Capítulo 30
(Amanda)
— Esse dia foi realmente incrível! Têm coisas que nunca voltam, não é? — Falo depois de muito ter gargalhado ao lado de Sarah e Safira.
Agora que ela pode forçar mais a mente sem ter medo de novas dores, está muito mais fácil para lembrar dos velhos tempos. Dessa vez, podemos contar a ela o passado sem nos preocupar com sua saúde, muito pelo contrário, ela disse que quanto mais redescobre seu passado, melhor se sente, porque vê que está sendo mais completa e entendendo a explicação para algumas coisas.
— Depois te mostro as fotos no meu celular, vou entrar um pouco agora. — Digo, ainda com um sorriso nos lábios e já me levantando da cadeira.
Alguns minutos atrás Leo veio chamar minha irmã para conversar, e confesso que estou bem ansiosa para saber no que isso vai dar. Ela já nos contou que rolou um clima entre eles e que estava só esperando que ele tomasse alguma atitude.
E lógico que, quando penso em tomadas de atitude, penso no Ícaro. Ao certo, não sei o que vai acontecer entre nós, quando vai acontecer ou até mesmo se vai acontecer. Assim como Sama e Leo, nós dois também não estamos nos falando muito — parece que o único casal bem resolvido agora é Ítalo e Safira mesmo —, mas eu não sinto mais tanta tensão entre nós.
Pelo menos não da minha parte, não depois do que disse a ele no encontro de jovens na praia. Eu fui sincera, eu disse a verdade, então apenas sinto que não está mais em minhas mãos, acho que está com ele, e agora é esperar pra saber se está pronto ou não para seguir em frente com algo.
Ao mesmo tempo em que passamos tanto tempo distante antes e depois de contar a verdade um para o outro e do fato de que isso foi muito doloroso, eu percebo que também nos fez amadurecer. É como se eu percebesse agora a minha forma de amar o Ícaro, e é como tia Sam sempre diz: um amor de verdade sabe esperar o tempo certo com paciência e, mais que isso, sabe entender que enquanto esse tempo não chega precisamos crescer. Seja espiritualmente, psicologicamente, financeiramente ou emocionalmente. Nos tornar pessoas melhores que têm coisas melhores para oferecer. É isso que vai fazer um relacionamento durar: maturidade, compromisso, responsabilidade...
Apesar de que não sou tão velha, os conselhos da minha tia enquanto tia e líder me fizeram ter uma perspectiva maior da vida, e eu venho constantemente aprendendo sobre espera, intimidade com Deus e estabilidade emocional. Sei que têm coisas que precisamos ter, ser e fazer antes de decidir dividir nossa vida com outro alguém.
Portanto, enquanto o tempo de firmar um namoro não chega, eu quero continuar cultivando meu amor por Deus, acima de tudo, depois por mim, minha família e meus amigos, sem esquecer o lugar especial que Ícaro ocupa em meu coração há muito tempo.
— Olá. — Cumprimento o dito cujo assim que chego à sala. Ele está sentado no sofá com o celular nas mãos e as pernas jogadas em cima da mesa de centro, provavelmente respondendo às milhares de felicitações que deve estar recebendo.
— Oi. — Ele ergue o rosto, bloqueia o celular, abre um sorriso e dá duas batidinhas no assento vazio ao seu lado, mas acabo sentando em outro, um pouco mais longe. — Cansou do quarteto fantástico? — Ironiza, se referindo a mim, minha irmã e nossas primas, já que recentemente estamos fazendo praticamente tudo juntas, como antes.
Sorrio. — Hoje não é o aniversário de nenhuma delas!
Ícaro ergue as sobrancelhas e sorri sem mostrar os dentes. — Me sinto lisonjeado então! Pelo menos no meu aniversário posso passar um tempo com você!
Balanço a cabeça e ergo uma sobrancelha. — Uma pena que não depende só de mim. — Falo, fazendo-o bufar e inclinar o pescoço para trás.
— Como é que você sempre consegue ficar com a palavra final, ein? É algum tipo de superpoder? — Pergunta.
— Não, é automático. Só consegue quem é muito bom!
— Ah, claro! Compreendo! — Se rende.
— Tenho um presente pra você, na verdade. — Falo depois de um tempo.
— Verdade? — Pergunta, ficando sério.
— Sim, é a comemoração do seu aniversário, ué! — Rio.
Ícaro solta um sorriso que mais parece um suspiro e assente com a cabeça.
— Eu sei, é que... — Balança a cabeça e depois fixa os olhos nos meus. — Também tenho um presente pra você.
Ergo uma sobrancelha e abro um sorrio de canto dos lábios.
— E meu aniversário é só em outubro! — Brinco.
Ele balança a cabeça. — É por isso que só vou te dar daqui a dois meses!
Abro a boca e faço uma expressão de surpresa. — O quê?! Está brincando comigo! — Gargalho.
Ele sorri. — Brincadeira! Depois te mostro. Mas agora é sua vez!
Afirmo com a cabeça. — Ok. — Levanto do sofá. — Só um momento!
Caminho a passos rápidos até o balcão da cozinha, onde está a bolsa da minha mãe, e pego a chave do carro. Vou até o portão da rua, abro-o e ando até o carro, abrindo a porta traseira e pegando o embrulho de presente fino e pequeno. Depois, volto para a sala.
— Pode me agradecer agora! — Digo, assim que entrego o presente em suas mãos. Ele abre a embalagem e, assim que vê, arregala os olhos e a boca e volta a olhar para mim.
— Ai, meu Deus! Amanda, o que é isso?! — Exclama pausadamente e me mantenho calma, esbanjando meu sorriso orgulhoso.
— A última edição do seu jogo de futebol favorito! — Reforço em palavras o que seus olhos acabaram de contemplar. Ícaro estava louco pra conseguir esse jogo há semanas, desde que foi lançado, mas nunca havia chegado a nenhuma das lojas que ele costuma comprar. Porém, na última vez que fui ao shopping, avistei o "ouro" e decidi fazer uma pequena surpresa a ele.
— E-eu sei, m-mas... Meu Deus! Eu não acredito! Meu Deus, Amanda! — Ele exclama enquanto analisa cada um dos detalhes da capa, do CD, das instruções, fotos e palavras.
— Já sabia que iria ter essa reação. — Digo com um sorriso.
— Meu Deus, meu Deus, meu Deus, meu Deus! — Franze as sobrancelhas e olha pra mim, me atacando em um abraço apertado. — Valeu, valeu, valeu, valeu! Você é incrível! — E depois me solta, voltando toda a atenção para o jogo novamente.
Divirto-me com suas reações enquanto ele corre para a televisão e o videogame e me esquece completamente. Só balanço a cabeça e me afasto, deixando-o só com sua euforia e voltando para o quintal.
⁂
— Hoje é dia de festa pra alegrar nossas almas! O Ícaro faz anos, uma salva de palmas! Ehhh! — Concluímos a famosa canção de aniversário e mais um show de aplausos e gritos se inicia. Ícaro está assoprando as velas com o número 17, mas se bem conheço nossos amigos, ainda está faltando uma coisa!
Fecho os olhos e espero.
— Com quem será, com quem será, com quem será que o Ítalo vai casar? — Começam em uníssono, em meio a gargalhadas e esparros.
Eu já sabia mesmo.
— Vai depender, vai depender, vai depender...
Sorrio.
— Amanda, Amanda! — Ouço alguém gritar.
— Se a Amanda vai querer! Uhuuu! — Concluem e sinto várias pessoas tocarem em meus ombros, mas apenas levo na brincadeira.
— Vai Ícaro, agora é o discurso! — Pedro grita.
— Isso, discurso! — Felipe.
— Discurso! Discurso! Discurso! — O coro entra em cena novamente, acompanhado pelas palmas.
Olho para o relógio: são 20:46. A Noa havia convidado minha família e a da Sarah para virmos almoçar aqui na casa deles; depois do almoço, voltamos para casa; mas ela também marcou um bolo depois do culto com os outros jovens lá da igreja. E cá estamos nós, amontoados no gramado da varanda da frente, ao redor de uma mesa de plástico com um bolo preto e branco no centro e alguns docinhos ao redor.
— Ok, ok... Vou fazer. — Sorri. — Quero agradecer primeiramente a Deus, lógico! Por ter me dado mais esse ano de vida, pela saúde, pela minha família, amigos e... — Respira fundo. — Pela vida da Safira também, que passou a primeira metade do ano apertada e preocupando a todos nós, mas está bem aqui, junto conosco, comemorando! É o meu aniversário, mas eu agradeço muito ao nosso Pai pela vida dela, especialmente! Por tudo o que passou e, mesmo assim, com a ajuda e a permissão dEle, venceu! Aliás, quero pedir que deem uma salva de palmas mais uma vez pra ela, nossa guerreira e... — Frisa, com um sorriso nos lábios. — Minha cunhadinha agora! — Gargalha.
Todos nós rimos e aplaudimos.
Eu admiro muito a sensibilidade do Ícaro e o seu carinho por todos nós. Admiro muitas coisas, na verdade. Mas não vem ao caso agora.
— Depois... — Ele continua assim que acabam as palmas. — Quero agradecer aos meus pais, Hugo e Noa, que estão sempre ao meu lado quando preciso; aos meus irmãos, Ítalo e Leo, grandes parceiros de jogos e da vida também! — Sorri. — Igualmente aos nossos líderes, Cauã e Sam, que, vale ressaltar, agora também fazem parte da minha família. — Ri mais uma vez. — A todos vocês também, galera, meus amigos, meus irmãos, meus companheiros... Obrigado por tudo, amo todos vocês! — Conclui, e novamente os aplausos e gritos retornam, inclusive os meus.
— Mas... — Ícaro grita, levantando as mãos para cima e chamando a atenção de todos. — Tem mais uma pessoa que eu gostaria de agradecer. — Sorri.
Ícaro foca o olhar em Ítalo, que está abraçando Safira pelas costas, e faz um sinal para ele com a cabeça, fazendo-o se afastar e entrar cuidadosamente dentro de casa. Não entendi o que isso quis dizer, mas volto a me atentar para seu discurso.
— Essa pessoa de quem vou falar agora... Bem, não tem um motivo exato para que eu a agradeça, eu quero agradecer mesmo por... Por ela existir. — Fala e, de repente, percebo que seus olhos estão focados nos meus.
Ícaro pigarreia e dá uns passos até chegar à frente da mesa.
— Amanda, por favor! — Ele fala, me lançando uma piscadela rápida e estendendo a mão para que eu me aproxime.
Meu coração então começa a acelerar loucamente, me deixando em um misto de ansiedade e nervosismo que não consigo controlar, mas, mesmo assim, me aproximo, já conseguindo ouvir alguns gemidos provocantes e murmúrios. Eu sei o que todos estão pensando. Só não sei se eles têm razão.
— Então, Amanda... — Ícaro fica completamente de frente pra mim, fazendo toda a "plateia" ficar em completo silêncio.
Engulo em seco.
— Algumas semanas atrás, estávamos conversando e... Você disse algo que me marcou, uma frase que ficou gravada na minha memória até hoje e acredito que pra sempre também. — A essa altura não consigo mais olhar para ninguém ao meu redor. Meu Deus, o que está acontecendo?! — Você disse que tinha se afogado em mim. — Sorri, e nesse momento parece que tudo fica em câmera lenta. — Mas isso é impossível, porque só nos afogamos quando as águas são mais profundas que nossa capacidade de sobreviver. — Fala.
Começo a refletir na última frase que diz, mas de repente ouço uma melodia no ar. Franzo as sobrancelhas e olho para a porta da frente: Ítalo ligou o som e agora está voltando para cá.
Meus olhos se enchem de lágrimas automaticamente somente ao pensar na possibilidade de acontecer agora exatamente o que estou pensando. Porque eu conheço a música que está ecoando, aliás, seria impossível esquecê-la: We Dance, de Bethel Music. Foi a música que apresentamos uma coreografia de balé no aniversário de 15 anos da Sarah, coincidentemente onde Ícaro foi o meu parceiro de dança e, algumas horas depois, meu primeiro beijo.
— Eu sei que algum tempo atrás pisei na bola com você e te fiz sofrer, e já te falei que me arrependo muito por isso. — Começa. — Mas eu quero te dizer mais uma vez que você é muito importante pra mim, uma garota incrível e que me encanta, que eu te amo e quero fazer tudo diferente!
Uma lágrima cai dos meus olhos.
— No começo do ano eu te pedi para me dar mais uma chance, pois eu faria tudo diferente... E estou fazendo. — Ele vira para trás, onde está Ítalo, e estende a mão para ele. Quando vira, vejo que está segurando uma pequena caixa de madeira, personalizada com papel de flores rosas. — Pode abrir pra mim, por favor? — Pede, me entregando a caixa.
Entendo minha mão trêmula e seguro a caixa enquanto procuro minha estabilidade. Destampo-a e, imediatamente, levo a mão direita à boca quando vejo o que tem dentro dela.
Calma. Respira.
Passo longos segundos encarando enquanto meu coração está louco para sair do peito.
Não sei distinguir exatamente se estou mais assustada ou impressionada. Como ele conseguiu isso?!
Já estou chorando e levanto os olhos para Ícaro, que está ansioso à minha frente. Ainda com a mão sobre a boca, volto a olhar para o que tem dentro da caixa: uma foto. Mas não é uma simples foto. Sou eu.
Eu e Ícaro. Molhados. Na piscina.
No meio de um beijo.
Abaixo a mão para segurá-la e viro-a de lado.
"Quando demos esse beijo, mais de um ano atrás, tudo era incerto e confuso entre nós. Não tínhamos noções e nem perspectivas do que poderia acontecer em seguida. A questão é que ele nos separou muito e por muito tempo. Mas hoje eu quero que você lembre dele como uma possibilidade para um recomeço, como uma planta de um projeto que pode ser construído e se tornar real. E eu quero que se torne real. Mas não depende só de mim."
Ainda estou pasma e boquiaberta diante do que está acontecendo. O aniversário é dele e a surpresa é minha?! Como isso é possível?!
Antes de decidir levantar meus olhos e encarar a realidade, olho para a caixa mais uma vez, e só então percebo que a foto não era a única coisa dentro dela.
Há um envelope vermelho de tamanho médio. Troco-o de lugar com a foto e abro-o: dentro dele há um papel cartão dobrado. O abro. E em letras garrafais encontro nada mais, nada menos do que o que minha intuição já dedurava que eu iria encontrar.
"QUER NAMORAR COMIGO?"
E bem abaixo, colado com uma fita transparente, um anel dourado fino, simples e com uma joia solitária em cima, brilhando tanto quanto meus olhos agora.
Levanto a cabeça e olho para Ícaro. Ele está com as duas mãos juntas à frente do rosto. Não sei se é sua intenção, mas eu sinto que está me implorando para aceitar.
Apesar do susto, eu abro um sorriso. Um sorriso que não sei bem se é de nervosismo ou felicidade, mas um sorriso. Sincero e genuíno.
Ícaro pediu uma chance sete meses atrás. Eu não disse que a daria, mas também não precisava dizer já que meus sentimentos estavam bem claros. Eu estava magoada, apenas isso. Não significava que meu amor por ele havia morrido.
Os meses seguintes serviram para que eu superasse, me curasse. E só então comecei a ver um Ícaro diferente. Um Ícaro que se importava com meus sentimentos e com meu bem-estar, e que estava sempre por perto, pronto para me ajudar sempre que eu precisasse, por mais que quase sempre eu recusasse.
Durante esses sete meses, foquei em meu relacionamento com Deus antes de tudo. Confiei, entreguei em Suas mãos, descansei e deixei que Ele cuidasse. E Ele cuidou. Eu não poderia deixar de agradecer por isso. Aliás, sei exatamente a forma de Lhe agradecer.
Ponho a caixa sobre a mesa atrás de mim, abrindo um espaço entre os docinhos, e desgrudo o anel dos pedaços cortados de fita. Ponho-o no meu dedo, abro um sorriso e abraço Ícaro com muita força, em uma intensidade que nunca abracei ninguém. Porque é ele. É ele quem escolhi, e ele mostrou que é suficientemente capaz de me fazer feliz.
— Obrigado por essa chance, prometo que não vou te decepcionar e, se decepcionar, vou pedir perdão e fazer tudo diferente, garanto! — Fala em tom baixo ao meu ouvido. Fecho os olhos e o aperto ainda mais. — Eu amo você.
— Eu amo você. — Repito, então me afasto e, por fim, nos beijamos. E dessa vez, diferentemente da primeira, é um beijo cheio de significados, emoções, sentimentos, história, planejamentos e futuro, que nos faz sentir que daqui em diante as coisas serão diferentes, melhores e verdadeiras. E isso torna tudo ainda mais incrível.
Ouço todos ao nosso redor gritarem e baterem palmas, e acabamos sorrindo juntos.
Ícaro se afasta devagar, sem tirar os olhos dos meus.
— Aquele jogo que você me deu hoje é incrível, mas sem dúvidas esse foi o melhor presente que eu poderia ter ganhado. Um presente pra vida toda! — Conclui e eu apenas aceno com a cabeça. Porque ele está certo. Nunca esteve tão certo na vida.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro