Capítulo 02
Acordei de um pulo, olhei para a janela. Vazia. O dia já tinha começado e eu acordando tarde.
Sentei na cama me sentindo cansada de mais. Descalça caminhei até o guarda roupas, a não ser uma aranha, não tinha nada.
- Legal Giovana. Não arrumou suas malas. – Me repreendi. – Agora vou ter que feder até subir as malas.
Lavei meu rosto cansado e inchado e depois de fazer minha higiene básica desci para a cozinha. Minha mãe havia saído e me deixou sozinha. Não que eu tenha medo, gostava de passar as férias com a minha avó, muito embora ela não falasse com a minha mãe.
Esperta que dona Rosa era, me deixou com os restos da noite passada. Peguei um prato e me servi de um pedaço de bolo, uma fatia de queijo e um copo – Sim um copo – de café fumegante.
- Bom dia senhora.
- Puta merda. – Quase voei da mesa, e ainda por cima queimei a boca. – Pode me chamar de Giovana, e por favor venha andando firme da próxima vez.
- Como quiser senhora.
A garota devia ter dezoito anos, era uma negra bonita de cabelos presos em um coque. Me senti uma velha com meus vinte e seis anos de gastrite e coluna torta, com meus pneuzinhos de fast food. Parei de comer e pousei a fatia de bolo no prato.
- Tia Malda te mandou, foi?
- Malda? – Ela me observou com a expressão neutra.
- Sim. Deixa pra lá. Como é o seu nome?
- Me chamo Sara senhora. – Ela respondeu calmamente.
- Sara, penso como a minha avó, não gosto de gente me chamando de senhora. Somos iguais entende? – Ela concordou. – Então só me chama de Gi. Não é como se fosse ficar ofendida. Não vou ser como as hipócritas que achavam que deveriam dar uma chibatada só por lhe chamar pelo nome.
Sara se encolheu toda na minha frente. Aquilo que já era estranho, se tornou bizarro. Fiquei em pé rapidamente e tentei me desculpar com ela, mas a garota se esquivou de mim e correu para a cozinha. Corri atrás dela. Lógico, odeio racismo e só quis fazer um comentário, não era porque morava em uma fazenda de café que adotaria os costumes horríveis da época.
- Sara por favor, eu só estava brin....
A cozinha estava vazia. Com as portas fechadas e janelas travadas. Não tinha como ela correr e se esconder. A casa era grande mas a cozinha era antiga, um quadrado grande com prateleiras, panelas e um fogão e forno a lenha, mesa pequena e um forno moderno a gás. Andei até metade da cozinha com o coração aos saltos.Sentia o ar pesado e uma vontade louca de correr. Meus pés descalços se arrastavam no piso de pedra fria. E então senti um puxão forte no braço que me fez rodopiar e por pouco não me choquei contra o fogão a lenha, que por sinal ardia.
- Quem está aí? – Disse firme. – Sara, eu não quis...
Todas as panelas de cima do fogão voaram no chão. Abri a boca e soltei todo o ar dos meus pulmões. Gritei porque só minha avó ficaria ali e ainda brigaria por ter que colocar tudo no lugar outra vez. Besta que não sou, corri dali, passei pela sala, quase derrubei a porta nos peitos, e corri para fora.
Estava apavorada.
O sol quase torrou meus olhos no momento em que passei pela porta. Senti a terra quente nos pés, mas continuei a correr.
- Onde vai? – Jorge vinha vindo na maior calma.
- Jorge do céu. Eu vi uma moça na casa. Achei que era viva, conversei com ela e tudo. Daí fui fazer uma brincadeira sobre chibatadas e quase morri. Ela sumiu dentro de casa. – Soltei tudo de uma vez.
- Não acredito Gi, você mal chega e já faz inimizade com o além. Não quero ninguém puxando meu pé. – Ele me jogou uma sacola pesada. – Trate de se comunicar com essa menina e diz que ela está despedida, manda ela para a luz,não sei.
- Você está me ouvindo Jorge?
- Claro que estou. – Ele olhou por cima dos ombros. – Olha só, sua mãe acaba de voltar do cemitério e não está nada bem. Por ela vendemos isso aqui e vamos embora, mas eu gosto daqui, e quero ficar. Por favor não conte essas coisas para ela.
Claro que o Jorge ia querer ficar na fazenda. Ele sempre se achou o Agroboy da família só porque cuidava de umas plantinhas na varanda de casa. Tirava aquelas foto de gente cansada, abraçado as plantas. Vencida voltei para dentro.Com olhos até na nuca, Sara podia achar interessante a ideia de arremessar coisas contra minha pessoa.
Tirei o dia para arrumar meu quarto, descobri não uma, mas uma família de aranhas morando no guarda roupas. Jorge agroboy quase enfartou quando as viu. E foi dona Rosa com a tia Malda que conseguiu dar um fim nelas.
Agro é tudo!
Acabada a seção de descarrego, organizei minhas coisas. Meus perfumes e cremes na penteadeira antiga, meus cremes de banho e de cabelo no banheiro antigo. E meus livros na minha prateleira que Jorge havia montado.
Tudo certo, nada resolvido. Teria que arrumar um jeito de trabalhar ali. Me formei em música aos vinte e três anos, arrumei um emprego em uma escola dando aula de violão, mas acabei por sair quando Jorge ficou doente. Encarei meu violão no canto do quarto.
- Tobias, logo eu brinco com você. – Mandei um beijo para o meu violão.
Almocei tarde, e consequentemente jantei mais tarde ainda. Quando minha mãe resolveu sair do quarto eu tinha preparado nossa noite de filmes. Até arrisquei ir para a cozinha. Estourei uma boa quantia de pipoca e fiz brigadeiro, mas não virei as costas, fazia nossas goloseimas meio de lado no fogão. Dessa vez não ia ser mais terror, pois a Sara ainda me deixava assustada. Fizemos nossa maratona de filmes de Romance começando por Orgulho e Preconceito e rumando para a Barraca do Beijo 1, o segundo não me interessava mais. Ah Noah, porque não aparece lá nos meus sonhos?
- Ah esse Darcy. – Suspirei. – Tão lindo. – Deve ser algum parente distante do Noah, não acha mãe?
Minha mãe ria, porque falar que Senhor Darcy era lindo e todo o pacote de elogios deixaria o careca dela com raiva, ela dizia não e meneava a cabeça afirmando.
Alguns filmes depois minha querida mãe resolveu deitar, me deixando a tarefa de apagar as luzes. Fiquei mais um pouco, apaguei as luzes e subi correndo, parecia que alguém ia morder a minha bunda se eu não chegasse no quarto.
Fechei a porta e passei o trinco. Com coisa que fantasmas iam bater na porta.
Dessa vez eu fui direto pro banheiro. Tomei meu banho, lavei o cabelo, cantei, conversei sozinha e imaginei uma vida perfeita ali. Escovei meus dentes e vesti meu pijama. Enrolei uma toalha na cabeça e saí. Iria ler até os olhos ficarem secos.
– Puta merda. – Não grita. Não Grita!
O homem estava de novo no meu quarto. Dessa vez eu sabia que não era sonho. Ele cravou os olhos verdes em mim, me olhou da pontinha dos pés até o fiozinho de cabelo quebrado. E juro que vi os olhos brilharem.
Fingir demência seria uma boa, se eu agisse com naturalidade. Ali na frente dele eu tremia mais que a pepita, a Pincher da minha ex vizinha.
Engoli em seco quando ele se aproximou, virei rapidamente, abri o trinco e corri para fora do quarto. No caminho praticamente passei por cima do Jorge nos embolamos no corredor escuro.
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