Meu presente, Seu futuro, Nosso passado | VOLUME 2 | Série "Tempo de Amar"
Apresento a vocês o segundo volume da série "Tempo de Amar", com a continuação das aventuras de Aline e Marcos. Chamado: 'Meu presente, Seu futuro, Nosso passado'.
Sinopse:
2014: Após a decisão que deixou corações partidos, Aline encaminha para a tão sonhada formatura na faculdade de Jornalismo, mas ao descobrir a verdade sobre alguém próximo, sua vida é girada de cabeça para baixo.
2032: Dando uma nova chance para o amor, Marcos tem que lidar com a maneira que o filho responderá a novidade, além do recém-chegado que promete trazer conflitos entre ele e a irmã.
O passado é turbulento e o futuro incerto. Seráque a relação dos dois voltará a ser a mesma?
Anteriormente na Série "Tempo de Amar": Aline e Rique saíram para jantar e tiveram uma noite romântica e agradável. Isso pôs nossa protagonista em dúvida de que rumo seguir, emocionalmente falando, mas enfim ela decidiu por terminar a amizade colorida com Marcos e seguir um romance com o chefe.
Obs: O capitulo a seguir tem um salto temporal de 1 mês em relação ao anterior de Aline.
Boa leitura =D
(Capitulo novo toda sexta feira)
Parte 1: Capitulo Um - Aline
23 de setembro de 2014.
Enquanto a van sacoleja pela estrada não acredito no meu azar. Um dia inteiro de viagem para o meio do nada. O interior sombrio e abafado da Bahia agora me recebe com boas vindas não tão calorosas. Observo o céu acinzentado. Como pode estar tão nublado e quente ao mesmo tempo? Os buracos no barro fazem com que meu queixo salte na mão ao tentar apoiá-lo.
- Acho que isso não está dando muito certo. - Khaliu ri.
Olho de soslaio. Está com o celular aberto em um aplicativo de mensagens.
- Merda. - pragueja baixinho. - Não acredito que o sinal já sumiu completamente.
- É, vai ter que aguentar ficar sem seu namorado perfeito por um tempo. - brinco.
Ele lança um sorriso nada natural, demonstrando a falta de apreciação pelo comentário.
Uma voz ressoa do outro lado da van.
- Acho que quando chegarmos à cidade vai melhorar.
É o fotógrafo que Rique mandou nos acompanhar para essa "incrível" jornada. Ele, que tem em torno de 26 anos, porta um bigodinho esquisito e um chapéu similar ao que meu pai utiliza quando pesca. Igor não é a pessoa mais estilosa, mas torço que suas habilidades com a câmera sejam melhores.
O motorista, ao ouvir a frase anterior, solta uma risada cheia de escárnio.
- Que cidade? - pergunta sarcasticamente.
Inclino a cabeça pela janela, confusa. Atravessamos uma porteira de madeira com os dizeres: 'Distrito de Coquinhos'. Nenhuma casa a vista. Nenhum asfalto. O caminho só se estende para um aglomerado de árvores no horizonte.
- Ainda bem que não ficarei por muito tempo. – completa.
- Cala a boca, Antônio. - Khaliu solta. Tento segurar o riso nervoso que sobe pela garganta.
Depois do que parece ser uma eternidade, o veiculo para. Khaliu salta desajeitado.
- Por que caralhos concordei em vir com vocês? - resmunga, mirando os sapatos já sujos de terra.
- Porque me adora? - tento. Puxo a mala do banco do passageiro, que cai com um ruído esquisito no chão úmido.
- Ele só queria um aumento. - Igor esclarece.
- Claro que eu queria um aumento. E, aliás, de onde veio toda essa lama se o tempo está tão seco?
- Boa sorte. - o motorista não poderia se importar menos com nossa situação, dando partida e esparramando terra para todos os lados.
- Você só pode estar de brincadeira! – o estagiário franze o cenho para o veículo que se afasta, de volta à civilização.
- Vamos. - chamo. - Acho melhor encontrar o hotel logo.
Com um aceno de cabeça resignado, os dois me seguem pelo caminho escorregadio. Não muito depois, uma espécie de vila começa a tomar forma metros a frente.
- Não acha que essas árvores são grandes demais? - Khaliu ergue o queixo, as amendoeiras se agigantando sobre nós e sobre as primeiras casas visíveis da região.
- É uma boa sombra, pelo menos. - comento.
- Um bom efeito estufa, você quer dizer. - Igor ri. - Além de abafado essas sombras deixam tudo meio tenebroso, não acha?
- Não. – minto, com a intenção de não deixar que primeiras impressões negativas atrapalhem na confecção do meu trabalho.
Igor toma a dianteira, tropeçando no solo irregular e tentando se equilibrar com os braços gorduchos. Não estou muito melhor. Pela situação que nos encontramos não é de se espantar que nenhum repórter queira vir a esse lugar. Remoo a competição perdida contra Cristian, até hoje tenho vontade de estrangulá-lo toda vez que cruzamos olhares no Jornal.
À medida que nos aproximamos, uma espécie de asfalto quebradiço surge da terra, contornando as ruas que ladeiam as moradias. Os carros que vejo são velhos, enferrujados. Os que passam por nós fazem muito barulho, além de jogarem uma cortina de fumaça cinza para o alto. Também avisto algumas carroças puxadas por cavalos cansados, e crianças sem camisa brincando de bola na rua, exibindo os dorsos magros e bronzeados. A habilidade delas de desviarem dos automóveis é admirável. Os comércios são escassos. Alguns botecos estão abertos, com pouquíssima clientela, as mesas amarelas e azuis portando marcas de cerveja estão em sua maioria vazias. O açougue ao lado já está fechando as portas. O dono com seu avental sujo de sangue emoldurando a barriga protuberante.
Casas simples de apenas um andar espalham-se pelas ruas paralelas. Moradias de pau a pique e madeira se intercalam. Aquelas de alvenaria não possuem reboco ou acabamento, em sua maioria. Poucas residências são "protegidas" por pequenas cercas de madeira, as quais delimitam os solos terrosos cheios de vegetação e aparentam estar ligeiramente estragadas pelas traças e pelo tempo.
Além das ladeiras, que estão destruindo minhas coxas já doloridas. As malas são um peso incômodo.
- Acho que é ali. - Igor aponta para o horizonte. Sigo olhando na direção até notar uma construção destoante.
Um casarão, enorme para os padrões locais, ergue-se imponente. A arquitetura remonta o século XIX. O lugar é esquisito, com seu acabamento de madeira, suspiro ao imaginar que dormirei ali pelos próximos dias.
- E o que seria aquilo? – Khaliu se manifesta, confuso.
- O hotel, sua anta. – o fotógrafo rebate.
Chegando mais perto, uma pequena placa de madeira possui os dizeres: "aberto 24h", que é o próprio nome do estabelecimento. Contenho um sorriso. Não é um objeto decorativo que combine com a estrutura, o que dá a impressão de que só é um lugar antigo que fora reutilizado da única maneira possível.
Igor tosse e abana o ar ao passar pela porta. Pontos de poeira dançam furiosamente no ambiente. Piso em um tapete peludo que só depois percebo ter uma forma de animal, o que me faz deixá-lo imediatamente. Que coisa horrível, pobre animal.
- Nossa. - Khaliu exclama, levando discretamente a camisa xadrez de flanela até o nariz.
Estou prestes a continuar arrastando a mala empoeirada, quando uma silhueta escura se forma em minha visão periférica. Fico paralisada, sem lembrar de ver alguém assim que entramos, porém um movimento brusco faz com que vire o pescoço rapidamente, a tempo de uma senhora acender o abajur no topo do balcão de madeira.
Prendo a respiração ruidosamente, o coração batendo descontrolado no peito.
A mulher ostenta um sorriso artificial, como se observasse das sombras o tempo inteiro. Aliás, por que é tão escuro aqui se ainda é dia?
- Oh, fico feliz por receber novos visitantes. - ela fala. - Me chamem de Socorro.
A voz arranhada faz com que o fotógrafo dê um salto no fim do corredor e se volte rapidamente para trás. Sinto uma tremenda vontade de rir, mas seria hipócrita, levando em consideração minha própria reação.
- Não estamos aqui exatamente para visitar... - Khaliu declara, desanimado.
- Então são os repórteres? - a senhora sorri assustadoramente. - Os que vieram escrever sobre os assassinatos? – liga um pequeno ventilador virado em sua direção.
Bizarro. Como ela soube disso? Talvez pela câmera balançando no pescoço de Igor.
- É. - respondo meio hesitante. - Não que seja muito empolgante.
O sorriso da mulher some instantaneamente.
- Não, não. Claro que não. - diz. - Ainda mais com toda essa lenda urbana rondando os casos.
- O que? - Igor arregala os olhos, à medida que Khaliu revira os seus.
- Agora não viado, estamos cansados. E com fome. – ele reclama.
A fala da recepcionista me intriga, mas concordo plenamente com meu colega. A barriga ronca ruidosamente de tempos em tempos.
- Claro, os quartos. - a mulher parece falar consigo mesma ao se virar para o mural atrás do balcão. Está recheado de chaves, mas a maioria está faltando. Sobre elas, uma cabeça assustadora de lobo guará "rosna" para nós.
- Ow. – falo admirada. Todos me encaram. - É uma excelente representação. - continuo, apontando para o lobo.
- Ah querida, não é uma representação. - a senhora estende três chaves no tampo arranhado. - É um lobo de verdade, empalhado. Sempre amei taxidermia. – comenta, orgulhosa. – Aqui estão as chaves, qualquer coisa é só chamar.
Khaliu e eu trocamos um olhar que diz: 'No que nos metemos', e seguimos para a escada.
- Isso é ilegal, não é? - ele pergunta retoricamente, mais alto que um murmúrio.
Igor tropeça a nossa frente. Fico receosa que caia e nos arraste escada abaixo, mas o rapaz simplesmente nos encara ao segurar o corrimão empoeirado.
- Deveríamos acrescentar isso à reportagem? - pergunta, encabulado.
Khaliu o fita em silêncio, o ultrapassando com um bufo exagerado.
- Claro que não. – diz, já no patamar superior. A voz ecoa pelas paredes de forma fantasmagórica.
Cerro os olhos ao alcançar o primeiro andar. Está muito escuro. Faixas de luz cruzam o corredor onde há cortinas pesadas, vermelhas com padrões losangulares bordados.
- Esse lugar parece ter vindo direto do período colonial. - Igor comenta.
- Do Primeiro Império, pra falar a verdade. - completo distraidamente, tentando captar o máximo do ambiente. - Dom Pedro ou algo assim.
- Vocês estão viajando. Deveríamos sair logo pra comer. - Khaliu afasta uma das cortinas, gerando uma área de luminosidade no piso de madeira. - Não deve ter serviço de quarto.
Com isso, cada um acomoda em seu quarto. O de Igor é no segundo andar, o que causa estranheza. Ficaria surpresa se houvesse mais alguém além de nós aqui.
Preciso tentar três vezes até conseguir girar a chave na fechadura. O cheiro empoeirado que me engloba é forte. Só tenho coragem de cruzar o cômodo e ir até uma das janelas, com intenção de abri-la. Assim, quando voltar do jantar, boa parte do aroma nada agradável terá se dissipado.
Uma das características peculiares é o fato de as paredes portarem dois ventiladores, além de um no teto. Isso não seria tão esquisito se mais um ventilador portátil não estivesse posicionado no criado-mudo.
Céus, o que é o clima desse lugar?
Levo a mão até o pescoço só para descobri-lo completamente encharcado. Faço uma careta, sentindo desconforto. Apoio a mala suja na parede e já estou pronta para ir. Ansiosa para um pouco de ar fresco e uma caminhada pela cidade.
Khaliu não demora, se mostrando impaciente por ter que esperar o fotógrafo. Meu colega de trabalho está claramente irritado pelo dia cansativo na estrada.
- Cara... - o fotógrafo nos surpreende. - Há muitos quartos interditados no meu andar. Não entendi nada.
- Vai ver mofaram demais. - Khaliu dá de ombros e seguimos para fora, sem encontrar a senhora na recepção.
A terra dá espaço para o asfalto antigo e calçadas confeccionadas por grandes blocos de pedra. Verde irrompe por entre as rachaduras e por toda a paisagem local. Literalmente.
Trepadeiras e heras entrelaçam-se pelos pequenos muros e paredes, subindo por janelas e às vezes até alcançando os telhados, como um jardim vertical natural. Imagino quantos insetos e umidade deve reter.
As casas continuam simples, porém as construções ao redor, à medida que nos aproximamos do centro, ligeiramente atemporais. Portas emolduradas e pilares que lembram a arquitetura neobarroca do Brasil Império. Percebo que andamos até chegar a uma espécie de centro histórico.
Apesar das características antigas nos batentes das portas do que imagino ser construções municipais, o resto permanece simplório, comum. As barraquinhas de vendedores ambulantes estão lotadas de salgadinhos baratos e balas. Ao lado, um carrinho de açaí, e logo passa por nós um senhor empurrando seu carrinho amarelo de picolé, consigo ler a palavra 'Caicó' em uma das laterais, deve ser uma marca da região.
O comércio do centro se mostra um pouco mais agitado. Uma praça grande se estende circularmente com uma fonte manchada e fora de funcionamento. Alguns outros vendedores na grama e pessoas de bermuda e chinelo serpenteando pelas calçadas na circunferência ao redor; cheias de mesas e cadeiras graças aos restaurantes. Vejo espetinhos e uma pizzaria.
Por onde andamos, olhares nos acompanham. Os cidadãos não param de encarar. Cabeças viram ao passarmos. Devemos ser um grupo peculiar para a população.
Exatamente ao norte da fonte, algo se sobressai. Um edifício quadrado, branco e imponente. Fico admirada com a beleza atemporal da peça histórica.
- Acho que é a prefeitura. - Khaliu esclarece ao me ver encarando. Igor leva a câmera até o rosto, apontando para as pilastras esculpidas com padrões complexos.
Observo por mais um instante. É a única construção de aparência, de fato, opulenta da cidade. E aos seus pés, na calçada, um garoto negro engraxa sapatos. Descalço e sujo. Meu coração se aperta. A imagem é de um contraste impactante.
Seguimos até um restaurante situado ao lado de um mercadinho. Portando uma espécie de varanda, o local nos obriga a subir alguns degraus antes de alcançarmos às mesas. Mais ventiladores como os do hotel giram sobre nossas cabeças. Nem de perto o suficiente para afastar o calor. Observo uma espécie de tapeçaria de pele pendurada na parede, os padrões são complexos e me distraem até que os dois garotos escolham os assentos.
- Que bela vista de bananeiras e amendoeiras. - Khaliu escorrega na cadeira. - Você, Igor, terá um ótimo trabalho com essas fotos.
O fotógrafo sorri.
- Está brincando? Não viu todas aqueles casarões sinistros com arquitetura antiga?
- Os caindo aos pedaços? - sinto meu humor um pouco ácido.
Somos interrompidos pelo garçom que aparentemente também é o cozinheiro e dono do local.
- Uau. - o homem assobia, enxugando as mãos no avental. - Não esperava por turistas.
- Não somos na verdade. – digo, mas repenso. Apesar do mesmo sotaque baiano é como se estivéssemos em outro estado. O homem ergue uma sobrancelha brincalhona para mim, o que faz ter vontade de soltar uma risada. Sinto-me um pouco melhor. – Tudo bem, somos.
Nesse momento avisto um casal subindo as escadas que levam até ali, apontam para as mesas ao nosso redor, como se escolhessem.
- O que vão pedir?
Relanceio para meus companheiros, incerta. Os dois dão de ombros.
- O que tiver de melhor.- digo. Já vi falarem isso muitas vezes e sempre parece dar certo.
- Serve. - Igor concorda. - Só quero comer e discutir os detalhes da reportagem o quanto antes.
A expressão amigável do cozinheiro se esvai rapidamente. É como se a frase fosse um gatilho. O clima agradável não existe mais, há apenas o olhar intenso do homem sobre nós.
- São repórteres? - pergunta pesadamente. - Vieram pelos assassinatos?
Khaliu afirma com a cabeça lentamente, notando a mudança no ar. O casal de antes hesita antes de sentar à mesa próxima a nossa. Os dois nos encaram em silêncio por um longo instante antes de escolherem cadeiras mais afastadas.
- O pedido sairá logo. Voltem cedo para onde estão ficando. - o homem que nos atende declara, quase que mecanicamente, afastando em seguida, sem sequer reconhecer a presença dos outros clientes.
Surpresa cobre a feição de Igor, já Khaliu franze o cenho por trás dos óculos na direção do interior do restaurante.
- Acho melhor discutirmos isso no hotel. - diz.
Engulo em seco, concordando:
- É. Só espero que esse cara não cuspa na nossa comida ou algo assim.
Igor lança um breve sorriso e Khaliu relaxa os ombros. A frase descontraída cumpriu seu propósito, mas não espantou por completo a tensão que se segue durante a refeição.
Gostou do capitulo? Compartilha com amigos, colegas, familia e outras pessoas que curtem esse tipo de história =D
Reinicio aterrorizante, gostaram da mudança de tom?
Próxima sexta tem capitulo novissimo para voces, até lá. Beijos e abraços <3
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