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1 - EM CRISE




São Paulo, setembro de 2015, antes da fama


Levi ajeitou os óculos no rosto pela terceira vez em menos de cinco minutos. Era um inferno. Fazia dias que adiava uma ida à ótica só para ajustar as hastes que, de tanto tempo de uso, estavam um pouco mais largas. No último ano sua vida andava tão desorganizada, desiludida e desestruturada que sequer tinha cabeça para pôr em ordem coisas simples do cotidiano como regular as hastes dos óculos ou trocar a lâmpada queimada de um dos corredores do apartamento.

Ia apenas levando, empurrando até o limite, até que Ana Paula ou gritasse para ele trocar a lâmpada ou fizesse isso sozinha, ou até seus óculos caírem e quebrarem a lente. Ultimamente, só tomava alguma atitude quando acontecia algum extremo. Do contrário, pouco se importava.

Com o indicador, empurrou os óculos de volta e se concentrou mais uma vez na leitura do original. Aos 32 anos, Levi trabalhava na Letras & Cia, uma grande e renomada editora dentro do mundo editorial, como editor e, por vezes, agente literário. Além disso, mantinha mais três empregos. Segunda, quarta e sexta, dava aulas à noite na faculdade. Terça e quinta, lecionava aulas de inglês em um cursinho. Aos sábados de manhã, ministrava um curso de escrita criativa, online, direto do seu escritório.

Para qualquer um que não o conhecesse, ele seria visto como um workaholic, e até se perguntariam como dava conta de tanta coisa a ser feita. Mas a verdade era que, se pudesse, Levi ocuparia cada segundo do seu dia se isso o ajudasse a esquecer a maldita crise no casamento.

Parou a leitura, fez algumas anotações em um bloco de notas e tornou a ler. Uma batida na porta, porém, o tirou de seu trabalho. Olhou no relógio que marcava a hora e a data. Quinta-feira. Seis de junho. Dez e meia da noite. Mateus Tavares, o editor-chefe, entrou sem esperar por permissão. Encostou a porta de volta e se sentou de frente para o amigo, abrindo dois botões do paletó.

— O que ainda está fazendo aqui? — Mateus perguntou, puxando uma caneta. Ele tinha a mania irritante de ficar girando-a entre os dedos enquanto conversava. Se estivesse ao telefone, rabiscava papéis e preenchia os espacinhos nas letras impressas de revistas, jornais ou rascunhos sobre a mesa.

— O prazo de resposta pra esse original acaba amanhã. Preciso terminar para enviar o feedback ao autor dentro do estabelecido. Estou acabando. No máximo, mais uma hora.

— Por que não vai pra casa e termina a leitura lá? — sugeriu. — Na verdade, acho que você precisa de uma pausa, mas se eu sugerir isso é capaz de me dar um tiro na cara.

Levi riu um pouco.

— Se eu chegar em casa com trabalho, é capaz de a Ana Paula me dar um tiro na cara. Ela não suporta quando trabalho em casa.

— E chegar depois do horário está tudo bem?

— É tão pior quanto, mas... preciso trabalhar, então. Ela que aceite isso.

Mateus não respondeu, não que não quisesse, mas porque Levi desengatou a falar de outros originais aprovados, repassou um relatório com algumas sugestões de edição nos textos selecionados, e começava a falar da sua agenda da semana próxima quando o amigo o interrompeu:

— Vai com calma, cara. Meu expediente acabou às seis horas. Fiz hora extra em uma reunião até as dez com o pessoal do marketing. Só estou esperando a Natália me ligar para eu ir buscá-la no cinema. Sai dessa, não estou a trabalho.

— Então chispa daqui, vai — resmungou, balançando as mãos. — Eu ainda estou trabalhando. E nem é hora extra. — Às vezes, Levi gostava de deixar trabalho acumular, fosse na editora ou na universidade, só pra ter um pretexto de ficar trabalhando até mais tarde. Tudo isso para chegar em casa e não se encontrar com Ana Paula.

Mateus se levantou, rindo.

— Você tem trabalhado demais no último ano, Levi. — Seu tom mudou para algo mais sério, para o tom de um amigo que se preocupa e que quer dar um conselho. — É por isso que seu casamento está em crise.

Levi o encarou seriamente, remoendo em memórias o verdadeiro motivo pela crise em seu casamento, que ele escondia de todo mundo e nem era por trabalhar demais. Houve um tempo em que era apenas um professor universitário. Dava aulas à noite na universidade e no ensino médio durante a manhã. Tinha tempo para a esposa e gostava de passar o tempo com ela. Contava os segundos para estar ao seu lado, os programas aos fins de semana: barzinho, sair pra dançar, motel, viagens nas férias.

Sua vida a dois começou a ruir muito antes do que Mateus pensava. Já tinha bem uns dois anos que seu casamento não era mais o mesmo, e tudo começou por culpa dele. Embora uma culpa não intencional, algo que não teria como ele saber nunca. Não sem antes dos exames.

Afastou os pensamentos da cabeça e retomou sua leitura, respondendo ao amigo:

— Você ficaria surpreso se soubesse o real motivo pela crise no meu casamento.

Mateus não insistiu no assunto. Desejou-lhe boa-noite e o deixou sozinho novamente.

Levi chegou em casa por volta de uma da manhã. Cheirava levemente a cerveja — tinha passado em um barzinho no caminho e tomado um copo junto com Julian, que lhe ligara e fizera o convite logo depois de Mateus deixar sua sala. O amigo aceitou, mas não sem antes terminar a avaliação do original e apenas um copo pequeno, afinal, estava dirigindo.

Jogou as chaves sobre a mesinha de centro e tirou o paletó. Acendeu a luz do abajur. Desfivelou o cinto e arrancou as calças. Tirou a camisa social, revelando uma regata azul-esverdeada por baixo. Foi até a cozinha e bebeu um copo de leite. Respirou fundo ao terminar, tentando entender os motivos por ainda levar adiante um casamento fracassado como o seu.

Muito atribuía ao fato de ter sido abandonado pelos pais ainda criança. A mãe fora embora quando mal completara quatro anos. O pai o criou por mais um ou um ano e pouco. Não deu conta da paternidade conciliada com o trabalho, não tinha paciência para suas birras e necessidades mais básicas, não tinha tempo para o filho. Achou melhor passar todas as responsabilidades e a guarda para a irmã, a tia Erica Alencastro. Uma mulher baixinha e simpática, casada com um ogro que chamava de marido, o tio Olavo. Sua mãe, Camila Fernandes, sumira no mundo, mas às vezes voltava para fazer seu "papel de mãe", e a última vez em que a vira estava se formando na faculdade. Até os dezoito anos, Leandro Alencastro, seu pai, mandava uma boa quantia para custear suas despesas, mas também não dava as caras, e o vira pela última vez já tinha bem uns nove anos.

Por ter sido criado pelos tios, embora ele sempre tenha odiado Olavo por seu jeito grosseiro e machista, eles eram sua única família, junto com Larissa, a prima que considerava uma irmã. Para Levi, sua família era importante. Muito. Acima de tudo e de todos. E Ana Paula era, querendo ou não, sua família também. Talvez por isso persistia em tentar salvar seu matrimônio, talvez fosse essa a razão por insistir em se manter casado quando, muito provavelmente, não a amasse mais e não suportasse mais viver daquela maneira.

Esforçou-se para se esquecer do passado, lavou o copo e atravessou o apartamento. Ao abrir a porta do quarto, esperou de coração vê-la dormindo. Mas a esposa estava acordada, assistindo a algum filme sem sentido na televisão. Tinha um balde de pipoca, copo de refrigerante e embalagens abertas de chocolate sobre a colcha vinho. Antes mesmo de olhar para o marido, Ana Paula mirou no relógio digital ao lado do criado-mudo. Só então, seus olhos encontraram os dele.

— O que aquela editora faz com você é exploração, trabalho escravo, sabia?

Caminhou até o guarda-roupa e pegou uma troca de roupa limpa.

— Não. Eu quem deixo trabalho acumular e depois preciso compensar o atraso.

— Talvez se não tivesse três empregos, desse conta de tudo.

Levi virou-se, segurando uma bermuda e camisa de dormir.

— Preciso trabalhar, Ana Paula. A gente precisa de dinheiro se quisermos...

Ana Paula o ignorou, voltando o olhar para a tevê. Aquele assunto estava encerrado havia muito tempo. Já tinham conversado, e ela já tinha dado seu posicionamento — seu veredito — sobre a questão e nada mudaria sua opinião. Além disso, sabia muito bem que Levi também já não compactuava com aqueles planos tinha muito tempo: desde que ela fizera a maior burrice de sua vida. De qualquer maneira, trabalhar tanto como o marido trabalhava era só um pretexto de se manter longe dela. Já não fazia mais sentido seguir com tais planos, traçados logo após se formarem na faculdade, e terrivelmente frustrados três anos atrás. Não quando estavam em crise. Não quando Levi...

— Odeio quando me ignora — o esposo resmungou, interrompendo seus pensamentos. — Você está me ignorando e ignorando as minhas tentativas de salvar nosso casamento.

— Suas tentativas? — ela bradou de volta, o olhando com fúria. — Você não tem tentado nada, Levi! Tudo que fez desde... desde...

— Não me lembre! — devolveu gritando, dando um soco na parede. Os olhos ficaram vermelhos de repente. — Não me lembre dessa porra, Ana Paula!

A esposa se calou na mesma hora. Cruzou os braços e tornou a olhar a tevê.

— De qualquer modo, trabalhar tanto não é seu jeito de tentar salvar nosso casamento. É seu jeito de ficar longe de mim — contestou, sem coragem de encará-lo.

Silêncio. Levi olhava para a mão machucada por conta do soco na parede.

— Sinto sua falta — Ana Paula sussurrou. Com o controle, desligou a televisão, apagou a luz do abajur ao seu lado e se enrolou nas cobertas, dando-lhe as costas. — Sinto sua falta.

No banheiro, os olhos dele continuavam vermelhos. Dessa vez não era de raiva. Tinha chorado. Sentado ao vaso com a tampa abaixada, só de cueca, depois do banho, ainda levemente molhado, como uma criança, tinha chorado. Manteve o chuveiro ligado para chorar sem que a esposa ouvisse. Ela nunca o vira chorar. Olavo sempre o ensinou que chorar era coisa de maricas. E se ele se deixava ser tomado por emoção era escondido. Quando criança, o tio o pegou chorando e isso o fez levar uma bronca e um tapa bem dado no rosto. Depois disso, se queria chorar, o fazia escondido.

Levantou-se, desligou o chuveiro e se encarou no espelho. Levi não queria esse sentimento dentro dele. Raiva, rancor, mágoa. Só queria, desde sempre, salvar seu casamento, esquecer todos os erros e desavenças, todas as barreiras, e ser feliz de novo com a esposa como era três anos atrás. Pensou que poderia superar, seguir em frente. Mas já tinham se passados dois anos desde tudo, desde que Ana Paula cometeu um erro por culpa dele. E esse erro dela o corroía. Não era capaz de perdoá-la por completo. E mesmo que tia Erica tenha lhe dito que ele jamais poderia ter culpa sobre algo que sequer sabia, Levi não conseguia não se sentir um pouquinho culpado. Afinal, seu casamento só desandou tudo por causa da sua...

— Levi — a esposa o chamou. Voz em tom de preocupação. — Está tudo bem aí? Está demorando.

Ele se concentrou na entonação da voz. Nada de emoções.

— Estou bem — respondeu. — Já vou me deitar.

Ana Paula nada disse. Ouviu-a voltar a se deitar.

Levi lavou o rosto e se encarou no espelho. Os olhos azuis estavam ainda marejados e vermelhos. Precisava fazer a barba também. Mas deixaria isso para o dia seguinte. Penteou os cabelos louro-escuro com os próprios dedos, terminou de se secar e vestiu o pijama.

Voltou para o quarto. Ana Paula o olhava com atenção, do seu lugar na cama. Deitou-se ao seu lado, de frente para ela. Ela se aproximou, beijou-o nos lábios, serena, mas ele mal retribuiu.

— Levi...

— Eu sei... — murmurou. — Só... não é fácil pra mim, Ana. Tenta entender o meu lado. Eu juro que estou tentando esquecer, seguir em frente. Eu quero mesmo salvar nosso casamento. E talvez se tivermos dinheiro o bastante para o tratamento e...

— Querido... Por favor, já falamos sobre isso. Só quero meu marido de volta. Só nós podemos salvar esse casamento, Levi. Não deposite esperança em algo que você nem sequer sabe se vai funcionar. Por favor — quase suplicou. — Só trabalhe menos, esteja aqui para o jantar, tenha tempo pra mim, pra nós. Se quer mesmo seguir em frente, esquecer e salvar nossa vida a dois, faço isso. Por favor.

Ele não a respondeu. Fechou os olhos. Respirava ruidosamente.

— Tudo bem — concordou apenas. — No domingo, vamos jantar fora, pode ser?

Ana Paula lhe ofereceu um sorriso singelo.

— Está ótimo. — Se aconchegou em seus braços.

Levi suspirou.

— Quer fazer sexo? — perguntou, com um sussurro.

— O monte de embalagens de chocolate não te dá nenhuma pista? — brincou, beijando-o no pescoço. — Veio pela manhã.

— Ah, claro. Tudo bem. — Deixou um beijo meio sem vida nos cabelos da esposa, virou-se, apagou a luz do abajur e fechou os olhos.

Não se atreveu a se virar de volta para a esposa.

Já não eram o mesmo casal. 

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