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42 - Idiota

Foi quase impossível para ele não agarrá-la, colocá-la na garupa da moto e desaparecer. Teria tentado, se houvesse um capacete sobressalente. Na pressa, nem pensara em pegar, então agora estava ali, diante dela, sem saber o que fazer ou falar.

Óbvio que o que saiu de sua boca foi alguma coisa idiota. Era impressionante o fato de ele simplesmente não conseguir deixar de ser idiota.

Ele tinha seus motivos. Estava nervoso e ansioso. Quando rastreou o aparelho dela e viu que ela estava na periferia da cidade, imaginou que o pai nojento dela tivesse se estabelecido por aquelas bandas e se questionou o motivo de Gabriela voltar para o domínio do velho. Chegara àquele portão disposto a botar fogo em tudo para que ela saísse de lá, como se ele mesmo fosse o mais bizarro e patético dos príncipes encantados.

Que idiota. De novo.

Ela não estava em perigo. Não parecia cativa ou subjugada, ainda que chorasse um pouco. Na verdade, ela continuava linda, saudável e reluzente como de costume. Ele sempre soube que ela era forte, que se sairia bem independente do fato de ele ter entrado no caminho e bagunçado a coisa toda. Por um ínfimo instante, cogitou a possibilidade de subir na moto e deixá-la em paz.

Todavia, não fugiria de novo. Não mais. No fundo, não se achava capaz de deixá-la em paz, a não ser que ela pedisse isso a ele.

— Essa é a casa da Nay... como soube que eu estava aqui? — A voz feminina soou firme em contraste com as lágrimas que ainda secavam no rosto levemente corado. 

Ele sentiu o som daquela voz como uma onda de calor a penetrar seu âmago. Sua natureza atormentada pedia que ele se rebelasse, que fosse rude, que gritasse e esperneasse como uma criança com medo de levar uma injeção. Precisava se concentrar e colocar as emoções conturbadas em ordem antes de agir como o insuportável de sempre.

— Podemos conversar?

Ela o encarou como se ponderasse. Não podia culpá-la. Os segundos que se passaram entre ela mandar uma mensagem para Nay e finalmente lhe dar passagem foram como se ele bambeasse numa corda entre dois arranha-céus.

— Você está bem? — ela perguntou, assim que se acomodou num sofá à sua frente. Ele fez o mesmo, sentou-se a um braço de distância e torceu o corpo para que ficassem de frente um para o outro. 

Ele olhou em volta; as paredes de um amarelo brilhante deixavam o ambiente alegre e vivo, e o contraste do tom quente com o azul escuro do sofá, estampado com motivos marinhos, os transportava para fora do cinza da cidade. O estilo boho evidenciado pelas plantas espalhadas e quadros de cordas trançadas o deixou confortável, como se estivessem num invólucro seguro e inspirador. Sentiu-se subitamente motivado.

— "Bem" não é exatamente a palavra. Em recuperação, eu diria.

— Eu diria que você foi um grande idiota, mas não posso menosprezar seu problema. 

Ele engoliu em seco e se perguntou como fora capaz de, no início, tratar os sentimentos dela com tamanha irresponsabilidade.

— Eu diria que eu sou um grande idiota que tem um problema desprezível.

— Não diga isso. 

— É o que é. 

O silêncio entre ambos perdurou por alguns minutos, tempo em que ele abriu a boca várias vezes, fechando-a em seguida. Sua mente confusa procurava uma forma de se abrir, mas ele se percebeu perdido entre o que devia falar e o que queria realmente falar. 

— Por que não me recebeu no hospital? — ela furou o hiato.

— Por que saiu da agência?

— Não começa com isso, Felipe. Me responda, por quê?

— Fui covarde, Gabriela. Eu tava envergonhado e deprimido. Odeio que me vejam assim, odeio sentir isso, então quando acontece, prefiro estar sozinho.

— Não precisa estar. Pablo ficou bem mal por aqueles dias.

Felipe sentiu a chama da insegurança ardendo de novo em seu peito. Pablo...

— Pablo preferia que eu estivesse morto.

— Não é verdade, não diga isso.

— Você não sabe como as coisas são...

— Sei o que observo. Enxergo ele, enxergo você. Felipe, vocês precisam resolver as coisas, o lance com a Jackie...

Por pouco ele não levantou do sofá e foi embora. Só de ouvir o nome da Jackie seu sangue fervia e ele se via incapaz de conversar com coerência. 

— Nunca estive com a Jackie. Nunca.

— Eu acredito em você.

Ele a encarou de súbito, o ar suspenso.

— Acredita...?

— Acredito.

Foi como se a sanduicheira que apertava seu o coração se abrisse de repente e o sangue pulsasse mais rápido em compensação. Atreveu-se a esticar o braço e tocá-la com a ponta dos dedos, numa tentativa de roubar um pouco do calor e da textura da pele. A penugem quase invisível e dourada que cobria o braço delicado se arrepiou ao toque, fazendo seus lábios se curvarem num sorriso. 

Havia se esquecido da sensação. Sorrir por nada. Mirou os olhos de mel e deixou que se derramassem sobre si e empapassem seus pensamentos com doçura. 

— O que vamos fazer agora? — perguntou e esperou ansioso por uma resposta promissora.

— Vamos conversar. Eu quero que me conte o motivo de se comportar assim, o motivo de se drogar e de me tratar como se me conhecesse há muito mais tempo do que poderia ser possível. Depois, eu posso falar de mim, e então a gente vê o que fazer com tudo isso.

Ele esperava por isso. Não haveria como seguir sem tais revelações. Não havia mais desculpas no depósito de esquivas, ele teria que falar sobre sentimentos.

Ele era um imprestável nesse quesito. 

— Certo... — ele suspirou longamente, então continuou — eu tenho um... problema. É um tipo de memória autobiográfica, algo na minha cabeça que, desde a infância, faz com que eu decore imagens. Toda e qualquer imagem que me chame a atenção. E não são só imagens, mas dependendo do evento, eu me lembro de detalhes completos, como cheiro, som, clima, diálogos, tudo. Seria bom, se a vida fosse cor-de-rosa, sem matizes sombrias, sem o breu da desgraça que a gente é forçado a ver onde quer que vá. Pra você ter uma noção, só no caminho pra cá, vi oito pessoas dormindo nas calçadas, cobertas por jornais ou cobertores encardidos em meio à garoa. Vi uma vítima de atropelamento sendo atendida por uma equipe de resgate. Vi exatamente onze crianças de diferentes idades pedindo ajuda nos semáforos, algumas sujas e descalças, outras não tão encardidas por fora mas certamente desamparadas por dentro. Vi um senhor sentado num banco de praça, tão solitário que quase poderia ser representado em preto e branco. Eu vi tudo isso e muito mais em meio à normalidade de uma manhã paulistana, e nunca vou me esquecer. Cada rosto, forma, cor e movimento vai ficar aqui, martelando e martelando, e eu passo o tempo todo tentando organizar essas coisas nas prateleiras menos importantes do meu depósito, o tempo todo movendo coisas da frente para deixar à vista o que realmente importa e isso é... exaustivo.

Gabriela se mantinha calada, mas seu olhar estava diferente. Parecia ter redescoberto a roda e ele se sentiu incomodado com a inspeção.

— Existe tratamento?

— Não exatamente. Na verdade, não chega a ser considerado um transtorno a ser tratado. É na verdade uma condição bem rara, e o foco é contornar os efeitos emocionais de tudo, então psicoterapia é o único caminho. A terapia ajuda a isolar algumas consequências, como a depressão e outras síndromes, isso pode levar à necessidade de investigação psiquiátrica, que empurra a gente pros psicotrópicos e, bem, esse é um bom começo pras grandes merdas futuras.

— Foi assim que você começou com as drogas?

— Não. Se fosse eu até poderia culpar terceiros. Foi porque quis, mesmo. Eu me envolvi com pessoas que usavam, achei que ia ajudar a aliviar as coisas na minha cabeça, minha hipersensibilidade a tudo, mas eu tava errado. Quando experimentei a primeira vez, fiquei bem por um tempo, depois aconteceu de novo, e de novo, eu fui ficando cada vez menos bem; eu tive medo e acabei contando pro meu irmão mais velho, que contou pro meu pai. Foi caótico, minha mãe me levava a médicos porque queria me "consertar", foi então que o caldo engrossou com os ansiolíticos, psicoestimulantes e antidepressivos. Um coquetel macabro que não fez nada a não ser piorar tudo. Não nego que a medicação é imprescindível em alguns casos, talvez até fosse no meu, mas eu já tinha apodrecido há muito tempo.

— Deve ter sido terrível.

— Não acho que seja nada perto do que você passou...

Subitamente, a sala cheia de cor pareceu menos saturada, como se o sol tivesse se escondido entre nuvens. Quase foi possível sentir a mudança da temperatura ao redor. Ele escorregou a mão pelo braço dela e capturou uma das mãos que repousava sobre o joelho, onde a saia do vestido deixava ver a pele arrepiada. Ela arfou, mas não se afastou ou repeliu o contato, o que o deixou aliviado. 

— Cada um tem sua tragédia, Felipe. Cada um lida como pode com a vida e não ter ido por esse caminho não significa que não trilhei outros de certa forma reprováveis. 

— Não faça isso. Não existe uma esfera onde o que você é e o que eu sou possam coexistir em pé de igualdade. Você é uma sobrevivente, uma desbravadora, é corajosa e extraordinária. Você é suave como o vento, mas pode ser destruidora como um vendaval, e eu não passo de um barco encalhado num esgoto. 

— Se o vento for bem forte, pode mover as águas e fazer o barco sair do lugar.

Ele ergueu a cabeça de pronto, surpreso com a analogia. Encarou-a por um longo tempo, conjecturando a respeito do que acabara de ouvir. Ela sustentava o olhar, determinada. Sua vontade se abalou, o autodesprezo foi contaminado com uma pequenina dose de fé, como uma gota de sangue num copo de água, aos poucos tonalizando o que não tinha cor.

— Você estaria disposta a tentar? Precisa saber que uma vez adicto, pra sempre adicto. Não sei por quanto tempo será capaz de suportar algo assim. Não sei quando será a próxima recaída, e se vier, se haverá um depois...

— Não penso no tempo, penso no agora; o agora é tudo o que eu tenho. O agora foi tudo o que tive em toda a minha curta vida.

O cachorro latiu de repente e o fez se sobressaltar. Gabriela também se assustou e foi quando se deram conta da proximidade e do isolamento. Ela entrelaçou os dedos aos seus, a pequena mão era quente e firme e ele teve uma vontade insana de abraçá-la, e de chorar.

— O agora é muito mais do que um momento, Gabriela. O agora existe por causa do ontem, e seria totalmente diferente se o ontem não tivesse sido uma porcaria. Tem algo que você precisa saber, e talvez isso mude as coisas entre nós.

— Vá em frente — ela não se abalou. Com a mão livre, ajeitou uma mecha de cabelo atrás da orelha e a sombra de um sorriso lhe aliviou o semblante. Temporariamente hipnotizado pela cena, ele demorou a responder.

— Talvez você se surpreenda, talvez perceba que sempre soube de alguma forma – ele tirou do bolso da frente da camisa um papel dobrado e entregou a ela. Lamentou que as mãos tivessem que se desprender para que ela desdobrasse a folha. Seu coração palpitou quando ela mirou a imagem, uma leve ruga entre as sobrancelhas mostrava que buscava entender do que se tratava.

— Ela, de novo?

— Olhe bem, Gabriela.

Ela encarou a imagem, confusa. A ruga mais pronunciada agora e uma pergunta solta na ponta da língua. Alternou o olhar entre a imagem e ele, até que percebeu a leve diferença no esboço que tinha em mãos. Era o mesmo cenário, a mesma janela, tudo igual exceto o rosto da garota, que estava de perfil. Foi então que ela compreendeu e finalmente encontrou voz.

— Como...?

— Isso tem quatro anos. Foi nesse dia que... eu matei a sua mãe.

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