Capítulo 13
Nem toda riqueza está em bens materiais, têm pessoas que são mais valiosas por ser do que por ter.
Capítulo treze
Othon
Ficar perto dela e vê-la com o marido não era fácil, entretanto, mais difícil era não vê-la todos os dias e eu sabia como era, me lembrava dos dias após o chalé em que eu fiquei dia após dia sentindo falta do seu olhar e o quanto me senti miserável, então eu me sacrificaria vendo-os juntos e ficaria ali a esperando até o dia que ela resolvesse tudo e aí enfim fosse minha.
Eu estava esperando que ela e o otário do marido descessem junto com os sogros para que fossemos para o maldito baile, que tomaria bastante atenção de todos nós seguranças e a sensação de ciúme já estava apertando por saber que era ele que estaria ao lado dela.
Todos estávamos preocupados com a exposição e o melhor que pensamos foi a família ir toda junta. Primeiramente dona Nice disse que sairia antes, pois se esperasse a Isabela com certeza se atrasaria, mas pela segurança Gerson a aconselhou ir todos juntos e ela acatou.
A família ia em dois carros e oito seguranças foram escalados para acompanhá-los, eu era um deles junto com meus amigos. Gerson confiava em nós por sermos mais próximos dele e por isso havia nos escalado, sabia o quanto éramos bons.
Eu já tinha olhado no relógio algumas vezes e se continuássemos demorando para sair, pegaríamos o horário de maior fluxo de chegada dos convidados ao baile e isso nos deixaria mais vulneráveis a um possível ataque.
Meus olhos percorriam a sala e eu estava de pé de frente para a grande janela que dava para o jardim, foi quando percebi que o Pietro e senhor Bernardo estavam descendo a escada e logo atrás a dona Nice descia com seu olhar superior e seu coque sem um fio fora do lugar. Eles passaram pelo último degrau e já foram se dirigindo para a porta da frente onde os carros estavam estacionados, até que meu olhar foi capturado novamente para a escada onde um movimento no topo chamou a minha atenção e meu coração saltou quando vi Isabela descendo a escada.
Tive que piscar e esconder os meus sentimentos ao vê-la. Isabela estava incrivelmente linda com um vestido esvoaçante, vermelho e o seu cabelo naquele momento não estava mais solto e cacheado como estava antes e sim amarrado em um rabo de cavalo, comprido e estava caindo lateralmente pelo seu ombro. Vi que ela me olhou rapidamente até ser acolhida pelo marido quando chegou no pé da escada, ele estendeu seu braço e Isabela aceitou de imediato.
Eu sentia a raiva fervilhar em mim todas as vezes que via os dois juntos e mais uma vez não foi diferente, fechei a cara ficando ainda mais sério e notando o meu desconforto, Jackson que estava ao meu lado, disse:
— Calma, fica calmo.
Então tirei o olhar do casal e dei um meneio de cabeça ao meu amigo, indicando que eu estava sob controle.
Saímos da mansão com a mesma tensão de sempre e naquele momento a tensão era ainda maior, pois pela primeira vez estávamos com toda a família por nossa responsabilidade.
Ao chegar no salão logo notei a entrada requintada e tinham fotógrafos por todos os lados e até parecia a entrada para o Oscar. Fomos em quatro carros, no primeiro estava dois seguranças do turno da noite, no segundo carro estava eu, Ricardo, Pietro e Isabela, no terceiro estavam senhor Bernardo, dona Nice, Gerson e Jackson e no último carro estavam mais dois seguranças do turno da noite.
Passamos com os carros em comboio pela entrada de onde seria o evento. O local era adornado por coqueiros enormes que iam, de ambos os lados, do portão até a frente do salão, que estava todo iluminado por refletores no chão.
O salão parecia um castelo, a entrada principal tinha uma grande porta de madeira com um tapete vermelho que ia da porta até onde os carros paravam para deixar os convidados. Duas torres altas, uma de cada lado da construção, exibiam duas faixas gigantes, que desciam do telhado da torre até o chão e dizia: "XI Baile anual da Elite". Contive o revirar de olhos para a grande bobeira que era ter um baile sem sentido nenhum, apenas para os ricos se exibirem e ostentarem seus carros de luxo ou fazerem competição de quem era mais esnobe. Se ao menos tivessem um propósito ou o baile tivesse um teor solidário, mas nem isso, pelo que eu soube era só um baile de ricos deslumbrados.
Os carros foram parando e como Ricardo estava dirigindo, eu desci para escoltar o casal até o salão, sendo assim, mais parecendo um chofer, mas com os olhos em todas as partes e sendo amparado pelos demais seguranças, que já tinham estacionado e estavam me dando cobertura, fui até a porta do carro e abri para que eles descessem. Primeiro saiu Pietro e logo começou a acenar para os fotógrafos esquecendo-se completamente de estender a mão para que a Isabela saísse do veículo, vendo que ele não faria, estendi a minha mão para ela, que colocou a sua sobre a minha e imediatamente o contato da sua mão na minha foi aquecedor.
Isabela me olhou agradecida e só depois que ela já estava de pé ao lado de Pietro que ele se lembrou dela e estendeu o braço para ampará-la. Idiota.
Os dois foram para dentro do salão, enquanto eu os seguia de perto e no caminho precisei apertar o fone que eu levava na orelha para acionar o microfone de alta-precisão que permitia que eu me comunicasse com os demais seguranças.
— Atenção, suspeito a direita — falei, ao ver um homem barbudo e com a mão para trás.
— QSL — respondeu, um dos seguranças do turno da noite que estava logo atrás de nós, usando o código que os seguranças usavam para dizer que havia entendido.
Logo o homem suspeito tirou das costas uma câmera e notei que ele era apenas um dos fotógrafos contratados. Eu estava tenso e preocupado com a Isabela que estava exposta àquela situação de perigo sem necessidade, apenas para fazer o que a sogra e o marido queriam.
Fomos andando até entrar no salão e Pietro e Isabela foram direcionados até a mesa que estava reservada para eles, imediatamente quando vi que estavam seguros, me encostei em um canto longe o suficiente para não ser notado e perto o suficiente para fazer uma intervenção se precisasse.
Logo senhor Bernardo e dona Nice entraram acompanhados por Gerson e Jackson que ao verem que seus protegidos estavam seguros, ambos foram para a outra extremidade do salão e o mesmo fez os demais seguranças que se espalharam também em duplas a fim de assegurar que nenhuma ameaça existia, enquanto Ricardo parou ao meu lado.
Fiquei encarando a mesa da Isabela e naquela situação eu podia olhá-la à vontade, afinal, eu era o segurança da família e resguardá-los e observá-los era a minha função. Vi quando ela sorriu para algo que Pietro disse a ela e vê-la dando sorrisos que não eram para mim me deixava desconfortável.
— Noite tensa, amigo? — Olhei para o Ricardo, que tentava puxar papo comigo.
— Muito.
— Não nos falamos, mas vi vocês dois juntos e mesmo de longe pude ver que ela te ama, cara.
— Valeu — respondi e abaixei a cabeça sem graça. ⸻, não consegui te agradecer novamente. Obrigado por ter se arriscado por mim, eles podiam ter desconfiado da sua saída.
Ricardo sorriu e deu de ombros como se não fosse nada.
— Tudo bem, eles ficam o dia todo naquele escritório, se eu quisesse ir embora e dormir, eles nem notariam que eu saí. Sondei o Gerson e o rastreador dos veículos não foram ativados para saberem onde estávamos.
— Mesmo assim agradeço. — Ficamos em silêncio e meio que senti a necessidade de explicar, aí falei: — Isabela disse que vai ficar comigo, vai só resolver a situação com ele. — Ricardo assentiu balançando a cabeça em positivo e olhando o salão, que estava enchendo a cada minuto com a entrada de mais magnatas da região.
Já havia passado algum tempo de festa e em um determinado momento os homens da mesa se levantaram, chamados pelo anfitrião a ir ao palco em que uma banda tocava e foram avisados que assim que a banda acabasse aquela música, eles seriam apresentados como os Fontenelles da Mineradora Fontenelle. Uma tremenda babaquice e era o momento em que os ricos que estavam presentes conseguiam status com suas empresas.
Dona Nice percebendo que a mesa da família ficaria em evidência, resolveu levantar-se junto com os homens e ir ao banheiro para retocar a maquiagem antes que eles subissem ao palco e com isso notei que eu teria que me aproximar de Isabela. Era o combinado da segurança: sempre que um dos protegidos se afastasse ou ficasse sozinho, quem tomaria conta seria o segurança já responsável por ele diariamente. Então vi quando Jackson se afastou com dona Nice e eu me posicionei ao lado da Isabela.
Ela me olhou e sorriu discretamente, mas mesmo sendo um sorriso que mal mexeu os lábios, consegui ver que ela gostou de me ter ao seu lado. Aproveitando a oportunidade de trocar algumas palavras com ela, sem olhá-la e falando em um tom mais baixo, para que apenas ela conseguisse me ouvir do lugar onde estava sentada, fiz um elogio:
— Você está realmente linda. — Engoli, disfarçando a minha ousadia.
— Igualmente — ela me respondeu e deu um gole em sua bebida, mas em seguida continuou a falar sem me olhar: — Um evento tão grande e com tanta gente com dinheiro, daria um excelente evento beneficente, não acha?
Eu não consegui manter meu olhar profissional e desviei o olhar do salão para encará-la com admiração e falei:
— Foi o mesmo que eu pensei assim que cheguei.
Ela sorriu e disfarçadamente falou:
— Tenho certeza que sim, você não me decepciona.
Vi quando dona Nice estava voltando para a mesa com seu nariz empinado e seu fiel coque imaculado, aquele que eu tinha vontade de bagunçar, aí como uma sombra que eu tinha que ser, voltei para o meu lugar mais distante e com um sorriso discreto no rosto, ocupei novamente a postura de segurança.
Já estávamos naquele baile por mais ou menos duas horas e as pessoas já estavam mais felizes e já tinham levantado para dançar ao som da banda ao vivo que tocava Frank Sinatra.
Assim que chegamos fiquei preocupado com Isabela ao perceber que ela parecia muito tensa, porém com o passar das horas e depois de trocar poucas palavras com ela, a observei sorrir em meio a conversas calorosas na mesa em que estava, a vi beber algumas taças de champanhe e ser muito receptiva quando Pietro se aproximava dela e a beijava ou falava algo em seu ouvido muito intimamente. Isabela parecia verdadeiramente feliz e com isso a sensação de felicidade que senti ao trocar poucas palavras com ela, havia passado e eu me sentia... trocado e esse pensamento começou a bagunçar a minha mente.
Ela era sem dúvidas a mulher mais bonita naquele salão, Pietro sabia disso e a exibia como um troféu, que ela até parecia gostar de ser. Para completar a exibição, vi quando ele a levou para a pista de dança e enquanto dançavam, ele falava algo olhando diretamente para ela, que sorria inúmeras vezes. Os dois sempre eram cumprimentados por pessoas que passavam e respondiam com sorrisos amistosos, eram tratados como se fossem um casal exemplar e invejado.
Vendo-os tão felizes e entrosados na pista de dança, era como se eles estivessem em seu habitat natural, como se a Isabela se encaixasse perfeitamente naquela cena e essa constatação fez com que a alegria em mim sumisse e eu me sentisse como um idiota por pensar que minutos atrás até me imaginei no lugar de Pietro, sendo feliz com ela. Ri com desdém dos meus pensamentos, pois como era ridículo pensar isso, já que eu nunca estaria em um baile como aquele com a Isabela, a não ser como seu segurança.
Olhei para eles novamente e cheguei à conclusão de que o que eu estava fazendo era separar um casal que naquele momento, e quem sabe desde sempre, parecia muito feliz.
Observando a cena de fora, quem estava sobrando era eu.
Balancei a cabeça em negativo para limpar os pensamentos que me machucavam e senti a raiva subir pelo meu corpo pela situação em que a vida havia me metido e claro, como sempre não era uma situação feliz. Mesmo eu tentando não sentir o peso do ciúme, do quanto eu era nada e do quanto eu nunca ia ser feliz, eu sentia e doía muito.
Claro que eu não seria feliz tão fácil, claro que a vida acharia um jeito de me tirar do fundo do poço em que eu estava vivendo me pregando uma peça e me mostrando um novo amor, mas um novo amor complicado e praticamente impossível para a minha realidade, com isso me jogaria de volta ao fundo do poço que era o meu lugar, mas me sentindo muito pior, extremamente pior.
Me pergunto se algum dia eu serei feliz.
Felicidade... acho que não sou digno de sentir.
Voltei a inspecionar cada canto do maldito salão, tirando os meus olhos do feliz casal. Eu estava nitidamente irritado e com o maxilar cerrado que demostrava toda a minha frustração.
— Não sofre por antecipação, cara. — Olhei para o lado e Ricardo indicou com o queixo Pietro e Isabela na pista, provavelmente por ter notado o meu desconforto com a cena.
— Estou me sentindo um idiota agora.
— Você não é.
Ri em desdém, sem conseguir dizer nada.
— Nem tudo que parece é — Ricardo tentou me animar, contido, enquanto fazia seu trabalho.
— Eu estou vendo com os meus olhos o que é — falei e Ricardo se manteve em silêncio. — Não é meu lugar.
Em seguida Pietro e Isabela voltaram a se sentar e com um meneio de cabeça o vi me chamar. Quando me aproximei da mesa em que a família estava acomodada, olhei apenas para o Pietro, mas pela minha visão periférica vi Isabela me olhar a todo momento.
— Senhor... — falei ao me aproximar e como se eu fosse um cachorro Pietro instruiu:
— Acompanhe Isabela até ao toalete feminino que fica do outro lado do salão.
Dei um meneio de cabeça e voltei meu olhar para o salão, evitando cruzar meu olhar com o da Isabela. Ela levantou-se, seguiu andando para o outro lado do salão e eu a acompanhei andando de longe e disfarçadamente, como se não estivesse com ela. Em seguida vi quando ela virou à direita de uma grande parede que dava direto em um corredor comprido, que ficava excluso a festa. A vi entrar por uma porta que indicava ser os banheiros e eu a esperei do lado de fora, até que não demorou muito e ela saiu com um sorriso feliz direcionado a mim, em resposta e sem dizer nada dei um meneio de cabeça e indiquei que ela voltasse para a mesa.
— Algum problema, Othon? — perguntou, séria e até parecendo triste.
— Problema nenhum. — Eu não a olhava, mantive meu olhar em volta, conferindo o ambiente.
Ela me encarou sem dizer nada, sem dar um passo e quando eu voltei a olhá-la notei que estava com a testa franzida.
— O que está acontecendo?
— Deixe-me acompanhá-la, por favor, ou seu marido estranhará a demora.
Ela continuou a me olhar sem se mover.
— Me conta o que está acontecendo ou eu não vou sair daqui.
A encarei.
— Não está acontecendo nada que não seja o normal.
Ela soltou o ar com raiva, balançou a cabeça em negativo e eu tirei o meu olhar do dela.
— Você... Olha, Othon... Fiz algo que você não gostou? — perguntou e eu a encarei, aí seu olhar culpado me deixou culpado também.
— Não, eu que estou fazendo algo que não gosto. Podemos voltar para o salão?
— Não! — falou alto para chamar a minha atenção. — Quero saber o motivo de você estar me tratando assim.
Olhei para o lado para conferir se alguém estava nos ouvindo, mas estávamos sozinhos. Eu não sabia o que responder, fiquei sem conseguir encará-la, sentindo meu peito apertar e me sentindo um idiota por estar com ciúmes dela com o marido, sendo que era eu quem estava sobrando ali e eu nem tinha esse direito.
— Me fala, Othon.
— Eu não consigo te ver com ele, Isabela. — Não consegui olhar para ela ao dizer isso.
— E eu não consigo mais ficar com ele, mas logo...
— Você parecia bem feliz lá — falei, parecendo um menino mimado e em seguida me arrependi de ter dito isso.
Isabela ergueu as sobrancelhas parecendo ofendida e disse:
— Sério que você acha que estou feliz com ele?
Dei de ombros, mas o que eu podia fazer se vê-los juntos me doía?
Os olhos da Isabela se encheram de lágrimas e ela piscou rápido e comprimiu os lábios os apertando para segurar o choro, no mesmo instante eu estava péssimo por fazê-la se sentir assim.
— Eu não estava feliz, eu estava... atuando. — Engoliu em seco, nitidamente controlando as lágrimas e continuou: — Você sabe e sempre soube da minha realidade, que eu não posso mudar de um dia para o outro, eu não posso ser egoísta a ponto de revirar a vida de várias pessoas apenas por causa da minha vontade, depois de passar alguns dias com você no chalé.
Com isso ela saiu andando e me deixou para trás com o caroço que se formou na minha garganta e a decepção borbulhando dentro de mim por ela desmerecer os dias que passou comigo no chalé como se fosse apenas "alguns dias" e não os melhores dias da minha vida.
Eu a acompanhei até a mesa e guardei meu coração destroçado dentro do peito, pensando que o dia seguinte seria outro dia e eu novamente me fecharia na minha vida vazia, vivida no automático e sem emoções, até que um dia esse tormento chamado vida acabasse.
Pensei que eu ia conseguir aguentar tudo para ficar perto dela, mas estava sendo demais para mim e para a minha sanidade, me doía demais ter que dividi-la, inclusive naquele momento onde eu a via brindar com a seu champanhe e sorrir de maneira alegre demais para quem acabou de ter uma conversa cheia de tensão comigo. Eu podia estar sendo infantil, podia estar com ciúmes desnecessários, mas a sensação de ser a sobra e a de não ser o suficiente para ela, estava doendo.
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