3 - Luíza
Quem ele pensa que é?
Só porque aceitei sair com ele amanhã e a carona hoje, acha que pode mandar na minha vida? Mas é claro que não! — Entro no banheiro, irritada. — Se essa gripe não estivesse me matando desceria para chamar Helen, mas vou para o banho, é bem melhor.
Mesmo sabendo que Helen não sairia com Will, fico tensa quando ela diz "só uns amassos" com tanta tranquilidade. Não que me importe com quem ele sai, digo a mim mesma, enquanto me ensaboo. E a voz irritante na minha cabeça grita MENTIROSA!!!!
Saio do banho e Hel está no sofá me esperando, assistindo um vídeo que faz parte do trabalho que estamos fazendo.
— Qual é seu problema, Luíza Emily? — Levanta-se, colocando o notebook sobre o sofá.
— No momento essa gripe idiota — digo, coçando o nariz com a toalha e tossindo quase sem parar.
— E essa gripe te deixou idiota também? — diz arqueando as sobrancelhas e cruza os braços, me encarando.
— O que é, Hel? — Passo por ela para subir.
Sei o que ela está falando, e ela sabe que eu sei. Ter uma amiga psicóloga é um saco! Mas, não quero falar disso, não agora irritada com Will e com ela me pressionando.
— Vai espantar o cara, Emilly.
— Não sei o que... — Tento fugir.
— Sabe perfeitamente. — Ergue as mãos sobre a cabeça, como se pedisse a Deus paciência. — Se gosta dele, para de graça, agora se não quer, fala logo, não faz jogo.
— Não estou faze...
— Ahhh, está sim. Qual é Lu? — Começa a pontuar nos dedos, me dando um sermão. — O cara. Te adora. Te conhece. Gosta do seu filho. Não gosta do seu ex, mas o tolera. — Revira os olhos. — O que está rolando? — Gesticula impaciente.
— Hel — suspiro cansada —, estou gripada, cansada, com dor de cabeça. — Na verdade, quero acabar o assunto. — E ainda trabalho amanhã. — Com minha melhor carinha de menina, completo: — Podemos falar disso outra hora?
— Tá legal — concorda, suspirando. Fecho os olhos agradecendo a Deus mentalmente. Ela prossegue: — Só responde uma coisa: — abro os olhos preparada para guerra — Pretende dar uma chance a ele?
— Sim — respondo apreensiva, meu coração está uma bagunça.
— Lu, se não for deixar o cara tentar ser mais que amigo — para com as mãos na cintura —, avisa logo, não seja injusta. — Espera eu terminar os espirros e assoar o nariz. — Vou fazer um chá, receita de família, amanhã estará inteira — diz como se nada tivesse ocorrido anteriormente.
Fico perplexa com a mudança de assunto, porém contente, concordo e subo. Vou ao quarto de Carlos. Vera sempre o coloca no horário certo na cama e vai embora. No início Carlos reclamou horrores, mas no final entendeu que se o deixar no controle ficará me esperando chegar, dormirá após as 23h e acordará exausto para a aula, então parou de reclamar.
Por causa da gripe, não lhe dou o beijo de boa noite, apenas olho seus cadernos e vou me deitar. Não demora, Helen sobe com um chá de cor meio amarronzada, não tem um cheiro ruim, porém, a aparência é horrível.
— Que coisa é essa? — Faço careta, apontando para o copo.
— Não pergunta, só beba. — Me entrega o copo. — Já deixei no ponto para beber, assim não diz 'está quente'. — Imita minha voz.
Faria careta ou protestaria a imitação que ela fez, se não viesse mais uma série de tosse e espirros. Quando finalmente respiro, penso que pior que estou não dá para ficar, então pego o copo com o chá e viro de vez. E para minha surpresa não é ruim.
— Bom — entrego o copo a ela —, o que é?
— Segredo de família, não posso contar — sorri confiante —, mas estará nova pela manhã, se seguir a regra. — Levanta e coloca o copo sobre minha mesa de livros.
— Regra? — pergunto, deitando-me.
— Sim. — Deita-se ao meu lado. — Minha avó sempre disse que esse chá faz milagres, porém, tem que ser tomado na hora que for dormir, e não pode se levantar ou ficar em sereno por pelo menos cinco horas. Por isso, só levante se for caso de vida ou morte e talvez se estiver muito apertada para ir ao banheiro. — Sorri de lado.
— E se levantar antes? — A encaro, espantada.
— Seja rápida para que seu corpo não sinta a mudança de temperatura — diz com tranquilidade e se ajeita.
— O que acontece, Hel? — pergunto sonolenta. O chá deve fazer mesmo milagre, estou com sono.
— O chá é milagroso, porém se tomar e sair no sereno, essa gripe que está, ficará ainda pior e corre o risco de pegar uma pneumonia.
— Tudo por causa do chá?! — Essa informação me fez dar um pulo, me sentando.
— Como eu disse, ele é excelente, mas tem uma regra e por isso se toma antes de dormir. — Helen me puxa de volta para me deitar. — Já que se espera que não precise sair da cama por no mínimo cinco horas.
— Um bom argumento — falo mais relaxada, e me deito ao seu lado.
— Por falar em argumento... — faz uma pausa longa e olho para ela. — Qual o seu para tratar o William daquele jeito? — Droga! Essa conversa de novo. Helen é uma amiga fantástica e sabe ser persistente quando quer algo.
— Ele exagerou — digo, mesmo não sendo total verdade.
— Sobre o que exatamente? Iria gostar se tudo que Lucas faz com você fosse uma amiga dele fazendo com ele? — Imagino a cena, e detesto, mas não quero dar o braço a torcer, então...
— Não vejo motivo para ficar irritada com isso, Hel. Somos amigos e adultos. — Me ajeito nos travesseiros, virando as costas para ela não ver como estou confusa. — E além do mais... O Lucas e eu somos só amigos, sabe disso.
— Sim, mas... — ela coloca os cotovelos sobre o colchão e preciso virar para encará-la. — O Will gosta de você, não só como amigo. Você sente algo por ele, dá para ver. O Lucas, faz isso para provocar, mas se der uma chance ele vai amar. — Pontua. — Se sabe o sentimento do Will, sabe como ele se sentiu vendo o Lucas com você e...
— Beleza, Helen, já entendi. — Tossindo novamente completo: — Exagerei.
— E o que faremos? — Helen sorri descaradamente.
— Vou pedir ao Lucas para não exagerar e pedir desculpa ao Will.
— É um começo — diz bocejando, e se deita virando para o outro lado. — Não faça besteira, Lu, o cara é legal e talvez seja um anjo enviado por Deus para finalmente te fazer feliz. Boa noite, Virgem — diz sorrindo.
A noite será longa. Não só pela gripe e o nariz entupido. Não!!!! Será longa porque Hel tem razão, pisei na bola e preciso resolver isso... São 23h40, vou mandar mensagem pedindo desculpas. — penso pegando meu celular.
Will
Oi, Will, desculpa pelo modo q o tratei há pouco.
Foi demais. Gostaria que me desculpasse, e que soubesse
que o Lucas é um amigo incrível que se preocupa comigo,
porém, nada além disso, mais uma vez desculpa.
Estou tão distraída digitando um pedido de desculpas correto que não percebo que ele estava digitando também, só vi depois que enviei a mensagem e a dele chegou ao mesmo instante.
Will
Borboleta, peço desculpas pelo meu comportamento idiota,
sei que não me deve explicações e muito menos responder minhas perguntas.
Me preocupo com você. Mesmo assim não foi correto minha atitude. Desculpa
Amigos ainda? Vai jantar comigo amanhã?
Confesso que minha surpresa foi imensa, não só pelo pedido de desculpa desnecessário, mas pelo apelido de adolescência que só ele usa, respondo em seguida com o apelido exclusivo dele.
Will
Amigos sempre, Coração
Que horas passa aqui? Trabalho amanhã!
Conversamos um tempo... Para minha surpresa é 1h10, e o chá realmente é milagroso... Não espirrei nenhuma vez conversando com Will. Coloco o celular na mesa ao lado da minha cama, e me deito de barriga para cima com a cabeça em dois travesseiros para respirar melhor. Então durmo.
Acordo com o celular tocando... Minha cabeça está zonza de sono e o corpo cansado, dormi tão pouco que nem parece que dormi. Helen está ao meu lado num sono profundo, por isso não escuta o celular. Viro para desligar o alarme, 05h30 chegou rápido, porém, não é o despertador e sim uma chamada. Começo a piscar para acordar de verdade, e o mais chocante é que é 1h33, e é Lucas!
Sento-me rapidamente e encosto a costas nos travesseiros, pisco novamente, tentando ver se é mesmo real ou estou sonhando, mas o celular continua tocando e vibrando em minhas mãos. Se fosse sonho, seria pesadelo já que Lucas não me ligaria a essa hora sem motivo. Atendo depois do que pareceu uma eternidade.
LUCAS — Preciso de você. — Parece desnorteado, isso me deixa alerta, sento já calçando o chinelo.
LUÍZA — O que houve, Lucas?
LUCAS — Preciso de carona para agora. — Minha cabeça lateja, como sino de igreja.
LUÍZA — Você está bem? — pergunto, levantando da cama e pegando o robe peludo que deixei fácil ontem.
LUCAS — Sim, só preciso sair daqui. — Suaviza o tom, mas já estou na sala apreensiva e pegando as chaves do carro.
LUÍZA — Daqui onde, Lucas?
LUCAS — Estou em Westminster.
LUÍZA — Não acredito — digo quase gritando e abro a porta. — O que está fazendo aí? Não. Nem responde, não quero saber. — Paro na garagem.
LUCAS — A Hel está com você? Vem com ela — diz com a voz preocupada.
LUÍZA — Não vou acordá-la, Lucas. — Destravo as portas do carro, e entro.
LUCAS — Não vem sozinha. É perigoso.
Está certo, Westminster, tem umas danceterias/boates das mais complicadas, está em uma das ruas mais caras da região, cheia de câmeras e segurança, mas é terra sem lei e levo uns quinze minutos de carro até lá.
LUÍZA — Vem de táxi para cá, se disser que vai para casa, não vou dormir, então vem para cá!
LUCAS — Não dá, estou sem grana.
LUÍZA — Pago quando chegar aqui. — Saio do carro, mais aliviada.
LUCAS — Esquece — diz bufando. — Estou em Westminster, os táxis só saem, com pelo menos vinte reais na mão, por garantia, já que só levam bêbados.
LUÍZA — Você não está bêbado — pontuo, entrando no carro novamente e abro o portão.
LUCAS — Mesmo assim, eles não confiam e não tiro a razão. — Suspira, como se estivesse cansado. — Deixa Luíza, vir sozinha é perigoso. Vou dar um jeito.
LUÍZA — Sinto muito — digo chegando à rua paralela à estrada principal. — Já estou chegando à Tunes.
LUCAS — Saiu de casa? Sozinha?! Tá maluca? — Altera a voz, quase gritando.
LUÍZA — Sim, sim e não.
LUCAS — Volta para casa agora! — Lucas está quase gritando. Ainda bem que está no viva voz.
LUÍZA — Devia ter pensando antes de me ligar, querido.
LUCAS — Pensei que viria com a Hel!
LUÍZA — Se tivesse que acordar a Hel, teria de trazer o Carlos e nós concordamos que não é lugar para ele, certo?
LUCAS — Está dirigindo a esta hora da noite, falando no celular e vindo para um local perigoso, só pode ter ficado maluca para sair sozinha.
LUÍZA — O celular está no viva voz... E esqueceu de acrescentar que estou gripada. — Limpo o nariz com um lenço, porque voltou a escorrer. — E não trouxe ninguém, porque não quero testemunhas quando te matar.
LUCAS — Onde está agora? — Ignora minha brincadeira.
LUÍZA — Na York com a Herdofeu. — Assuo o nariz novamente.
LUCAS — Mais cinco minutos e está aqui — fala tão tenso que consigo vê-lo passar a mão sobre o rosto.
LUÍZA — Acho que antes, não tem carro na rua e os semáforos estão amarelos — continuo falando para criar uma distração a minha cabeça, se pensar vou voltar para casa.
LUCAS — Cara me odeio por ter te ligado — Lucas se repreende, parecendo irritado e uma crise de tosse começa. — Lu? Lu... Droga... Luízaaaaaaaaaa.
LUÍZA — Calma — consigo falar, ainda tossindo. — Só é a gripe, estou na rua da boate, onde está? — Não paro, apenas diminuo a velocidade, procurando por ele.
Lucas sai de uma boate mais à frente e assim que o vejo, respiro aliviada. Desligo. Vou até ele. Meu coração dá pulos de alegria já que vejo que está bem e sem hematomas. Lucas entra rápido e saímos. Fico em silêncio apenas um minuto, no máximo. Queria chegar em casa para termos uma conversa civilizada, mas são quase 2h de sexta-feira, acordo as 05h para trabalhar, estou gripada e não estou dormindo porque ele simplesmente resolveu vir aonde havíamos combinado que nunca mais viria.
— Qual o seu problema, Lucas? Sério? Westminster!? — Bato no volante.
— Não é o que está pensando...
— Sinceramente, não é — O interrompo irritada e a tosse vem forte. Sinto meu cérebro chacoalhar. — Estou pensando, por qual razão estou na rua a esta hora, sendo que estou gripada, tenho um filho adolescente, não tenho irmão da sua idade e preciso trabalhar daqui a pouco. — Não olho para ele.
— Luíza, deixa eu explicar... — Vou deixar, porém, meu celular toca, é de casa. Meu coração para na garganta ao ver o número e atendo no viva voz.
HELEN — Onde você está Luíza?! — A voz de Helen tem uma urgência que faz meus neurônios virarem pó.
O dia não foi dos melhores e a noite também não está lá essas coisas, não me surpreenderia se ela me dissesse que tem um elefante cor-de-rosa no meu portão.
LUÍZA — O Cá está bem?
HELEN — Dormindo. — Suspira irritada, e eu aliviada. — Onde diabos se meteu?
LUÍZA — Vim buscar o Lucas.
HELEN — Onde?
LUÍZA — Estamos chegando em casa. — Não digo onde fui. — Chego em três minutos. — Começo a sentir frio, e não estou a fim de conversar.
HELEN — Ótimo — fala sendo sarcástica. — Dá tempo de amolar a faca para matá-lo. — Desliga.
— Mereço isso — diz Lucas, olhando para o outro lado.
Apesar das circunstâncias, sei o quanto tem se esforçado nos últimos anos, e o quanto não quer viver o passado novamente. Seja lá qual for o motivo de ter ido a Westminster, deve ter explicação. Ele prometeu não voltar.
— Qual é Lucas...
— Não — Lucas me detém —, sério mesmo, não sou nada seu, não deveria se importar. Sou só um estor...
— Chega tá? — Dessa vez o interrompo, limpo o nariz, novamente. — Sei que posso contar com você em qualquer hora, situação ou lugar. — Faço uma pausa. — Estou errada?
— Não, mas...
— Acabou o assunto. — Pego o controle, mas o portão abre antes, e revela uma Helen preocupada.
Entro com o carro, fecho o portão e saímos sem nenhuma palavra mais. Helen encara Lucas com severidade e me puxa para perto, guiando-me até a escada.
— Não devia ter saído da cama, lembra? — Passa a mão sobre meus ombros.
— Lucas precisava de ajuda, fiz o correto.
— Eu sei. — Helen me acompanha até o sofá, como se fosse uma criança, e passa o edredom sobre meus ombros. — Mas está gripada e tomou o chá, não podia ter saído da cama, além do mais, poderia ter me chamado.
— Você não dirige. — Lucas entra, trancando a porta.
— E você! — Helen explode e tento detê-la, mas o frio me vence e me encolho no sofá. — É a porra de um idiota que só usa o pau ao invés de usar a cabeça. — Vai em direção a ele.
— Você não sabe de nada! — Lucas se defende, meio irritado.
— Eu sei que você é tão idiota que age sem pensar e acaba fazendo mal as pessoas. — Me encolho numa crise de tosse violenta, seguida de calafrios. O que me deixa irritada porque não posso entrar na briga deles. — Olha o que fez com a Luíza, ela tomou um chá medicinal seu idiota, não podia se levantar da cama até de manhã, mas graças a você... — aponta o dedo no peito dele, irritada, e vem até mim — ... está pior... Lu, olha para mim. — Ergue meu queixo. — Quero que vá se deitar, ouviu?
— Eu vou, mas o Lucas... — Outro ataque de tosse.
— O Lucas vai ficar bem, não vou matá-lo até amanhecer, prometo. Vou te deixar fazer as honras.
— Fico honrada — brinco, tremendo de frio. — Me dá outro copo daquele chá, e vou me deitar.
— De jeito nenhum, amiga, você tomou e saiu no sereno, temos que esperar e torcer para não ficar pior, não pode tomar outra dose de chá até amanhã à noite — explica me enrolando mais com o edredom.
— Então pega um analgésico ali no... — Me encolho.
— Você não pode tomar nenhum remédio até de manhã, Lu, é perigoso... Saiu no sereno, não sei o que poderá causar se tomar um remédio agora, e sinceramente, não vou arriscar. — Helen me entrega um lenço, pois começo a tossir violentamente. — Vai se deitar, vou arrumar um lugar para o Lucas e de manhã deixo você matá-lo.
Levanto-me enrolada e tremendo muito, não sei se foi por ter saído depois de tomar o tal chá ou se essa gripe realmente vai me fazer ir ao médico, mas estou com dor em todo lugar, nariz tapado, e muito sono.
— Lucas, por favor, não a irrite — digo tremendo de frio, indo à escada.
— Não vou. Pode deixar. — Lucas vem até mim. — Desculpa, vou te compensar, prometo. — Beija minha mão. — Agora vai para cama. — Começo a subir, não antes de escutar Helen dizer.
— Quero saber o motivo de ter tirado Luíza da cama a esta hora, quero a verdade com detalhes Lucas, ou não respondo por mim...
Subo pensando que definitivamente tenho amigos maravilhosos, me dão trabalhos gigantescos, mas ainda assim fariam tudo um pelo outro. Olho novamente se Carlos está dormindo, depois dos gritos altos que Helen deu no Lucas e me deito, tremendo. Ao contrário da outra hora que me deitei, após o chá, agora estou deitada de barriga para cima, cabeça em dois travesseiros, porém, nariz tapado, tossindo muito e com espirros que não querem parar. Definitivamente será uma longa noite...
Acordo com o peso da perna de Helen sobre a minha. Se bem que... Acordar não é bem o termo correto. Passei a noite com o nariz tapado e a boca aberta, o que deixou minha garganta seca e agora uma dor de garganta. Graças a Deus, não tive febre, já que a Helen disse que seria arriscado tomar medicamentos. Sem forças, levanto tentando manter silêncio, porém, quando se está gripada é quase impossível e começo a tossir.
— Aonde você vai? — Helen acorda.
— Fazer xixi, e tomar um banho — respondo, assoando o nariz.
— Vou descer com você — diz, levantando e se espreguiça.
— Dorme mais. São 5h40, ainda — digo, olhando o relógio.
— Sem chances — responde, me seguindo. — Acho que você deveria ir ao médico e depois voltar pra cama, não dormiu nada e... — Começo a espirrar e Helen para olhando para mim. — Qual é Lu, além da gripe, não dormiu direito. Avisa seu pai que não vai hoje — pede.
— Tenho compromisso — respondo, indo em direção à escada e ela me segue.
Apesar de ter um banheiro desço para usar o de baixo. Lucas está saindo do quarto dele e olho para Helen sorrindo, ela revira os olhos. Entra no banheiro e sigo-a, trancando a porta.
— Ele explicou e você fez certo em buscá-lo, porém, deveria ter me chamado. — Começa a escovar os dentes.
— Você não dirige — digo, tirando a roupa e começo a tremer.
— Iria de Uber, chamaria o Fábio, daria um jeito, Emy. — Me encara com a escova na boca. — Vou sair, tranca a porta. O Lucas está aqui. — Lava o rosto e sai.
Tomo um banho quente, lavo os cabelos e depois de colocar a roupa para trabalhar, escovo os dentes e penteio o cabelo. Passo uma maquiagem leve, pois tenho reunião e não posso parecer um zumbi. Saio do banheiro e o cheiro de café invade meu nariz. Mesmo com essa gripe não deixo de sentir o cheiro do meu vício.
— Humm, delícia — comento, assoando o nariz.
— Eu sei que sou delicioso. — Lucas vem até mim e me beija na testa.
— Estou falando do cheiro do café. — O empurro, brincando.
— Vou dizer que acredito — brinca. — Está com o nariz tapado, mas como Carlos está aqui vou dizer que acredito. — Lucas pisca para Carlos, que prende o riso.
— Cala a boca. — Começo a tossir de novo. — Bom dia, meu lindo. — Vou até Carlos e me sento ao seu lado. — Dormiu bem?
— Bom dia, mãe. — Me encara, comendo um pão. — Não sabia que teríamos visitas. — Ergue as sobrancelhas, e não contenho o riso. Parece demais com meu pai.
— Foi uma surpresa para mim também. — Aceito a xícara de café que Lucas me dá, não antes de uma crise de espirros. — Cadê a Helen?
— Trocando de roupas no seu quarto — responde Carlos e sorri. — A propósito, a avise que eu moro aqui e entro no seu quarto sem bater. — Paro a xícara antes de chegar à boca. — Seria legal ela trocar de roupas com a porta trancada, se não quiser que eu veja.
— Você viu a Hel pelada? — Me espanto e quase engasgo com o café, o que me faz tossir mais.
— Garoto esperto — Lucas fala, e olho feio para ele. — Quer dizer, não pode, Cá. — Pisca para meu filho que sorri.
Sei que meu filho cresceu. Já tivemos a tão temida conversa sobre meninas e preservativos, mas gosto que todos achem que ainda o trato como bebê, mesmo ele sabendo que não é assim quando estamos sozinhos. Sou uma mãe, pode-se dizer liberal, tenho limites, porém não existe tema que Carlos não possa falar comigo, o que inclui sexo, drogas, bebidas e meninas, claro que só falamos quando estamos sozinhos, mesmo que ultimamente ele esteja distante.
— Não deu para evitar mãe. — Carlos me tira do devaneio. — Fui te desejar bom dia, ela estava no seu quarto, e não estava pelada, só de calcinha e sutiã e nem me viu. — Volta a comer. — A propósito, por que o tio Lucas está aqui se hoje é sexta e temos compromissos?
Lucas e Carlos saem de vez em quando, não para lugares de adulto e nem sozinhos, mas gostam de vídeo game e futebol, então não os impeço de sair. Porém, nenhum dos dois — Lucas e Helen — vem a minha casa no meio da semana, já que todos — exceto Helen — trabalhamos ou estudamos. Saímos só fim de semana.
— É uma longa história, querido. Não sei bem, mas Lucas vai me explicar daqui a pouco. — Mais espirros. — Vou pedir a Hel para ter mais cuidado.
— Com o quê? — Helen desce, pronta para ir embora. Ela tem um quarto e roupas aqui.
— Ficou pelada na frente do Carlos, quer assustar o garoto, Helen? — Lucas exagera, já que Helen é linda.
— Nossa. — Helen arregala os olhos. — Desculpa, sobrinho lindo. — Vem até ele e o beija na cabeça. — Não vi que fiz isso.
— Tudo bem, tia — Carlos diz sem graça.
— Hel, quando for trocar de roupas tranca a porta e se o Lucas estiver aqui, coloque algo sobre a fechadura — falo rindo para provocar Lucas, e começo a tossir novamente. — Sabemos como ele é...
— Ei — reclama, mas sorri —, não posso fazer nada se amo mulher. — Pisca para Carlos que sorri mais.
— Não temos dúvidas disso — resmungo. — Querido, termina logo seu café, teremos que deixar a Hel e o Lu, nos seus lugares antes de irmos ao colégio.
— Eu vou com o Fábio — Me informa Helen, dando de ombros. — Vou começar um tratamento de beleza hoje no Lix Beautiful, e papai deixou o Fá disponível.
— Preciso do seu carro — diz Lucas a mim. — Levo o Cá, te deixo no serviço e trago seu carro à noite. — Ergo a sobrancelha, o encarando. — Por favor, tenho reunião hoje.
— Eu também, uma reunião e duas entrevistas. — Saio correndo para o banheiro para assoar o nariz. Essa gripe está acabando comigo e pelo jeito com minha memória também, pois Lucas completa.
— Duas reuniões e uma entrevista, Luíza — Me corrige.
— Como podem saber as atividades do outro e não namorarem?! — Helen diz tomando o suco.
— Dois motivos — começa Lucas. — Emy disse a semana inteira o que ia fazer hoje, e ela não me quer como padrasto do Carlos.
— E o mais importante — falo voltando à cozinha. — O Carlos não te quer como padrasto, quer filho?
— Gosto do Lucas. — Carlos dá de ombros sorrindo. — Só que você não gosta dele assim, então melhor como tio. — Olha Lucas e fala depois. — Desculpa, Lucas.
— Isso me dá a vantagem de poder te ensinar umas coisinhas e sua mãe não me matar. — Lucas bate no ombro dele.
— Te mato mesmo assim. — Tomo o restante do café, e eles riem da minha cara. — Vamos, o Cá entra às 7h. — Pego minha bolsa, uma caixa de lenço de papel e um lenço de pano. — Lu, quero uma boa explicação no caminho. — Enquanto esperamos Fábio chegar, escuto parte da conversa entre Lucas e Carlos.
— E eles ficam babando, não sei por quê.
— Ela é gostosa — Lucas fala com um sorriso sem vergonha.
Fabio chega e nos despedimos de Helen, então seguimos para meu carro.
— Filho o que estão falando? — Finjo não ter escutado.
— Nada de mais mãe, estava dizendo ao Lucas que meus amigos gostam de você. — Carlos não completa.
— Isso é bom, não é?
— É sim — Carlos afirma, distante e olho para Lucas que dá de ombros e vai ao volante.
Seguimos até o colégio quietos, eu, o mais quieta que uma gripe e tosse deixam. Sinto frio e me encolho encostando a cabeça no vidro. Não demora, Lucas e Carlos começam a falar sobre o jogo de algum time, mas não estou prestando atenção. Chegando ao colégio, e preparo-me para me despedir do meu filho, mas Lucas barra me segurando.
— Faz isso daqui. — Segura forte meu pulso. — Confia em mim. — Viro para ver Carlos pelo vidro do carro e seguro a mão dele.
— Peço para seu pai vir te buscar. — Ele se aproxima e beija minha testa.
— Quero que a senhora cuide dessa gripe, e posso ir sozinho se quiser.
— De jeito nenhum, se seu pai não vier, eu venho — afirmo, tossindo novamente.
— Mãe, a senhora está com uma gripe horrível, eu po...
— Eu venho, se o seu pai não vier — Lucas o interrompe. — Vamos a uma balada. — Pisca para Carlos, sorrindo.
— De jeito nen...
— Mãe, ele está brincando — diz Carlos, rindo de mim.
— Nunca se sabe vindo do Lucas. — Acabo rindo da careta que Lucas faz e paro com uma crise de tosse. — Tchau, meu lindo. — Sento normal e assoo o nariz.
— Tchau, mãe, tchau, Lucas — Carlos diz afastando-se e Lucas volta ao trânsito, pegando o caminho do meu trabalho.
— Por que me impediu? — pergunto, após assoar o nariz novamente.
— Você está constrangendo o garoto. — Lucas sorri malicioso e o encaro.
— Quê? — Começo a pontuar nos dedos enquanto falo. — Não falo besteiras perto dos garotos, não tento ser novinha, não o chamo de bebê nem nada constran...
— Você é gostosa, Luíza — me interrompe e ri, enquanto começo a tossir descontroladamente, e dessa vez não é pela gripe. — Está deixando os meninos de pau duro.
— Cala a boca! — reclamo após recuperar o fôlego e o pouco de sanidade que me resta, então mudo o assunto. — O que houve ontem? Não vou esquecer. — Assoo o nariz novamente.
— Me desculpa de novo — diz sem jeito. — Eu não sabia que estava indo para lá.
— Isso é quase impossível, é maior de idade e com certeza não estava chapado.
— Eu ia ao apartamento da Steffany, tínhamos planejado umas rodadas de sexo quente em diversas partes, mas fomos jantar antes e depois a louca disse que queria dançar e que conhecia um lugar legal.
— Eu te disse que não gostava daquela mulher — comento tossindo.
— Era 1h e só tínhamos iniciado as preliminares no restaurante. — Ergo a mão, pedindo que pare os detalhes, ele ri. — Eu não perguntei, só entrei no carro. E para minha surpresa ela me levou lá.
— E por que ficou?
— Eu disse para irmos a outro lugar, mas ela disse que ficaria com ou sem mim, então te liguei... O resto você sabe.
— Sim — espirro umas vezes —, mas nunca sai sem dinheiro.
— Sim, saí da faculdade com R$350 na carteira, só que não levei o débito e gastei tudo antes de irmos a Westminster.
— Lucas. — Suspiro, cansada. Não é a primeira vez que falamos sobre isso. — Sabe que não deve ir a Westminster. — Paro o protesto dele com a mão. — Eu sei que não foi de propósito, mas sabe o que poderia ter acontecido.
— Eu sei, por isso te liguei, você é minha fonte de segurança. — Aperta o volante.
— Sabe que não poderei estar perto sempre — falo apreensiva. — Sabe o que me irrita? Essas mulheres, Lucas. Não me importo que curta com essas mulheres de uma noite só, mas não acha que deve se valorizar mais?
— Gosto de me divertir, Lu. — justifica, como sempre.
— Não o crítico, sabe disso. — Espirro mais umas vezes e paro, assoando o nariz. — Você é lindo, inteligente, diretor financeiro de uma multinacional, deve procurar uma mulher que te complete, Lucas.
— Você não me aceita — Lucas protesta, sorrindo. — Quando vai aceitar casar comigo?
— Não completo você — digo negando com a cabeça, como sempre.
— Como não? É mais linda que eu, mais inteligente, minha mãe e irmã adoram você e o Carlos — completa sorrindo. — E tenta desesperadamente colocar bom senso na minha cabeça, mesmo sendo impossível. — Começamos a rir, mas logo paro.
— Sabe que adoro você e o Carlos também, mas sabemos que você precisa de uma mulher que bata de frente com você, que te coloque de joelhos, e mande em você como um cachorrinho — o provoco. — E não sou essa.
— Então vou virar padre. Não existe uma mulher assim, Luíza — afirma, como sempre. — Não vou me rastejar para nenhuma mulher.
— Assim dizem todos...
— Não vai rolar, Emy, isso é vida real, não um romance. — Ri e me encara, parando no semáforo. — Agora vamos brigar com você.
— Comigo??? — Arregalo os olhos, colocando uma mão sobre o peito. — Não faço nada errado.
— Não!? — Lucas me lança um olhar de advertência, como se eu soubesse do que está falando, estreita os olhos e vira novamente colocando o carro em movimento. — E o que me diz de ficar deixando adolescentes excitados?
— Tá maluco, Lucas? Nunca fiz isso! — protesto, ultrajada.
— Na boa, Lu, está deixando o Carlos sem jeito. — Sorrindo, Lucas balança a cabeça negativo. — O que é engraçado. Normalmente ficamos sem graça com uma mãe mal arrumada, mas você está conseguindo a façanha de deixar seu filho sem graça sendo linda. — Abro a boca para protestar, mas não sai nada. — Toda vez que aparece na frente daquela garotada, eles ficam malucos pensando como você é sem roupas.
— Cala a boca, Lucas! — Detesto quando fala desse jeito.
— Sério, eles estão cheios de testosterona, não pensam em outra coisa, não podem evitar. — Dá de ombros, sem me encarar. — São adolescentes, quando crescerem mudam.
— E você cresce quando? — provoco, ainda sem gostar do que ele fala.
— Nunca, enquanto puder — diz sem hesitar —, mas para deixar seu filho mais confortável, arruma um marido ou evita sair na frente deles. — fala pausadamente cada palavra. — O QUE INCLUI NÃO SAIR DO CARRO PARA SE DESPEDIR DELE! — Ainda concentrado na estrada, completa. — Menos ainda cumprimentar os amigos dele com beijos ou abraços.
Encolho os ombros. É extremamente constrangedor. Durante toda minha vida fiz de tudo para meu filho não se envergonhar de mim, e agora é exatamente isso que acontece.
Seguimos o caminho em assuntos neutros... Ele não quer falar sobre um relacionamento sério e eu não quero falar sobre excitar garotos. Não que Lucas dê trégua ao assunto, já que continua falando coisas idiotas quando estamos quase chegando a Ribeiro, e por sorte meu celular toca, e é William.
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