.
Insatisfeita com a falta de respostas para as perguntas que martelavam na minha cabeça, eu arrastei a perna relutante até a porta principal, e ao abri-la me deparei com uma escada imensa.
Óbvio que não vou conseguir descer, não nesse estado.
E mesmo que o corrimão possa ajudar, qualquer tropeço seria fatal.
Seja lá quem me sequestrou deve ter uma boa explicação pra isso.
Fechei a porta e voltei pra cama, me sentindo um pouco desconfortável, era como se o meu corpo tivesse sido virado de cabeça pra baixo, e eu sentisse os ossos chacoalhando dentro dele.
De repente ouvi alguns passos na escada, e rapidamente eu me deitei na cama, sentindo uma dor aguda.
Mordi os lábios para conter a agonia, ajeitei o cobertor, e fingi que eu estava dormindo.
O estranho entrou, fechou a porta, em seguida veio com passos lentos na minha direção.
Meu coração disparou.
Prendi a respiração assim que ele chegou bem perto. Eu estava com rosto virado para a parede, rezando para que ele não me fizesse nenhum mal.
-- Sei que não está dormindo.
Uma voz grave soou me assustando completamente.
Virei o rosto devagar e me deparei com um cara magro, cabelos negros, olhos verdes mas de um tom mais escuro, além de está usando óculos de grau.
Ele sorriu assim que reparou que eu não parava de olhar para ele, mas na verdade eu não estava encantada e sim confusa e assustada.
Como eu vim parar aqui, quem é esse cara?
E por quê ele está sentado do meu lado na cama, será que passamos a noite juntos e eu não me lembro.
-- Que bom que acordou, já estava na hora.
Eu continuei calada tentando entender a situação. Acho que beber aquele perfume não foi uma boa ideia, meu estômago já estava começando a revirar.
O cara estranho até que é bonito, mas a cor dos seus olhos me faz lembrar de uma pessoa que eu quero muito esquecer, e só por causa disso eu não estou tão confortável.
-- Eu sei que deve estar assustada - Suspirou - e que não sabe o que está acontecendo, mas não se preocupe eu irei esclarecer tudo depois, mas primeiro..
Ele se virou e pegou uma bandeja com o café da manhã, que estava atrás dele, e colocou diante de mim.
-- Precisa comer.
Olhei para a bandeja e depois para ele, ainda mais confusa.
-- Quem é você?
Ele suspirou novamente e me olhou, procurando as palavras certas.
-- Desculpe por ter te causado todo esse transtorno, juro que não foi minha intenção - Ele fala com tristeza no olhar.
-- Como assim? - Olhei no fundo dos seus olhos e franzi as sobrancelhas.
-- Digamos que eu... meio que atropelei você.
Arregalei os olhos, assustada.
-- Mas diferente de muitos, eu não fugi, e inclusive assumi a responsabilidade de cuidar de você...eu não queria, eu não bebi nem nada, mas eu estava frustrado, tinha acabado de voltar do hospital onde recebi uma notícia ruim, e...
Ele respirou fundo ao ver que eu estava comecando a ficar agitada, e tirou os óculos me olhar melhor nos olhos.
-- Enfim, eu sinto muito.
Eu abaixei a cabeça atordoada vendo diversas memórias se embaralhar na minha cabeça, e junto com elas uma forte dor.
-- Eu... preciso sair daqui, tenho que ir embora - Me levantei da cama.
Eu nem sabia se ainda tinha uma casa. Minha mãe deve ter desistido de mim, como a maioria das pessoas.
-- Espera - Ele segurou o meu braço, mas eu puxei de volta, sentindo a minha respiração acelerada, me sufocando.
Ninguém nunca mais vai chegar perto de mim, não vou deixar ninguém me machucar outra vez.
Senti as lágrimas nos olhos.
-- Você não está em condições de voltar pra casa, fica aqui mais alguns dias até você se recuperar totalmente
Ele estava com um olhar gentil, porém é muito estranho alguém te ajudar hoje em dia, sem esperar nada em troca.
Há muitos lobos em pele cordeiro.
-- Não, fica longe de mim, eu não conheço você, você pode ser qualquer um tentando se aproveitar das minhas fraquezas, mas eu não vou deixar, está entendendo? - Gritei.
Ele se aproximou calmamente e tentou tocar o meu rosto, mas eu me afastei relutante, mas em nenhum momento ele me agrediu, como eu já presenciei muitos fazerem no tempo que estive morando na rua.
-- Eu não quero me aproveitar de você, quero cuidar de você, te ajudar a se reerguer, é o mínimo que eu posso fazer depois de ter te atropelado e tornado sua vida ainda mais limitada..
Enterrei o meu rosto nas mãos aflita, sentindo uma dor dilacerante no abdômen, toda vez que eu respirava.
Por impulso, eu levantei um pouco a blusa e vi que minha barriga também estava enfaixada.
Ele acompanhou os meus olhos com tristeza, enquanto eu tampava a boca apavorada. Eu nunca tinha me machucado feio assim.
O que está acontecendo comigo?
-- Você fraturou algumas costelas no impacto, mas já foi submetida a cirurgia e tem que se recuperar bem.. eu inclusive tive que dormir no hospital, porque você ficou alguns dias desacordada, você não tinha nada, nem roupas, nenhum documento, eu não faço ideia de quem você é, como é a sua vida, e nem que diabos você estava fazendo na rua sozinha aquela hora, mas eu não vou sossegar até que você esteja perfeitamente bem, e para isso acontecer, eu preciso que confie em mim
Pensei por um instante. Confiar é uma palavra forte que foi tirada a muito tempo do meu vocabulário, é difícil confiar nas pessoas depois que você é destruída, depois que você é abandonada, mas eu não tenho para onde ir, e não quero voltar para rua, porque uma coisa é confiar, outra e se sentir segura, e eu não estou segura ao lado desse estranho que se faz de bonzinho, mas nas ruas eu estou muito mais vulnerável. Tem homens piores do que ele lá, piores do que o Fred.
Não, piores que o Fred não existe, até apanhar é menos doloroso do que o que ele fez comigo.
E aqui sabe se lá onde estou, eu tenho uma cama e comida, então se eu recusar tudo isso para voltar para o inferno, eu estarei sendo idiota, porém vou dormir com um olho aberto e o outro fechado, caso esse cara tente me fazer algo.
Ele é estranho sim, mas por outro lado, ele salvou a minha vida, e mesmo que eu não confie nele, ainda sim estou em dívida com ele.
Devo a minha vida a ele, porque ele simplesmente poderia ter me deixado lá pra morrer, e no entanto me trouxe para a sua casa. Acho que na situação da qual eu me encontro, ninguém faria isso por mim.
-- Está bem - Suspirei
Ele abriu um sorriso genuíno.
-- Ótimo, agora é melhor buscar outro café porque esse daqui já esfriou - Ele riu — Eu já volto.
E assim que ele se levantou e saiu, eu ataquei aquela torrada como se fosse a primeira refeição que eu faço na vida.
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