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Capítulo 2



Acordei com a típica sensação de lentidão após o gás. Meus braços estavam pesados e pareciam mais compridos, a pálpebra tremia e os lábios estavam secos, não importando o quanto tentava umedecê-los. Mas nada disso me impediu de perceber que tudo havia mudado nesse intervalo. 

Não mesmo.

Eu podia estar chocado com aquela estranha camada sobre a minha pele, que eu constatei rapidamente que era o que a tela chamava de vestimenta, indumentária, ou ainda, roupa; poderia estar chocado com os sapatos que apertavam meus pés de uma maneira bastante incomum. O que me chamava a atenção, no entanto, era que, apesar de eu estar em um lugar de dois metros e meio quadrados, certamente não era o mesmo que eu estava antes do gás.

Ah não, tinha uma diferença fundamental aqui. Tinha uma porta.

Uma porta.

Ri em uma mistura de loucura, deleite e assombro. Tapei minha boca com duas mãos, sentindo a pulsação aumentar e o corpo aquecer. Levantei com as pernas ainda enfraquecidas e rodeei uma única vez no lugar como se um eixo me prendesse. Um giro completo foi tudo que levou para que a tela, do lado oposto onde deveria estar, ligasse.

"Olá, Ninguém. Bem-vindo ao primeiro dia do estágio final. Além desta porta, dentro de um terreno de tamanho indeterminado, há um número indefinido de homo sapiens. Seu objetivo é ser o único sobrevivente. Como prêmio por sua graduação, você receberá um nome e um lugar em nossa Meritocracia. Não há regras, além da sobrevivência. Seja competente."

A tela desligou.

Ptshhhh. Ouvi atrás de mim.

A porta se abriu. O som mudou imediatamente e havia uma profusão de cores pelo espaço aberto. Hesitante, caminhei, cruzando o portal.

Uma vastidão me aguardava. Pisquei os olhos vezes sem conta (ou dezessete vezes), a náusea me acometeu junto com a tontura e caí sentado no chão; em um chão que não era de concreto polido, mas de um material escuro e poroso. Seria aquilo terra? Provavelmente terra. Peguei um punhado e cheirei. Um tanto daquele pó entrou no meu nariz e tossi, ainda que maravilhado por sentir aquele cheiro que não se comparava a nada em meus sete mil, seiscentos e setenta dias de Ninguém.

Senti que ia desmaiar de novo e fechei os olhos. Segurei a respiração. Arrastei-me de costas, desesperado, tateando o terreno atrás de mim. Precisava voltar. Queria um cubo perfeito. Paredes, paredes são seguras. Meu coração estava acelerado. Cento e sessenta batimentos por minuto, contei. "Eu vou morrer, se continuar assim, vou morrer."

Não achava a porta. Virei, respirando com dificuldade.

Morrer era assim?

Cadê a porta?

— Cadê a porta? — Sussurrei por entredentes.

Minhas entranhas pareciam congeladas, as mãos suavam. Seria isso o medo? Eu estava louco?

— Isso é real?

"Atenção, este casulo será implodido em dez segundos. Dez, nove..."

Levantei atabalhoado, a mensagem foi o suficiente para me tirar do estupor. Tentei correr, já tinha corrido antes, é claro. O casulo me obrigava a fazer exercícios a cada dois dias – em uma simulação. A simulação, contudo, não tinha me preparado para pedras, terra, grama ou sapatos.

Não sabia o que esperar. Uma grande explosão, talvez, como as simulações de guerra. Certamente não havia imaginado um amontoado de pedras se desprendendo e caindo, como se tivessem sido feitas para aquilo.

Repassei a mensagem inicial da tela em minha cabeça. Não tinha muitas informações, afinal. Estava no quinto estágio, precisava sobreviver. Eram instruções bem básicas.

Olhei para cima, o céu aparecia por entre as copas das árvores. Era azul, reflexo da luz nas moléculas de gases, água e poeira. Era lindo.

Precisava sobreviver. Decidi andar. Ficar parado olhando o céu não garantia minha sobrevivência – o que garantia, no entanto, eu ainda não sabia dizer.

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