Capítulo 14
Capítulo catorze
Rosabel
Era segunda-feira e eu que ia fechar a loja.
Sentindo-me meio cansada e apoiada no balcão contava os minutos para o dia acabar. Tinha passado o domingo no quarto e só saí para ir à missa a noite com a dona Cássia e ainda assim me sentia exausta.
Assim que cheguei na loja contei sobre o meu sábado para Cyndi, deixando de fora a parte perigosa e só contando que perdi a virgindade com o Martin. Logo a minha amiga marcou uma consulta com sua ginecologista e para a minha sorte teve vaga naquele mesmo dia na hora do almoço, o que foi bom, assim tirei minhas dúvidas e comecei a tomar anticoncepcional.
Contei a ela também sobre o flyer com o símbolo e Cyndi me incentivou a procurar saber mais sobre aquilo e quem sabe descobrir se tinha relação com o meu passado e até mesmo com a minha família.
Havia tentado esquecer o assunto durante todo o domingo que passei trancada no meu quarto para não ver o Martin, mas após Cyndi dizer que talvez pudesse mesmo ter alguma ligação comigo, pensei que futuramente eu criasse coragem para procurar.
Não queria criar expectativas para depois não ter nada a ver com nada.
Sozinha na loja, não sabia muito bem o que estava sentindo em relação a tudo, ao mesmo tempo em que eu queria manter uma relação de amizade com o Martin, pensava que devia era me afastar de vez e no segundo seguinte queria bater na porta dele e gritar:
Me possuaaaa, seu gostosoooooo!!!
Andava tão desavergonhada que só pensava e repensava no sexo e nas sensações que vivenciei pela primeira vez. Daria tudo para ter as mãos dele em mim novamente.
Suspirei desanimada.
Olhei para o lado de fora da loja e tudo estava bem calmo, sem muito movimento por estar próximo da hora das lojas ao lado fecharem também.
Como havia pedido espaço a Martin, cheguei à conclusão que iria sozinha para a casa aquela noite e quando fui espiar do lado de fora na esperança de que ele estivesse lá e não levasse o espaço em consideração na ida para casa, não o vi em lugar algum.
A hora de encerrar o expediente chegou, fechei a loja e comecei a andar sozinha. A noite estava fria, como andou na última semana, com isso, apertei os braços na frente do peito e me encolhi, além de torcer para que o meu salário saísse logo para que eu comprasse casacos. Não ia pedir a dona Cássia, ela já fazia demais por mim.
Enquanto andava relembrei todas as noites que Martin e eu dividimos o caminho para casa, todas as conversas e isso me causou uma sensação de vazio. O queria comigo e já estava arrependida do espaço que pedi.
Sei lá por que, mentalmente perguntei-me: se caso alguém me seguisse, o que eu faria? Imediatamente outra pergunta tomou conta dos meus pensamentos e pensei: e se os que seguiram a Martin e a mim estivessem à espreita para me pegar?
Entrei em um transe de pensamentos negativos e muitos deles eram de pessoas me capturando. Balancei a cabeça para limpar a mente e eu devia estar com medo por nada. Martin pegou quem nos seguiu e eu estava segura.
Passo após passo, rezei para Deus me tirar aquela sensação e tentei imaginar que Martin estava ali comigo como nas outras noites.
Lembrei-me das nossas conversas aleatórias enquanto fazíamos aquele mesmo percurso e sorri sentindo saudade da sua companhia, entretanto, na solidão de passo após passo, não demorou muito até que eu percebesse que não estava mesmo sozinha e alguém me seguia muito de perto.
Não olhei para trás com medo de que se olhasse e visse o rosto, a pessoa parasse de me seguir e me capturasse de vez, então apertei ainda mais o andado para ver se abria uma distância e se caso não estivesse sendo seguida e fosse loucura da minha cabeça, quem quer que fosse ficaria para trás, porém, para o meu desespero, a pessoa atrás de mim andou mais rápido também.
Meu coração batia acelerado, mais do que eu conseguia andar, o medo tomando conta do meu corpo fazia com que eu tremesse e até sentisse as pernas mole, mas me forcei a andar o mais rápido que pude.
Ainda sem olhar para trás, notava no chão a sombra de uma pessoa muito perto de mim, a uns dois ou três passos de distância.
Mais uma vez cogitei que talvez eu estivesse sendo paranoica e aquele, andando muito perto, fosse uma pessoa qualquer, então fazendo um segundo teste mudei o caminho para casa e virei em outra rua. Só que a sombra virou também.
Ai, meu Deus.
"Não temas segue adiante e não olhes para trás. Segura na mão de Deus e vai..."
Comecei a cantar mentalmente pedindo a proteção de Deus e pensando que eu morreria no próximo passo, porém, quando achei que não fosse mais conseguir andar e estava pensando em correr, ouvi:
— Rosabel. — Parei de imediato e respirei aliviada quando reconheci a voz de Martin.
Virei-me de frente e confirmei que era realmente ele quem estava andando perto de mim. Fechei meus olhos, encostei-me ao muro ao lado, não conseguindo me manter de pé e comecei a chorar.
Vi o desespero no rosto de Martin, tomando entendimento do que eu estava sentindo.
— Ei...
— Você... quase me matou de medo! — acusei, com voz de choro e olhei para o chão com a respiração ainda acelerada.
Com dois passos rápidos se aproximou de mim e me puxou para junto do seu corpo, como se quisesse tirar o meu medo com um abraço.
— Desculpa, não queria te assustar. Você me pediu espaço, mas eu precisava te proteger, então pensei em andar perto, mas não junto — falou tudo de uma vez parecendo desesperado. — Não deixaria você voltar para casa sozinha.
Eu ainda chorava e tinha a testa apoiada em seu peito, enquanto os seus braços me apertavam como forma de me acalmar. Desceu seu rosto ao lado do meu, me puxou ainda mais para perto e sussurrou repetindo o pedido de desculpas no meu ouvido:
— Me desculpa, não queria te assustar, só te proteger. — Assenti, como se dissesse que estava tudo bem e me mantive agarrada a ele.
Até que senti a pele do seu rosto colado ao meu e vagarosamente começou a se aproximar da minha boca, fazendo as minhas pernas voltarem a tremer. Foi aí que seus lábios encostaram-se aos meus e ele me beijou.
De início foi um beijo lento e calmo como se pedisse permissão para aquilo, mas logo Martin me pegou ainda mais apertado com seus braços a minha volta e eu deixei-me envolver, até que um carro passou, viu a cena e buzinou me lembrando que estávamos na calçada, em público e não era aquele tipo de distância que pensei para nós.
Afastei-me de seus braços e não o encarei, o que o fez me dizer com a voz ríspida ou até triste:
— Vem, vamos para a casa. — Começou a andar como se fosse para eu segui-lo e assim eu fiz, mas estava com raiva do seu modo. Me beija e depois vira as costas como se eu fosse a errada em me afastar?
— Podemos só... esperar um pouco? Acho que fomos rápido demais no início, depois tudo o que aconteceu e...
— Podemos. — Tirou sua blusa e colocou sobre meus ombros. — Você está gelada. — disse ainda com aquele tom distante e eu queria arrancar a cabeça dele e fazê-lo me escutar, mas apenas continuamos andando em silêncio até que não demorou e estávamos entrando em casa e sendo recebidos por dona Cássia.
— Chegaram meus filhos. — Sua recepção calorosa me fez rir. — Já fiz o jantar mais cedo, porque imaginei que Rosabel chegaria com fome. Vão lavar as mãos e venham. — Parecia falar com duas crianças.
Ambos fizemos como dona Cássia disse e logo estávamos os três sentados à mesa.
— Vocês estão tão quietos. Aconteceu alguma coisa? — dona Cássia perguntou.
— Cansaço. Hoje a loja esteve cheia durante todo o dia — menti.
— Ah, isso é bom.
— É sim.
— E você Martin? — perguntou ao filho, mas ele só deu de ombros e colocou uma garfada de carne na boca, então ela insistiu: — Cansaço também?
— Sim — respondeu vago e dona Cássia juntou as sobrancelhas desconfiada, mas mudou de assunto:
— Sabe quem eu encontrei hoje, filho? Seu amigo Guilherme. Me falou que você apresentou Rosabel para ele. Fiquei muito feliz com isso. — Virou-se para mim. — Ele me passou o número do seu telefone para te entregar. Pediu para você mandar uma mensagem.
— Ah, que legal.— Sorri para o Martin que nem me deu atenção e parecia irritado.
Talvez por ter me beijado ou sei lá o porquê.
— Guilherme me pareceu uma ótima pessoa — falei e coloquei a carne na boca.
— É sim, conheço a mãe dele e foi por isso que o encontrei, ele estava junto com ela. Super apoio essa amizade — disse cheia de segundas intenções e com uma olhada rápida notei a expressão impaciente no rosto do Martin.
— Vou mandar mensagem para ele. Agora que Martin me deu um celular posso me comunicar com o mundo. — Sorri para ele que me deu um meneio de cabeça, um sorriso que mais pareceu uma careta e continuou comendo.
— Meu filho é tão bonzinho. — Dona Cássia soprou um beijo para Martin que para a mãe sorriu. — Que bom que ele te deu, porque se não eu ia dar. Muito mais prático enviar mensagens do que escrever bilhetes.
— Verdade. Agora também acho. Não troquei muitas mensagens, só com Cyndi e com a senhora, mas já estou gostando muito.
— Agora poderá trocar com o Guilherme. Quem sabe vocês não saem um dia desses.
Martin nesse momento se levantou bruscamente arrastando a cadeira no chão, levou seu prato a pia e saiu da cozinha após dizer:
— Vou para o quarto, lembrei-me que tenho um problema da empresa para resolver.
Dona Cássia me olhou com as sobrancelhas erguidas como se perguntasse o que tinha acontecido.
— Ele me disse que tinha mesmo um problema — falei depressa, mentindo e me perguntei se esse problema era algo relacionado a noite de sábado ou comigo, já que mal me olhou depois que chegamos.
Cogitei que podia estar bravo por Guilherme, mas me senti uma boba imaginando que Martin estaria com ciúmes de mim. Puff... Claro que não.
Martin
— Tomar no cu! — xinguei ao entrar no quarto.
Era o que me faltava, ver o Guilherme todo amigo da Rosabel e a minha mãe apoiando. Pensei que ela só incentivava a amizade dos dois, porque não conhecia o mesmo Guilherme que eu.
Apesar que comparado a mim, era um santo e Rosabel estava mais bem acompanhada com ele do que comigo.
Sentia-me irritado como uma criança que perdeu o brinquedo novo e sabia que estava sendo infantil, Rosabel era livre para ser amiga, ou o que quer que fosse, de quem quisesse e eu que tinha que controlar o ciúme que tomava conta de mim sempre que a imaginava com outro homem que não eu.
Não devia tê-la beijado, mas sua boca estava tão perto e tão chamativa após o choro que foi mais forte que o meu autocontrole. Além de eu estar me sentindo tão culpado por tê-la assustado daquela forma que o beijo me pareceu uma espécie de afago.
Embora pelo modo como se afastou de mim, ela não viu dessa forma e sim como uma invasão ao seu espaço e eu de imediato me senti envergonhado, em resposta apenas quis seguir para casa.
Deitei-me na minha cama e resolvi assistir um filme para deixar de pensar besteira, no entanto, um comercial de um creme rejuvenescedor passando na TV chamou a minha atenção quando o símbolo que Rosabel havia dito que estava ligado à sua história, apareceu como logo da empresa fabricante do creme Afrodite Cosméticos.
Juntei as sobrancelhas e peguei o celular para uma pesquisa rápida. A empresa havia sido fundada no ano de 1995 e foi sucesso na época com aquele mesmo creme rejuvenescedor, que segundo a matéria, fazia milagre entre as mulheres, no entanto, teve uma mudança na sua gestão em 1996 e a empresa foi assumida por Gabriela Gothel única herdeira da família Gothel.
Olhei para aquela matéria, analisei a foto da tal herdeira que aparentava ter por volta de cinquenta anos e algo ali me parecia familiar, como se já a tivesse visto, cogitei que a impressão se devia, por ser uma empresa famosa e aquela mulher podia ter aparecido nos meios de comunicação, porém, me perguntei: qual a relação de Rosabel com o símbolo da empresa?
Pesquisei mais coisas sobre aquele símbolo e apareceu que era o da deusa da beleza. Considerando que Rosabel era linda, fazia sentido ter sido abandonada no convento com coisas com aquele símbolo. Uma deusa.
Deixei de lado o celular quando ouvi um barulho na porta da frente, pensei em ir até lá, mas fiquei apenas na vontade ou ficaria muito claro que eu me via meio viciado na sua presença. O que era um inferno.
Eu não podia só ter transado e pronto? Por que me sentia daquela forma com aquela ânsia de ficar perto dela?
Não queria que nada de mal a acontecesse e não me perdoaria se por minha culpa perdesse aquele sorriso lindo e o ar inocente, então para protegê-la me manteria por perto, mas não tão perto.
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