Capítulo 18
Capítulo dezoito
Depois da pizza, dona Cássia, eu e Martin começamos a assistir à novela e não demorou até que ela sentasse ereta no sofá, dissesse estar com sono e avisar que ia dormir, porque no dia seguinte ia viajar.
— De novo, mãe?
— Sim, porque essa viagem já estava marcada desde o início do ano e... — O encarou com as mãos na cintura. — Para de me controlar, menino! — Rimos.
— Quando a senhora volta?
— Vamos para um resort all inclusive. Saímos sexta e voltamos só no outro domingo. Então vocês terão que se virar sem mim.
— Deve ser muito divertido essas excursões. Gostaria de ir com a senhora um dia desses — falei.
— Para a minha idade é sim muito divertido, para a sua acho que não. — A música que indicava que a novela havia acabado tocou e dona Cássia levantou-se em seguida. — Vou indo. Boa noite, crianças.
Respondemos em uníssono e a vimos subir escada acima. Logo o silêncio se instaurou entre nós e eu me sentia muito envergonhada. Não sabia porque tinha permitido que aquele rompante de sexo quente acontecesse entre nós dois na sala da dona Cássia.
Olhava para a TV, mas sentia os olhos do Martin em mim, me avaliando e parecendo esperar que eu dissesse alguma coisa, no entanto, eu só pensava o quanto eu me sentia cheia de vergonha.
— Vou subir para dormir. — Levantei-me.
— Espera. — Pegou-me pela mão e ficou de pé bem perto de mim. — Precisamos continuar de onde paramos. — Na TV o cantor Silva se apresentava em um programa cantando a música , intensificando toda a sensação de tê-lo perto de mim e aumentando o clima romântico entre nós.
— Martin... — Respirei fundo e ele encostou seus lábios nos meus bem de leve.
— Você me deixa louco.
— Não podemos... não aqui — sussurrei.
Beija eu, beija eu, beija eu, me beija...
— Então onde e quando? — Encostou sua testa na minha. Pensei que se dona Cássia voltasse como eu explicaria aquela cena, mas não conseguia me afastar.
— Se é o certo eu não sei, mas se não for, eu sempre fui meio errado mesmo.
Quando ia colar nossos lábios de novo o seu celular o que estava pousado na mesa no centro da sala começou a vibrar e no mesmo instante nos separamos assustados como se estivéssemos fazendo algo errado.
De imediato olhamos para o aparelho e para a minha tristeza no visor apareceu o nome "Raquel".
— Preciso atender. — Rapidamente Martin se afastou de mim para atendê-la.
Fiquei paralisada sentindo o vazio pela falta do corpo dele próximo do meu e a desconfiança por ver o nome de quem ligava.
— Alô. Posso... Claro... não, não... Não vai demorar e logo estarei a caminho.
Tão depressa ela chama e ele vai?
Martin ainda falava com ela quando me afastei, saí da sala e segui em direção ao meu quarto. Era melhor evitar explicações desnecessárias.
Em minha mente martelava a pergunta de qual era a relação dos dois e o gosto amargo do ciúme tomou conta de mim.
Tranquei a porta do quarto quando cheguei nele e me preparei para dormir ainda sentindo o cheiro do Martin, o gosto do seu beijo e o ciúme martelando em minha mente, que me fazia criar várias histórias e questionamentos sobre a agilidade com que Martin atendeu a tal Raquel e as suposições queimavam o meu peito de forma que me sentia enganada sem nem ao menos ter nada com ele.
Vi a maçaneta da minha porta ser mexida com cuidado e sabia que era Martin provavelmente mexendo nela lentamente para não fazer barulho e falar comigo sem que dona Cássia ouvisse, mas eu não abri a porta.
Deitei-me na minha cama e fiquei de ouvido em pé, à espreita se Martin ia mesmo sair, como deduzi pelas partes picadas da conversa.
Até que não demorou e confirmei quando o ouvi ligar o carro. Corri para a janela, depois vi Martin saindo da garagem e sumir na noite.
Fiquei remoendo meus ciúmes, meu desejo reprimido e insistentemente pensava que eu precisava conhecer outras pessoas... Já havia pensado naquilo, mas sempre era para Martin que eu acabava voltando. Precisava virar essa página.
Martin não voltou para a casa depois que saiu para encontrar com a Raquel, o que me fez pensar que ele tinha terminado com ela o que começou comigo. Na sexta também não voltou e sua mãe disse que havia ligado para ele e com pressa Martin a atendeu e avisou que teve problemas no trabalho e que ia dormir por lá de novo.
Dona Cássia até me pediu desculpas por me deixar sozinha para ir para a sua excursão, mas garanti que me sentia bem sozinha e teria a companhia de Papa.
Senti-me muito incomodada por Martin não ter me enviado uma mensagem sequer.
Tá, ele não me devia explicação, mas pelo modo como tínhamos passado o dia, pela forma como me tratou e por tudo... podia ter me enviado uma única mensagem.
Na noite de sexta saí do trabalho e voltei para casa sozinha. Senti medo, mas andei tão rápido quanto as minhas pernas podiam e cheguei depressa.
Durante todo o percurso pensei que gostaria que Martin estivesse ali, mas para a minha decepção cheguei em casa e ele não estava.
Já de banho tomado brinquei com Papa, vi um pouco de uma série que comecei para me distrair e graças ao dia cheio logo dormi como uma pedra.
No dia seguinte, após um dia de trabalho exaustivo, mas regado a muito bate-papo com a Cyndi, no sábado à noite comecei a encerrar o expediente na loja e ao sair meio desligada para fechar a porta da vitrine, dei de cara com Guilherme me esperando do lado de fora.
— Oi. — Sua voz grossa tomou meus ouvidos.
— Oi! — cumprimentei-o tentando parecer natural, mas claramente sendo pega de surpresa com sua presença.
— Esqueceu que tínhamos marcado um chopinho hoje?
— Claro que não, só... achei que ia me esperar no bar.
Ele riu, obviamente notando minha mentira.
— Vim te pegar aqui.
— Só um minutinho que vou terminar de fechar e já volto.
Entrei correndo na loja, me olhei no espelho e ainda bem que meu cabelo estava alinhado, só o soltei e deixei as ondas compridas caindo por minhas costas.
Terminei de fechar tudo e um pouco animada segui para o bar com ele, na esperança que conseguisse me divertir.
O espaço era descolado, exibia paredes pintadas de preto e tambores de ferro faziam papéis de mesas, já os acentos eram bancos de madeiras que ficavam dispostos em volta dos tambores e também nos cantos do bar.
Ao invés de ficarmos na frente, na área aberta e com maior movimentação, preferimos seguir mais para o fundo, onde poderíamos conversar.
— Não me mandou mais mensagem. O que aconteceu?
— Correria do dia a dia. — Dei de ombros. — Trabalho, casa e só.
— Bom que hoje pode desestressar e curtir um pouco.
— Você também não me mandou mensagem.
— Achei que fosse atrapalhar. — Lançou-me um sorriso tímido e confesso que o achei bonito naquele momento.
Seguimos para uma mesa e mesmo não sendo tarde, o bar estava cheio e a animação era feita por música ao vivo tocada por uma banda local.
Guilherme sentou-se ao meu lado, fizemos nossos pedidos e preferi beber um suco, afinal, no meu primeiro contato com o álcool eu tinha perdido a virgindade, só Deus sabe o que mais eu perderia na segunda vez.
— E então, tem gostado da vida sem ser freira?
Dei de ombros e não queria conversar sobre aquilo, mas fazia parte da minha vida e eu teria que lidar com perguntas como aquela constantemente.
— Sim.
— Tem feito algo de diferente?
Pensei se deveria contar sobre a ida a lugares ilegais, fuga de bandidos, invasão a propriedade privada, entre outras coisas.
— Nadinha. Vivo apenas do trabalho para casa e hoje em um bar com você. — Sorri.
— Podemos repetir quando quiser. — Pegou na minha mão. — Posso te mostrar mais da cidade, pontos turísticos, lugares legais para frequentar à noite.
— Eu adoraria.
Nossas bebidas chegaram e Guilherme tirou a mão de cima da minha para dar espaço ao garçom e foi nesse momento que olhei para uma mesa distante e entre as pessoas que andavam pelo bar, vi o Martin sentado e me olhando.
Meu coração acelerou só por vê-lo ali após dois dias sem nem um contato.
Martin me ergueu sua bebida como em um brinde e me lançou um sorriso que não atingiu os olhos. Um sorriso frio. Depois o vi pegar o celular e com um semblante sério ligou para alguém.
Será que ele foi me buscar? Por que estava ali?
— E a loja? Ainda gostando do trabalho? — Guilherme perguntou após o garçom deixar a mesa e não contei a ele que Martin também estava no bar.
— Muito. Gosto de lidar com o público.
— Você é mesmo muito simpática, deve fazer sucesso com os clientes.
Sorri tentando esquecer que o meu malvado favorito podia estar me olhando da outra mesa.
— Sempre fui muito tagarela e ajudar o próximo mesmo que for para escolher uma fantasia é algo que eu gosto muito. Mas e o seu trabalho? Me conta mais sobre ele.
Guilherme e eu começamos um diálogo interessante sobre o trabalho dele como biólogo e me contou coisas interessantíssimas, que tomaram toda a minha atenção. Sempre fui apaixonada por bichos e ler e escutar sobre eles me fascinava desde que era menina. Inclusive, na minha nova vida eu até pensei em estudar algo como biologia ou veterinária.
No meio da conversa, lancei olhares sorrateiros na direção da mesa em que Martin estava e o observei rapidamente para ver que bebia uma cerveja na garrafinha long neck, parecia muito sério e mexia no celular.
Tentei não olhar tanto e aproveitar a companhia do Guilherme que estava sendo muito agradável. Ele era engraçado e não deixava a conversa parar, emendava um assunto no outro, me incluía nele mesmo eu não tendo tanta experiência e quando o dizia que não conhecia algo, prontamente o Gui dizia que me apresentaria em breve.
Seus olhares para mim eram sempre de admiração e faziam com que eu me sentisse linda ao seu lado.
Algum tempo havia se passado, tínhamos pedido uns petiscos e depois de alguns sucos precisei ir ao banheiro. Levantei-me sem olhar para a mesa do Martin e segui mais para o fundo do bar, onde em uma área aberta ficavam os banheiros.
Depois de fazer xixi e lavar as mãos, me olhei no espelho e parecia tão sem graça como sempre comparada as outras mulheres no bar, o bom que era cedo e apesar de lindas, a maioria das mulheres ali também tinham saído do trabalho como eu.
Logo saí do banheiro e no momento em que dei dois passos para fora fui pega pelo braço, por alguém que me puxou para um canto escondido e reprimi um grito quando mãos tomaram minha boca.
— Não acredito que você está aqui com ele — Martin falou muito perto de mim e com seu corpo me prensando contra a parede.
Mesmo em meio ao susto consegui sentir seu cheiro característico e a lembrança de momentos que o tive tão perto invadiram meus pensamentos, mas eu estava muito irritada com ele. Tirei sua mão da minha boca.
— Você está louco!
— Eu vim te buscar.
— Não precisava, já que sumiu com a Raquel desde quinta. Não me enviou uma mensagem sequer.
— O quê? — Se fez de desentendido.
— Ouvi você atendê-la e depois sair. Quando está comigo pensa nela?
Ele juntou as sobrancelhas e me olhou como se eu tivesse dizendo a maior bobagem do mundo, mas antes que Martin respondesse, eu completei:
— Estou acompanhada, volta para a Raquel. — Fui me afastar dele, mas me puxou de volta.
— Está com ciúme?
— Claro que não!
— Não vai me deixar explicar?
— Não me deve explicação.
Não queria que parecesse ciúme adolescente, eu já era uma mulher, mas era ciúme nu e cru, daqueles que doía e desde que Martin saiu de casa após o nosso momento na sala e a ligação da Raquel que estou queimando de ciúme
Saí da sua pegada e voltei para a mesa com o Guilherme. Tentei disfarçar meu coração acelerado quando me sentei e fiz uma pergunta aleatória sobre a música que tocava para que tirasse o foco de mim.
Tentei manter um papo animado ao mesmo tempo em que dava uma ou outra olhada pelo bar, porém, em uma das minhas olhadas furtivas em direção à mesa em que Martin estava acomodado, para a minha surpresa ele não estava mais sozinho. A tal da Raquel estava com ele.
Filho da mãe!
Por mais que eu quisesse manter a normalidade, algo em mim mudou e senti o ciúme e a raiva gritar ainda mais alto no meu peito. Guilherme provavelmente seguiu meu olhar e viu o Martin sentado distante.
— Olha quem está aqui hoje também. Quem é aquela? É a namorada dele? — Ouvir outra mulher ocupando o cargo de namorada do Martin fazia a raiva borbulhar como água fervendo dentro de mim.
— Não sei, acho que sim.
— Creio que já vi ele com ela. — Semicerrou os olhos como se isso fizesse com que ele enxergasse melhor.
— Ah, é?
— Sim, na quinta-feira eu estava saindo da escola em que dou aula noturna e vi Martin com uma mulher parecida com aquela. Ambos estavam entrando no carro dele.
— Vai ver estão começando um namoro. — Dei de ombros demonstrando-me desinteressada, mas dentro de mim as perguntas explodiam.
Martin teria algo com a Raquel? E se tivesse e eu cheguei depois e fiz com que ele a traísse?
Repensei e cogitei que foi por isso que Martin não deixou com que Raquel e eu conversássemos muito quando fui na boate pegar os livros ou por isso saiu tão depressa depois que ela ligou na quinta-feira.
Eu era uma péssima pessoa. Nem sequer perguntei quem era ela ou qual o envolvimento dos dois quando a vi. Nem perguntei se tinha alguém antes de me entregar para ele.
Sentia meu coração apertado e pensava que precisava mudar isso e logo.
Acabaria com qualquer fagulha de envolvimento que eu tivesse com o Martin naquele momento e não seria responsável por tirar o homem de outra mulher. Com isso, criando coragem apesar do coração doendo, olhei para o Guilherme e perguntei:
— Se eu te pedisse um beijo, você me daria?
— O quê? — Ele ergueu as sobrancelhas como se estranhasse o meu pedido repentino.
— Tudo bem se não quiser e...
Antes que eu terminasse a frase, Guilherme me deu um beijo de boca aberta, em que sua língua invadiu a minha e eu mal consegui respirar.
Nossa senhora!
Se era descobrir o mundo e os homens que eu queria, em pouco tempo já havia experimentado dois.
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