Capitulo Vinte e nove - Aline
Anteriormente em 'Desde agora e para sempre': Aline e marcos começaram uma amizade colorida. Numa saída para se divertir, Aline e Cris acabaram por arranjar briga com alguns skinheads, mas levaram a melhor graças a seu amigo e dono do bar, Morcego. Em um erro no jornal, a garota acabou enviando as mesmas matérias do dia anterior, o que quase custou seu emprego, mas por algum motivo desconhecido (ou nem tanto) recebeu mais uma chance do seu chefe.
Obs: O capitulo a seguir tem um salto temporal de 2 meses em relação ao anterior de Aline.
Boa leitura :D
(Capitulo novo toda sexta feira)
4 de julho de 2014.
Dolores está nervosa. Claro que está. apesar de tentar não transparecer. As mãos contorcem em seu colo sem parar; finjo não reparar. O caminho até o estúdio de moda é longo, de forma que coloco uma música que goste com o intuído de acalmá-la. Não funciona.
O estacionamento está lotado, tenho que dar várias voltas e por fim, decido parar em uma quadra próxima.
- E se meus sapatos sujarem? - Dolores pergunta, apreensiva.
- Não vão. - olho em volta. - Vamos pela calçada e asfalto. Nada de barro por ali.
É natural que esteja preocupada com cada detalhe. A seleção para as modelos do ano tem a fama de ser muito exigente.
Chegamos até a fachada espelhada da agência, sem imprevistos, e admito que a arquitetura imensa do lugar intimida quem ousa passar por aqui. Endireitando os ombros, a garota assume uma pose confiante e atravessa as portas, eu a sigo.
Aparecemos com cerca de uma hora de antecedência, mas o local está tão cheio de garotas que faz alguém que sofre de ansiedade como eu querer sair correndo. Fico feliz por Dolores não ter o mesmo problema.
Quando driblamos aquelas várias aspirantes à Gisele Bündchen e finalmente conseguimos uma senha - apesar de ser um número bem alto -, sinto-me um pouco mais aliviada. Agora é só questão de tempo.
O hall é enorme. Cheio de poltronas e cadeiras para que todas as competidoras se acomodem sem problemas. Com muita sorte conseguimos encontrar uma espécie de mesinha, a qual está livre, e corro para pular em um dos bancos altos, antes que qualquer outro tenha a chance de fazê-lo. Deposito a bolsa sobre a superfície metálica da mesa e cruzo os calcanhares.
Dolores demora um pouco mais para se acomodar. Por sua expressão, percebo que a confiança que esperava manter começa a esvair.
- Parece que vai demorar. - comento.
Ela olha para baixo e mexe em uma das unhas. A resposta é breve:
- Sim.
- Que tal sairmos para comer alguma coisa? É cedo e não lembro de vê-la tomar o café da manhã.
Imagens das cafeterias espelhadas ao redor do edifício flutuam deliciosamente pela minha cabeça. Provavelmente outras pessoas tiveram a mesma ideia que eu, pois vez ou outra alguém sai pela porta ainda segurando o papelzinho, com a senha balançando entre os dedos. Olho para Dolores esperando encontrar concordância ou até um pouco de animação em seu semblante, mas me deparo com o completo oposto.
Ela parece preocupada.
- Melhor não. - diz e desvia o olhar. - Sem fome.
Estranho. Antes costumávamos todos tomar o café juntos, mas agora as coisas mudaram. Cada um vai para seu canto.
Entediada, deixo meu olhar vagar pelos vários rostos que lotam os arredores. Cabelos lisos, meninas magras. Muitas clavículas e ossos visíveis saltando da pele. Tenho um bom pressentimento sobre a audição de Dolores. Suas curvas se destacarão no meio de toda essa gente.
Porém, quando a hora chega, minha certeza vacila sob o olhar crítico dos juízes. É evidente que a de Dolores também.
- Número 87. - uma mulher loira de nariz empinado declara, franzindo o cenho quando nos aproximamos. - Siga-me. - se volta para mim. - Você pode esperar aqui.
Dou um tapinha discreto de incentivo nas costas de minha meia-irmã e a observo desaparecer em um longo corredor. A garota provavelmente terá que vestir algumas roupas para esse comercial de moda, fico imaginando qual combinação esquisita seria.
Após esperar por uns dez minutos, decido ir atrás de algumas rosquinhas. Talvez ela volte com fome.
Com a fila um pouco maior do que previ, volto atrasada para a agência. Quando estou prestes a entrar, alguém abre abruptamente as portas e esbarra em mim. Cambaleio para trás, tentando equilibrar as rosquinhas e a mim mesma, quando percebo que se trata de Dolores.
Seus olhos brilham, cheios de uma tristeza que não consigo entender. Até que me abraça pela cintura e enterra o rosto em meu peito.
- Ah, querida. - murmuro, passando os braços ao redor dela. - Sinto muito.
Ela não diz uma palavra, só continua ali por alguns minutos. Espero pacientemente, sem querer pressioná-la. É óbvio que não conseguiu o contrato. Afasta-se, fungando uma vez e segue até o carro, tentando manter a postura. A admiro por isso.
Queria que Verônica estivesse aqui, provavelmente ela saberia o que fazer em relação aos sentimentos partidos da filha. Infelizmente a mulher não pode nos acompanhar por ter que resolver problemas no banco.
Já no caminho para casa, tomo coragem para perguntar:
- O que falaram?
Silêncio. Ela respira fundo e solta o ar pesadamente. O queixo está apoiado em uma das mãos enquanto seus olhos passeiam pela paisagem da via costeira
- Que eu tinha que perder peso. Alguns quilos, não sei.
- O que?! Tem que ser brincadeira.
Fico pasma. Dolores é magra, apenas tem os quadris largos e seios mais cheios, o que honestamente é bem bonito.
- Mas não é. - responde simplesmente.
Lembro de todas aquelas garotas magras e me sinto furiosa com a horrível realidade que aqueles padrões impossíveis impõem. Aperto minhas mãos em torno do volante e não pergunto mais nada pelo resto do percurso.
Deixo os preparativos do jantar nas mãos de Verônica por um instante. Seria uma refeição especial para animar Dolores e comemorar o fato da seleção brasileira ter se classificado para a semifinal.
Não sei que tipo de família comemoraria tal acontecimento além da minha. Talvez muitas. O Brasil tem uma séria obsessão por futebol.
Temos carne de cordeiro, bem macia; costelas de porco, Camarões grelhados, feijoada com farofa para acompanhar, além da salada de maionese. Meu pai até comprou uns acarajés - apesar de eu preferir abará -. Com certeza sofreríamos de severas dores de barriga pelos próximos dois dias. Mas Verônica e papai simplesmente pareciam ignorar as consequências, ou de fato não se importavam.
Com o jantar na mesa, nos servimos com gosto. A única que não presente é Dolores, que estava no banho quando fui chamá-la. Mas porra, que banho demorado. Terminamos a refeição e ficamos esparramados na sala nos sentindo como balões inflados. E ainda assim, nada dela aparecer.
Verônica não se importa. Guarda a comida em potes e os deixa organizados na bancada para que a filha se sirva quando tiver fome.
Permanecemos ali até que gradualmente todos vão para seus quartos, sendo a última e pouco interessada no filme que preenche a tela. Desligo a televisão e apago as luzes, seguindo escada acima. A única luz acesa é a do quarto de Dolores.
Bato na porta levemente. Está tarde e não pretendo acordar ninguém. Ouço um murmuro e tomo isso como permissão para entrar.
Ela se encontra deitada sobre a colcha rosa com o rosto enterrado no travesseiro. Vira a cabeça para o lado a fim da voz sair clara.
- Está tudo bem? – indago, levemente preocupada.
- Sim.
- Boa noite, então.
Quando me viro para sair, ela chama a atenção:
- Preciso falar com você sobre uma coisa.
Dirijo-me até a ponta da cama.
- Claro.
Momentos de silêncio se estendem enquanto espero pacientemente. Dolores se ergue de repente, como se um onda de empolgação percorresse seu corpo.
- É aquele garoto.
- Que garoto?
- O que conheci durante as férias. - ela soa tímida. Demora até completar a frase e a pronuncia com visível esforço. - Nós quase nos beijamos.
Tento puxar à memória esse tal garoto, mas nada me vem, então concentro nos fatos atuais.
- E o que aconteceu para não se beijarem? Você não queria?
Dolores contorce as mãos, um pouco constrangida.
- Queria, muito.
- Então...?
- Seria errado. - diz, atropelando nas palavras.
Sinto vontade de rir.
- Por deus, por que beijar um garoto seria errado? - pergunto, a voz se elevando mais do que pretendera.
- Shhh. - Dolores leva o dedo aos lábios. - Alguém pode escutar! E você acabou de citar o motivo.
- Como assim? - fico confusa.
- Deus.
- O que "Deus" tem a ver com isso?
Ela levanta e começa a andar em círculos.
- Seria errado perante os olhos do Senhor. Pouco prudente e nada casto.
- Caralho, você está falando que nem uma testemunha de Jeová. - rio.
- Cala a boca, é sério! - exclama, mas não consegue conter um sorriso por conta da piada.
- Daqui alguns dias usará saias até as canelas e sairá batendo na porta da casa dos outros. – continuo, em tom descontraído.
Ela joga uma almofada em mim.
- Tudo bem, tudo bem. - digo, erguendo as mãos em um pedido de desculpas. - Deus não tem nada a ver com isso, querida. Ele não se importaria com tal coisa. "Ame o próximo", lembra? - tento.
- Mas não significa amar tanto assim.
Solto uma gargalhada.
- Às vezes acho que você leva a igreja muito a sério.
- Sim, eu levo.
Seguro seu pulso com delicadeza e a faço sentar ao meu lado.
- Certo, mas não deixe isso te impedir de viver sua vida. Amar, beijar, transar.
Ela solta uma exclamação e seu rosto adquire uma tonalidade vermelha que se sobressalta no tom de pele moreno.
- 'Transar' não é uma palavra proibida. Mas claro, só quando for mais velha. - abrando a frase anterior, devido à sua personalidade acanhada.
O rubor cede aos poucos e Dolores acena com a cabeça.
- Prometo que não irá para o inferno ou algo assim. – sorrio e ela devolve o gesto, ainda incerta.
Nesse instante um celular vibra, e sei não ser o meu.
- Ah, é ele. - Dolores enterra a mão no rosto.
Tenho vontade de rir do drama que é ser adolescente. Fui exatamente assim. Só que sem envolver Deus na história.
Agarro o aparelho antes que ela tenha a chance de pegá-lo. Dolores solta uma exclamação quando fico em pé na cama, erguendo o celular. Ela me imita, mas não importa quanto pule, não consegue alcançá-lo.
- Não pode fazer isso! - guincha.
Dou um sorriso diabólico.
- Posso e vou. - com isso salto da cama e corro pelo quarto enquanto digito. Dolores parece prestes a ter um colapso nervoso.
- Pronto. - jogo o celular para ela. - Agora você tem um encontro.
Me encara, perplexa, e olha para a tela. Sei que por dentro seu coração deve estar batendo vigorosamente contra o peito, com aquela sensação peculiar de quando estamos começando a nos apaixonar. Está tudo estampado em seu rosto.
Ela fica muda e cai pesadamente na cama.
- Durma bem. Te ajudo com a roupa depois - mando um beijinho e saio do quarto.
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Obrigado por ler. Até o próximo. Beijos e abraços <3
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