Uma Boa Menina | Capítulo Doze
Não precisou esperar por muito tempo até Elisa reaparecer. Ela finalmente tinha um tempo livre, encontrou Clarissa no mesmo sofá com um livro de poesia, imersa e concentrada na leitura.
A loira desviou o olhar e sorriu quando Elisa sentou-se ao seu lado, as duas se aconchegaram nas almofadas até estarem praticamente deitadas, os corpos entrelaçados fazendo com que sentisse o calor que a energia de Elisa vibrava.
— Você pensou sobre o que eu te disse mais cedo? — indagou ela, os olhos dourados brilhando em preocupação quando lhe encararam. Estavam bem próximas, podia ver cada contorno do rosto de Elisa, cada nuance de fogo em seus olhos vívidos.
— Foi o que eu mais fiz, mas ainda não tomei uma decisão — disse, em um tom baixo que soou como um suspiro. Sentiu os braços de Elisa lhe puxando para mais perto, apertando o abraço quando se ajeitaram nas almofadas coloridas do sofá.
— Cass, o tempo é diferente para nós aqui e é um pouco imprevisível. Quanto mais tempo você passa aqui, mais corre o risco de que anos se passem lá — alertou, a voz suave. As palavras da ruiva pesaram em seus pensamentos, repetindo-se como um disco riscado e se fixando em suas aflições.
— Você voltaria se pudesse? — questionou Clarissa, por fim e Elisa desviou o olhar por um momento, deixando as mãos deslizarem por seus cachos loiros e enrolando as mechas onduladas nas pontas dos dedos. Gostava de quando ela fazia isso, de senti-la mexendo delicadamente em seu cabelo como costumava fazer quando namoravam.
— Talvez. Onyx foi o recomeço que eu precisava, antes eu me sentia sufocada, perdida e cheguei aqui em um estado de fragilidade emocional que deixou claro que eu precisava mudar se quisesse melhorar. Eu senti e sinto falta da minha vida antiga, imagino onde estaria agora se mudasse minhas escolhas, mas nunca quereria voltar a ser aquela Elisa de antes — disse, por fim. Clarissa entendia tudo aquilo. Fizera coisas ali que nunca julgara ser capaz de fazer, estava finalmente vivendo e não lendo alguma aventura e se abstendo das próprias decisões. Deixara de ser a garota que lia sobre lutas para finalmente lutar. — Voltar seria ótimo, mas ter minha antiga vida de volta... Eu teria de abrir mão de tudo o que eu sou agora e não quero voltar a ser aquela outra garota. — Outra garota. Não era um exagero de Elisa, Clarissa ficava cada vez mais surpresa e encantada ao ver essa versão mais autoconfiante, empoderada e aberta da ruiva. Aquela outra garota havia desaparecido, a garota fechada e frágil, a garota que dependia dos outros para se sentir bem.
Ela havia perdido muitas coisas ao estar ali agora, mas era como havia dito, aquele lugar representava recomeço. Talvez devesse tentar isso antes de tomar uma decisão.
« ♡ »
Acabaram adormecendo no meio de alguma poesia que Clarissa lia. Ficaram um bom tempo ali, os corpos entrelaçados no sofá enquanto a loira lia os poemas em uma voz suave, suas palavras perdendo-se no meio do silêncio da biblioteca.
Ficaram só as duas, o sofá, os corpos entrelaçados e a voz de Clarissa recitando as palavras bonitas do poema. Quando acordou, tempo depois, Elisa ainda estava adormecida com a cabeça em seu ombro, os braços em volta de sua cintura e os cabelos ruivos espalhados em seu peito, mesclando-se com os cachinhos loiros.
Por alguns segundos apenas fechou os olhos novamente, sentindo os braços entrelaçados, as correntes de energia que pareciam transbordar de Elisa. O brilho dourado era muito mais intenso quando ela dormia, como uma aura incandescente que formigava e esquentava tudo ao seu redor.
Ela realmente tinha razão, aquilo equilibrava e recarregava as energias.
Depois de algum tempo, sentiu a mão dela apertando a sua, a ruiva se revirando e ajeitando-se ao seu lado, mas continuou deitada. Clarissa abriu os olhos para encará-la, sorrindo ao deslizar as mãos pelas mechas longas dela.
— Você não está atrasada para algo? — questionou, baixinho e Elisa riu, escondendo o rosto nos cachinhos loiros e volumosos. Clarissa encarou os anjos pintados no teto abobadado, observando as asas bem desenhadas que pareciam tão incandescentes e poderosas quanto as de Elisa.
— Eu sempre estou atrasada para algo, então só vou fingir que me esqueci da reunião — disse a ruiva, fazendo Clarissa rir e afagar mais uma vez os cabelos incandescentes e avermelhados, sem ter como deixar de comparar Elisa com as pinturas perfeitas e detalhadas do teto.
— Gostei do plano — murmurou, virando-se e encostando suavemente os lábios nos dela, em um beijo leve. Ficaram em silêncio por algum tempo, abraçadas e aproveitando a companhia uma da outra, como se não houvessem passado as últimas horas juntas.
Quando Elisa finalmente decidiu que não poderia adiar mais nada, elas se levantaram e ajeitaram as roupas amassadas. O lugar permanecia vazio, desconfiava que aquilo era quase uma forma mística de manter privacidade, perguntaria à Elisa qualquer hora.
Clarissa decidiu ficar na biblioteca por mais algum tempo, mas acompanhou Elisa até um dos corredores de estantes e se despediram com um beijo rápido. Virou-se e percebeu que era somente ela e os livros, as estantes subindo até um ponto em que se perdia em sua visão, algum lugar perto do teto abobadado iluminado.
Decidiu voltar para as mesas de pesquisa, Kenan havia falado algo sobre conseguir se teleportar. Se agora era uma garota fantasma, então podia usar do teleporte e aprimorar isso, talvez conseguisse algum livro sobre o assunto, algo que lhe explicasse exatamente como que acontecia a manipulação de energia ou como podia controlar isso.
Havia uma pessoa andando entre mesinhas, se afastando na direção das estantes. Clarissa reconheceu os cabelos escuros flutuando ao seu redor, os movimentos elegantes de bailarina e a garota não se virou, então não a viu.
Foi fácil tomar a decisão de ir em frente para ver o conteúdo dos cadernos abertos que Lynn havia deixado em cima da mesa. A ideia de encontrar alguma prova ou até mesmo algo suspeito era atraente demais para simplesmente virar as costas ao ver que ela havia deixado as anotações abertas e desprotegidas na mesa.
Acelerou o passo até a mesa e reparou nos cadernos. As folhas brancas estavam rabiscadas com uma escrita coreana e um símbolo que se repetia diversas vezes. Franziu as sobrancelhas, frustrada.
Já havia estudado diversas línguas mortas, conseguia traduzir todo tipo de escrita arcaica, mas nunca havia estudado o alfabeto coreano. Apenas prestou atenção no símbolo, tentando memorizar suas linhas e talvez um pouco do alfabeto. Talvez conseguisse se lembrar de uma linha ou duas e...
— Nunca te ensinaram que é feio mexer nos pertences dos outros? — Ouviu a voz fria de Lynn e levantou o rosto para encará-la no mesmo momento em que a menina tirou o caderno da mesa, fechando-o com rigidez.
— Preciso mesmo te responder? — A loira levantou as sobrancelhas, o tom ácido tornando as palavras incisivas quando a encarou. Os olhos de Lynn cintilaram em chamas, Clarissa quase recuou por um momento quando sentiu o poder emanando dela como uma onda sufocante, queimando-a.
Apertou as mãos contra a madeira da mesa e engoliu o próprio medo. Não se permitiria intimidar por ela, não agora e nem nunca.
Lucas tinha razão, Elisa sabia muito bem se defender. Clarissa a tinha visto usar as espadas, os poderes e apostava todas as fichas em Elisa em uma guerra fria ente Lynn e a ruiva. Só precisava que ela estivesse ciente de que havia alguém próximo que representava perigo.
— Você nunca foi muito cautelosa — riu ela, de uma forma seca e quase sem humor. Clarissa levantou os olhos para encará-la, Lynn lhe fitava com desdém, como se realmente achasse graça de sua coragem ou estivesse encarando uma criança irritada.
— Realmente acha que pode me assustar? — indagou a loira, sem desviar o olhar ou vacilar.
— Admiro sua coragem, Clarissa, mas vai aprender que, no final das contas, é melhor ficar calada como a boa menina que você é. — Mais uma vez o tom soou como um deboche, o que fez com que suas mãos se apertassem na mesa em ódio e irritação. Sabia que aquela era uma batalha inútil, o que podia fazer contra uma querubim que era vice-comandante do exército? Mas odiava se sentir tão subestimada assim, daria um jeito de desmascará-la, qualquer jeito.
Não se importava de enfrentá-la em um julgamento sem provas se isso fosse o suficiente para alertar Elisa.
— Eu estou tão de saco cheio de você — rebateu, as palavras sendo pronunciadas com mais força do que o normal. Estava irritada e sem paciência, podia sentir a fúria quente vibrar como energia. — Se você acha que vou deixar isso continuar, está muito enganada e se você acha que vou ficar calada, está claro que não me conhece.
— O que está acontecendo? — indagou uma voz, vinda das estantes atrás de Clarissa e a loira se surpreendeu quando viu Elisa adentrando a sala de estudos, o som dos saltos altos repercutindo enquanto andava.
— Conte a ela, Clarissa — desafiou Lynn, um sorriso cheio de escárnio se abrindo em seu rosto. Arthur entrou logo atrás de Elisa, talvez eles tivessem voltado para pegar algum dos livros sobre armas na biblioteca e isso significava que ouviram toda a irritação em sua voz, todas as palavras de acusação que havia dito.
Lynn continuava lhe encarando com um olhar de escárnio, Arthur lhe fitava com seriedade e Elisa ainda olhava para as duas com aqueles olhos incandescentes, esperando uma resposta. Clarissa desviou o olhar, por um instante fitou as prateleiras lotadas de livros atrás de Elisa, como se aquelas páginas velhas pudessem lhe dar as respostas para aquele dilema.
Conte a ela, Clarissa.
— Lynn está envolvida com quem fez aquilo com Lena, se é que ela própria não o fez. A ouvi falando com alguém e Lynn disse claramente que não queria que Elisa se envolvesse com a investigação — disse, fazendo uma pausa e tamborilando os dedos na madeira da mesa, tentando não se sentir tão nervosa. Lynn continuava lhe encarando com atenção, aqueles olhos fixos em si como se soubesse que estava cometendo um grande erro. — Liz, ela tem planejado algo contra você e usado isso para me manter calada. Precisa acreditar em mim. — O tom que usou foi quase uma súplica, um tom de "por favor, tome cuidado". Toda a raiva havia sido substituída por uma preocupação, fixou seus olhos no de Elisa para que ela soubesse que estava sendo sincera, para que visse a súplica em seus olhos e ficasse atenta com Lynn.
— Alguém mais ouviu? — questionou Arthur e ele havia assumido novamente aquela face neutra e séria de quando havia lhe conhecido, quando ele lhe interrogou pela primeira vez. Clarissa hesitou.
Não sabia se Lynn havia visto Lucas, mas sabia que ela ficaria observando qualquer coisa que fizesse. Seria muito melhor se Lucas permanecesse fora do foco dela e então continuasse procurando por provas enquanto Clarissa atraía toda a atenção principal.
Talvez essa briga com Lynn não fosse tão inútil, afinal.
— Não — respondeu, o maxilar tensionado.
— Possui alguma prova para embasar sua denúncia? — indagou, fazendo com que Clarissa fixasse os olhos nos de Lynn. Ela levantou as sobrancelhas, como se estivesse lhe desafiando a responder, mesmo sabendo o qual seria sua resposta.
— Não — disse, as mãos se apertando ao lado no corpo. Estava ficando irritada com tudo aquilo, Lynn parecia se divertir cada vez mais ao ouvir suas respostas secas e curtas enquanto Elisa apenas permanecia calada, os olhos fixos em si de maneira séria.
— Possui alguma maneira de comprovar o que ouviu? — Clarissa quase riu com escárnio e desta vez se apoiou na mesa de madeira quando cruzou os braços, impaciente quando o encarou.
— Nós não temos celulares ou gravadores aqui, Arthur — respondeu a loira, secamente. Ele apenas balançou a cabeça de forma frustrada e quase cansada, como se achasse que tudo aquilo era inútil.
— Você não está se ajudando, Clarissa — comentou Arthur, e Clarissa apenas permaneceu calada por alguns segundos, levando o olhar até Lynn. As duas se encararam, o silêncio pareceu se solidificar entre elas e roubar todo o ar da sala. A loira tinha noção de que Elisa ainda lhe encarava, esperando por respostas.
— O caderno. Ela tinha algo no caderno quando cheguei, em alfabeto coreano e havia um símbolo, não acho que pareça um símbolo usado por querubins — disse, como uma única tentativa. Talvez houvesse algo incriminador ali ou talvez não, não achava que Lynn seria burra o suficiente para deixar algo incriminador desprotegido daquela maneira, mas não podia arriscar.
Lynn apenas esticou o caderno para Elisa, que foi em frente e pareceu meio hesitante, mas folheou suas páginas com atenção. Franziu as sobrancelhas, fechando-o quando se voltou para Clarissa e parecia preocupada, decepcionada, definitivamente não parecia acreditar em nada do que havia falado antes.
— Cass... está em branco — disse, simplesmente e Clarissa arregalou os olhos, dando um passo a frente e pegando o caderno das mãos de Elisa. Folheou rapidamente, mas os símbolos desenhados haviam sumido, como se página fosse arrancada.
Lembrava-se nitidamente do caderno em cima da mesa, dos escritos em alfabeto coreano e do símbolo estranho que se repetia em toda a página. Estava logo no início, era simplesmente ilógico e impossível que houvesse sumido.
Mas estava em Onyx, tudo era possível em uma dimensão de querubins.
Clarissa forçou um suspiro irritado, Lynn pegou o caderno de suas mãos e seu olhar exibiu uma irritação fingida, um sentimento de incredulidade falso brilhou em seu olhar.
— É por isso, Clarissa, que você não pode inventar acusações. Não sei exatamente o que você tem contra mim, mas eu nunca ameaçaria você, Elisa ou qualquer pessoa aqui, voltaria no tempo sem hesitar se pudesse salvar Lena — retrucou ela, seu tom ofendido fez Clarissa estremecer de ódio, as mãos se fechando em punhos quando a fitou nos olhos.
A sala cheia de mesas decoradas da biblioteca pareceu ficar pequena demais, Clarissa sentia que podia jogá-la contra aquelas estantes com tanta força que elas cairiam uma a uma, como um dominó.
— Vocês realmente acreditam nisso? — Se virou para Elisa e Arthur. Elisa tinha os lábios comprimidos e a face tensa, deixando bem claro que não estava gostando daquilo e trocou olhares com Arthur, ambos sérios e irredutíveis. — Pelo amor de Deus! Por que eu arriscaria inventar acusações sobre a vice-comandante do exército? Acham mesmo que eu me meteria nisso se estivesse mentindo? — Sua voz soou mais alterada desta vez, a raiva transbordando pela fala rápida e mais alta do que o normal.
— Você tem qualquer coisa que prove a culpa dela além do seu testemunho? É importante que você fundamente suas denúncias ou, sinto muito, não podemos fazer nada por você — explicou Arthur, calmamente. Clarissa apenas baixou o olhar e não respondeu, os cabelos loiros fizeram uma cortina cacheada ao seu redor e percebeu que as mãos ainda estavam fechadas em punho. Sabia que não tinha sangue nas veias, mas definitivamente podia sentir algo correndo ali com um pulsar elétrico.
— Onde você quer chegar com isso? Por que está tão empenhada em me culpar? — Lynn cruzou os braços, os olhos felinos caindo sobre si de uma forma determinada e sentiu a energia dela lhe rodear, intimidando-lhe. — Talvez você esteja escondendo algo.
— O quê? — Clarissa pareceu tão chocada que mal conseguiu reagir. Sentia o olhar de Ethan e Elisa atrás de si, mas permaneceu com os olhos fixos nos de Lynn. Ela fingia uma expressão chocada, incrédula enquanto lhe encarava e Clarissa sentiu algo realmente ruim sobre aquilo.
— Eu sei sobre as suas dificuldades no início do treinamento, as habilidades de uma bruxa poderiam te ajudar muito, não é? — indagou e Clarissa arregalou os olhos, mal tendo tempo de rebater o que ela havia dito antes que Lynn recomeçasse a falar. — Até onde você iria para se tornar querubim e ficar ao lado de Elisa? Com os poderes de uma bruxa, a melhora súbita nos treinamentos e a habilidade com...
— Pare! — Clarissa gritou e mais uma vez sentiu aquela corrente fria e cheia de energia em suas veias, pulsando mais forte, queimando como fogo. Não era fogo, não, era algo frio que lhe queimava do mesmo modo.
Lynn foi jogada para trás como se Clarissa tivesse a empurrado com força, foi lançada pelos ares e girou por cima das mesas, batendo com força em uma das estantes, exatamente como a loira havia imaginado. Permaneceu calada e paralisada, sem virar-se para encarar os outros.
Não havia nem ao menos tocado nela, jogara Lynn para o outro lado do salão apenas com aquele olhar furioso. Sabia que fantasmas tinham facilidade com telecinesia, mas não achava que poderia fazer algo tão grandioso.
Lynn finalmente se levantou com graciosidade do outro lado do salão, sem machucado algum ou qualquer careta de dor. Não doeria. Clarissa sabia disso.
— Vocês precisam de mais provas para considerá-la suspeita? Você pode explicar tudo isso, Clarissa? — Estava tão zonza e chocada enquanto encarava Lynn, contra as estantes e com os braços cruzados, que demorou para assimilar suas palavras. Revirou os olhos de maneira irritada, sentindo-se cansada de toda aquela discussão.
Apenas se virou para Elisa e Arthur, ambos pareciam incrédulos e espantados quando lhe observaram.
— Tudo bem, revistem meu quarto ou façam o que tiverem de fazer, não sou eu quem está mentindo aqui — disse, dando de ombros. Lynn riu atrás de si.
« ♡ »
— O que você está fazendo? — indagou Elisa, enquanto Clarissa estava sentada na cama com os braços cruzados, uma expressão fechada e seus olhos obscurecidos com a raiva. A ruiva sentou-se ao seu lado, mas Clarissa apenas desviou o olhar.
— Você sabe o que eu estou fazendo — respondeu, sem vontade de encarar Arthur e Lynn avaliando tudo em sua escrivaninha. Eles já haviam revistado o guarda-roupa e o gaveteiro ao lado da cama e não haviam encontrado nada além de livros, cadernos rabiscados e fotos, nada suspeito que pudesse fundamentar as acusações de Lynn.
— Sem provas? — questionou ela, levantando as sobrancelhas e fazendo algo dentro de si revirar. Era como se Elisa estivesse duvidando, sendo cautelosa e lhe encarando de uma forma que parecia achar tudo aquilo um drama, como se tivesse acusado Lynn apenas por birra.
— Eu precisava avisar você — disse, dando de ombros. Estava tão irritada que apenas cruzou os braços e evitou o olhar de Elisa, sem querer falar com ela naquele momento. Não havia feito tudo aquilo para ela achar que se tratava apenas de um ciúme infantil.
— Cass... — começou ela, de uma forma cautelosa. A loira revirou os olhos, impaciente.
— Você não acredita, não é? — indagou, voltando-se para ela. Os cachos loiros flutuavam ao redor de Clarissa, como se aquele poder cheio de eletricidade ainda não houvesse se esvaído e seu rosto era emoldurado pelas mechas volumosas.
— Haverá um julgamento. Não deveria ter feito isso sem provas — respondeu a ruiva, pacientemente. Clarissa conteve mais um revirar de olhos enquanto observava Ethan folhear os livros em cima da escrivaninha, Lynn observando os papéis avulsos que geralmente continuam poemas ou textos escritos.
— Está me culpando por priorizar você e não dar a mínima para o julgamento? — rebateu, ainda incrédula. Elisa lhe encarava como se estivesse lidando com uma criança teimosa, os olhos dourados pareciam calmos e pacientes quando voltou a falar.
— Você sabe que não estou falando sobre isso — disse a ruiva, a voz mais firme. Ela deslizou a mão até a de Clarissa, entrelaçando os dedos nos seus e acariciando a palma de sua mão com certo carinho. — Eu confio em você, Cass, mas não a quero envolvida com algo grande que eu ainda não sei o que é. Também preciso que confie em mim, eu sei me cuidar. — Elisa manteve a voz mais baixa, para que só ela ouvisse e a loira estremeceu quando sentiu a mão da ruiva contra sua, a energia dela pulsando de uma forma calma que aliviava todo o estresse e a raiva que vinha sentindo.
Pensou nas palavras de Elisa, pensou nas palavras de Lynn.
— Você não pode me pedir para parar de ficar preocupada, não tem esse direito — respondeu, desta vez com o tom de voz mais vazio e baixo. Elisa apertou mais sua mão enquanto a loira deixava os cabelos caírem na frente do rosto e deslizava a mão livre pela costura da colcha roxa.
— Não, mas...
— A gaveta tem um fundo falso — disse Arthur, fazendo Elisa se calar. Clarissa franziu as sobrancelhas, confusa.
Nunca havia visto nenhum fundo falso e nenhum esconderijo ali, mas agora Ethan tirava os livros e folhas rabiscadas de dentro da gaveta e a loira sentia tudo se revirar dentro de si. Tinha certeza de que sentiria seu coração acelerado se ele ainda batesse, mas apenas permaneceu paralisada enquanto via Ethan remover uma pequena placa de madeira da gaveta.
Foi só então que percebeu que havia cometido um erro, um grande, grande erro.
Viu quando Arthur tirou uma adaga pequena e afiada de lá, a mão de Elisa soltou-se da sua e estava tão atônita e confusa que apenas permaneceu em silêncio, todos encarando a adaga.
— Alguém a colocou aí. — Foi tudo o que conseguiu dizer, mas sua voz saiu vazia e chocada demais. Voltou o olhar para Lynn, que agora lhe encarava com uma máscara de seriedade e ela apenas levantou uma sobrancelha em desdém. Clarissa quase conseguiu ler a mensagem por trás da expressão. Eu venci. — Eu nunca vi essa adaga, nem ao menos sabia do fundo falso — completou, sem tirar os olhos de Lynn, que também fixava o rosto no seu.
— Sua pulseira — disse ela, só então Clarissa baixou o olhar para o próprio pulso e percebeu que uma ponta da pulseira que Lynn havia lhe dado tempos atrás aparecia sob a manga comprida. Havia se esquecido dela, estava sempre usando blusas compridas e a pulseira era tão leve e fina que quase não a sentia.
Apenas tensionou os lábios, sabendo o que aconteceria em seguida. Sabia que, se fosse utilizar energia de uma bruxa, então precisaria usá-la em um colar ou uma pulseira. Estava prestes a chorar ou gritar, mas manteve-se firme.
Sem dizer nada, as mão ficaram trêmulas quando dobrou a manga e tirou a joia, entregando-lhe para Elisa. Ela havia se levantado, podia jurar que parecia mais pálida quando pegou a pulseira e fechou os dedos em volta dela, como se estivesse lendo a energia daquele cordão prateado.
Clarissa apenas estremeceu. Não podia acreditar que fora tão estúpida e manipulada, não podia acreditar que Lynn havia lhe levado exatamente onde queria que estivesse e nem se dera conta.
— Energia de bruxa — disse a ruiva, a voz fraca quando lhe encarou com aqueles olhos dourados. Por um momento, eles pareceram apagados quando encararam os seus.
— Liz... — Elisa não disse mais nada, a ignorou e se virou. Seus saltos ecoaram pelo quarto quando ela passou por Arthur e por Lynn, deixando a pulseira prateada em cima da escrivaninha e depois seguindo para porta.
Clarissa permaneceu parada, apenas ouvindo os saltos altos ecoarem e logo depois a porta se bater com força. Não conseguiu reagir, as mãos apertavam o colchão e a colcha como se isso pudesse lhe ajudar a voltar para a realidade.
— Sinto muito, Clarissa. — Piscou lentamente e percebeu que Arthur estava em sua frente agora, mal teve tempo de se levantar ou recuar quando ele pegou seu pulso. Sentiu a pele arder no lugar onde ele havia tocado, como se a mão dele estivesse lhe queimado e logo depois uma luz dourada incandescente começou a lhe rodear, como uma nuvem cintilante que ofuscava seus olhos.
Clarissa se levantou, franzindo as sobrancelhas.
— Espere, o que você... — Foi então que viu o quarto desaparecer ao seu redor, como névoa se desmanchando. Paredes cinzentas surgiram no lugar das estantes e as lamparinas de seu quarto sumiram no meio daquilo, a cama com cabeceira decorada se tornou uma de metal simples.
Se virou, os olhos arregalados quando a nuvem luminosa desapareceu por completo ao seu redor. Mal acreditou quando viu grades, não grades de metal, mas grades que se pareciam mais com barras violetas brilhantes, como se fossem feitas de eletricidade. Elas brilhavam e lançavam sombras nas paredes.
A loira deixou-se cair de joelhos e finalmente as lágrimas escorreram em seu rosto.
Vai aprender que, no final das contas, é melhor ficar calada como a boa menina que você é.
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