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Mais Uma Chance | Capítulo Trinta e Um

Clarissa sentou-se ao lado de Lucas e Kenan, contendo um revirar de olhos quando viu que Elisa estava sentada ao lado de Asmodeus, junto com Arthur na mesa de frente para a sua. Estavam em um salão diferente do que fora julgada, este era oval e com as mesas dispostas em um semicírculo.

Apesar da mesa oval, duas mesas retas estavam dispostas nas laterais e era onde estavam sentados como testemunhas. Até acharia engraçada a inversão de lugares entre ela e Lynn, mas estava tensa demais para isso e queria que Lena estivesse ali, lhe acalmando e garantindo que as coisas dariam certo.

Mas ela não queria se expor ainda, não quando estavam tentando encontrar seus poderes e uma forma de reavê-los. Continuou tamborilando os dedos e balançando as pernas debaixo da mesa, ansiosa para sair dali.

Estranhou que não havia nenhum trono de veludo, nenhuma criatura dourada representante do Conclave para assistir ao julgamento. Talvez os tratamentos fossem diferentes por Lynn ser querubim, deduziu.

Reconheceu Dabria, os outros rostos sentados no semicírculo também eram levemente familiares. Os olhos dourados, as expressões sérias e as roupas elegantes não lhe assustavam tanto quanto antes.

A interrogadora começou lendo as acusações, tinha o mesmo ar intocável e perfeito que Clarissa se lembrava, os cabelos loiros arrumados e sem um fio fora do lugar. Parecia tão apática quanto as figuras douradas que vira quando chegou naquela dimensão.

Provavelmente Arthur tinha reunido todas as acusações, Dabria acusou Lynn de vazar informações do exército, conspirar contra os querubins e a comandante do exército. Clarissa suspirou. Elisa parecia bem longe de ser a comandante do exército agora, Arthur havia continuado em seu lugar quando elas voltaram.

Lynn estava sentada de frente para a interrogadora, escutava tudo com uma expressão fria e indiferente, Clarissa sentia tudo se revirar com aqueles olhos dourados e a expressão inabalável que ela tinha.

— De fato, Elisa afastou Ethan e Lynn quando desconfiou que os acontecimentos no exército foram planejados pelos dois. As informações erradas e vazadas foram emboscadas que jamais haviam acontecido antes, ela descreve tudo nos relatórios — disse Ethan, como primeira testemunha. Dabria assentiu, pegando uma pilha de papéis dispostas sobre a mesa redonda. Aquilo, Clarissa imaginou, seria o relatório de Elisa justificando o afastamento dos dois. — Não houve nenhum desvio de comunicação ou atividade suspeita que pudesse ter gerado os enganos e eles pararam assim que os outros dois foram afastados. Nunca, sob o comando de Elisa, o exército passou por tal situação, apenas quando Ethan e Lynn estavam presentes — continuou ele.

— Vocês têm alguma prova? — indagou Lynn, levantando uma sobrancelha. Clarissa estava impressionada com a frieza dela, com o quão inabalável era sua expressão. — Seria fácil para Elisa nos afastar e então cessar os atentados para nos fazer parecer culpados — argumentou, sem elevar a voz e com um tom despreocupado. Não existia nervosismo ou ansiedade, apenas as palavras suaves e sem alteração.

Arthur se inclinou, cruzando os braços sobre a mesa.

— Por qual motivo atacou Elisa, se nega a autoria dos atos? Talvez você só a quisesse longe da investigação e do exército, já que ela estava atrapalhando seus planos, impedindo-a de continuar no exército e investigando o ataque contra Lena — questionou, mantendo o tom firme e inabalável. Ele parecia confiável. Clarissa desconfiava dele por ter evitado se envolver nos acontecimentos, mas era importante ter alguém de fora, alguém sem suspeitas para dar confiança ao relato, percebeu. — É mais fácil admitir que se sentiu ameaçada e encurralada com Elisa investigando tudo com tanto afinco — concluiu, sem tirar os olhos de Lynn. A loira sentia-se enjoada, focou o olhar nos vitrais cheios de desenhos que compunham o salão circular e desejou estar em outro lugar. Os anjos de vidro colorido lhe encaravam com faces tristes e espadas levantadas.

— Sempre tive uma boa relação com Elisa, não levei o afastamento para o lado pessoal — contra-argumentou Lynn, o que era um fato. Todos ali pareciam saber o quanto Lynn e Elisa eram próximas, sempre trabalhando em conjunto no exército e muitas vezes passando o tempo livre juntas. Ninguém podia dizer que a relação delas era conturbada. — E tenho como provar que nenhum documento foi assinado por mim ou por Ethan durante aquele período, então não há como termos enviado informações falsas — relatou, com o mesmo tom firme, não deixando dúvida alguma. Dabria anotava sem parar no papel que tinha em mãos, assim como os outros, e Clarissa desejou poder ler o que eles estavam anotando, saber de que lado estavam.

— Os documentos passavam pelos cartógrafos e pela equipe de comunicação, mesmo os que são assinados por Elisa. É possível que qualquer membro da equipe tenha adulterado o conteúdo, provavelmente a mando de vocês — afirmou Arthur, com a voz estranhamente calma e firme. Clarissa se sentia tão irritada com Lynn que jamais conseguiria ter a cordialidade dele. — Então Elisa afastou vocês dois, ambos sabiam que seriam pegos caso suas marcas energéticas estivessem presentes nos documentos ou até mesmo nas salas do exército — concluiu, o que parecia fazer muito sentido. Clarissa só ouvia o barulho de caneta contra o papel, as vozes ecoando no grande salão e lhe deixando zonza. Observou o teto iluminado, tentando desvendar suas pinturas.

— Não ouvi você falando de provas. Ou é só uma suposição? — indagou Lynn, com um sorriso cínico no rosto e um olhar inabalável.

— Basta! — interrompeu a interrogadora, sua voz ecoando com autoridade pelo salão. Clarissa se voltou para ela, observando seu penteado perfeito e a postura impiedosa que ela tinha. — Lynn, está ciente de que está acusando Elisa de conspiração, não é? Se declara a sua inocência quanto aos acontecimentos que assolaram o exército, ainda deve explicar o motivo de tê-la atacado. — Ela pediu o relato das outras testemunhas. Clarissa e Lucas falaram, Kenan e Arthur também, todos detalhando exatamente sua visão dos acontecimentos do salão.

Kenan lhe instruíra a falar com detalhes e foi o que fez, desde o momento em que Lucas lhe pediu ajuda, até os túneis e finalmente os símbolos no salão. Pelo que entendera, Lucas escapara por pouco de uma repreensão por ter lhe tirado de lá sem autorização.

— Por que não fala com mais detalhes sobre como abriu um portal demoníaco, Clarissa? — pediu Lynn, o que fez a loira franzir as sobrancelhas, hesitante. Olhou para Kenan em busca de orientação, ele lhe encarava com um olhar sério de aviso. Sabia o que aquilo significava.

Cuidado. Não fale mais do que o necessário.

— Não teria acontecido se você ou seus cúmplices não tivessem me ligado ao primeiro portal — disse, orgulhosa por conseguir manter a voz fria o bastante para soar calma. — Não foi proposital, não tinha controle do que estava fazendo — argumentou, mantendo o tom sincero e aberto, sem nada a esconder. — Asmodeus pode confirmar que eu não estive na dimensão infernal por vontade própria, não é? — Olhou para Asmodeus, sentado do outro lado do salão, e abriu um sorriso cínico, o olhar ácido e obscurecido de raiva. Asmodeus apenas acenou de leve, movendo só dedos e retribuindo o sorriso falso.

— Mas estou curiosa... A energia demoníaca não te afetou? Você deveria falar um pouco mais sobre como estão seus poderes, eles podem ser preocupantes para o Concílio — continuou Lynn, enquanto Clarissa ouvia tudo com as sobrancelhas franzidas. Não entendia o que ela queria com aquilo, mas Kenan continuava lhe lançando um olhar alarmado e, quando Clarissa o encarou, ele fez um gesto negativo quase imperceptível com a cabeça. Nada de falar sobre o que aconteceu nas escadarias. — A adaga que atingiu Lena foi encontrada no seu quarto, usava uma pulseira com poderes de bruxa e é de se esperar que tenha ido para um lado mais sombrio e demoníaco. É de se esperar, também, que Elisa estivesse te protegendo e encobrindo, exatamente como estava fazendo no salão.

— Como? — Clarissa riu baixo, incrédula com suas palavras e acusações. Ela realmente achava que podia distorcer tudo daquele modo?

Lynn não recuou.

— Eu não tive escolha, tentei impedir você de abrir o portal demoníaco e ela entrou na frente — disse. Clarissa tentou rebater, mas a interrogadora levantou a mão e lhe lançou um olhar de aviso, mandando-lhe ficar quieta para continuar ouvindo a querubim.

Lynn mentia, e fazia isso muito bem. Realmente parecia que Elisa era a conspiradora ali, que Clarissa havia se envolvido com energia inimiga e que Lynn só estava tentando fazer o certo. Ela fazia parecer que havia atacado Elisa em legítima defesa, que estava tentando impedir Clarissa de abrir o portal demoníaco. As coisas estavam ficando ruins rápido demais, o modo cheio de convicção com que Lynn falava deixava até mesmo Elisa confusa, as sobrancelhas franzidas enquanto a ouvia.

Lynn usava todos os fatos a seu favor, distorcendo-os e deixando Clarissa incrédula quando percebeu que o Concílio estava realmente em dúvida, tentando acompanhar e comparar as versões. Foi quando as portas duplas se abriram, interrompendo o relato de Lynn.

Lena estava parada na porta e todos a encaravam com espanto, o silêncio que recaíra sobre o salão foi sufocante. Todos mantinham os olhos sobre a garota quando Lena adentrou o salão, deixando bem visíveis seus olhos castanhos e sua aparência humana.

Ela parecia pequena sobre os olhares de choque e surpresa, mas manteve uma postura inabalável.

— Clarissa é inocente e Elisa também — afirmou Lena, aumentando o tom de voz para que todos a ouvissem. Ninguém ousou falar uma palavra ou tirar os olhos da menina, que parecia furiosa enquanto falava. Clarissa sorria, feliz e orgulhosa enquanto a observava. — Comecei a desconfiar de Lynn e Ethan quando descobri que eles se encontravam fora do horário normal das reuniões, mas achei que Elisa estava ciente disso. Em todas as jogadas tarô, as cartas apontavam que eu estava em perigo, então resolvi me proteger e acompanhar mais de perto o que Lynn e Ethan estavam fazendo. Descobri que eles buscavam os poderes de uma trindade gêmea, três querubins com os mesmos níveis de habilidades e poderes. Eu fazia parte disso, aparentemente, e roubaram meus poderes para algo grande, algo que tenho certeza de que nos prejudicará — relatou, seus passos ecoando pelo salão quando o adentrou, indo em direção às mesas de testemunhas. — Clarissa é inocente, nunca representou nenhuma ameaça, e Elisa trabalhou exaustivamente para tentar descobrir o que aconteceu comigo. Se tivesse a mínima suspeita de que elas são as responsáveis por enfiar aquela adaga em mim, jamais estaria defendendo-as perante o Concílio — concluiu, sentando-se ao lado de Clarissa. Foi meio inconsciente quando as duas entrelaçaram as mãos e trocaram olhares, com leves sorrisos surgindo nos lábios. Sabia que Lena ouviria tudo, mas não imaginava que ela fosse aparecer deste modo.

Não achava que fosse planejado, mas seu depoimento pareceu lhes salvar das mentiras de Lynn.

A interrogadora começou a fazer diversas perguntas, todas direcionadas para Lena, que as respondia com calma e detalhava cada acontecimento. Relatou sobre suas desconfianças, sobre como colocou sua energia no colar de Clarissa e como Elisa a salvou. Não conseguiu responder quando Dabria lhe perguntou quem havia lhe atacado, suas memórias continuavam anuviadas demais para isso e seguiram o interrogatório.

Em nenhum momento eles paravam de rabiscar as malditas folhas de papel, Clarissa sentia-se zonza e exausta, o julgamento durou muito tempo e não aguentava mais ouvir as mesmas perguntas e respostas repetidas. Lynn nunca se embolava em sua versão da história, nem eles.

Depois do que pareceram horas e horas de perguntas sem fim, a interrogadora finalmente declarou o julgamento encerrado. Ela ainda comparava as duas versões, observando os pontos em comum na versão de Lynn e dos outros.

— O caso será levado ao Conclave, Lynn continuará contida enquanto não tivermos uma resposta — anunciou ela, empilhando os papéis com provas e depoimentos, sem olhar para eles. Finalmente a loira se levantou, aliviada e desesperada para sair daquele salão.

Elisa correu em sua direção e lhe chamou quando foi em direção à porta, mas Clarissa lhe ignorou e se afastou antes que ela pudesse falar qualquer coisa.

« ♡ »

Clarissa achou que, depois de tanto tempo de interrogatório, teria um tempo para descansar e Kenan lhe daria uma folga depois de todo o drama com Elisa. Estava enganada.

— Eu já falei que te odeio hoje? — murmurou ela, sem tirar os olhos do vaso de argila em cima da mesa. Aparentemente, Kenan queria que sugasse a vida daquela planta como fizera com as plantas da escadaria, mas era mais fácil fazer aquilo de forma espontânea.

Se Clarissa encarasse aquela planta verde por mais alguns minutos, tinha certeza de que colocaria fogo nela com os próprios olhos. Kenan ainda insistia que ela tentasse, já que ele parecia decidido a desvendar seus novos poderes demoníacos.

— É a segunda vez — relatou ele, enquanto a loira tocava as folhas e tentava achar um modo de secá-las como fizera antes.

— Só duas? — Clarissa levantou a face, encarando-o com os olhos arregalados. A expressão de espanto dela fez Kenan levantar uma sobrancelha.

— Tem razão — admitiu ele, com muita seriedade. — Em um dia bom, você diz eu te odeio pelo menos dezesseis vezes — comentou, e a menina emitiu um ruído desanimado.

Tentava imaginar a energia da planta passando por seus dedos, sugando sua vitalidade com cada toque. Nada funcionada e sua cabeça estava latejando, só queria pegar aquele vaso e tacá-lo contra a parede.

Estava sendo terrivelmente derrotada por uma planta inofensiva.

— Eu não consigo fazer isso — insistiu ela, bufando e dobrando os braços em volta do corpo com frustração. As folhas balançaram, como se debochando de suas lamentações e Clarissa levantou o olhar para o teto, encarando a luz.

Não estavam no salão de espelhos naquele dia, Kenan achou mais prático usar uma sala relativamente pequena, composta por paredes decoradas com cristais coloridos e lapidados, que cintilavam sobre a luz intensa. Havia apenas uma mesa de madeira redonda em seu centro, onde Kenan e ela estavam sentados de frente um para o outro.

— Você fez uma vez — começou Kenan, sem dar a mínima para seu drama. — Faça de novo — insistiu, mesmo sobre os protestos incessantes de Clarissa. A menina parecia realmente frustrada quando puxou a planta mais para perto, apoiando os braços na mesa de madeira para conseguir envolver a folhagem.

— Eu te odeio — respondeu ela, e o cômodo era tão vazio que sua voz ecoou.

— Três vezes. Está melhorando — retrucou ele, com um sorrisinho irritante. Clarissa revirou os olhos e voltou-se para as folhas verdes, desejando que elas ficassem cinzentas de uma vez para Kenan parar de lhe encher o saco com aquilo. — Tente mais uma vez, se não conseguir, trabalhamos com a teoria de que aquilo foi um efeito passageiro e seguimos, certo? — Aquilo pareceu deixar Clarissa mais animada e a menina focou o olhar com mais afinco, tentando desligar os outros sentidos. Deixou que o salão desaparecesse ao seu redor, esqueceu-se de que Kenan lhe encarava com expectativa e tentou sentir a pulsação que emanava das folhas verdes.

Quando se deu conta, uma flor desabrochou no topo da folhagem como se crescesse abruptamente. Pelo menos as pétalas eram de um vermelho exuberante e conseguia sentir dali seu perfume.

— Isso serve? — indagou, levantando uma sobrancelha quando encarou Kenan. Ele afundou na cadeira de maneira frustrada e Clarissa deu de ombros, contendo uma risada. Eles já haviam trabalhado com o crescimento de plantas antes, era uma atividade básica para treinar o foco.

Os dois se viraram quando as portas duplas se abriram, o som de passos ecoando no salão quando Lucas e Elisa entraram, quebrando o silêncio imaculado do local. Clarissa conteve um suspiro quando os olhos da ruiva caíram sobre si, com um pingo de ansiedade e nervosismo que os deixava maiores.

Lucas tinha um olhar confuso ao reparar na planta e nos dois sentados ao redor da mesa de madeira.

— Estou lutando com uma planta — relatou a loira, apontando para as folhas verdes.

— E perdendo — complementou Kenan, e Clarissa respondeu com uma careta. Lucas riu, enquanto atravessava o salão, mas logo a expressão descontraída se transformou em seriedade. Clarissa evitou encarar Elisa, que entrou logo atrás dele.

— O Concílio quer falar com você e com Lena. Eles interrogaram Ethan e, aparentemente, ele confirmou todas as mentiras de Lynn — disse, tensionando o maxilar com irritação. Kenan franziu as sobrancelhas, mas já estava se levantando. — Elisa não consegue se lembrar dos acontecimentos, você é a pessoa mais envolvida na investigação, eles querem te interrogar — completou, quando Kenan já estava de pé e pronto para sair do salão. Clarissa afundou na própria cadeira. Não duvidava que quisessem lhe interrogar também, mas estava torcendo para que os interrogatórios permanecessem apenas nos envolvidos com a investigação.

— Continue tentando — insistiu Kenan, quando já estava se virando apressadamente e se afastando. Clarissa cruzou os braços quando se voltou para Elisa.

— O que você está fazendo aqui? — perguntou, quando percebeu que Lucas e Kenan estavam saindo e que ficaria sozinha com a ruiva. Elisa puxou uma cadeira e sentou-se, o olhar perdido mostrando que não sabia onde começar. Clarissa estava impaciente.

— Me desculpe. Fui idiota, nunca deveria ter falado aquilo — disse, e a outra não exibiu reação, continuava lhe encarando com frieza. O cabelo loiro tinha uma aura de luz que cintilava contra o salão, os cachinhos espiralando como ondas. — Eu só estava perdida e sufocada, ele era o único que não me conhecia e que não esperava algo de mim — murmurou e então se inclinou sobre a mesa, puxando algo do bolso do casaco que usava. Clarissa ficou surpresa quando viu que ela estava espalhando as fotos por cima da mesa, organizando-as lado a lado e formando um mural. — Eu passei um bom tempo encarando estas fotos, mas é como investigar a vida de outra pessoa. Eu poderia voltar a cantar e tocar piano, poderia recuperar meus poderes e voltar ao posto de comandante do exército, mas ainda não seria a Elisa que você conheceu — confessou, olhando para as fotografias. Clarissa também havia baixado o olhar e encarava tudo aquilo, toda sua história com Elisa, tudo o que fora jogado no lixo desde que voltaram da dimensão infernal. — É horrível bater em um muro branco toda vez que te vejo, olhar para essas fotos e perceber que não há nada para me lembrar. Se houvesse uma maneira de recuperar minhas memórias, eu ficaria feliz, mas não quero passar a eternidade apegada a um passado do qual não fiz parte — desabafou, levantando o olhar para Clarissa. Sentiu um aperto na garganta quando a encarou, desejando ver a Elisa que conhecia, a Elisa das fotos.

Sentia que estava encarando uma estranha ali, o que tornava tudo pior. Era como se outra pessoa de repente substituísse a Elisa que amava.

— Então o que você sugere? — perguntou, seus sentimentos conflitantes escorrendo pela voz incerta. A ruiva mordeu os lábios, passando a mão pela mesa e arrastando as fotos até que elas estivessem organizadas em uma pequena pilha, quase como um livreto.

— Me dê mais uma chance — suplicou, esticando a pilha de fotografias para que Clarissa pegasse. A loira entendeu o significado daquele gesto: Ela estava desistindo do passado, desistindo de procurar mais sobre quem costumava ser. — Me deixe te conhecer e, ao mesmo tempo, me conheça. Vamos parar de insistir no passado, é mais fácil seguir pensando em quem posso me tornar do que tentar ser algo que não sou. Desde que você apareceu na biblioteca, só consigo pensar em como você foi corajosa ao se impor, em como sua risada é bonita, como seus olhos brilham quando está falando de algo que gosta e, de algum modo, tudo fez sentido quando Lena disse que namorávamos — disse, ainda com o olhar baixo e a expressão insegura ao encarar Clarissa. A loira não tinha reação, estava entre conter as lágrimas que sentia nos olhos e querer abraçá-la, jogar-se em seus braços como se isso fosse melhorar algo. — Eu sei que talvez seja difícil deixar para trás tudo o que vivemos juntas, mas estou pedindo para que foque no que ainda podemos ter. Me mostre o motivo de eu ter me apaixonado por você, me mostre quem você é e eu farei o máximo para que isso dê certo. — Clarissa precisou desviar o olhar, sem encarar aquela expressão cheia de expectativas que conhecia tão bem.

Ela não entendia. Ela não entendia quão bagunçada e perdida estava. Não fazia tanto tempo que estava naquela dimensão, afinal, e ainda era difícil quando pensava sobre aquilo. Elisa lhe dava estabilidade para se acalmar e continuar, lhe garantia que ainda estaria ali quando se quebrasse. O relacionamento com Elisa era um ponto de fuga, algo em que sabia que podia confiar de olhos fechados.

Depois de Asmodeus, realmente se sentia perdida. Queria seus pais, queria sentir alguma familiaridade para se confortar, queria segurança. Aquela Elisa não poderia lhe oferecer nada disso e, pelo contrário, parecia trazer ainda mais bagunça emocional, mais do que podia aguentar sem desabar. Conseguiria tentar em outra ocasião, mas não estava preparada para aquilo no momento.

— Me desculpe, Elisa, não acho que estou bem o suficiente para me esforçar em um relacionamento enquanto você tenta — murmurou, mas sem usar o tom frio de sempre. Só foi sincera, mantendo a voz baixa e embargada enquanto se levantava. Não achava que algo de bom pudesse sair daquela conversa. — Não vou bancar sua babá moral e não preciso de um relacionamento incerto com alguém que resolveu transar com o primeiro cara detestável que apareceu — disse, já se afastando e agora com certa amargura transparecendo nas palavras. Kenan e a planta que se danem.

— Cass — chamou ela, quando estava acelerando o passo para atravessar o cômodo e ouviu a ruiva correndo em sua direção. Elisa segurou seu pulso e Clarissa se virou antes que ela tivesse a chance de falar.

De repente, elas estavam muito mais próximas do que deveriam e aquilo deixou Clarissa zonza. Por um momento, as duas ficaram caladas, se encarando. Fitou os olhos castanhos de Elisa, sentindo algo se apertar dentro de si.

Ela parecia humana. Humana como era quando lhe conheceu no ensino médio. Humana como quando pediam pizza e ficavam rindo no sofá. Humana como quando lhe abraçava em todas as suas memórias. Clarissa vacilou por um momento, a dúvida crescendo dentro de si.

— Você quer saber o motivo de ter se apaixonado por mim? — murmurou, com um riso baixo. Hesitaram um pouco, em silêncio. Quase podia sentir a pulsação ao redor de Elisa, como se ela fosse um ímã lhe atraindo. Clarissa inclinou-se apenas um pouco, tocando os lábios dela com os seus e tentando fazer cessar a dúvida dentro de si. Elisa a envolveu contra seu corpo, puxando-a, e Clarissa tentou sentir tudo o que sentia antes, tentou achar alguma forma de fazer aquilo dar certo. Só sobrava uma sensação de que estava fazendo algo errado, de que não deveria beijá-la, pois não soava como antes. Depois de alguns segundos, sentiu uma pontada de conforto e então se afastou. — Isso é parte dele — sussurrou, baixando o olhar. Elisa parecia tão confusa e em dúvida quanto Clarissa, sem certeza do que aquele beijo significava.

Elas se olharam mais uma vez e, por um instante, Elisa quase achou que Clarissa ia se inclinar e lhe beijar de novo, mas a loira suspirou e virou-se para se afastar. A ruiva não foi atrás desta vez, permaneceu parada no salão como uma criança chorosa que havia se perdido dos pais.

— O que preciso fazer para te convencer? — perguntou ela, aflita. Clarissa parou, já com a mão na maçaneta. Ela não se virou, continuou encarando os entalhes de madeira na porta.

— Talvez eu me convença quando achar que suas palavras são verdadeiras, mas realmente não sei se posso confiar na sua sinceridade agora e não quero acabar me magoando de novo — respondeu, por fim, e deixou Elisa sozinha no salão silencioso.

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