Capítulo Cinquenta e sete - Marcos
Anteriormente em 'Desde Agora e Para Sempre': Depois que a bagunça com Nick e os bandidos fica mais séria, Marcos busca entender o que está contecendo.
Boa leitura =D
(Capitulos novos toda quarta feira)
10 de Julho de 2032.
Permanecemos até o anoitecer para conseguir terminar o que disse, além de limpar os tapetes, o piso do veículo e a lona. Seria muito arriscado simplesmente jogá-la fora. Ao final, Nick liga para a loja para conferir se tudo está correndo bem.
Exaustos, cada um toma banho na sua vez e depois preparo o jantar: strogonoff de frango.
- Temos que decidir o que faremos. – tampo a panela e deixo que termine de cozinhar.
- Sobre... – meu amigo mantém os olhos na televisão, está jogando Call of Duty.
Sento ao seu lado.
- Sobre o fato de ter que lavar dinheiro para criminosos a fim de preservar sua vida, ou já esqueceu? – falo em tom descontraído.
- É mesmo, o que sugere?
- Eu? Nada. Você é o único aqui que já teve alguma experiência com isso.
Ele pausa o jogo.
- Não posso simplesmente pedir pra sair, temos lavar o dinheiro de ontem antes.
- Mas assim não adiantará porra nenhuma. Eles continuarão mandando que faça o trabalho sujo deles.
- Não se forem pegos. – um brilho arteiro ilumina seu olhar.
- Como?
- Não sei exatamente, mas posso falar com Alan e bolar alguma coisa.
- Ótimo plano. – sou sarcástico.
- Calma jovem padawan, tudo a seu tempo. – faz referência a Star Wars.
- Tem certeza que pode confiar nele?
- No Alan? Claro! Ele é nosso brother.
- Que se juntou com criminosos. – rebato.
- Os caras estavam o pressionando, sabe como é por aquelas quebradas onde mora.
- Mas ele não precisava fazer isso. – mostro o gesso.
- Ele não quebrou sua mão.
- Mas permitiu. Se fosse o Alan que conhecíamos, não teria topado participar daquilo.
Permanece calado.
- Só toma cuidado. – aconselho.
- Deixa isso pra depois, o importante agora é decidirmos como lavaremos o dinheiro.
- Primeiro explica o que é isso. – a palavra "lavar" soando estranhamente engraçada em minha mente.
- Se fosse explicar tudo levaria dias, mas basicamente o que tem que saber é que existem várias formas de repassar dinheiro, faço a mais simples, que consiste em alterar valores de produtos e serviços, fazer com que se tornem mais caros do que são realmente.
- Traduz pro português agora, não entendi porra alguma. - tento acompanhar, sabedoria financeira nunca foi meu forte.
- Darei um exemplo: eu peço um carregamento de monitores por um determinado valor, no momento de registrar na documentação de encargos do mês ou até no imposto de renda esse valor é dobrado ou triplicado, substituindo a quantia real. - explica com gestos, quase "desenhando" para mim. - Esse excedente representa a parte que foi "limpa", ou seja, deixou de ser dinheiro roubado e passou a ser propriedade da loja, como lucro de vendas, por assim dizer. Após realizar esse processo com toda a grana, devolvo para Roger e os comparsas, retirando meus quinze por cento.
Minha mente gira, é muita informação. Abandono as dúvidas, focando no mais simples, para não enlouquecer:
- Só fica com quinze por cento?
- Pode parecer pouco, mas dependendo do valor que roubam, se torna uma mini fortuna.
Impressiono com seu conhecimento sobre o assunto.
- Há quanto tempo faz isso? – indago.
- Desde o começo do ano.
Reflito por um instante.
- Então o carro, o vídeo game...
- Comprados com o dinheiro que desviei. Essa casa também. – conclui.
- Filho da puta... – falo mais como forma de admiração do que chateado.
- Cada um usa seus talentos no que pode. – se gaba.
- Mas essa será a última vez que fará, certo? – assumo o tom sério.
- Sim, essa vida já deu para mim.
Quero acreditar, mas algo me "diz" que a tentação que o dinheiro lhe causa é algo inconscientemente incontrolável.
- Deixa ver se entendi, temos que comprar algo com o dinheiro que eles te deram.
- Não. Minha estratégia da loja não funcionará dessa vez, é muita grana, mais do que jamais entregaram, levaria meses para finalizar, e não temos esse tempo.
- E agora, como resolve?
Suspira, a mente trabalhando em possibilidades:
- Acho que comprar um item muito caro para depois revender é a melhor opção, já fiz uma vez.
- Mas comprar tipo o que?
- Algo que de preferência gaste toda a quantia de uma vez, pouparia tempo e esforço.
- Um carro? - falo e ele analisa:
- Teríamos que adquirir pelo menos uns três, e carros são difíceis e demorados para repassar.
- Um barco?
- Não, tem que ser mais caro.
- Mais caro que isso só uma mansão. – lanço em brincadeira, vendo sua feição mudar aos poucos:
- É isso!
- Como vamos comprar uma casa assim, de uma hora para outra? – tento fazê-lo desistir da sandice. – Não disse que o prazo é curto?
- Sim, mas é melhor arriscar do que ter que trabalhar em dobro depois.
Desaprovo ao acenar com a cabeça:
- Não acho que dará certo.
- Confia e relaxa Marcos, a partir de amanhã começarei a procurar.
Mesmo desconfortável com a decisão, acato o conselho e retorno ao fogão.
- Quer água ou café? – Rafael oferece.
- Não, obrigado.
O ambiente parcialmente escuro me deixa mais à vontade. Não tenho ideia há quanto tempo estou nesse consultório, os minutos aqui geralmente passam mais rápido.
- Estava falando sobre a fase pós-término entre você e Aline, continue, por favor. – diz.
Volto-me ao interior da mente, as péssimas lembranças tomando conta.
- A princípio foi muito difícil, chorava praticamente o dia todo, por saudades dela, de Theo; perdi as contas de quantas vezes liguei ou fui à casa do pai dela, mas Aline sempre me ignorava.
- Você se culpava pelo que aconteceu. - afirma.
Balanço a cabeça positivamente.
- Ainda se culpa atualmente?
- Não.
- Por quê? – busca entender.
- Nosso casamento não estava bem há algum tempo, o que fiz foi somente colocar a cereja em um bolo que já estava estragado.
Anota algo.
- Casamento é quase um processo, algo trabalhoso, sei como é. – diz em tom descontraído.
- Com certeza.
- E teve a coragem de ficar dez anos nessa rotina. – admira.
- Pois é. Falando assim até parece algo gigantesco, mas nem é. – digo.
- Durante o tempo de maior turbulência, você cogitou o divórcio?
- Não. Na época falei para mim mesmo que não desistiria.
- Porque a amava. – conclui.
Concordo com um aceno.
- E ainda a ama?
Sua pergunta me pega de supetão, sinto o nó na garganta e um aperto no peito. A pergunta flutua em minha mente e o psicólogo fica ali, me encarando, esperando uma resposta.
- Não sei. – falo com sinceridade.
- Vamos fazer de outra forma. Quando falo a palavra "Aline", qual a primeira coisa que vem à mente?
- Theo.
Ele anota.
- Entendo. A imagem dela está muito ligada a do filho de vocês. – fala. – Mas se fosse para definir em um sentimento, qual seria?
Penso por um instante, desviando o olhar depois retorno a ele:
- Carinho.
Anota novamente.
- Tenho certeza que dividiram muito momentos bons.
- Sim... – sorrio ao relembrar. – E acho que é nesse ponto que minha cabeça me fode, porque no tempo em que estávamos juntos tinha certeza que ela era a mulher da minha vida, alguém com quem teria um bocado de filhos e envelheceria do lado. – respiro fundo. – Mas hoje isso não faz tanto sentido. Não pela separação, mas é como se o passado fosse um sonho, uma projeção da minha imaginação.
É libertador falar isso em voz alta, ter com quem compartilhar o que guardei por tantos anos.
- E atribui essa sensação à forma como se relacionam atualmente?
- Sim, mas algo dentro de mim também mudou em relação a ela. Passei a perceber que a presença de Aline tem atrapalhado minha vida, não a presença física, mas aqui. – bato o indicador na lateral da cabeça.
- Não consegue esquecê-la. – chega ao ponto exato do porque o procurei.
Meu âmago se revira sem parar, a enxurrada mista de sentimentos causando certo mal estar.
- Eu tentei, mas todo o esforço para superar essa história tem me esgotado.
- Superar Aline, você quer dizer.
- Sim.
- E quando fala que ela atrapalha sua vida, se refere ao fato de estabelecer um laço emocional com outra pessoa que não seja Aline?
Ouvindo da sua boca, minha justificativa soa como algo bobo.
- Sei que parte dessa culpa é minha, mas sim, é nesse sentido.
- E durante o período após o divórcio, tentou um relacionamento com alguém?
- Cheguei a sair, conversar com algumas mulheres, mas parecia que estava anestesiado, não conseguia ter empatia por nenhuma delas, os beijos não causavam efeito algum, o sexo era monótono.
- E isso acontece até hoje?
- Não, até porque desisti de relacionamentos convencionais.
- Como isso quer dizer namoro, casamento?
- Sim. – esclareço.
- Não acha que se fechando desse jeito será pior?
- Acho, mas com a idade que possuo e o fato de já ter um filho, isso acabou se tornando uma opção confortável. – admito. – Quando preciso de uma companhia, intimamente falando, chamo uma prostituta.
- Entendo. É uma alternativa mais simples e direta, você transa, paga e ela vai embora.
- Isso. Sem cobranças, ou ciúmes, ou apego. – completo. – Mas posso dizer que cheguei a desenvolver certa amizade com a que me atende.
Anota algo no bloco de papel.
- Além da facilidade, acha que essa decisão pode ter sido baseada em outro critério? – indaga.
Reflito um instante, mas nada vem à mente.
- Não sei. Como assim? – busco entender o sentido de sua frase.
- Medo, por exemplo.
- Do que poderia ter medo? – a confusão ainda paira sobre mim.
- De abandonar as memórias com sua ex-esposa; de "substituí-la" por outra pessoa; de ser infeliz emocionalmente; de se decepcionar da mesma forma ou até cometer o mesmo erro.
As palavras me acertam como um soco. Engulo em seco, começando a arrepiar, o coração acelerado. Desvio o olhar e retorno para ele.
- Talvez...
- Quero que olhe para dentro de si, para esses quatro anos após a separação e me responda: Você deixou que o medo e a insegurança lhe dominassem, ou é algo que estou inventando agora?
Sinto-me vulnerável, exposto. Nunca ouvi tantas verdades em uma só frase. A vergonha cobre meu semblante. Não acredito que me escondi atrás de sentimentos tão bobos e insignificantes por todo esse tempo.
- Você tem razão, fui um covarde. – digo, cabisbaixo.
- Isso não é covardia Marcos, é uma defesa natural da mente. – esclarece. – Você não mais queria se entristecer pelo término com Aline, e seu subconsciente lhe apresentou uma saída fácil, convencendo de que uma vida sem uma parceira fixa era algo mais satisfatório.
À medida que fala, as coisas tomam mais sentido em minha mente.
- Quero mudar isso, quero esquecê-la. – declaro, obstinado.
Arregala os olhos.
- Sendo sincero, não sugiro que siga dessa forma, Aline é parte importante da sua vida, a mãe do seu filho. Forçar as lembranças para fora será algo impossível.
- O que sugere então? Faço qualquer coisa para deixar esse medo no passado.
Fica pensativo.
- Durante uma das aulas na minha especialização em terapia de casais, um professor ensinou uma técnica, um ritual, como ele próprio chamou, para se desprender de "bagagens" emocionais, como um trauma, um acontecimento, ou uma pessoa.
Ouço com atenção.
- Esse procedimento consiste em seguir algumas etapas, as quais auxiliam a pessoa nesse processo de desprendimento emocional.
Fico entusiasmado com o que ouço.
- Faria isso comigo?
- Se quiser, não vejo porque não.
- Claro que quero. – falo, animado. – O que tenho que fazer?
Pensa um pouco.
- Preciso buscar mais sobre a técnica e adaptar ao seu caso. Posso te mandar uma mensagem com as primeiras etapas e você retorna semana que vem?
- Sim, sem problema.
O fim da sessão chega e saio do consultóriosuspirando aliviado, mais um passo foi dado para que supere Aline e todas asmágoas do passado.
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Obrigado por ler. Até o próximo. Beijos e abraços <3
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