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19 Confidências

Mal coloco os pés para fora do carro e sou atacada, Lobo vem em cima de mim enlouquecido, sei que quer brincar, porém me sinto encurralada com toda a sua perseguição e latidos.

Correndo entre minhas pernas ao dar um pulo mais agressivo o cachorro acaba me desequilíbrando, sinto dor ao ir de encontro com o chão da garagem, entretanto antes que consiga me levantar Lobo lambuza meu rosto com indesejados beijos caninos.

A gargalhada de Felipe ecoa junto aos gritos de Cristina repreendendo o filhote agitado, a mulher faz um enorme esforço para tirá-lo de cima de mim e prende na coleira a fera de pelo caramelo.

- Para de rir! - reclamo com meu amigo segurando risada também.

Depois de lavar o rosto, vou para mesa, o cheiro delicioso da comida faz minha barriga roncar, apesar de faminta fico tímida ao me servir evitando encher o prato.

Cristina durante todo o almoço conversa animada contando sobre sua manhã no trabalho e rindo de alguns clientes.

Fico encantada com o jeito espontâneo e comunicativo que tem, a sua leveza preenche o ambiente, porém não se estende ao senhor Vicente.

Falando vez ou outra o avô do meu amigo mexe a comida no prato com desânimo, está distante perdido em seus próprios pensamentos, ao me notar o homem contrai os lábios num frágil sorriso, retribuo o gesto.

- Vou levar a marmita do Pedro, senão daqui a pouco chego lá e ele está desmaiado de fome, fica de olho no seu vô e não esquece de passear com o Lobo - em despedida Cristina beija a bochecha de Felipe dando as recomendações.

- Está bom mãe - o garoto concorda impaciente.

- Marcela pode ficar o tempo que quiser, já conversei com a Luísa e não vai ter problemas. Sinta-se em casa. - Para minha surpresa também ganho um beijo estalado no rosto.

Assim que sua mãe sai Felipe me lança um olhar travesso, com um sorriso brincando nos lábios vai para a cozinha com cara de quem está prestes a aprontar.

- O que vai fazer? - curiosa sigo-o.

- Comida de verdade, chega dessas verduras não sou coelho.

- Mas a gente acabou de almoçar...

- Você não entende a tortura que eu vivo, sabe o que é pedir um doce e sua mãe fazer salada de fruta, sequer põe leite condensado, usa groselha. Groselha! - Felipe deixa claro sua indignação, sem notar o quanto é engraçado o seu drama.

- Sabe cozinhar? - encostada na bancada observo-o.

- Que isso Má, aqui é Master Chefe, mas se minha mãe reclamar diz que a ideia foi sua. - pede abrindo o armário em busca dos ingredientes.

- É sério Felipe? - questiono incrédula.

- Fica tranquila, você é visita ela não vai te xingar caso dê algo errado.

- O que pode dar errado em fazer um pudim? - fico preocupada

- Nada, é super fácil. - dá de ombros confiante - Enquanto faço a calda, põe aí 4 ovos, uma xícara de leite, e uma caixinha de leite condenado.

No fogão Felipe mexe a panela fazendo o caramelo, não consigo evitar de sorrir vendo-o usar o avental preto cheio de bolinhas brancas, está uma gracinha. Pelo jeito Cristina tem fascinação por galinha da Angola, o filtro tem uma capa com essa estampa, os panos de prato, a cortina e até o butijão de gás tem uma sainha com o desenho da ave.

- Acho que está quebrado - noto a dificuldade das pás em bater a massa.

- Usa uma colher para ajudar a mexer - explica casualmente.

Destampo o liquidificador usando a colher de pau, a ideia não dá muito certo, voa massa para todo o lugar, sob os gritos de susto do Felipe desligo o aparelho.

- Minha roupa - choramingando reclamo da sujeira, olho ao redor e o desespero toma conta de mim - Sua mãe vai enlouquecer se vê o estado dessa cozinha.

-Respira, a gente vai limpar. - me tranquiliza.

Mexendo em baixo da pia pega os produtos de limpeza, em seguida passamos longos minutos nos dedicando a deixar o cômodo brilhando, por fim satisfeita observo meu amigo lavar a flanela, o aroma de lavanda impregna o ambiente, nós conseguimos deixar a cozinha outra vez habitável.

- Você precisa de um banho - Felipe rindo joga água em mim.

- Seu idiota - empurro-o de leve.

- Só estou te ajudando - descarado me molha outra vez.

Lanço um olhar bravo em sua direção, porém Felipe também me encara em desafio, tirando toda minha pose de chateada.

- Bobo - como posso permanecer séria com o garoto fazendo caretas.

- Venci, você riu primeiro. Agora sem brincadeira vai tomar banho, pode por uma camiseta minha.

Até penso em protestar ofendida, contudo estou realmente toda suja e melada, um pouco constrangida sigo Felipe que me arruma uma toalha. Após a chuveirada paro no espelho do corredor me analisando, gosto da camiseta larga e comprida como um vestido em mim, é estampada por um garoto usando chapéu de palha, ele tem um enorme sorriso num cartaz de procurado, o desenho deve ser de algum anime que curte.

- O que foi? - constrangida questiono o olhar demorado de Felipe em mim.

- Nada, só... Sei lá achei que a camiseta ficou legal em você - responde sem jeito e então me ameaça em tom de brincadeira - É minha preferida, se estragar vai se arrepender.

Dou de ombros notando a panela em seu colo, sem cerimônia pego uma colher e sento do seu lado no sofá querendo um pouco.

- Pelo menos a calda deu certo - me delicio com o doce, enquanto vemos As Branquelas.

- Minha vó Cora fazia direto bala, pirulito de caramelo, adorava cozinhar e me mimava preparando gostosuras. Tenho certeza que ia amar o doce de leite que preparava no no fogão de lenha, era divino. - Felipe com ternura conta, a falta que sente da avó transborda.

- Vocês eram bem unidos, né ?

- Mais que isso, fui criado pelos meus avós, amo meus pais e entendo que têm que trabalhar, contudo é vazio e triste sem vovó Cora comigo. - Felipe com pesar me confidencia, não é um assunto fácil para ele - O meu Vô é quem mais sofre, detestou quando a gente se mudou para vir morar na cidade, e tem dias, como hoje que fica trancado no quadro numa tristeza paralisante. As vezes acho que vai desmoronar, não pele enrugada feito rachaduras, e sim seu olhar tão quebrado, parece que quer ir, não tem mais vontade de viver sem a vovó.

- Sinto muito. - é tudo o que consegui dizer ao saber das dores que meu amigo passa, e agora entendo toda apatia do senhor que mal terminou de comer e já foi se deitar.

- É ruim, mas sei que todo mundo tem problemas, a vida é assim. - Solta um suspiro resignado - E você, nunca fala nada da sua casa, de vez em quando reclama da Jéssica, mas te conheço, pega as coisas sem permissão, por isso pode tratar de me devolver minha camiseta.

- Não tenho o que falar, minha família é normal - a resposta sai no automático.

- Quando quiser contar a verdade vou te ouvir - o olhar de cuidado que Felipe me lança faz meu coração se aquecer, diante do seu carinho sorrio agradecida.

- Adoro esse filme - desvio de assunto focando na televisão.

O sherek com seu humor peculiar arranca nossas risadas e fico até um pouco constrangida, a que o ogro vira homem sendo assediado por mulheres desconhecidas me faz questionar se essas piadas realmente são para crianças.

— Eu dou melhor — Felipe imita me fazendo rir cortando o clima estranho.

Estou no palco envolta em nuvens de fumaça e jogo de luzes, o microfone que seguro amplifica minha voz que toma conta de todo o lugar. É um grande show, à minha frente vejo a plateia, milhares de pessoas contagiadas pela música que canto, suas mãos balançam no ar, conectados a mim e entregues à magia da canção Never be the same.

Ouço gritarem meu nome numa mistura de admiração, energia e entusiasmo, estão felizes em me ouvir, em me ver, são meus fãs. Esse carinho me enche de euforia, estou no céu.

De repente a música para, abro os olhos caindo na realidade, a escova de cabelos é o meu microfone, e minha única plateia é a Jéssica que me fita feroz.

- Dá para parar com esse barulho?! Não aguento mais te ouvir gritando.

- Estou cantando - protesto ofendida.

- Cantando - sorri com deboche - Você sequer sabe falar o português direito, quanto mais cantar em inglês.

- Isso é inveja da minha voz linda - Coloco o radio novamente na tomada com uma careta de desdém. Como ousa desligar a minha música?

- Hahaha! Te ouvir me deixou traumatizada, não com ciumes, nunca mais escuto Camilla Cabello.

Incomodada com sua crítica fico em silêncio, observando-a passar maquiagem desejo que o lápis fure seu olho.

- Já notou que só reclama comigo!? Tudo que faço te incomoda - suspiro entristecida.

- É que não tenho paciência para suas besteiras.

- Você é uma péssima irmã, sequer parece que gosta de mim - chateada sento na cama, hoje foi horrível, passar um tempo com o Felipe ajudou ficar suportável esse dia, contudo também queria sentir alegria em estar na minha casa.

Sinto o olhar de Jéssica sobre mim, estamos quietas, sua expressão fica suave, até diria que doce.

- Na maior parte do tempo não gosto mesmo de você, mas admito que quando está dormindo fica adorável. - zomba e volta sua atenção ao espelho.

- Sua chata - Jogo o travesseiro acertando suas costas.

Por segundos fico receosa de como será sua reação, com atenção em seus movimentos vejo-a soltar o lápis de olho, calmamente se levanta e me encara.

Imaginando ela pulando em cima de mim agressiva pronta para me matar, contudo Jéssica pega o travesseiro vindo em minha direção com um sorriso travesso.

Enquanto sou atingida por travesseiradas consigo pegar minha almofada e revido. A guerra começa, com golpes que a deixam desnorteada, esquivo de seus ataques, sou ágil e corro para longe de suas investidas.

- Você não me pega, hahaha - mostro a língua debochada.

Ela vem sobre mim com rapidez, tento me desvencilhar, contudo, o guarda- roupas não deixa, estou encurralada, droga de quarto minúsculo. Sou acertada diversas vezes e caio na cama derrotada, Jéssica se joga do meu lado.

Estamos deitadas ofegantes e risonhas, o som de nossas gargalhadas enchem o cômodo, um clima amigável paira no ar esquentando o ambiente. Nesse instante Jéssica é uma boa companhia e fico feliz de estarmos juntas, até mesmo em dividir o quarto.

- Sei que tenho um jeito grosseiro de ser, mas te amo, desculpe ser tão chata com você - apesar da dificuldade em falar de sentimentos a honestidade de suas palavras me surpreender, sorrio emocionada com sua desajeitada ternura.

Com efusão envolvo-a num abraço, Jéssica automaticamente se encolhe incomodada, porém hesitante retribui o gesto de carinho.

- É bom você não esquecer o que te disse, porque não vou repetir - afasta-se levantando rápida. O momento de ser boazinha acabou.

Jéssica é rabugenta, no entanto no fundo, bem no fundo quase achando petróleo, tem um coração, penso vendo a garota se maquiar outra vez negando minha existência.

- Está se arrumando tanto assim para ir aonde? - fico curiosa presenciando a pilha de roupas que jogou no chão na tentativa de encontrar o que vestir.

-Vou dormir na casa da Dara - Jessica sorri com malícia, o crooped de renda com um generoso decote deixa seus seios a mostra é escondido pelo longo casaco que veste.

- Qual o nome dele? - investigo.

- É o Guilherme - responde animada, para minha surpresa.

- Use camisinha - aconselho um tanto constrangida.

- Acha que sou boba? - revira os olhos, dentro da bolsa mostra a cartela de preservativos guardada. - São camisinhas que dão no posto de saúde, tem a mesma qualidade e protege igual as que são vendidas, a diferença é que não vem com sabores e são de graça.

Apenas concordo com a cabeça um pouco embaraçada, nunca pensei falar desse assunto com minha irmã, porém noto que essa é a sua tentativa de ser mais companheira.

- Divirta-se - desejo vendo-a sair com seu andar confiante.

Espero que continue sendo legal comigo.

Oii, que bom ter você aqui❣️

Desconfiavam do desastre que seria o Felipe e a Marcela na cozinha?! kkkkk

Depois Felipe contou sobre sua família, achavam que a vida dele era assim?

Jéssica e Marcela se entendendo, será que dura essa proximidade delas?

Deixe seu comentário e estrelinha 🌟

Obrigada pela leitura, até mais 😘

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