Capítulo 6
O restante da manhã passa voando com Mel entretida com os brinquedos e eu perdido em pensamentos enquanto a observo.
— Está com fome, princesa? – pergunto quando vejo que já está na hora do almoço.
Ela tira os olhos da boneca que tem nas mãos e se vira para mim.
— Muita tio Rule.
— Que tal irmos comer alguma coisa? — Mel olha para os brinquedos e parece em dúvida. — Quando voltarmos você pode brincar mais – acrescento.
— Posso mesmo? — pergunta.
— Claro, já disse que a partir de agora pode brincar com o que quiser. Tudo o que tem aqui é seu.
Ela abre um de seus lindos sorrisos e corre para os meus braços para me abraçar.
— Você é demais tio Rule. — Mel deposita um beijo na minha bochecha e se encolhe dando risadas quando minha barba faz cocegas em seus lábios. – Sua baba faz cosquinhas – diz risonha.
— Vou tira-la depois, tudo bem. Agora vejamos, o que você quer comer?
Mel me olha com ar pensativo. Um minúsculo dedo no queixo como se avaliasse o que pedir.
— Pode ser batata fita?
— Batata frita? — pergunto e ela assente com a cabeça. — Com muito ketchup? – pergunto escondendo uma risada.
— Com muittooooooo ketchup! – grita.
— Então pode.
Mel pula animada e começa a me puxar porta a fora.
— Vamos logo tio, eu quero muito comer e voltar para bincar com meus binquedos.
— Vamos correr então. Quer ir de cavalinho?
— Sim – grita e volta a pular animada.
A pego em meus braços e a coloco sentada em meus ombros. Sua risada ecoando pela casa.
— Segura Mel, vamos ter um pouco de turbulência.
Seguro bem em seus braços e desço as escadas como se estivesse a ponto de cair, Mel adora e me encoraja a ir cada vez mais rápido.
Decido leva-la até o bar da Lucy, lá é um ambiente agradável e familiar, apesar dos homens que frequentam o lugar a noite. Assim que entramos pela porta Lucy vem nos receber.
— Veja o que temos por aqui. Quem seria essa menina linda com você, Rule?
Mel se esconde atrás das minhas pernas envergonhada. Já percebi que por algum motivo ela é mito fechada e não gosta de ir com estranhos, não sei como se apegou tanto a mim.
— Mel, essa é Lucy, uma grande amiga minha e umas das melhores cozinheiras da região. Lucy essa é Mel, uma pequena/grande amiga que está morrendo de fome e quer batata frita com muitooo ketchup.
— Bem vinda Mel – Lucy diz sorridente e estende a mão para Mel.
— Obigada — Mel responde acanhada, mas estende a mão.
— Venham, vou separar uma mesa para vocês.
Lucy nos leva até uma mesa no canto e anota nossos pedidos. Comemos entre muitas brincadeiras e risadas. Varias pessoas nos olhavam, principalmente para Mel, ela é uma criança muito esperta e conquista a todos por onde passa. Seu jeito tímido e acanhado parece chamar ainda mais atenção.
— Gostou da comida, Mel? – Lucy pergunta quando vem retirar os pratos.
— Muito. O homem mau não deixava a gente comer bata fita — Mel responde animada.
Homem mau? No momento em que vou perguntar sobre esse tal homem mau, Lucy vem retirar a mesa.
— O que vão querer para a sobremesa? Acabei de retirar do forno uma torta de maça que está deliciosa. O que acha Mel, quer um pedaço? — Lucy pergunta, mas minha cabeça está no que Mel acabou de falar.
— Eu posso tio Rule? — pergunta.
— Claro, meu anjo. Lucy nos traga dois pedaços de torta, por favor.
— Claro.
Lucy sai para pegar os pedaços de torta e aproveito para perguntar para Mel sobre esse tal homem mau.
— Mel, meu anjo. Quem é o homem mau que não te deixava comer batata frita?
Seus olhos encontram os meus e ela parece com medo de algo. Suas mãozinhas brincam com o guardanapo. Mel volta seu olhar para a mesa e então fala tão baixo que quase não consigo ouvir.
— A mamãe disse que eu não posso contar pra ninguém tio Rule.
Só pode ser por isso que elas estavam em um carro sem documentos ou qualquer tipo de identificação. Só poderiam estar fugindo de alguém. Percebo que Mel esta desconfortável e por maior que seja minha curiosidade nesse momento decido não perguntar mais nada por enquanto.
— Tudo bem, princesa. Mas eu quero que se lembre que eu só quero o seu bem e da sua mamãe. Então pode me contar tudo o que quiser, tudo bem?
Ela balança a cabeça em sinal afirmativo e Lucy volta com os pedaços de torta.
— Aqui está. Um pra você — diz ao colocar um pedaço para Mel. — E outro pra você. Espero que gostem, qualquer coisa é só me chamarem.
— Obrigado Lucy.
— Obigado.
Comemos nossa torta em silêncio, até que meu telefone toca.
— Alô! – Atendo sem ao menos ver quem é.
— Rule querido, fui até o abrigo ver a Mel e elas me disseram que está com você — Nancy fala do outro lado da linha.
— Me perdoe Nancy, acabei esquecendo de te avisar. Viemos almoçar aqui no bar da Lucy, mas já estamos voltando pra casa.
— Será que eu poderia visita-los? – pergunta receosa. O que não é de se estranhar depois do meu comportamento idiota nos últimos dias, ou anos.
— Claro, seria um prazer.
— Perfeito, vou pedir que Scoth me leve até lá daqui a pouco.
— Ótimo, eu preciso mesmo falar com ele.
— Então até daqui a pouco querido.
— Até.
Guardo o telefone no bolso e Mel me olha curiosa.
— Princesa, você ficaria um pouco com a tia Nancy enquanto vou ao mercado – pergunto para Mel.
— Sim – responde animada. Nancy já a conquistou.
— Então vamos pra casa que ela está indo pra lá.
— Eu posso mostrar meu quarto pa ela? — pergunta.
— Claro que pode, princesa.
— Eba!
Pago a conta e voltamos pra casa. Assim que entramos Mel corre para as escadas, rumo ao quarto. Uma meia hora depois Nancy e Scoth chegam. Assim que a campainha toca Mel corre para atender.
— Tia Nancy — grita e se joga para Nancy que a recebe de braços abertos.
— Princesa, estava com saudades já.
— Tia, eu tenho um quato tão lindo. Você quê vê?
— Eu adoraria.
Mel começa a arrastar Nancy para as escadas.
— Nancy você se importa de olhar Mel enquanto vou até o mercado com Scoth? – pergunto.
— Será um prazer, podem ir tranquilos.
— Obrigada. Já volto, princesa – digo e aceno para Mel que está impaciente para mostrar logo seu quarto para Nancy.
— Tchau tio Rule.
— Ela nem viu que eu estava aqui — Scoth finalmente fala.
— Mel está muito animada com o quarto. Não foi por mal — explico e ele assente.
— Nancy disse que você queria falar comigo. Aconteceu alguma coisa? – pergunta, sua expressão se tornando preocupada.
— Me dá uma carona até o mercado que te explico tudo no caminho.
— Claro, vamos.
Entramos no carro e no caminho explico para Scoth tudo o que aconteceu.
— Você tem toda razão, provavelmente elas estavam fugindo. Mas de quem? E por quê? — Scoth fala quando termino de contar.
— Isso teremos que descobrir. Elas podem estar correndo perigo.
Só de pensar que Mel pode estar correndo perigo meu sangue ferve.
— Não se preocupe Rule, nada de mal irá acontecer com nenhuma das duas.
— Deus te ouça.
— Vou passar tudo para o departamento de polícia. Enquanto isso você pode tentar descobrir mais alguma coisa com a Mel.
— Vou tentar, mas não posso garantir muita coisa.
— Qualquer coisa que conseguir estaremos no lucro. Em todos os meus anos nunca vi alguém que não pudesse ser identificado de alguma forma. Por mais difícil que seja, nós vamos descobrir tudo mais cedo ou mais tarde.
— A mãe dela continua no mesmo estado? — pergunto.
— Na mesma. Os médicos disseram que o quadro dela está estável. Ao mesmo tempo que isso é bom, não podemos ter muitas esperanças.
— Ela precisa se recuperar – digo exasperado.
— Não vamos perder a fé Rule. Tudo vai ficar bem. A propósito eu conversei com Holt e expliquei a situação – fala cauteloso. Com toda essa confusão acabei me esquecendo desse assunto. Acho que agora com todas essas circunstâncias ficar afastado talvez não seja uma má ideia.
— E...?
— E consegui convencê-lo a te dar férias prolongadas ao invés de um afastamento.
Scoth é o melhor homem que conheci em toda a minha vida, não tenho palavras para agradecer tudo o que ele faz por mim. Mesmo quando não mereço.
— Obrigado Scoth, por tudo — agradeço, pois não sei mais o que dizer.
— Você pra mim é com um filho Rule, não tem o que agradecer.
— Tenho sim. Agradecer e também me desculpar pelo modo como agi esse últimos anos. Você tinha toda razão quando disse que está na hora de mudar minha vida, e é isso o que vou fazer Scoth.
Ele tira os olhos da estrada e me encara. Seus olhos cintilam com algo que ouso dizer ser orgulho, mas também um carinho tão grande que você realmente só vê nos olhos de um pai.
— Eu só quero que você seja feliz, Rule.
Compro tudo o que preciso para abastecer a dispensa de casa e também algumas coisas pessoais para Mel. A mochila que achamos no carro contém poucas roupas e nada de objetos pessoais. Então achei melhor providenciar tudo o que ela precisa.
Voltamos para casa já no final da tarde. Nancy preparou o jantar e logo depois ela e Scoth foram embora. Coloquei Mel na cama, fui tomar um banho e fui tentar dormir, mas os acontecimentos de hoje não saíram da minha cabeça.
Quem será que poderia, ou pode, querer fazer mal as duas?
***
— Entre — grito para a pessoa que bate na porta.
— Com licença, senhor.
— Alguma novidade? – pergunto ansioso.
— Por enquanto não. Mas vamos acha-las.
— Claro que irão acha-las. Ou vocês irão pagar muito caro por isso. Estamos entendidos? – grito.
Os olhos do homem a minha frente demonstram o medo que ele sente nesse momento.
— Claro senhor.
— Agora saia da minha frente.
O homem sai e volto a ficar sozinho. Giro minha cadeira e me deparo com a paisagem do enorme jardim. Minha casa, meu dinheiro. Não posso permitir que tudo vá por agua abaixo por causa de uma vadia qualquer.
— Eu irei acha-la, pode ter certeza. E então vai aprender a nunca mais vai abrir o bico para falar nada.
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