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Capítulo 5

Você pode se fechar para se preservar, mas talvez, deixar alguém entrar seja o caminho para se curar e se abrir para a felicidade.


Capítulo cinco

Othon

Eu estava na janela vendo o dia amanhecer depois de cochilar em pé e acordar por diversas vezes preocupado e com a sensação de que algo tinha acontecido com a Isabela. Ela estava dormindo no sofá da sala onde depois da nossa conversa tão cheia de emoção e talvez por beber quase toda a garrafa de vinho, acabou dormindo e para não acordá-la eu acabei deixando-a ali mesmo e só procurei um cobertor e a cobri.

Me peguei pensando que mais tarde quando voltássemos para a mansão, ela seria massacrada pelo marido escroto dela e pelos sogros nojentos e a Isabela não merecia isso. Pensei que ela era tão bonita e gente boa, que merecia alguém que a amasse acima de tudo e pudesse a fazer feliz. A observei e ela dormia calmamente, deitada de lado e abraçada ao cobertor que eu joguei sobre ela, parecia em paz.

Fui até a cozinha e entre as coisas que ela havia levado procurei pó de café e encontrei. Abri os armários, achei a cafeteira e coloquei o café para fazer, depois encontrei bolachas e um bolo pronto. Ri comigo mesmo pensando que ela tinha levado comida para passar uma grande temporada ali. Depois do café pronto, levei tudo para a mesa e a arrumei bem mais ou menos, me servi do café e quando fui pousar a xícara no pires, peguei em falso e o movimento da xícara no pires fez um barulho que a acordou

— Bom dia — cumprimentei.

— Bom dia — ela respondeu, ainda sonolenta e parecendo envergonhada. — Eu desmaiei aqui, tanto vinho só podia ser sonífero. Ei, você dormiu?

Ri.

— Não, na verdade cochilei em pé enquanto observava a janela.

— Tadinhooo... Vem dormir agora que eu fico de guarda.

Sorri largamente.

— Obrigado, mas estou bem. Vem tomar café.

— O cheiro está ótimo. Já vou, me dá só um minuto.

Isabela saiu para ir ao banheiro e quando voltou havia prendido o cabelo em um rabo alto, tinha os olhos inchados de quem acabou de acordar e ela ficava muito bonita sem maquiagem. Foi direto para a mesa onde eu estava sentado e a esperando.

— Devo estar horrível, eu sei — falou, tímida quando viu que eu a encarava.

— Não acho, na verdade, estou te achando muito bonita.

— Sem maquiagem e com esse cabelo?

— O que tem de errado com seu cabelo?

Ela deu de ombros como se não soubesse responder.

— Com todo respeito, mas você fica linda sem maquiagem.

— Obrigada. — Me encarou e eu sorri

Ela se deliciou com o café e comeu um pedaço do bolo que ela havia levado.

— Você não vai comer?

— Não tenho costume de comer, só tomo um café puro mesmo.

Ela sorriu.

— Pois eu acordo com a fome que Jesus sentiu no deserto.

Ri da sua fome e a observei comer com vontade, quando percebi que ela havia terminado comecei o assunto que talvez ela não fosse gostar muito:

— Quando estiver pronta podemos ir.

Ela me olhou séria e disse:

— Você estragou meus planos...

— Desculpa, mas todos devem estar preocupados... — eu a interrompi e ela me interrompeu em seguida, levantando o indicador para falar:

— Você estragou meus planos, mas foi uma das melhores noites que eu tive nos últimos tempos. Preciso te agradecer por você ter sido a única pessoa com quem eu consegui falar.

A encarei sério e falei:

— Igualmente.

Isabela segurou o meu olhar e nos encaramos por alguns segundos em que senti o meu coração acelerar. Ela respirou fundo e disse quebrando o contato visual:

— Vou juntar as coisas e podemos ir.

Rapidamente juntamos tudo e colocamos as bolsas no carro, porém, quando saímos do chalé e no claro da manhã que ainda estava chuvosa, conseguimos ver o estrago das chuvas do dia anterior. Havia árvore quebrada e folhas para todos os lados e pensando no percurso para chegarmos até ali entre árvores e ribanceiras, achei melhor ligar a TV e esperar para ver se aparecia alguma notícia sobre as estradas. Entramos e assim que ligamos a TV da sala, a emissora local já exibia notícias sobre a ponte da cidade que rompeu e as diversas árvores que caíram, ilhando os moradores, além de ter deixado todos sem área de celular e telefone fixo. Os meteorologistas deram a previsão de mais chuva para toda semana e corria risco de mais deslizamentos, sendo assim, a indicação era para que todos ficassem em suas casas e não arriscassem sair delas, pois toda a área serrana estava em risco e em estado de alerta.

— E agora? — perguntei.

Ela levantou as sobrancelhas e quando eu achei que fosse ter um ataque, Isabela riu e disse:

— Sorte que eu trouxe muita comida. — Me fazendo rir também com o seu comentário.

— Então vamos ficar? Ou você quer tentar achar um caminho seguro?

— Não, claro que vamos ficar. Esse já era o meu plano inicial e não quero nos arriscar, além de que se pensarmos na ameaça que eu estava sofrendo, aqui não estou sofrendo mais, já que estamos ilhados.

— Tem razão. Bom, só penso em como vou ficar aqui sem roupa e sem nada — falei, só então pensando que eu precisava de um banho, uma escova de dente e roupas.

No momento em que terminei de falar, Isabela pareceu pensar, me pediu um minuto, foi até a parte de cima do chalé e logo depois voltou trazendo uma pilha de coisas.

— Desculpa, mas com o vinho e a intensidade de ontem, não pensei sobre isso e fui uma egoísta, mas olha — ela me entregou a pilha de coisas. ⸻, a gente sempre deixa coisas extras aqui e quando eu estive aqui com as minhas irmãs, nós repusemos o estoque e está tudo novo. Se quiser ir tomar banho fica à vontade e as toalhas estão nos armários nos banheiros. Ah, as roupas estão no guarda-roupas, não sei se o cheiro está muito bom apesar de estarem guardadas em saquinhos, são do Pietro e não sei se servem, mas é o que temos no momento. — Ela deu de ombros sem jeito.

— Está ótimo, obrigado.

— Olha, como não sei quanto tempo ficaremos aqui, tem três quartos na parte de cima e você pode escolher o seu que eu fico com qualquer um, porque não dá para você ficar dormindo na janela e de pé.

Eu ri e concordei:

— Tudo bem, então vou ficar com o da frente que eu consigo ver a entrada do chalé.

— Combinado e eu fico com o de frente para o seu.

Assenti.

Ok. Vou tomar banho.

Fui para o quarto e colocando os itens em cima da cama vi que tinha um kit de cuecas que ainda estavam embaladas e itens de higiene pessoal, com isso me preparei para o banho me perguntando como a minha vida pôde dar tantas voltas e eu fui acabar ali com a Isabela e quando pensei nela, uma sensação de conforto me invadiu, mas eu tinha que me manter distante, pois ela era a minha patroa, casada e demais para mim.

Mas o que eu estava pensando?

Tomei banho rapidamente por medo de deixá-la sozinha e algo acontecer, saí do banho e achei uma calça esportiva e uma camiseta preta de gola "V" a calça serviu e a camisa ficou um pouco apertada, mas estava bom já que era o que tinha e eu estava louco por um banho.

Quando desci Isabela estava lendo deitada no sofá e quando notou a minha presença abaixou o livro para me olhar, sorriu e falou:

— E não é que serviu!

Abri os braços, me olhei e respondi:

— Um pouco apertado, mas está bom, pelo menos eu pude tomar banho.

— Você é maior que o Pietro. — Sorri e me sentei na cadeira ao lado.

— Sim, um pouco.

Ficamos em silêncio e parecíamos estranhos novamente.

— Parece que hoje vai chover o dia todo de novo.

— Sim. — O típico falar do tempo quando não se tem assunto. — O que vamos fazer enquanto esperamos o tempo melhorar e possamos sair daqui? — perguntei.

— Está ansioso para se livrar de mim?

— Não — respondi apenas e ela parecia esperar que eu dissesse mais alguma coisa, porém a minha resposta foi apenas não. Eu não queria voltar para a mansão, pois não queria voltar para a minha vida sem cor, ali naquele chalé era como se eu tivesse voltado no tempo e era novamente o Othon de anos atrás e como se lesse o que eu estava pensando Isabela falou quando viu que eu não ia dizer mais nada:

— Nem parece você com essas roupas despojadas.

Ri.

— Me sinto como se não fosse mesmo.

Mais silêncio.

— Mas respondendo a sua pergunta, podemos andar a cavalo, nadar no rio, aproveitar a piscina ou velejar — falou, irônica. ⸻, mas como não queremos nada disso, podemos assistir à TV que só está pegando a emissora local ou escolher algum filme nos DVDs antigos. Eu e minhas irmãs trouxemos uma coleção de clássicos de romance quando viemos passar o fim de semana aqui. — Fiz uma careta.

— Romance? — perguntei e ela levantou uma sobrancelha.

— Qual o problema com romance?

— Não tem guerra? Ação? Terror?

— Não, apenas romance — falou, sorrindo orgulhosa da sua predileção por romance.

— Tudo bem, então vamos assistir algum.

Ela se levantou e foi até a estante, abriu a porta e tirou a caixa com vários DVDs falando os títulos conforme foi passando por eles:

— Uma linda mulher... Diário de uma paixão... Ghost... Tudo por amor... Tudo por amor é triste... Guarda-costas. Ah, esse eu amo as músicas... — falou empolgada das músicas do filme Guarda-costas, mas voltou a olhar para os DVDs e em silêncio quando percebeu o quão sugestivo era o filme, aí notando o seu desconforto eu sugeri:

— Nunca vi esse que você disse ser triste.

— Tudo por amor? Esse não, eu vou chorar e você vai rir de mim.

— Juro que não vou — falei cruzando os dedos e rindo.

— Você já está rindo. Vou colocar o Diário de uma paixão.

Isabela colocou o DVD no aparelho, sentou-se no sofá e se cobriu com o cobertor. Começamos a assistir ao filme e em menos de dez minutos de filme eu já estava desconfortável naquela cadeira de madeira que era pequena demais para mim.

— Othon, sente-se aqui, porque essa cadeira é muito dura.

— Não, estou bem aqui. Obrigado.

— Você não está bem aí que eu estou vendo, anda sente-se aqui.

Me sentindo muito tentado, olhei para o sofá que parecia bem confortável e me levantei indo até ele e me acomodando no canto oposto ao da Isabela. Conforme o filme ia passando ela foi comentando as partes que mais amava e até repetia as falas junto com os personagens, o que me fazia rir. No final do filme ela chorou e eu ri dela que jogou a almofada em mim me pedindo para que eu parasse. Por várias vezes eu a vi pegar o celular como se esperasse que estivesse com área e alguém mandasse uma mensagem ou uma ligação. O meu celular também estava carregado, pois eu andava com um carregador na mochila que eu levava todo dia para a mansão com os meus pertences, mas não havia como ligar ou receber mensagens ou chamadas, estava completamente sem sinal.

— Gostou do filme? — perguntou, enquanto na TV passavam os créditos.

— Muito bom, mas eu não sei se no lugar do Noah eu esperaria a Allie.

— Esperaria sim, vejo que você tem cara de romântico.

— Eu era.

— Ainda é, tenho certeza, ninguém muda assim — falou, mas pareceu pensar e séria completou: — Pietro mudou.

— Eu não sou como ele — falei, um tanto áspero e antes que pudesse pensar.

Ela assentiu e mudou de assunto, mas continuando no marido:

— Você acha que ele está preocupado comigo ou com raiva? Claro que com raiva, ? — ela mesma respondeu, ao mesmo tempo ainda perguntando. — E os pais dele neste momento devem estar falando tanto de mim que a raiva dele deve estar ainda maior por isso. — Me mantive em silêncio, porém eu concordava com ela.

Isabela pegou o celular mais uma vez como se fosse uma mania que pegou durante o dia, e dessa vez falou entusiasmada:

— Que bom!

— O que aconteceu?

— Enviei a mesma mensagem para todos, dizendo que eu estava bem e que não se preocupassem. Talvez deva ter acontecido uma oscilação de área, porque foi enviada.

— O que você escreveu?

— Escrevi: "Não se preocupem, estou ilhada e não consigo voltar, mas Othon está comigo". Ao menos minhas irmãs não vão se preocupar.

— Sim. — Fiquei pensando que se ela fosse minha mulher eu daria um jeito de buscá-la, na verdade se ela fosse minha mulher ela nem estaria ali com o segurança.

— Sabe, quando penso no Pietro, em seus pais e na mansão, eu não tenho vontade nenhuma de voltar e eu não sei... — Isabela deixou a fala inacabada, apertou os lábios como se segurasse o choro, mas foi em vão e ela começou a chorar.

Eu não sabia o que fazer, mas me arrastei pelo sofá em sua direção, ficando mais próximo dela e ainda sentado peguei a sua mão. Não falei uma só palavra e na verdade eu não sabia o que dizer, apenas continuei segurando a sua mão e a aloquei entre as minhas, entrelaçando os nossos dedos vagarosamente depois. Eles se encaixavam perfeitamente e com o simples toque das nossas mãos se unindo senti o meu coração acelerar e eu não entendia ou não queria entender, apenas mantive nossas mãos entrelaçadas e fiquei olhando para elas, enquanto sentia a minha respiração faltar no meu peito e sentia o olhar da Isabela em mim.

Eu sabia que assim como eu ela também estava sentindo a mesma intensidade e também estava lutando uma batalha contra os sentimentos prós e contras. Dentro de mim os pensamentos de não ser um bom profissional, de estar traindo a confiança e de estar abusando do momento em que a Isabela estava vulnerável e fragilizada, me dividia, porém, eu não queria soltá-la e com um medo enorme de não resistir eu ergui meu olhar e encarei seus olhos chorosos que me olhavam com vontade. 

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