Esse lugar é assombrado?
Levanto algumas horas depois da minha chegada nessa estadia que é altamente desconfortável, mas o que posso dizer? Pelo menos tenho uma cama para deitar e eles oferecem comida também. Achei lucrativo.
Apesar de o chão do quarto fazer barulho a cada passo que eu dou e de precisar dar vários passos até chegar à casinha para poder fazer minhas necessidades, talvez eu me acostume com isso.
Era o que eu pensava até entrar na casinha e ver algo horrível, tenebroso, gosmento e muito, muito nojento... UM SAPO!
— AHHH! — grito e saio correndo do quarto, esbarrando em uma garota morena de olhos escuros.
— Céus! — Ela coloca a mão no coração. — Alguém invadiu o seu quarto, senhor? — E nesse exato momento me lembro que eu estou vestido de homem e há poucos segundos gritava como uma donzela em apuros.
— Não, não — digo após alguns pigarros para tentar voltar à voz masculina. — Eu jurava ter visto um fantasma.
— Bem que dizem que esse local é assombrado. — A moça sorri para mim e eu retribuo. — Se precisar de alguma coisa, pode me chamar. Meu nome é Liane. — Ela pisca para mim e vai embora, me deixando corada.
Isso vai ser ainda mais difícil do que eu imaginei. Como vou passar meses fingindo ser um homem? Será que eu não pensei que estaria condenada pelo resto da minha vida?
Ao lembrar de tudo isso, lembro-me o motivo de tudo isso: Matteo. Eu devo ter enlouquecido mesmo, porque mesmo se algum dia eu o encontrar, jamais poderei me revelar como mulher para ele.
Se alguém descobre que eu fugi do palácio, estarei com o pé na cova.
Decido que é bom sair para pensar em como irei me sustentar nos próximos anos e no que eu fiz da minha vida. Piso meus pés fora daquele prédio e suspiro, o ar desse lugar é diferente, parece algo de verdade.
Quando se vive muito tempo em um castelo, você acaba esquecendo-se do dever dos príncipes, princesas, reis e rainhas, que é amar e cuidar do seu povo. Sei que vovó Cristal e o vô Nicholas fizeram um bom trabalho e orgulharam a todos, mas minha mãe estava deixando meu pai destruir o nosso reino tão amado.
Vejo algumas mães brincando com seus filhos, pessoas correndo atrás de algumas galinhas, tirando leite da vaca e fico contente, pensando que eu gostaria de conseguir guardar todas aquelas imagens na minha memória para sempre.
— Ah, bom dia, senhor. — Uma criança me cumprimenta. — Pode pegar aquele brinquedo para mim? — Aponta para uma boneca que estava em cima do muro de uma casa não tão alta.
— Claro, mocinha.
Pego impulso e me jogo em cima do muro, tentando escalar por alguns buracos que estavam ali e algumas irregularidades. Sorrio ao pegar a boneca e desço feliz, mas paro ao notar o público me olhando com espanto.
— Que homem forte. — Ouço alguém dizer e ignoro, me voltando para a garotinha que me pediu o brinquedo.
— Aqui está! — Ela sorri e me dá um abraço doce que eu retribuo.
— Obrigada, moço. Você salvou a Bella.
— É o nome dela?
— Isso mesmo! O senhor gostou? — Afirmo com a cabeça e alguém grita. — Mamãe está me chamando, até mais.
E a criança sai saltitando toda feliz para sua mãe que está a esperando no meio da multidão também.
— Quem é o senhor? Novo na cidade? — Uma moça loira me questiona e se aproxima.
— Vamos dizer que acabei aqui por acaso, e gostaria de saber exatamente onde estou.
— Você está em MontNorth, mais precisamente na parte pobre de MontNorth, mas não parece ser alguém sem condições financeiras — deduziu.
— Não, mas achei aqui acolhedor.
— Diga isso até começar a ser assombrado pelos saqueadores da rua. A gente já não tem nada e o pouco que temos, tomam de nós.
Franzo o cenho e suspiro, nada muda de um reino para o outro.
— Preciso ir, senhora. Muito obrigado pela recepção.
Me despeço e saio andando, decidindo que já sei o que irei fazer... Vou retratar pessoas em telas e imagens que gosto e vender na parte nobre da cidade.
Fico andando pelo reino para observar a movimentação, tudo bem pacato. Quando volto para casa já é noite e me sinto exausta.
Estranhamente continuo ouvindo barulhos dentro da casa, mas ignoro e decido que preciso descansar. Troco de roupa, colocando uma camisola confortável e tiro aquele chapéu da minha cabeça, deixando meus longos cabelos loiros soltos.
O barulho não cessa e decido tomar uma atitude, mesmo que com medo. Será que realmente existem fantasmas aqui? Faço uma oração enquanto ando com a lamparina pelo quarto, procurando de onde vem o som.
Me mexo lentamente para meus sons não ocultarem o barulho que pretendo encontrar, estou me sentindo muito tensa. Paro de respirar por alguns segundos e noto que há outra respiração no local, o que me deixa amedrontada.
Abaixo para curiar embaixo da mesa e levo um susto, soltando um grito.
— QUEM É VOCÊ? AI, QUE SUSTO!
— Não, quem é você? — A criança sai debaixo da minha mesa e fica me encarando.
— A pessoa que alugou esse local! — respondo e me abaixo para ficar do tamanho dela. — E você?
— Bem... — Mexeu as pequenas mãos e fez cara de choro. — Eu sou Nina e fico nessa casa desde sempre, ninguém nunca alugou esse quarto.
— E como você vive?
— Eu... vamos dizer que quando as pessoas não estão percebendo, eu vou e retiro alguma coisa delas.
— Você furta as pessoas?
— Bem... Sim.
— Tão jovem... — murmuro e sinto uma tristeza profunda.
— Você faz isso sozinha?
— Claro que não, eu não sou tão boa nisso. Se fosse depender de mim para conseguir sobreviver, eu estaria morta há muito tempo — fala de uma forma tão natural e se senta na minha cama.
— Entendo.
Como eu irei reagir a isso? É só uma criancinha que não deve passar dos 8 anos. Que mundo é esse onde as crianças precisam furtar para viver?
— Você vai me expulsar daqui?
— Deveria... — Sento na cama ao lado dela e olho para fora da janela, e percebo que venta muito agitando várias folhas das árvores.
— Eu sei que está fugindo do palácio e que é uma princesa, não um rapaz — diz como se fosse uma ameaça. Talvez fosse.
— Espertinha. Como saberia disso?
— Vi suas roupas e achei isso aqui também. — Me mostra o meu colar que ganhei da vovó e eu retiro rapidamente de suas mãos.
— Tudo bem, você fica! Mas... Eu tenho uma condição.
— Diga.
— Você nunca mais vai furtar ninguém — imponho e ela me olha meio pensativa.
— Irá cuidar de mim? — Seus olhos brilham.
— Melhor que ninguém!
— Será que consegue cuidar de mim melhor que o meu "maninho"? — Faz aspas com a mão.
— Que seria?
— Não posso falar sobre ele, sou proibida. — Coloca a mão sobre a boca como se fosse um segredo e eu balanço a cabeça.
— Tudo bem. Vamos comer e dormir que estou cansada. — Pego o pão que comprei durante a tarde e me sento à pequena mesa com ela para comermos.
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