Capitulo Dois - Aline
Anteriormente em 'Desde Agora e Para Sempre': Após uma viagem de férias, Aline e a família voltam a Salvador para aproveitar o fim do descanso em uma antiga casa de praia.
Boa leitura =D
(Capitulos novos toda quarta feira)
8 de Janeiro de 2014.
Encaro a escada espiralada e com estrutura pouco confiável. Engulo em seco. Espero que não desabe nem nada.
A passos cautelosos desço ao térreo. A sala e a cozinha atrás de mim são como uma, divididas por uma bancada. O espaço é grande, há janelas para todos os lados que com pouca limpeza serão perfeitas para apreciar a paisagem a volta. Cortinas levemente transparentes agitam, trazendo vida ao local.
Fiz questão de abrir todas as janelas, para que o ar pudesse circular, e em instantes o cheiro da maresia já preenchia a casa. Espero que a beleza exótica do lugar com seus móveis em madeira simples seja do agrado a todos.
— Aline, João, Dolores! — a voz do meu pai ecoa do quintal. — Se arrumem para almoçar!
Obedeço com empolgação.
O restaurante é o que podemos chamar de tipicamente tropical. Camarões, lagostas e toda espécie de frutos-do-mar decoram as paredes muito bem iluminadas pelo sol do meio-dia. Demorou até encontrar um local que agrade a todos. Na recepção, aguardamos por poucos minutos, e admiro as cordas trançadas que moldam o ambiente, são como redes incrivelmente complexas que espalham e ramificam pelas paredes. Lindo. Pergunto-me se tais peças artesanais foram confeccionadas por trabalhadores regionais. Duvido.
Um aquário em tom esverdeado atrai a atenção de todos os olhares, provavelmente pelo tamanho e as luzes estrategicamente posicionadas. Peixes exóticos agitam as nadadeiras dentro da estrutura que estende por grande parte da parede leste. É como ver uma amostra dos personagens da Pequena Sereia.
O garçom interrompe os pensamentos nos conduzindo para a mesa mais rápido que imaginava, afinal o estabelecimento está cheio.
Viro-me para João Vitor:
— É engraçado estarmos prestes a degustar uma versão gourmet de toda essa decoração — lhe arranco gargalhadas que atraem olhares curiosos.
Não compreendo como a mistura de todas aquelas variações de ornamentos resultam em um ambiente tão agradável, ao invés de poluição visual. As luzes que pendem do teto proporcionam uma experiência quase mágica, e meu apetite só cresce.
A mesa na sacada do andar superior é perfeita, exposta ao ar livre com toque rústico. Casais, famílias pequenas, e outras numerosas nos cercam e sinto a vontade. O toque sutil do timbre baixo das conversas e risos traz uma atmosfera bem mais caseira e simples do que inicialmente imaginara.
Ir a restaurantes diferenciados já virou tradição em nossas viagens, que, aliás, é o único momento que temos tempo e disponibilidade para reunir todos.
— Jesus amado, as coisas aqui são um roubo! — papai reclama com o cardápio em mãos.
— Falei para ir naquele dogão que passamos. — João protesta.
— E almoçar pão com salsicha?! Nem pensar. — rebato.
— Melhor que essa carne salgada e sem gosto. — aponta — E ainda tem a possibilidade de comermos coco de peixe.
Dolores franze em uma careta de nojo.
— Para de ser idiota, óbvio que não. — o adulto intervém.
— Quem te garante? — o outro retruca.
— É um restaurante grande, o mínimo da obrigação é ter higiene.
— Já vi na internet gente que foi para o hospital com bactéria de frutos-do-mar.
— Cala a boca, João. Vai comer o que tiver ou fica com fome. Não vou passar mais uma hora rodando a cidade para atender as preferências de vocês. — e lá vai papai perdendo a paciência novamente, até que demorou dessa vez.
Contenho o riso e o garoto fecha a carranca, sabe que não sairá vitorioso dessa.
Pedidos feitos, e os pratos que chegam são belíssimos, destaque para o suculento badejo assado e disposto sobre folhas de alface e rúcula. Tiro fotos para fazer inveja a meus mais tarde, e atacamos sem dó.
Em pouco tempo, metade do animal já não existe, reflexo de horas na estrada sem nada para comer. A carne branca desmancha na boca, acompanhada do vinagrete e da farofa úmida e crocante de bacon, formam uma combinação incrível. O molho cítrico e levemente apimentado é viciante, facilmente fundaria uma religião somente para adorá-lo e enaltece-lo.
— Ei! Deixa para os outros! — João queixa quando adiciono mais duas colheres da mistura ao meu prato.
— Deu mole perdeu, querido. — lanço em deboche. — Não era você que odiava peixe?
— Mas o molho eu quero! — tenta alcançar o ramekin, mas reposiciono do outro lado, mais próximo de Dolores, arrancando risos discretos da garota.
— Pega leve minha filha, só você comeu metade do molho. — o mais velho intervém.
— Vocês que estão devagar. — falo em tom divertido, mas logo devolvo o objeto ao local original.
Mais algumas garfadas e João muda o assunto:
— E a televisão, vai dar para consertar? — direciona a papai.
— Creio ser problema na antena, vou subir depois no telhado para ver. — responde com a boca parcialmente cheia.
— E o cara ainda teve a pachorra de confirmar haver televisão na casa, aquilo está mais para máquina de lavar do século passado.
Concordo com um som gutural enquanto mastigo. O eletrodoméstico robusto e de modelo com tubo e botões é algo que não via desde a infância.
— Não esquece que estamos sem internet. — aponto.
— Tenho que mandar mensagem para Josué. — o mais velho se refere ao dono da casa de praia.
— Ele mandou mensagem mais cedo. — Dolores revela. — Disse que tem que pegar uns fios no quartinho do quintal e me deu a senha.
A garota sempre precisa e necessária em suas falas.
— Tem que consertar a televisão antes da noite, hoje começa as eliminatórias da Liga dos Campeões. — João avisa.
— É hoje? — o outro parece pego de surpresa.
— Real Madrid vai destruir hoje.
— Sei não, eles quase perderam a última partida.
— Porque CR7 estava machucado, e mesmo assim deu o nome, mas hoje ele bota para foder.
— Olha a boca, menino. — papai repreende, levando outra garfada à boca.
O garoto dá de ombros, nitidamente empolgado com o evento de mais tarde. Gostaria que se empolgasse desse jeito para os estudos, e aposto que o patriarca pensa o mesmo.
Relevo a conversa sobre futebol que prossegue e disfarçadamente alcanço o molho, depositando mais duas colheres no prato, a proveito da distração dos dois. Dolores acha graça, e distrai espetando cada pedaço de bacon restante no prato.
Com a barriga lotada, o que me força a afrouxar um dos botões da calça jeans, pedimos para embalar as sobras para "viagem". Papai nem esconde a agitação para o passar do dia e a chegada de Verônica, e eu só queria ter um lugar melhor para ir e não ter que encarar a mulher.
O táxi estaciona com um chiado agudo dos pneus contra o asfalto quente do meio da tarde. As duas pequenas maletas são agilmente retiradas e posicionadas em frente a porta do passageiro, transparecendo a pressa do motorista para apanhar mais passageiros, que devem aumentado graças ao fluxo incomum proporcionado pela aproximação da Copa do Mundo. O carro enfeitado com bandeirinhas do Brasil é um pouco cômico.
A rua que dá acesso à casa de praia é um beco, o que dificulta as manobras do carro. Uma serelepe Dolores cruza a varanda e o caminho de pedras, a sigo com o ânimo de alguém que está começando uma dieta restritiva. Percebo a agitação nas casas vizinhas, com músicas em alto volume e conversas, antes de notar a presença da mulher.
E então o veículo acelera, desaparecendo na estrada, e lá está Verônica. Dolores acelera o passo, abrindo um sorriso e os braços para a mãe. A semelhança entre as duas é ainda mais perceptível quando juntas. Verônica a fita com os olhos castanhos claros transbordando amor e saudade.
— Olá, Verônica. — alcanço-as ofertando boas-vindas.
— Oi, Aline. — abre um largo sorriso e logo me envolve nos braços e um estalo na bochecha esquerda, demonstrando os modos refinados.
Forço o sorriso, mantenho em mente o quão feliz ela faz Dolores e papai, mas aquele toque de ciúmes mal contido insiste em espetar.
A filha leva sua mala de mão que acredito conter objetos pessoas e o conjunto de tricô, do qual no vive sem. Não é possível que trouxe mais roupas, visto a bagagem enorme que mandara colocar no carro.
De braços cruzados, mãe e filha caminham para o interior da residência colocando o papo em dia, que logo torna em um monólogo por parte de da mais velha. Suspiro, sabendo que será um longo resto de dia.
— E ai, como foi o dia? — a voz de Cris fala em meu ouvido. Ajusto o celular o melhor possível para não correr o risco de cair, enquanto tento organizar minimante a bagunça que são minhas roupas na mala.
— Ainda bem que você ligou, estou incomunicável aqui? — faço pilhas separando camisas, vestidos, shorts e roupa íntima, mas elas pouco cresceram nos últimos trinta minutos.
— Porquê?
— Seu Júlio ainda não instalou a internet, e meus dados móveis acabaram durante o trajeto para cá. — bufo chateada.
— Vocês não estão de férias? O que ele tem mais para fazer que não instalou ainda?
— Quando Verônica chega já sabe como, o homem fica ceguinho. — em meio a desordem encontro o carregador que pensei ter esquecido em São Paulo, e alegro brevemente.
— Ata. — responde com a mesma indiferença.
— Mas daqui a pouco vou lá embaixo tentar domar aqueles cabos.
— Boa sorte. — consigo ouvir uma risada sarcástica. — Então o dia foi um saco.
— Teve esse almoço no restaurante e passamos o resto da tarde limpando e ajeitando o andar de baixo. Só agora consegui pegar em minhas coisas.
— Meu Deus! Credo — ri. O som de um secador é perceptível no fundo da ligação.
— Inventando coisa para fazer no cabelo de novo? — indago curiosa.
— Não. Retoquei e acabei de lavar, estou finalizando.
Imagino como as mechas azuis estão belas e vibrantes, do jeito que gosta.
Desisto das roupas e desabo na cama de casal que ocupa boa parte do cômodo. Uma nuvem de poeira agita ao meu redor. Fico mais sossegada e à vontade sabendo que o restante da casa já está organizada, e não terei que fazer isso amanha.
— E as festas? Já encontrou alguma? — ela pergunta.
— Que nada... — desapontamento domina enquanto reviro no colchão. — Pensa que papai me deixará sair perambulando por aí todas as noites?
— Você é uma mulher, tem vinte e dois anos, é livre para ir aonde quiser, ele tem que acostumar com isso — bufa contrariada.
— É mais fácil o inferno congelar. — um sorriso sarcástico corta meus lábios. — Mas relaxa, não é como se alguma dessas coisas tivesse me impedido antes.
Cristina gargalha do outro lado da linha:
— Tem razão.
Imerjo em assuntos variados com ela pelos próximos vinte minutos, divertindo com os incentivos festivos, fofocas e pitacos sobre o curso de jornalismo. É reconfortante voltar a conversar com minha melhor amiga.
Quando desligo, o céu escureceu lá fora. Ainda animada pelo diálogo com Cris, deslizo um dos grandes retângulos verticais de vidro e inclino sobre a janela, à procura de pontinhos coloridos pela costa, e não surpreendo ao avistar vários. A cidade parece estar bem animada hoje.
Sento no batente acolchoado que decora o quarto como um mini sofá embutido, e relanceio para as pilhas de vestimentas no chão, ponderando retornar a elas. De súbito um rangido anuncia a presença de meu pai, que veste um avental de cozinha. Os olhos não aparentam cansaço como antes, o que não faz sentido considerando que não dormiu desde que chegamos. Rapidamente relaciono seu aparente bom humor com a chegada de esposa e, de repente, lá está a pontada amarga novamente.
— Desça para o jantar, fiz o arroz temperado que gosta. — anuncia, já esquivando para fora do quarto, pronto para chamar João Vitor ou Dolores.
— O favorito da mamãe... Aposto que a outra já acabou com tudo. — resmungo, referindo a Verônica, e volto a atenção para a mala, porém, o comentário não sai despercebido.
— Não use esse tom para falar de sua madrasta. — ele estanca na porta e assume uma postura rígida. — Ela não fez mal nenhum a você e... — para abruptamente.
Estranho a interrupção do sermão e levanto a visão. Suas orelhas tornando rosadas, aviso claro que uma tempestade de desaprovação está por vir.
Sigo seu olhar afiado até a almofada ao lado, onde um vestido brilha num azul-escuro intenso, assim como o céu estrelado. Inspiro com força ao perceber o que passa pela cabeça do homem. Ainda não havia decidido se realmente sairia hoje, mas agora, a ansiedade revira as entranhas com a vontade crescente de sair dali. Pela respiração descompassada julgo que enlouqueceria caso sentasse à mesa para comer peixe com arroz.
— Nem pense em não descer para o jantar. — ele chia pelos dentes cerrados, batendo a porta com força na saída.
Meu interior explode em misto de sentimentos conflituosos, e logo me pego arrancando a blusa pela cabeça para colocar o vestido.
O quiosque brilha diante dos meus olhos como a maravilha tropical dos sonhos de todos os turistas. O teto de palha é extenso e sustentado por fortes vigas de bambus adornadas com lâmpadas de luz amarelada. Decorações coloridas enfeitam as cadeiras e mesas, atribuindo um ar festivo ao salão exterior. Pequenas lanternas de papel em estilo japonês reluzem indicam o caminho até a recepção.
Contenho um sorriso satisfeito. As ondas bem delineadas do meu cabelo balançando, acompanhando o ritmo dos passos.
O trajeto pela praia até aqui foi tranquilo e satisfatório, com os saltos pendentes nas mãos, deliciei com a areia úmida bem assentada pela maré que regressara durante a passagem do dia para a noite.
Porém, ao entrar no bar, o som abafado da música pulsante, mesclado com as vozes dos jovens e adultos na farra traz aquilo que preciso. A euforia do ambiente funde à minha. Aqui sinto livre e confortável.
Encosto na bancada do bar que também possui decorações que lembram o Havaí. Aparentemente é típico dos estabelecimentos da cidade misturar várias referências com maestria. Aconchegando em um dos bancos altos, percebo alguns olhares dirigidos a mim, mas nada fora do comum. Em lugares assim, o que as pessoas mais fazem é observar.
A parede espelhada do outro lado do balcão contendo bebidas proporciona a visão da minha maquiagem bem delineada. Foi o máximo que consegui fazer com a pressa de sair de casa.
Outro reflexo que o espelho mostra é uma figura aproximando, o bartender. Estou prestes a anunciar meu pedido, quando um rapaz de pele bronzeada e cabelos cacheados aparece ao lado, sustentando garrafas vazias de cerveja entre os dedos e depositando no balcão. Um dos atendentes levanta o polegar para sua figura indicando que trará a próxima rodada.
O bartender corpulento levanta uma sobrancelha, esperando que fale o que desejo, mas antes que pudesse abrir a boca, o rapaz de olhos castanhos abre um sorriso direcionado a mim:
— Que tal o mesmo quero meu? — inclina a cabeça para o grande grupo que festeja.
Gostou do capitulo? Compartilha com os amigos, colegas, familia, e quem mais goste desse tipo de história =D
Obrigado por ler. Até o próximo. Beijos e abraços <3
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro