03. NANCY PEDE AJUDA
— Sério, quatro a um, bocó.
Robin gargalha da desgraça alheia do colega, anotando outro pauzinho no quadro branco de foras de Harrington.
Há um curativo na minha testa, um no cotovelo esquerdo e outro no joelho direito. Estou sentada a quatro horas nessa sorveteria e sinceramente não pretendo ir a mais nenhum lugar, talvez para não exigir esforço do meu corpo ou talvez por quê a comédia naquele ambiente era o suficiente para minha serotonina.
— Qual a razão por ele estar desesperadamente querendo sair com alguém? — pergunto a Robin, observando o garoto de longe.
— Talvez para provar que superou Nancy Wheeler ou por carência mesmo. — Robin joga as pernas para cima da mesa se reencostando na cadeira.
Estamos no fundo, a janela está aberta. Por isso diálogo baixo.
— Nancy Wheeler é a ex? — pergunto.
— A ex que trocou ele por Jonathan Byers.
— Eu ouvi isso, hein! — gritou Harrington do lado de fora.
— E eu tô mentindo? — Robin provocou de volta.
Steve revirou os olhos do outro lado da janela, antes mesmo de se virar para atender um grupo de garotas.
— A questão é: estamos apostando e até agora eu tô ganhando. — aponta pro quadro.
— É. Eu tô vendo.
Há alguma coisa nisso que não se encaixa muito bem, quer dizer, Steve não é tão ruim. Claro que não faz o meu tipo, apesar de ser um pouco atraente, por quê Wheeler o trocaria por outra pessoa? Ah, não ser que esse Jonathan seja muito, muito bom em alguma coisa.
— Como que o ridículo ali atropelou você? — Robin me pergunta, se levantando para pegar um pacote de pipoca.
— Desci no ponto errado no caminho daqui, não sei como ele não me viu.
Olho de relance através da janela o vendo trabalhar.
— Além de ser ruim em flertar também é cego. — Robin enche a mão de pipoca colocando na boca.
— Pelo menos resultou em alguma coisa boa, estava cansada de estar na companhia de pequenas pessoas abaixo de dezesseis anos.
Robin gargalha no "pequenas pessoas" se sentando novamente na cadeira.
— Steve é assim. Tem uma creche, não sei como e nem por quê aquelas crianças gostam tanto dele. Mas, estão o tempo todo aqui.
Sorrio sem perceber, olhando mais uma vez através da janela. Só que nossos olhares se encontram por dois segundos, antes mesmo dele desviar e voltar a atender. Me lembro do motivo exato por não ter amigos, por não deixar ninguém se aproximar. Algo ruim sempre... sempre acontece. E o sorriso que antes pairava sobre meus lábios ao olhar para o garoto, simplesmente desapareceu.
— De verdade Robin, pra mim já deu. Seu tempo agora.
Steve adentra de uma vez o ambiente tirando o chapéu da cabeça, frustrado com alguma coisa.
— Cansado de perder? — Robin se levanta do meu lado.
— É esse chapéu ridículo que esconde meu maior charme. Quer saber? Dane-se as regras. — jogou o chapéu na mesa a minha frente — Vai lá, vai. — fez movimentos de vai e vem com a mão para a garota.
— Fala sério, eu te cobri dois turnos essa semana e você ainda chegou atrasado hoje.
— Eu cheguei atrasado por causa... — moveu as duas mãos na minha direção.
Franzi o cenho instantaneamente, me sentindo acusada.
— Ei. Não foi minha culpa, não.
Mas, eu sabia que tinha sido sim. A qualquer movimento meu, um andar, um respirar, um gesto pequeno — faz com que algo ruim aconteça em algum lugar. Raramente é comigo, na maioria das vezes é longe, é a quilômetros de distância, é em outra cidade ou país. Na maioria das vezes eu não vejo, então não me sinto tão culpada. Mas, quando é comigo eu sei... eu sei a razão.
— Não tô dizendo que foi sua culpa, só tô dizendo que não foi totalmente minha. — se explicou rapidamente.
Seguro novamente a vontade de sorrir. Ele era patético.
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— Pode voltar amanhã se quiser. — Robin comentou enquanto saíamos para fora.
Passei literalmente o restante da tarde todinha ali, sem fazer absolutamente nada. E sinceramente? Eu me sentia bem.
— Se o marinheiro ali não tentar me matar de novo.
Olhamos para trás em conjunto vendo Steve rodando a chave do carro entre os dedos, alheio as coisas a sua volta.
— Gostei muito de atrapalhar o trabalho de vocês, qualquer coisa é só chamar. — brinco assim que Steve chega perto de nós duas.
— Foi uma honra.
Ele fingiu uma reverência, me fazendo gargalhar ao mesmo tempo que Robin já se distanciava.
— Desculpa pelo atropelamento. — pediu, após eu cessar minha risada.
Não sei se era alguma coisa da luz do poste ou sei lá o que. Mas, me senti nervosa por um segundo ao ter totalmente a atenção dele sobre mim.
— Foi uma honra. — imitei seu gesto, arrancando dessa vez uma risada nasalada dele.
Steve enfiou as duas mãos no bolso do uniforme, ao mesmo tempo em que seus olhos pararam sobre algo a frente. Imitei seus movimentos, dando de cara com Billy encostado no carro com os braços cruzados observando a cena cautelosamente.
A porra do arrepio subiu toda minha espinha.
Não me despedi dele, apenas caminhei na direção de Hargrove com a expressão mais confusa possível no rosto.
— Que merda é essa? — sua voz soou estridente e rouca.
Billy tirou o cigarro da boca, apontando o dedo para minha testa.
— Foi um acidente.
Entro no banco do passageiro, meu coração a mil. Ele também entra no do motorista. Dois segundos depois arranca o carro sobre as ruas de Hawkins, permaneço quieta. Pois, não pedi para ele me buscar.
— O que estava fazendo com o Harrington?
Estressado, Billy está estressado. Sua voz sai tão firme e grossa que eu me forço a não olhá-lo.
— Ah, eu, sei lá. — dou de ombros.
— Ah, você, sei lá, Layla? — pergunta, soltando uma risada sarcástica.
As ruas estão escuras, o único som é o das pedrinhas batendo na lataria do carro.
— Quer que eu diga o que, Hargrove? — me viro dessa vez na sua direção — Eu hein.
Ele pisa fundo, meu corpo cola no assento.
— Eu quero você longe, dele. — gritou, com os dentes cerrados.
— Por quê eu... por q-
— Me entendeu, Barnes? Longe. — era uma ordem.
Seus olhos fervia de alguma coisa quando ele olhou para mim.
— Para o carro. — pedi, nervosa.
Ele fingiu não me escutar, pisou mais fundo no acelerador.
— Billy, para a porra do carro. — gritei — Para essa merda.
Fez o que pedi, apertou o freio com tanta força que se eu não tivesse me segurado teria batido minha cabeça já machucada na porta.
— Vou andando.
Desci, bati a porta e comecei a andar na mesma direção. Um segundo, dois, três, quatro. Foi o tempo que levou para ele arrancar o carro mais uma vez, passar por mim e me deixar para trás. Segurei a dor de cabeça que queria começar a se instalar em mim, da mesma maneira que segurei as lágrimas. Ele era um babaca de merda, um babaca de merda que eu não havia pedido pra me buscar. Apesar de nos primeiros dois segundos ao vê-lo lá parado me esperando, meu coração deu uma acelerada. Agora estava tudo desmoronando.
— Ei.
— Puta merda, caralho. — gritei tão alto que qualquer um passando por ali teria ouvido.
A pessoa tirou a lanterna do meu rosto, estava parada ao lado do próprio carro.
— Desculpe. — sorriu, abaixando a luz — Pode me ajudar aqui?
Apoiei a mão no meu peito, sentindo a maneira que meu coração batia rápido pelo susto.
— Sim, claro. Desculpa, você me assustou pra caralho. — falei e ela sorriu, entregando a lanterna nas minhas mãos.
Aquele ali era o momento típico dos filmes quando alguém é morto ou sequestrado.
— Você é? — pergunto, ao vê-la se inclinando sobre o capô do carro.
— Nancy e você?
— Ué. — emito um som agudo — Nancy, a ex?
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