2. As rosas de Isadora
Hoje é sexta feira, dia 19 junho de 2020, já se foram 90 dias que você se foi. Um motorista irresponsável, entrou pela contramão causando um acidente que levou de mim o grande amor da minha vida, Isadora! Fomos casados por cinco felizes anos e dessa união nasceram dois filhos, Ana Vitória de 4 anos e Roberto de 9 meses.
Esse será o primeiro inverno sem ela, tem sido muito difícil pois em cada cômodo existe uma lembrança dela, fotos espalhadas pela casa toda, a organização dos móveis, as cores das paredes e isso sem contar a reforma do jardim, onde foi plantado um canteiro de rosas brancas, suas flores preferidas.
Nesse período a minha vida virou de cabeça para baixo, eu que nunca fui muito social, me fechei ainda mais para o mundo. A minha vida se resume apenas no trabalho e no cuidados com os meus filhos. Parece que ainda ouço a voz dela cheia de orgulho dizendo "os nossos filhos" e isso me dói muito!
Foi no álcool que encontrei a maneira de me anestesiar de todo esse sofrimento. Eu bebo todas as noites até perder a minha razão e cair no sono.
Ela se foi sem ter a oportunidade de se despedir, isso aumenta ainda mais a minha saudade, ela ainda era jovem e linda! Eu realmente não acho isso justo! Porque a vida me deu um amor tão grande e tão lindo para me tirar tão rápido assim? E os nossos filhos? No fundo o que eu mais queria é um momento em sua companhia, mesmo que por um breve instante, uma única oportunidade que fosse, apenas para olhar em seus olhos pela última vez!
Me sirvo de um uísque puro e me sento na poltrona que era a preferida de Isadora, bebo tudo em apenas um gole, a bebida desce queimando a garganta quando chega ao estômago sinto o meu corpo se anestesiar. A casa está em silêncio, as crianças estão dormindo, apenas a luz da sala permanece acessa, me sirvo de mais dose, mas dessa vez encho o copo, apenas para não ter o trabalho de me levantar tão rápido, de repente o meu olha se prende em uma caixa que está na mesinha de centro da sala!
Caminho meio cambaleante porque o álcool já começa a fazer efeito, abro a caixa e encontro o anel de noivado de Isadora; foi então que me recordei que ela sempre o guardava lá, pois sendo enfermeira-chefe em um hospital, não podia usar joias durante o trabalho. Foi impossível controlar o choro; parece que foi ontem, em um jantar em família, mesmo sabendo do sim, eu me sentia tão nervoso e ao mesmo tempo tão feliz! Desisto do copo e já pego a garrafa e começo a esvaziá-la em grandes goles! A medida que o álcool começa a agir em meu cérebro tudo vai ficando cada vez mais escuro.
Acordo com um toque suave na minha perna, a princípio penso que é a Beatriz, a babá das crianças, que mais uma vez adormeci bêbado naquela mesma poltrona, mas não era! Antes mesmo de abrir os olhos eu já reconheci aquele perfume. Me levanto assustado da poltrona esfregando os olhos, assim que eles recuperam a nitidez, vejo Isadora mas não consigo acreditar na informação que me é transmitida! Na verdade o susto foi tão grande que levou todo o efeito do álcool embora!
Ainda meio confuso, comecei a falar:
- Isadora? É você? Isso não é possível! - foi o que consegui falar, ainda incrédulo.
- Sim, Daniel! Sou eu! Ou você já se esqueceu de mim? - Respondeu esboçando um sorriso.
- Você sabe que eu nunca vou te esquecer... Passe o tempo que passar, eu te amo! E vou te amar pra sempre! - respondo com lágrimas nos olhos.
- Meu amor, eu também, te amo! E nada nesse mundo, vai mudar isso! - os seus olhos brilharam após dizer essa frase.
- Então, porque que você foi embora? - pergunto sem conseguir conter o choro.
Nesse momento ela abaixou a cabeça, como quem pensa no que vai me responder, e fica em silêncio por alguns segundos, me ponho a observá-la, os seus cabelos negros ondulados chegava a altura dos ombros, fazia contraste com a sua pele clara, o seu corpo magro e bem desenhado ficava ainda mais lindo com aquele vestido branco, longo e esvoaçante que quase cobria os seus pés descalços.
Novamente o seu olhar se encontra com o meu, os seus olhos estavam ainda mais brilhantes, em um castanho cor de mel tão lindo como uma tarde de outono.
- Talvez seja complicado para você compreender agora, mas foi necessário, acredite! Também foi muito difícil pra mim. Mas era o meu momento de ir. Naquele dia a única coisa que eu mais queria era voltar pra casa e dormir do seu lado. Mas era a minha hora, eu precisava partir! - o seu tom de voz era muito melancólico.
- Não, isso não é justo! Você passou a sua vida trabalhando para ajudar a salvar vidas. Por que a sua própria vida não foi salva? - insisto revoltado.
- Mas eu fui salva! Eu fui salva pelo teu amor. Foi esse sentimento tão lindo e puro que você me dedicou que conseguiu curar todas as feridas que haviam dentro da minha alma, você me aceitou do jeito que eu era, lutou para que todos os meus sonhos se tornassem reais - e sorrindo se aproximou acariciando o meu rosto banhado em lágrimas. Foi nessa hora que eu percebi que ela usava o anel de noivado. Eu não entendi porque ele sempre esteve no mesmo lugar desde que ela se foi, então resolvi perguntar:
- Você está usando o anel? Como isso é possível? - indaguei curioso.
- Eu nunca vou me esquecer desse dia, aquele momento ia marcar pra sempre a minha vida. O que eu não sabia, era que minha alma também foi marcada! Por isso, vou levar esse anel por toda a eternidade, representando pra mim o eterno e verdadeiro amor! - respondeu olhando admira a sua mão.
Nessa hora fiquei em silêncio, pensativo, não havia o que falar, afinal ela apenas confirmou o que meu coração já havia me dito desde o primeiro dia em que a vi! Apesar da saudade que ainda machucava meu peito, tive uma sensação de paz e leveza que não saberia descrever naquele momento.
- Posso ver os nossos filhos? - ela me pergunta sorrindo.
- Claro, "Os nosso filhos"! - repeti, a conduzindo pela mão até o quarto das crianças.
Ela entrou no quarto devagar, se aproximou da cama de Vitória e acariciando os seus cabelos sorrindo, disse:
- Ela herdou os seus olhos e a cor dos seus cabelos. Ela será uma linda mulher! - sorriu enquanto uma lágrima corria de seus olhos.
- Mas ela tem a sua bondade e cuida muito bem do Roberto! - respondi tentando não chorar.
Aproximando do berço, Isadora acaricia o rosto de Roberto e diz bem baixinho:
- Meu pequeno milagre, você herdou o meu gênio forte e agitado! Cuida bem do Papai quando crescer! - pediu ainda com o rosto molhando de lágrimas saindo do quarto.
Caminhamos em silêncio de volta para a sala, novamente me olhando com uma expressão séria, Isadora me pede:
- Cuida deles pra mim? Eles são os milagres que a vida me deu. Por favor não desista! Por mim e por nossos filhos! - havia um tom de súplica em sua voz.
- Eu não sei se consigo, depois que você se foi, tudo ficou mais difícil. Você me prometeu que iriamos envelhecer juntos. Mas você se foi cedo demais, me deixou aqui. Eu não sei viver sem você! - respondo em prantos.
- Daniel, meu amor! Eu preciso que você me entenda. Preciso ir, você tem que me prometer que vai continuar sendo esse homem por quem me apaixonei. Eu preciso disso pra poder prosseguir, tenha fé e um pouco de paciência, essa promessa irá se cumprir! - pediu com muita doçura na voz.
Indo em direção a janela me chamou.
- Olha, esse é o nosso jardim! Observa bem, você fez um canteiro de rosas brancas, porque sabia que são as rosas que eu mais amo. Elas serão testemunhas de que ainda vamos envelhecer juntos e que estarei ao seu lado até o último suspiro! - me pediu de forma tão meiga, olhando em meus olhos, segurando meu rosto.
- Como? Isso não é mais possível... - minha voz quase não saiu por causa do meu pranto.
- Apenas confie em mim, me prometa que não vai desistir! - insistiu Isadora mais uma vez.
- Tá bom, eu prometo! - concordei meio sem entender.
- É bom ouvir isso! Porque você cumpre as suas promessas. - disse com um sorriso lindo. - Agora eu preciso ir...
- Você não pode ficar? - pergunto angustiado.
- Eu preciso ir, mas não vou totalmente, estaremos sempre juntos porque o vínculo que nos une é perfeito. Eu te amo e vou te amar pra sempre! - me disse sorrindo.
- Eu também te amo muito! - gritei antes que a sua imagem desaparecesse completamente.
Acordo com um toque suave em minha perna, mais uma vez adormeci bêbado naquela mesma poltrona, ainda meio sonolento ouço a voz de Beatriz em um tom alterado pela empolgação:
- Daniel, acorda! E venha ver - me diz empolgada.
- O que houve Beatriz? Isso lá é jeito de me acordar? - pergunto assustado ainda sentindo o perfume de Isadora na sala.
- Daniel, você não vai acreditar! Em pleno inverno as roseiras floresceram! - Beatriz me puxa pela mão até a janela da sala me mostrando o jardim repleto de rosas brancas. -
Por Rogério roggeriosilva
Avaliado por VanessaSakata
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