Capítulo 27 - Você é meu tudo
"Eu prometo te dizer eu te amo todas as noites e te provar isso todos os dias".
🐍▫️Antoinette▫️🐍
Enquanto íamos parando gradualmente ainda enroladas uma na outra, nossas respirações pesadas e ofegantes preenchiam a sala, iluminada apenas pela lareira que ainda flamejava. Os meus olhos foram se abrindo, à medida que as palavras de Cheryl pairavam sobre nós. Como uma estátua, ela permaneceu no meu colo. Seus braços continuaram envolvendo meu pescoço e nossos rostos se mantiveram colados. Minha cabeça se movia a mil por hora, e podia sentir seu coração batendo no mesmo ritmo que o meu.
Movi o polegar com delicadeza, tocando as covinhas deliciosas na sua lombar, e respirei fundo.
- Pêsse...
- Shhh - interrompeu, em um tom baixo e ansioso - Só isso. Shhh. Não diga nada - fiz menção de mover a cabeça e olhar em sua direção, mas Cheryl me segurou firme - Não se mexa. Por favor.
Confusa, continuei abraçando-a na mesma posição, aconchegada no seu calor. Expirei um tanto trêmula, preocupada, ao ver que ela permaneceu imóvel e em silêncio. Por que Pêssegos estava tão quieta, droga? Será que tinha se arrependido de dizer aquelas palavras? Talvez tivesse sido um mero impulso inspirado pelo sexo incrível que tínhamos acabado de fazer. Talvez ela não estivesse falando sério.
Surpreendentemente, o meu coração parou com aquele pensamento em particular.
- Cheryl. - suspirei - Por favor.
- Desculpe - sua voz era trêmula.
Engoli em seco. Ouvi Pêssegos fungar alto e tentei olhar seu rosto novamente, mas ela era forte demais.
- Cheryl. - supliquei - Olhe para mim.
- Não consigo.
- Por que não?
- Porque eu... não consigo. Eu não devia...
Ao ouvir aquelas palavras, segurei em seus pulsos e os afastei. Enquanto segurava seu rosto carinhosamente, deixei que meu olhar passasse questionador pela sua face. Imediatamente uma sensação enorme de desconforto se alojou dentro de mim, quando percebi que Cheryl estava chorando e sua expressão era de dor.
Mordendo o lábio inferior, afastei os cabelos úmidos do seu lindo rosto.
- O que você não devia ter feito?
Se tinha sido apenas um tropeço, então queria ouvi-la dizer. Por mais masoquista que isso parecesse, se Cheryl falou aquelas palavras sem ter a intenção, precisava saber. Queria acreditar nela, de verdade, mas havia muitas coisas em minha cabeça que me faziam duvidar. Odiava ter qualquer dúvida, mas não conseguia evitar. Havia sido programada daquele jeito: para ser desconfiada e descrente.
Fechei os olhos por um momento, tentando ao máximo me livrar da incerteza que se espalhava por todo o meu corpo. Quando voltei a abri-los, Pêssegos olhava para baixo, para nossos corpos ainda conectados um no outro.
- Eu não devia ter dito aquilo.
Desabei, observando-a enxugar as lágrimas. Deixei que minhas mãos caíssem, derrotadas. A sensação quente de pós-coito dentro de mim ficou instantaneamente fria.
- Está tudo bem - falei, sem tentar demonstrar a dor que estava sentindo - Acontece.
- O que acontece? - perguntou, deslizando a mão entre meus seios e contornando minha pele com as pontas dos dedos.
- Tenho certeza de que as pessoas dizem coisas assim o tempo todo. Você sabe, quando se deixam levar pelo momento - respondi, mantendo os olhos nas chamas que tremulavam na lareira.
Houve um segundo de silêncio total em que Pêssegos ficou tensa em meus braços. Raios iluminavam a sala. Os meus olhos se fecharam automaticamente, quando sua mão tocou meu queixo, aproximando nossos rostos de maneira lenta e tortuosa.
- Você acha que me deixei levar pelo momento? - dei de ombros. Ela balançou a cabeça de um lado para o outro e limpou a garganta - Não me deixei levar, Antoinette.
O meu nome nunca soava tão bem quanto na voz de Cheryl. Fixei meu olhos nos dela, buscando por qualquer relance de mentira, mas tudo o que seus lindos olhos diziam era a verdade.
- Não deixou? - a sua cabeça continuava balançando, enquanto ela fazia um "não" silencioso com a boca. O meu peito se agitou enquanto tentava recuperar a linha de pensamento e a habilidade de falar - Se você não se deixou levar pelo momento - murmurei - Por que está pedindo desculpas?
Pêssegos desenhou círculos invisíveis em torno do meu umbigo. Ela ficou em silêncio por um bom tempo, deixando-me uma pilha de nervos.
- Pedi desculpas porque não queria ter dito daquela maneira. Eu não sabia se você ia querer ouvir. Estava com medo de que não quisesse ouvir - aos poucos, ela ergueu a cabeça - Eu não queria falar quando estivéssemos juntas desse jeito.
- Por quê?
- Porque é clichê. Piegas.
- Cher - saí de dentro dela, segurando suas mãos contra meu próprio peito e respirei fundo - Você estava falando sério?
A minha voz parecia tão estranha. Sentia-me pequena. Minúscula. Fraca. Frágil. Cheryl encostou a testa na minha.
- Sim - sussurrou - Estava. Por tudo o que sou, eu estava falando sério.
🍒▫️Cheryl▫️🍒
Dizer aquelas três palavras para Antoinette, por mais assustador e inesperado que tenha sido, havia deixado tudo dentro de mim mais leve. Eu amava cada pedacinho dela, dentro e fora, bom e mau, passado e presente.
Topaz soltou um suspiro, seus dedos estavam repentinamente no meu rosto, tocando meus lábios.
- Quero ouvir - Toni sacudiu a cabeça, atônita - Eu não sabia quanto até agora. Nunca mais se desculpe por dizer isso.
- Mas...
Ela me interrompeu de novo com um beijo ardente que fez meus dedos do pé se apertarem. Era cheio de desejo, gratidão e um gemido longo que vinha de suas entranhas. O meu corpo se aconchegou no seu, aliviado.
- Posso confessar uma coisa? - perguntou baixinho, quando nossos lábios se separaram - Você é a primeira pessoa, a primeira pessoa de toda a minha vida a dizer essas palavras para mim.
Pisquei, perplexa.
- Mas sua família... - comecei, provocando uma expressão surpresa e sardônica nela. Certo. É claro que não - Sua avó? - arrisquei - Amigos?
Os seus olhos fitaram minha boca.
- Eu sempre fui o "tesouro" da vó, e ela, de fato, me amava, mas nunca disse as palavras. E meus amigos? - ela riu - Não somos exatamente do tipo que abraça e troca afagos. Zack é como um irmão para mim, mas... Não, não dizemos isso um para o outro.
Estava completamente abismada. Como é que a mulher à minha frente nunca tinha ouvido alguém lhe dizer que ela era amada? Que tipo de pais permitiriam isso? Como é que Antoinette tinha conseguido viver por tanto tempo sem que lhe dissessem como ela era especial? Sem palavras, a beijei novamente.
- Não se desculpe, pelo amor de Deus - pediu - Ouvir essas palavras de você... Não importa onde ou como as disse. O que importa é que simplesmente disse.
Abracei-a com força, nossos corpos totalmente colados um no outro, enviando vibrações gostosas para meu sexo.
- Eu amo você - sussurrei mais uma vez, com os lábios perto do seu ouvido.
Topaz apertou de leve minha cintura e plantou um beijo carinhoso no meu pescoço, deixando-me extasiada e arrepiada.
- Obrigada por ter sido minha primeira.
Enterrei o nariz nos cabelos dela, sentindo seu cheiro gostoso.
- Obrigada a você por ser a minha primeira - Antoinette se afastou, olhando-me de forma questionadora - Eu já disse a outras pessoas que as amava - esclareci - Você sabe, família. Mas nunca tinha me sentido assim com relação a ninguém, Topaz.
O seu sorriso iluminou a sala e aqueceu todo o meu coração de uma forma inexplicável.
- Uau - ela lambeu os lábios e soltou a cabeça no encosto do sofá, encarando-me, me mantendo prisioneira. Às vezes sua boca se abria para falar, mas a fechava de novo.
- Está tudo bem - acalmei, descendo as mãos pelas laterais do seu corpo - Pare de pensar tanto nisso.
Antoinette tremeu com a risada e beijou minha testa.
- Você me conhece tão bem.
- Conheço - ela se endireitou. Conseguia ver uma batalha em seus olhos. Meu coração ficou apertado - Eu não disse aquilo para ouvir nada de volta. Está tudo bem.
- Mas...
- Não, Topaz, é sério, não preciso ouvir isso de você. E não quero que pense que precisa dizer.
Acariciei levemente seu rosto e ela me encarou, seus olhos brilhando como dois sóis.
- Por que você me ama, Pêssegos?
A incompreensão completa na sua expressão doeu em mim. Deslizei o polegar por seu maxilar enquanto um trovão estourava no céu.
- Eu a amo porque você é muito especial - dei um beijo na sua bochecha direita - Você é generosa - no nariz - Atenciosa - no lábio superior - Intensa - no lábio inferior - E você é, sem dúvida, a mulher mais linda que já vi.
Ela encostou a testa na minha.
- Deus, eu... - Antoinette ergueu a cabeça de supetão - Preciso mostrar a você quanto... Por que eu... Tem mais.
Segurei seu rosto em uma tentativa de acalmá-la.
- Me mostre o que quer que queira me mostrar. Não vou a lugar algum.
Ela ergueu-me do seu colo e com o celular iluminando o caminho no escuro, corri com as roupas para o banheiro do andar de baixo, me limpei, e voltei para Toni a tempo de ela enrolar um grande cobertor em meus ombros. Ela estava segurando uma lanterna e esticou sua outra mão para mim.
- Venha comigo.
Peguei sua mão e deixei que Topaz me guiasse escada acima e pelo corredor. Ela parou em frente à terceira porta depois do nosso quarto e colocou a mão na maçaneta. Toni a girou e abriu a porta, que rangeu alto, como se não fosse aberta há muito tempo. Fui atingida por uma rajada de ar gelado e um aroma mofado e antigo. Com apenas a lanterna e o brilho intermitente da lua em meio às nuvens da tempestade, era difícil enxergar muita coisa. O pequeno quarto estava decorado com papel de parede escuro, interrompido apenas por pôsteres de banda e jogadores de beisebol. Um painel de cortiça estava pendurado ao lado do guarda-roupa, coberto de desenhos e canhotos de ingressos. Lençóis brancos para proteger da poeira escondiam a mobília e a pequena cama estava desarrumada, com o colchão à mostra e sem uso. Virei-me para olhar Antoinette, que me fitava pacientemente.
- Este era o seu quarto - afirmei.
Ela iluminou as paredes com a lanterna, parando em uma imagem de uma Triumph. Ambas ficamos em silêncio, até que Topaz colocou um dos seus braços em torno dos meus ombros e lentamente levou-me até à cama, onde me sentei. Toni passou a mão por seus cabelos antes de ir até ao guarda-roupa. Resmungou e xingou quando o abriu e começou a tirar caixas de vários tamanhos. Remexeu-as até pegar um livro pequenino, preso por um elástico de borracha.
Topaz se levantou e voltou para a cama, sentando-se ao meu lado. Respirando fundo, ela colocou o livro nas minhas pernas, agora cruzadas, olhando fixamente para ele, como se o livro fosse saltar e atacá-la. Coloquei a mão no seu joelho direito e dei um aperto reconfortante.
- Isto é uma espécie de... É um diário - gaguejou - Parece idiota, eu sei, mas depois... - ela fez uma pausa - Só acho que vai explicar melhor as coisas.
- Você quer que eu leia?
Antoinette riu sem alegria alguma.
- Sim, eu... Porra, Cheryl, não sei.
O nervosismo dela era desconcertante.
- Ok.
Com os dedos tensos, removi o elástico do livro enquanto Topaz abria a pequena janela do quarto e acendia um cigarro. Coloquei o elástico na cama e abri a capa. O que vi fez-me piscar de surpresa e engolir um ofego de choque. A minha cabeça se voltou de imediato para Toni, que ergueu os ombros, desculpando-se.
Colado torto na primeira página amarelada estava um artigo reportando a morte do senador Clifford Blossom. Havia uma foto em preto e branco dele e de Penélope, tirada no dia de sua eleição. Ele estava tão feliz e tão bonito. Penélope estava linda também. Trazia no rosto um sorriso que não via fazia muito tempo. O meu coração ficou apertado com a saudade de minha mãe, que havia dito naquela época que eu podia ser o que quisesse.
Os meus olhos leram rapidamente o artigo, sabendo o que iria encontrar, os detalhes que iria ler. Palavras saltavam em frente sob a luz da lanterna: "pavoroso", "perturbador", "hemorragia cerebral", "polícia atirou em dois suspeitos". Engoli em seco e deixei que meus dedos deslizassem pelo rosto do meu pai. Com muito cuidado, certificando-me de não danificar o papel, virei a página. Havia mais artigos detalhando o funeral, a fundação criada em homenagem a meu pai e os eventos a que Penélope tinha ido em memória de Clifford. Em cada foto granulada de minha mãe, percebi como ela envelhecera. A beleza e o resplendor, tão notáveis na primeira fotografia, tinham desaparecido por completo.
Os meus olhos se encheram de lágrimas. Enquanto eles percorriam o artigo, percebi que, todas as vezes que meu nome aparecia, estava sublinhado ou circulado. Era a mesma coisa em todos os artigos, inclusive no primeiro. Continuei folheando o diário em silêncio, observando os artigos que Antoinette tinha coletado. Parei ao deparar com uma página coberta de garranchos. A primeira data era um mês após a morte do meu pai:
Sonhei com ela de novo. Toda vez que fecho os olhos, ela está lá. Ela me assombra e não sei por quê. Desde aquela noite, ela está dentro do meu cérebro. Queria poder tirá-la dali como vovó costumava fazer com o sorvete de chocolate no freezer, mas aí... Acho que eu sentiria saudades dela.
Duas semanas depois:
Senti o cheiro dela hoje. Eu estava com Zack e passamos por uma banquinha. Pêssegos. Pêssegos doces. O cabelo dela tinha cheiro de pêssegos. Comprei alguns. Zack me chamou de louca. Acho que ele tem razão.
Dois dias depois:
Estou louca mesmo. Sei que estou. Eu a vi. Sei que vi. Mas é impossível.
Natal:
Briguei com meu pai. Ele me chamou de ingrata. Eu o chamei de babaca. Ele encontrou meus cigarros. Fiquei deitada na cama e fechei os olhos e a vi e senti o cheiro do cabelo dela de novo. Doideira, né? Aquilo me acalmou. Acho que se a ajudei aquela noite, então talvez ela não se importasse se eu a usasse dessa forma. Talvez ela não ligasse. Talvez ela nem sequer se lembre de mim.
Continuei lendo. As passagens eram curtas, não mais que cinco linhas cada, mas colossais em seus significados. A mão que cobria minha boca aberta e incrédula ficou molhada de lágrimas. Ao mesmo tempo, a cama se mexeu com o peso de Toni. Ela abraçou os próprios joelhos. Ficou atipicamente imóvel ao meu lado.
Ano-novo:
O mundo, para mim, é o mundo apenas. Um palco onde cada pessoa representa um papel. E o meu é triste sem ela.
- Topaz. - solucei ao ler suas palavras.
- Me desculpe. Merda. Eu não devia ter... Eu só queria que você entendesse.
- O que você queria que eu entendesse? - precisava que ela explicasse.
🐍▫️Antoinette▫️🐍
Peguei o diário das suas mãos, folheando-o, sorrindo ironicamente de algumas das minhas palavras e fechando os olhos com outras.
- Aquela noite - comecei em voz baixa - A noite em que nos conhecemos. Foi a mais longa, a mais assustadora da minha vida - sorri - Mas eu não mudaria nadinha, por nada no mundo - toquei no diário, quase como uma reverência - Eu comecei isto quando tinha 11 anos. Dezesseis anos atrás.
Os meus olhos pousaram nos cabelos dela.
- Cher, seu cheiro era... Foi como se ele tivesse tomado conta do meu cérebro. Eu não conseguia pensar em mais nada. Ele me acalmava quando eu estava prestes a matar meu pai, e, mesmo quando estava em Arthur Kill, eu retornava àquela noite e pensava em você. Aquelas eram as noites em que eu dormia melhor - coloquei o diário de lado e segurei suas mãos - Não quero assustar você com isso, não mesmo, mas ouvir aquelas palavras e não conseguir dizê-las de volta... - sacudi a cabeça - Eu esperava que isto fosse ajudar você a enxergar - olhei para ela - Entende, Cheryl? Entende o que significa para mim?
Pêssegos não respondeu.
- Hoje, quando a apresentei ao Petey - continuei, com um sorriso torto - Não fazia a menor ideia do que dizer para ele. Pensei em dezenas de rótulos, incluindo "minha namorada", mas isso simplesmente... não parecia grande o suficiente - o meu rosto se contraiu para demonstrar meu desgosto pela palavra - E eu não podia dizer "minha Pêssegos", porque esse jeito de chamar você é exclusivamente meu.
Assim como meu coração era exclusivamente dela. Só dela. De minha Pêssegos.
- Cheryl. - sussurrei, puxando-a para mais perto. Nossas testas se tocaram e fechei os olhos - Não sei o que vai acontecer quando voltarmos à cidade. Não faço ideia. Mas o que sei é que não quero mais ninguém além de você. Quero ficar com você pelo tempo que me quiser. Quero mais noites como esta e quero poder andar na rua segurando sua mão e sabendo que, uma vez na vida, todas as outras pessoas invejam o que é meu.
Ela apertou meu moletom com as mãos. Envolvia-a em meus braços e sussurrei em seu pescoço:
- Você é tudo para mim, Pêssegos. Sempre foi. Sempre. Você é a melhor coisa que já aconteceu na minha vida - beijei seus lábios - Você é meu tudo.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro