Capítulo um
Coração fechado, mas os olhos abertos podem ser a chave.
Capítulo um
Othon
Eram sete horas da manhã de uma segunda-feira e eu estava de pé na sala da enorme mansão dos Fontenelles. Eu já usava um terno, um rádio com fone de comunicação e tinha as minhas mãos pousadas na frente do corpo em uma pose de espera. Meu rosto sério e compenetrado, focava nas instruções que me eram passadas naquele momento.
⸺ Vocês terão que proteger essa família como se fosse a família de vocês ⸺ falou o chefe da segurança, enquanto eu e os demais seguranças recém-contratados estávamos enfileirados e de frente para a família que nos observava com atenção. ⸺ Cada um de nós teremos um membro da família para proteger como se fosse uma parte do nosso corpo.
Gerson, o chefe da segurança, era um cara forte, branco e com sobrancelhas grossas que o deixava com cara de mau, ele falava de forma dramática e ao mesmo tempo concisa, talvez fosse o modo que ele achou de nos alarmar e ao mesmo tempo manter a calma, além da forma sucinta de demonstrar como deveríamos agir ali e qual era o nosso lugar naquela família: o de sombra, sem voz e, às vezes, até invisível.
Eu e os demais seguranças éramos observados por uma família acomodada no grande sofá branco da sala em que estávamos, os quatro eram a personificação da família aristocrata e eu tinha certeza, só de olhá-los, que aquela riqueza toda era herança vinda de gerações. Todos naquele sofá emanavam ar de superioridade e até mesmo arrogância e eu discretamente comecei a encarar um a um, enquanto ainda ouvia o Gerson falar.
A família era formada por um senhor branco com cara de magnata, cabelos grisalhos e olhar hostil, ao seu lado uma senhora também com cabelos grisalhos, mas com cada fio no lugar e aparentemente jovem para o marido, nos encarava com impaciência e tinha olhos tão azuis que de longe pareciam até que não tinham cor, já na outra ponta do sofá um homem por volta dos trinta anos e com os mesmos olhos azuis e olhar impaciente da mãe, nos observa enquanto conferia seguidas vezes o relógio em seu pulso e era advertido pela mulher ao seu lado, sua esposa, que tinha seu cabelo preto e liso, na altura dos ombros e perfeitamente escovados, além de uma maquiagem perfeita àquela hora da manhã, entregando a dondoca que era.
⸺ Cada um de nós vamos ficar com um membro da família, escolhido por eles. Eu acompanharei o senhor Bernardo, Jackson a senhora Nice, Ricardo o senhor Pietro e Othon acompanhará a Isabela. ⸺ Assenti, tentando disfarçar a minha decepção quando ouvi meu nome sendo citado por último e me informando que eu acompanharia a dondoca mais nova. Droga!
Troquei um rápido olhar com a mulher que me encarava do sofá, mas voltei a encarar o Gerson, após Ricardo que estava ao meu lado, ter usado discretamente seu cotovelo para me cutucar. Eu sabia o motivo do cutucão, era por eu ter tido o azar de ter sido escolhido para proteger Isabela, já que no dia anterior recebemos o perfil de cada um dos protegidos e todos nós gostaríamos de ter caído com a senhora Nice que ficava a maior parte do tempo em casa e quem a protegesse teria o serviço mais tranquilo, pensando melhor, eu preferia mesmo ter caído com o seu marido, a ter que ficar seguindo uma mulher para programas de mulheres.
Percebi quando Pietro, o homem mais jovem, se levantou do sofá e foi andando em nossa direção, acompanhado pelo resto da família e disse:
⸺ Já que está tudo certo e a divisão já foi feita, podemos sair, Gerson? Estamos quase atrasados para a reunião na empresa.
⸺ Tudo certo, senhor Pietro, ontem passei mais ou menos o itinerário da família para todos os seguranças, então eles já estão familiarizados com a rotina de cada um de vocês. Só faltava mesmo vocês me passarem quem ficaria com quem.
⸺ Ok. Então vamos, pai? ⸺ perguntou Pietro.
O senhor Bernardo assentiu, pegou a sua maleta que estava em uma mesa próxima e seguiu dando apenas um meneio de cabeça para o Ricardo que seria seu segurança naquele dia no lugar de Gerson que ficaria na casa. Com isso Pietro e o pai dividiriam o segurança e o carro e saíram da sala após uma despedida rápida dada as mulheres. Dona Nice subiu para o seu quarto dizendo que estava muito cedo para fazer qualquer coisa e disse também que se precisasse sair avisaria ao Jackson. Ao observá-la subir fiquei me perguntando: se ela ia voltar a dormir, qual o objetivo de arrumar o cabelo em um coque tão perfeito e fazer uma maquiagem, tão cedo?
⸺ Othon, vou até meu quarto e vou ter que sair daqui em mais ou menos uma hora ⸺ falou Isabela, entre um olhar sério.
⸺ Tudo bem, senhora, eu estarei pronto.
⸺ Não precisa me chamar de senhora, pode me chamar só de Isabela como todos os outros funcionários.
Dei um meneio de cabeça, mas enquanto a observava subir os degraus da escada, pensei que seria estranho chamá-la pelo nome, mesmo que ela preferisse assim. Vi quando ela se virou rumo ao seu quarto e sumiu do meu campo de visão.
No dia anterior fomos apresentados a casa e inspecionamos atentamente a planta que apresentava cada canto e cômodo e por isso sabíamos exatamente onde cada membro daquela família dormia e todas as suas rotinas.
⸺ Será que é cabeleireiro ou shopping que você vai com ela, hein, Othon? ⸺ Jackson me provocou.
⸺ Olha o respeito com os patrões, Jackson! ⸺ Gerson o advertiu e fomos andando em direção a cozinha.
Gerson era tio do Jackson, já trabalhava naquela casa há muitos anos e foi ele quem nos convidou para trabalhar como seguranças, quando a família começou a receber ameaças de um suposto assassino, que já tinha atentado contra a empresa de Mineração que a família era dona e como o meu antigo emprego já não precisava tanto dos meus serviços, logo topei. Pelo o que eu soube pelo Jackson, seu tio era solitário e fechado, morava apenas com seus cachorros e nunca havia sido casado. Talvez por isso ele fosse tão sério, mas quem era eu para julgar alguém por seriedade, quando eu era mais fechado que uma ostra.
Eu e meus três amigos crescemos na mesma rua e eles sabiam tudo da minha vida, viram quando fui morar com a minha tia aos nove anos, após meu pai e mãe terem sido assassinados pelos traficantes ao qual ele devia, viram quando perdi minha tia que foi como uma mãe para mim e viram quando finalmente pensei que seria feliz e um tiro tirou a vida da minha namorada e do meu filho que ela esperava, desde então viram eu me tornar o cara sem alegria que eu era naquele momento e que descontava a frustação de uma vida sem cor no Muay Thai e em várias outras técnicas de defesa pessoal para proteger pessoas desconhecidas, como se isso fosse ajudar na decepção de não ter sido capaz de evitar que as pessoas que eu amei fossem tiradas da minha vida.
Revirei os olhos para o que meu amigo tinha dito e falei:
⸺ Independente de onde ela for, eu a protegerei.
Jackson sorriu e ia dizer alguma coisa, mas foi interrompido por Selma, que era uma das empregadas e entrava na cozinha.
⸺ Querem comer algo no café, rapazes? ⸺ nos perguntou.
⸺ Podemos comer? ⸺ perguntei, achando estranho aquela bondade.
⸺ Claro. Nos horários das refeições podemos comer à vontade.
Assenti.
⸺ Eu aceito um café ⸺ Gerson disse.
Selma o serviu e perguntou o que eu queria, mas apenas a respondi sério:
⸺ Por favor, apenas água.
Ela me olhou estranhando o meu jeito contido, talvez já acostumada com a simpatia dos demais e Jackson a tranquilizou:
⸺ Não liga para a rispidez dele, Selma, o Othon é uma boa pessoa, mas parece um velho rabugento de noventa anos. ⸺ Selma me serviu a água, sorrindo. Tínhamos a conhecido um dia antes, mas ela já era íntima de todos, menos de mim, claro. ⸺ Além de que, Othon também está bravinho com a ideia de ter que proteger a Isabela, ele não queria ser o segurança dela.
No mesmo momento em que Jackson terminou a frase, vi que o olhar da Selma se voltou para alguém atrás de mim e quando voltei meu olhar na direção em que ela olhava, parada na porta da cozinha estava Isabela e ela quando viu que a notamos, falou imediatamente para mim:
⸺ Othon, podemos sair quando estiver pronto, um pouco antes do combinado, por favor?
Me coloquei de pé prontamente e respondi:
⸺ Claro, podemos ir quando quiser.
⸺ Te espero na porta da frente e Gerson, minha sogra pediu para que fosse até seu quarto, ela tem algumas dúvidas, mas está indisposta para descer ⸺ falou e saiu.
Lancei um olhar reprovador para Jackson que parecia arrependido, depois saí da cozinha e me dirigi para a garagem para buscar o carro da Isabela. Dessa parte do serviço eu gostei, dirigir me manteria ocupado enquanto estivesse no mesmo carro com ela, além de eu não ter que interagir com mais uma pessoa no carro, caso além de mim tivesse um motorista.
Fui o primeiro a dizer que realmente era bom fazermos o trabalho de motorista quando nos foi avisado sobre isso, eles achavam que o corte de mais um profissional ajudaria na segurança da família, além de que ganharíamos um salário a mais por fazer dois trabalhos e eu queria mesmo era o dinheiro, que na verdade eu nem ia gastar, mas eu tinha adquirido uma mania de juntá-lo.
Saí da garagem com o luxuoso carro preto e segui para a frente da grande casa construída no estilo medieval, era toda em blocos aparentes de cor cinza e trepadeiras verdes subiam pelas paredes, dando vida a casa. Tinha uma grande porta de madeira, com pilastras em formato cilíndrico em cada lateral, que davam um ar imponente e deixavam a entrada principal parecendo um castelo e foi em frente a grande porta com poucos degraus a sua frente, que eu parei o carro para esperar Isabela. Não demorou nada e usando óculos escuros, ela saiu pela porta, foi andando em direção ao carro e entrou no banco de trás.
Sem me olhar, enquanto eu a olhava pelo retrovisor, disse que podíamos ir para a biblioteca pública da cidade. Pensei que graças a Deus não era Shopping. Assenti e comecei a movimentar o carro pela estrada de pedregulho dentro da propriedade, que de ambos os lados tinha um jardim bem cuidado, seguindo até o grande portão verde também no estilo medieval, mas modernizado e automático. A casa parecia um palácio no meio da cidade.
Isabela e eu fomos o caminho em silêncio, até que ela parecendo desconfortável me pediu:
⸺ Pode ligar o rádio, por favor?
⸺ Claro. ⸺ Comecei a mudar a estação do rádio e sem saber onde parar por não conhecer o gosto musical dela, perguntei:
⸺ Tem algo que queira ouvir?
⸺ Qualquer coisa. Coloque algo que você gosta.
A encarei pelo retrovisor, ela estava sem os óculos escuros naquele momento e me encarou de volta. Quebrei o contato visual e conectei o meu celular ao dispositivo de som, depois deixei a minha playlist tocar e logo começou da Creed. Isabela quando ouviu os acordes da música colocou os óculos novamente e voltou seu olhar para fora do carro como se estivesse apreciando a música, a próxima música era Don't stop dancing também da Creed e como ela não pediu para trocar eu deixei tocar, então ao final da segunda música ela me disse:
⸺ Letras tristes e de incentivo. ⸺ Meu olhar cruzou mais uma vez com o dela pelo retrovisor e apenas dei um sorriso sem vontade, quando mais uma música triste que me deu força em momentos tão difíceis começava a tocar e era que falava sobre todos nós termos paz dentro de nós e isso que nos ajudava a seguir.
⸺ Quer que eu mude, senhora? ⸺ perguntei.
⸺ Não, pode deixar tocar. E, Othon, por favor, só Isabela.
⸺ Me desculpe, é o costume.
⸺ Desacostume. Todos na casa só me chamam de Isabela e com você não precisa ser diferente. ⸺ Ela não era simpática e eu preferia assim, então apenas assenti em resposta
Ficamos em silêncio novamente e as minhas músicas de sempre continuaram tocando enquanto seguíamos até a biblioteca. Assim que o destino foi se aproximando comecei a olhar para todos os lados, cantos e para pontos em que um possível assassino pudesse estar à espreita. Vagarosamente estacionei o carro em frente à biblioteca, saí dele e enquanto fechava o botão do meu paletó a caminho da porta da Isabela, eu observava tudo, quando ela viu que eu estava a postos resolveu sair do carro e rapidamente subimos a pequena escada que levava até a porta da biblioteca. Assim que entramos varri o local com o olhar enquanto Isabela falava com a moça sorridente na recepção, que em seguida saiu como se fosse chamar alguém.
⸺ Você não precisa ficar assim tão próximo de mim, pode ir circular se quiser e quando eu terminar te chamo.
⸺ Preciso, senhora... Desculpe... Isabela. Essa é o meu trabalho ⸺ falei, olhando em volta e com as mãos na frente do corpo, na típica posição de segurança.
Quando rapidamente voltei a olhá-la, a vi torcer a boca em desagrado.
⸺ Tudo bem, então faça seu trabalho, apesar de eu saber que você não gosta de fazê-lo.
⸺ Eu trabalho de segurança desde que larguei a faculdade de letras e gosto muito do meu trabalho ⸺ falei, enquanto olhava em volta.
⸺ Sim, gosta de ser segurança, só não gosta de ser o meu segurança. Ouvi o outro segurança falando sobre a sua preferência de não querer me proteger.
Tirei os olhos do salão da biblioteca onde estávamos e a encarei olhando em seus olhos.
⸺ Me desculpe, mas eu preferia mesmo ficar com qualquer um dos outros membros da família, nada pessoal, apenas que eu não sei lidar muito bem com o mundo feminino de shopping, cabeleireiro, manicure e essas coisas, porém, eu estou à sua disposição.
Ela me encarou parecendo ofendida, mas nesse momento a outra pessoa que a recepcionista havia ido chamar apareceu e cumprimentou Isabela com alegria. Ambas seguiram pelo corredor e depois entraram em uma grande sala onde tinham umas trinta crianças sentadas em um círculo e assim que viram Isabela entrar, aplaudiram com muito fervor demonstrando em seus rostos sorridentes a felicidade em vê-la. Examinei a sala e fiquei parado na porta de olho em tudo ali e em cada movimento, até que Isabela foi até mim e disse:
⸺ Sei que ser carregador não faz parte do seu trabalho, mas poderia pegar uma caixa de papelão que deixei no porta-malas do carro, por favor?
⸺ Claro, mas não saia daqui até eu voltar. ⸺ Ela ergueu a sobrancelha com o rosto sério e até achei que ia revirar os olhos, mas não fez. Tive vontade de rir, mas me segurei.
Rapidamente a busquei e voltei com uma grande caixa de papelão um tanto pesada. A coloquei sobre uma mesa dentro da sala que Isabela estava e quando a olhei indicando que tinha feito o que ela pediu, com um sorriso e um meneio de cabeça ela me agradeceu.
Voltei a assumir meu posto na porta e do lado de fora da sala, de onde eu conseguia ver a entrada do lugar e todo espaço onde Isabela estava, lá dentro ela sentou-se em uma cadeira de frente para as crianças, pegou um livro e começou a ler para elas, que riam, cantavam e pareciam muito interessadas em tudo que Isabela contava, enquanto eu, parado na porta, me revezava entre prestar atenção na história e ao mesmo tempo em cada movimento a nossa volta.
Isabela ria feliz com a interação com as crianças, que pela aparência percebi que não serem do mesmo nível financeiro que o seu e que ela estava fazendo aquilo como voluntária, aí eu a admirei por aquele gesto e pensei que a dondoca talvez tivesse coração e não fosse só futilidade.
A leitura acabou e um momento incrível aconteceu em seguida, quando Isabela foi até a caixa que eu havia retirado do carro e de dentro dela tirou sacos coloridos e amarrados como se fossem presentes e feliz distribuiu para as crianças. Dentro de cada saco tinha um kit com brinquedos, guloseimas e material escolar, vi em cada rostinho a alegria de receber aquele presente e o sorriso no rosto da Isabela era maior do que o das crianças.
Depois de mais ou menos duas horas na biblioteca fomos embora e ao se despedir da mulher que tomava conta do espaço, Isabela prometeu que tentaria voltar em breve e então saímos em direção ao carro. Eu novamente andei observando tudo e cada canto, e já dentro do veículo a perguntei se tinha mais algum lugar em que gostaria de ir, mas Isabela negou e então partimos de volta para a casa.
No caminho, mais uma vez ela pediu para que eu colocasse uma música e novamente coloquei minha playlist triste.
Depois de um tempo ouvindo as músicas que eu coloquei e parecendo mais leve, depois de interagir com as crianças, Isabela falou chamando a minha atenção:
⸺ Sabe, estou me perguntando por que tanta melancolia... Tantas músicas tristes. ⸺ Sorriu.
⸺ Aprendi a gostar.
⸺ Aprendeu?
Apenas assenti em resposta a sua pergunta e em seguida vi pelo retrovisor quando ela voltou a olhar para fora do carro como se não fosse dizer mais nada, porém, imediatamente como se quisesse saber mais sobre o que eu tinha dito, me perguntou:
⸺ Algum motivo para ouvi-las?
⸺ Ouvir música sempre foi a terapia que organizou meus sentimentos e eu tive muitos momentos em minha vida em que precisei ouvir algo que me dissesse que eu não era o único passando por momentos difíceis, com essas eu pensava que tinham pessoas passando por momentos mil vezes mais difíceis que o meu e isso me dava força. ⸺ Talvez eu estivesse falando demais e percebi que Isabela ficou em silêncio como se o que tinha acabado de falar tivesse mexido com ela e em silêncio seguimos, até que parei em frente à porta principal da mansão e antes de descer do carro Isabela falou parecendo envergonhada:
⸺ Othon, você pode, por favor, não comentar com o meu marido que eu fui até a biblioteca?
⸺ Ele já sabe. Ligou no momento em que você contava a história e eu passei tudo para ele.
Em um movimento totalmente involuntário ela torceu levemente a boca parecendo descontente e assentiu, em seguida desceu do carro e entrou na casa. Fiquei olhando-a subir pensando que depois da primeira impressão eu podia dizer que a Isabela não era tão ruim como eu pensava e nas poucas horas que passei com ela, eu já conseguia ver mais um ar solidário do que o ar de superioridade em seu rosto, diferente do que eu tinha visto mais cedo.
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