Passeio em família
Fernando
Acordei na sexta de manhã, meio estressado por vários motivos. O primeiro de todos é que não voltei a falar com os meus pais depois da conversa de ontem, o segundo é que ontem acabei não indo a Angels, porque me encontrei com a Fabi no caminho, saímos para conversar sobre essa historia maluca de casamento e acabamos emendando a noite. O terceiro motivo é que preciso parar de ter recaídas com a minha ex. O sexo é bom, ela é gostosa, mas nossos pais querem nos casar e pelo o que vi, ela também parece não estar a fim desse combinado. E o quarto motivo pelo qual estou irritado, é que eu não vi a Clara ontem e sei lá, estou com a impressão de que eu devia ter ido para a Angels, para leva-la embora, não saber o que aconteceu com ela depois que foi embora do trabalho está me deixando doido.
Levantei da cama em um pulo e liguei para Angels. Sempre ficava um segurança lá durante o dia. Por sorte o segurança que ainda estava lá era o Valmir, não deveria pedir para que outra pessoa, que não fosse Gustavo, João e Rodrigo, abrisse os arquivos confidenciais dos funcionários, mas eu estava tão preocupado que passei por cima das regras para saber notícias dela. Pedi para Valmir ir até a minha mesa, pegar a pasta com o nome da Clara e procurar o numero do telefone dela, que ele achou rapidamente. Pensei por um minuto se deveria ou não ligar para ela, e claro o sim prevaleceu. O telefone deu dois toques até que eu ouvi a voz dela invadir meus ouvidos:
— Alô.
— Oi Clara.
— Oi, com quem eu falo?
— É... Aqui é o Fernando — Limpei a garganta e continuei — Estou ligando para saber se está tudo bem.
— Sim, está sim. — Vi que ela parecia surpresa.
— É que ontem eu não pude ir a Angels e fiquei preocupado em deixa-la voltar sozinha para casa.
— Não voltei sozinha. Ontem voltei acompanhada.
Parei de falar. Ela não podia ter saído com alguém ontem. Na verdade ela podia sim, ela é solteira.
— Arrumou companhia ontem? Toma cuidado com esses carinhas que frequentam a Angels. — Perguntei sem vontade de ouvir a resposta e com um pouco de raiva.
— Não. — Ela riu. — A Laura voltou comigo ontem, mas muito obrigada por se preocupar.
— Sempre me preocupo com as minhas amigas. — Falei mais aliviado.
Ela sorriu e um silêncio se formou na linha.
— Fernando, desculpa, preciso desligar. É que a Mayara está aqui, louca me pedindo para leva-la até o parque dos pássaros, para patinar com patins novo que ganhou dos pais da Laura.
— Nossa adoro patinar, sempre fui ótimo nisso.
— Eu sou um zero a esquerda, tropeço até andando, quem dirá em cima de rodinhas, mas ser mãe é isso, vou me virar para fazer as vontades dessa pequena.
— Olha, se você não se importar eu posso fazer companhia a vocês e ensinar umas técnicas para a Mayara. — Me ofereci para o passeio mãe e filha, não estou acreditando que fiz isso.
— Seria ótimo, mas não precisa se for te atrapalhar. — Ela parecia sorrir.
— De jeito nenhum. Pego vocês aí em dez minutos.
— Tudo bem.
Desliguei, corri me arrumar para encontrar com duas gatas. Já estava quase saindo quando tive uma ideia.
— Dri — Falei quando a minha irmã atendeu ao telefone. — Me empresta os seus patins?
— Claro, mas você não tem o seu?
— Sim, mas é que vou emprestar um para Clara.
— Clara? A bargirl que te acha um gatão?
Ri.
— Essa mesma. Vou levar ela e a filha no parque dos pássaros para aprender a andar de patins.
— Uauuu! Que passeio família, quem te viu quem te vê hem.
— Cala boca Adriana. É que estou sem fazer nada, ela me disse que ia, e resolvi relembrar os velhos tempos me oferecendo para ir junto.
— Tudo bem, não precisa se explicar maninho. Divirta-se. Ah! E ela é uma gata viu.
— Dri já estou passando aí para pegar, leva para mim no portão, por favor? Porque não quero ver nossos pais.
— Tudo bem. Mas eles ainda continuam com a história do casamento de ontem?
— Sim. — respondi exasperado. — Estão irredutíveis e agem como se fosse normal.
— Não se estressa, tudo vai se resolver, eles vão cair em si e ver o quanto isso é idiota.
— Tomara, não quero ser o renegado da família. Mas vou esquecer isso por hora e estou passando aí para pegar os patins.
— Tudo bem.
Passei na casa dos meus pais peguei os patins com a Adriana e já estava estacionando o carro em frente a casa da Clara quando a vi sair no portão com a filha. As duas eram bem parecidas e lindas.
— E aí meninas, vamos nos divertir? — Falei descendo do carro.
— Simmm — A Mayara gritou e eu sorri enquanto olhava para a mãe dela que me olhava com um sorriso tímido nos lábios.
Elas entraram no carro e seguimos até o parque. Quando chegamos lá, estacionei em baixo de uma árvore e abri o porta malas para tirar tudo que eu havia preparado.
— Nem pensar! — Clara falou com um pânico evidente no rosto ao ver o patins que eu oferecia a ela.
— É fácil. Vou te mostrar o quanto é simples. — Eu sorria largamente.
— Nem pensar. Eu não nasci para isso. Eu sou tão desastrada que vou me quebrar inteira e pensa: Hoje é sexta feira, tem apresentação na Angels. Você não quer perder uma das suas atrações não é?
— Veremos. Até a hora de irmos, eu vou te convencer a pelo menos tentar andar um pouco.
— Duvido que consiga.
— Eu sempre consigo tudo que quero. — Pisquei para ela e ela sorriu.
— Tudo bem senhor mimado até a hora de irmos veremos.
Sorri para ela e segurei o olhar até sermos interrompidos por uma vozinha:
— Mãe, antes de começarmos a patinar podemos comer? Eu estou com uma fominha.
— Ahhh, princesa Mayara eu penso em tudo. — Falei indo até o porta malas e tirando a cesta de piquenique que também pedi para a minha irmã preparar para mim. — Tcharammm.
— O que é isso? — Mayara perguntou.
— Cesta de Piquenique. — Pisquei para ela.
— Nunca fiz piquenique. — A May falou com os olhinhos brilhando e notei que a Clara se fechou como se tivesse tido uma lembrança ruim. — Ele nunca nos deixava sair não é mãe?
— Sim filha, mas esqueça isso, é passado e hoje estamos aqui para nos divertirmos não é? — Um turbilhão de emoções passava no olhar que as duas trocaram.
— Olha... Vocês duas vão ficar aí tristes? Ou vão sentar comigo ali debaixo daquela árvore e comer esse monte de coisa gostosa que eu trouxe?
— Coisa gostosaaaa. — A pequena gritou e foi correndo em direção à árvore.
— Obrigada. — A Clara sussurrou para mim me olhando intensamente e senti um arrepio subir pelo meu corpo, um arrepio acompanhado por um sentimento bom.
Comemos e depois que a May estava de barriga cheia, logo começou a correr atrás dos pombos e nos deixou a sós. Clara me contou um pouco do que viveu com o marido e a cada historia que ela me contava, eu sentia uma raiva enorme me atingir e uma vontade gigante de socar a cara desse homem até ele não respirar mais.
— Ela sofreu bastante, e eu, tive que ser forte por mim e por ela. O que me deixava um pouco mais tranquila quando estava internada com alguma coisa quebrada, era que ele ficava um doce por conta da consciência pesada, mas aí era só eu sair e ficar bem, que ele voltava a beber e aí a bebida o transformava e ele ficava agressivo outra vez.
Engoli em seco e olhei para a criança que corria feliz a minha frente e tentei imaginar o tanto de medo que ela passou. Voltei a olhar para a mulher delicada, que estava sentada ao meu lado, de cabeça baixa, me contando a pior parte da sua vida e pensei: Tão delicada e tão forte.
— Foi assim. — Ela ergueu o olhar e me olhou nos olhos, com um sorriso tranquilo nos lábios, depois que acabou de me contar como enfim teve coragem de sair do inferno em que vivia.
— Você foi muito corajosa e forte. Nesse momento para mim, você é a mulher mais forte que conheci na vida.
— Ah para!
— Sério. Foi preciso muita força para fugir de tudo que você vivia, mas acho que você deveria ter ido à polícia antes e denunciado ele.
— Se eu fizesse isso ele nunca me deixaria em paz, então a melhor saída foi fugir. Ele nem imagina onde estou. — Ela deu de ombros sem graça.
— A melhor coisa que você fez foi vir para cá.
— Sim, foi.
— E a segunda melhor, foi trabalhar na Angels. — Eu sorri e ela me sorriu de volta.
— Ei vocês dois. — A menininha linda com sorriso no rosto nos interrompeu. — Vamos ou não andar de patins?
— Vocês vão, eu não. — Clara respondeu erguendo as mãos em rendição.
— Ah mamãe, você não vai fazer essa desfeita com o Fernando, vai?
— Verdade, muita desfeita. — Falei sorrindo depois de receber uma piscadinha da May para concordar com ela. Essa menina era tão linda.
— Vão vocês enquanto isso, fico aqui criando coragem.
Clara encheu a Mayara de apetrechos de segurança, em seguida colocamos nossos patins e comecei a ensinar a ela tudo que eu sabia de como patinar com facilidade. Clara nos acompanhava com atenção, sorrindo de longe e nos vigiando de onde estava.
— Sabe, queria te chamar de tio, você se importa? — Mayara me perguntou com um sorrisinho angelical no rosto.
— Claro que não.
— Pode ser tio Nando então?
— Tio Nando ficou ótimo. — Eu sorria. Mesmo eu não tendo contato com crianças anteriormente acho que estou me saindo bem.
— Tio Nando, você quer namorar a minha mãe?
Engasguei.
— Não... Bom, não... Somos só amigos.
— Ah que pena. Você não sabe o que esta perdendo, ela é muito legal sabe. — Ela se desequilibrou, eu a segurei e logo ela fez um sinal para que a deixasse continuar sozinha.
— Sim, ela é muito legal. — Olhei para frente e já estávamos quase perto de onde a Clara nos olhava.
— Você tem os olhos puxadinhos iguais aos do príncipe da princesa Mulan.
Ri.
— É porque sou descendente de japonês.
Ela pareceu pensar um pouquinho enquanto dava breves passinhos deslizando com as rodinhas dos patins.
— E você é muito bonito e altão.
— Obrigada. Você também é muito bonita e parece a princesa... — Pensei um pouco e não sabia o nome de nenhuma princesa e ela percebeu.
— Você não conhece as princesas?
— Hummm você me pegou, não conheço. — Falei sorrindo.
— Meninos — Ela disse revirando os olhinhos. — Eu sou loira, mas queria mesmo ser a princesa Merida, a valente. Ela tem o cabelo todo enrolado, selvagem e solto, é forte e corajosa e protegeu a mãe dela, quando correu perigo.
Ela pareceu reviver lembranças tristes, fez uma carinha que doeu meu coração.
— Pois eu digo que você é igual a essa princesa aí. Tenho certeza que é você, que sempre que protege a sua mãe. Eeee... se soltar o cabeço e bagunçar assim — passei a mão nos cabelos dela deixando-os bagunçados. — Vai ficar como os dela.
E então ela voltou a sorrir.
— Ah você bagunçou meu cabelo, vou te pegar! — Ela veio andando em minha direção parecendo um robozinho sobre rodinhas e eu simulei fugir dela. Ambos riamos até que chegamos próximos da Clara.
— Mamãe o tio Nando bagunçou o meu cabelo para ficar igual o da Merida.
— Ah, mas isso é inadmissível! É um pecado bagunçar os cachos de uma princesa. E desde quando somos Tio Nando? — Clara me perguntou cruzando os braços.
— Nós conversamos e chegamos a um acordo, agora sou Tio Nando. E mudando de assunto, agora que a May é uma profissional nos patins. — Pisquei para a Mayara — É a sua vez de aprender.
— Ai meu Deus, nem pensar Fernando.
— Mãe, chama ele de Nando também. Combina muito mais com ele e mãe, vai patinar, é muito legal — Tentei segurar o sorriso ao ver o desconforto da Clara as tentativas da filha dela de nos aproximar, mas foi em vão, ri largamente.
— Tudo bem... Nando, — Ela pausou sorrindo. — Eu vou, mas se eu cair e me quebrar toda, vou pedir indenização a você.
— Feito.
Ela colocou os patins da minha irmã e me fez tirar o meu, segundo ela, eu não conseguiria segura-la seu eu tivesse usando patins também. Ela foi patinar devagar e sorria como criança, fomos até o final do corredor arborizado e voltamos. Ela segurando a minha mão e a May sentada na grama, a uns metros de distância nos olhando.
Quando estávamos voltando, um pombo passou voando na frente da Clara e a desequilibrou fazendo com que ela quase caísse, e eu para impedir, a segurei pela cintura e a puxei para mim, firmando o seu corpo ao meu. Quando ela se equilibrou novamente estava com o corpo colado ao meu e a mão sobre o meu peito. Os olhos dela pararam fixados nos meus e eu senti a minha respiração acelerar. Olhei para os lábios dela e vi que ela também respirava aceleradamente.
— Respira. Eu te peguei. — Ela assentiu, se afastou de mim, mas não disse nada.
Meu coração estava batendo acelerado com certeza pelo movimento brusco que fiz para segura-la, só por isso.
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