6- Trechos
É apenas um monte de terra, não significa nada para ninguém, ou talvez signifique coisas demais para realmente significar alguma coisa.
Lá chove, venta e as vezes neva. Todos os verbos sem sujeito acontecem lá. Somente os sujeitos parecem sem importância.
Ela se impõe sobre tudo, se torna mais maldição que descanso. Não pode ser chamada de lar, mas muitos a chamam de inimiga.
Os gritos humanos que são ouvidos por lá ela mais fomenta do que abafa, ela não é mãe, é aliciadora.
Ela se alimenta dos corpos ensanguentados que são jogados em seu solo e se torna mais poderosa. Alguns ousam extrair de suas entranhas, mas ela cobra matando muitos outros.
Essa terra não pede emprestado, ela toma e quando dela tomam ela arrasta milhares em resposta.
Não posso dizer que ela se regozija com osso, pois não é verdade, porém não sente nenhuma dor em ver e causar sofrimento.
Nessa terra a única lei que impera é a dela e nós não conseguimos compreendê-la, porque é milenar e nós apenas décadas.
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Estava conversando esses dias sobre como é difícil explicar nossos sentimentos para os outros, seria como decifrar uma cor para um cego. Bem, achei que seria uma boa ideia para um texto. Vermelho, para mim essa cor é a mais sensual possível. Quando penso nela me vem muitas coisas. Vou tentar traduzir o meu vermelho.
O que é o vermelho? Para mim é a carícia da língua em um beijo, o coração acelerado pela emoção que chega repentinamente.
O vermelho é uma boca a roçar em seu pescoço e também é a mordida que se segue. É o contato da mão macia com a calejada.
O seu primeiro orgasmo foi vermelho, a dor de um parto é vermelha, a atração entre dois corpos, todo desejo é vermelho.
Vermelho não é racional, ele pulsa, gira e grita sua vontade sem deixar chances para a recusa. Vermelha é a fome das crianças pobres. O mundo e a vida são predominantemente vermelhos.
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Meu coração foi destruído, dilacerado. Fui de peito aberto e suas garras se enfiaram em mim quando eu esperava um abraço. O pior, para você, a errada era eu. Ferida no chão te perguntei o por que, não me disse, se recusou a dizer. Ganhei a pena sem saber meu crime. Continuo sangrando, uma hemorragia que não pode ser estancada sem auxílio, mas você age como se não houvesse ferimento algum e ainda pede que caminhe contigo. Eu tentei, juro que tentei, mas a fraqueza tomou conta e eu caí de novo ao chão, morrendo a teus pés, por tuas garras e acreditando em meu crime que não sei qual foi.
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Quando os olhos pesam nada mais parece importar. Não é a vontade de fechá-los que te move, mas a própria força gravitacional.
Tantos motivos fazem as pálpebras se fecharem por mais do que o tempo de uma piscadela. Sono, espirro, bocejo e choro.
Depois de muitas lágrimas derramadas uma dor pinça sua fronte e faz com que seus olhos se fechem. Na maior parte das vezes isso faz cessar o choro, nunca o real sofrimento que causou o pranto.
Nosso corpo não gosta de excessos e ele espeta seu crânio no intuito de que pare. Nos resta apenas sofrer na seca, prantear pelo espírito até que nossa matéria perceba que não paramos de sofrer e, com medo de um coração explodido, porque partido ele já está, permita novas lágrimas. Doce e triste concessão que nosso cérebro permite à nossa alma ferida.
Quando enfim tudo passa, sobra dentro de nós um espaço oco e olhos ainda mais pesados e cheios de areia. Creio que ela vem do deserto que se tornou nosso interior, era tanta areia que vaza por nossas órbitas.
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Chore, chore seu sangue, meu amor. Deixe seu coração transbordar. A dor é uma energia fluída que corre em fluxos diversos, deixe que ela flua em você.
Amor, amor meu, torne-se repetitiva em sua escrita, que suas lágrimas digam as mesmas palavras que escapam por seus olhos. Já que seus lábios não querem se abrir e sua voz resolveu calar.
Vejo seu universo no reflexo de cada gota perdida em seus cílios, quantas estrelas, meu amor. Perco a conta das constelações que existem em sua alma, tantos pontos brilhantes perdidos no azul profundo de seu espírito.
Tão azul, mergulhei ali na esperança de me afogar, mas teu ser é universo e não oceano. Esperando afundar, flutuei.
A, meu amor, chore. Abra espaço em você para mim, a cada gota que sai de ti, algo de mim entra em você.
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Por que dói? Esse mantra em minha mente, sobra confusão, sinto-me alienada, tudo some em meio à dor.
Que dor é essa? Meu corpo não sangra, meu coração bate, meus membros funcionam sem esforço, mas dói.
Será que ninguém vê? Ou na verdade sou eu que não enxergo a dor dos outros porque não os vejo sangrar? Seremos nós todos doloridos e cansados presos em corpos mentirosos?
Eu não te enxergo e você não me vê. Portanto, não sei se sente o que eu sinto. Se eu desnudar a mim mesma na sua frente, você fará o mesmo? Vai me acariciar? Vai me apedrejar? Ou correr para me cobrir envergonhado da minha nudez?
E se retribuísse? O que eu faria a tua alma desprotegida se sua imagem me desse asco?
Assim, não uno minha dor a tua, se é que ela existe. Como um caramujo, me encolho com medo, deixo minha concha brilhante e colorida falar por mim.
Meu sorriso, meus abraços, dou polimento à minha casca para que seja a mais bela possível e me recolho à minha dor. Por que dói?
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As vezes, tudo o que sobra dentro de nós é um imenso vazio. Não importa o que aconteça externamente, nada consegue nos preencher.
O nada deveria ser pacífico, mas a verdade é que ele dói. Esse vazio nasce pequeno, em algum espaço do nosso coração e enfia seus dentinhos ao seu redor. A cada pedaço de nós que ele come, maior se torna e mais dolorosas são as mordidas.
O vazio se alimenta de tudo e então passa fome, ele se contorce e morde as paredes de nosso espírito, mas não há mais nada para arrancar. Esse é o momento em que mais dói.
Esse ser indomável não se contenta em ser preso na jaula de um espírito oco. Então ele tenta arranhar tudo o que alcança através das barras.
Quando suas garras raspam o corpo fora da alma, cortes aparecem em nossa pele. São as feridas do vazio.
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Se apaixonar é como andar sobre rosas, as pétalas macias com a textura da pele mais fina, mas os espinhos estão ali.
Alguns olham muito para o chão, evitando a todo custo os caules dolorosos dessas lindas flores, mas infelizmente perdem todo o prazer das pétalas por estarem concentrados demais nessa possível dor.
Outros correm desesperadamente pelo roseiral, sentem tudo com toda a intensidade, a montanha russa de emoções. Porém, em algum momento seus pés estão tão feridos que caem e não conseguem se levantar mais.
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Quando se perde o controle de si mesmo é como se a mente se libertasse da alma. Acaba qualquer meio de contato com o mundo exterior, seu corpo ganha uma independência anormal.
Um desespero cresce em seu ser e te torna quase irracional, mas isso não faz com que sua máquina volte a funcionar normalmente.
Barulhos estranhos chegam até você, milhares de vozes que não formam palavras. Os raios de luz atingem suas retinas, porém nada é enxergado. Braços e pernas não aceitam os comandos mais persistentes.
Você sente que será o fim, ficará para sempre nessa prisão que já foi seu único canal com o mundo físico, sua alma finalmente para de lutar.
Durante algum tempo tudo permanece parado. Repentinamente isso acaba, a normalidade chega e o controle novamente é seu.
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