Capítulo 12
Saí às pressas da biblioteca e sentindo meu corpo em chamas.
Há tempos um beijo não me ligava assim, do modo como eu estava naquele momento, entretanto, eu senti que era errado. Pensei nos meus pais e em como eles reagiriam se soubessem que eu estava aos beijos e tendo pensamentos indecentes com o meu patrão. Provavelmente não aprovariam.
Também pensei que estávamos indo rápido demais, tão rápido que mal sabia como em poucas semanas a nossa relação tinha passado de ranço um do outro, para ele se tornando meu herói ao me salvar de um estupro e depois para um beijo quente, muito quente, na mesma biblioteca em que ele tinha me assustado e me expulsado.
Enquanto andava para o quarto, pensei que Félix era intenso, cheio de coisas para lidar e talvez estivesse me usando como distração e eu tinha medo de me deixar ser usada e depois me machucar.
Mas eu queria usá-lo.
Queria usar do seu corpo... e que corpo, mas não queria que ele usasse do meu coração.
Tranquei-me no quarto e decidi tomar um banho frio para tirar o calor que eu estava sentindo, porém, dentro do banheiro, antes de tirar a roupa, me encarei e minhas bochechas vermelhas indicavam o quanto eu estava doida de tesão por aquele homem.
Podia ter transado loucamente com ele antes de encerrar tudo.
Eu não conseguia parar de pensar no quanto o sexo com Félix devia ser incrível e um arrependimento por ser uma medrosa que pensa demais tomou meus pensamentos, no entanto, antes isso do que me arrepender depois de algo que eu fiz.
Ou será que se arrepender de ter feito é um sentimento melhor do que não fazer e aí se arrepender de não ter feito?
Foda-se!
Saí do banheiro, abri a porta do meu quarto e corri em direção à biblioteca.
Eu ia pular no colo dele e pedir para que Félix me possuísse ali mesmo em meio aos livros, ia cavalgar em seu colo, o mostrar que eu o queria tanto quanto demonstrou me querer e depois do sexo incrível, que desfrutaríamos como dois animais no cio, eu com certeza me sentiria menos quente.
Ri do meu pensamento e me apressei para chegar até ele... Contudo, quando cheguei esbaforida na biblioteca, o cômodo estava completamente vazio.
— Félix... — Ninguém respondeu.
Bufei.
Droga!
Pode ser sinal de Deus para que eu me aquiete e me mantenha com foco apenas no trabalho, que era o que eu tinha ido fazer ali.
Acordei pela manhã, me sentindo cansada por mais uma noite maldormida e um tanto... frustrada pela falta do bendito sexo que foi planejado e não executado.
Passei a noite pensando que tinha sido melhor assim, foi bom ele não estar na biblioteca para eu não fazer uma loucura. Senti como se Deus tivesse colocado a mão em meu ombro e tivesse dito: "Te controla, doida!".
Com sono me arrastei até a cozinha, cumprimentei as meninas e tomei apenas o café.
— De novo só o café, dona Arabela? — Madalena perguntou com as mãos na cintura.
— Estou sem fome, acordo sem fome na verdade.
— Mas não tem jantado também, porque deixo o jantar e você nem toca.
Sorri.
— À noite tenho tomado um chá ou faço um lanche rápido.
— Entendi... Escuta, você sabe se aconteceu alguma coisa com Félix ou entre você e o Félix? — Madalena cruzou os braços na frente do peito.
Quase cuspi o café, mas engasguei e os olhos de todas caíram sobre mim.
— Ham? Não! Por quê?
— Bela, ele veio tomar café mais cedo, só faltou cuspir fogo e mal nos falou bom dia. Se ele fosse um pouco menos educado não teria dito — Viviane me contou como se tivesse contando uma fofoca.
— Desde domingo que não o víamos assim — Cecília falou.
— E o que será que causou esse mau humor? — Me fiz de desentendida.
— Achamos que você podia saber. Clóvis disse que viu vocês dois na biblioteca ontem, antes de dormir — Cecília falou desconfiada.
Mordomo fofoqueiro!
— Eu não. Nós lemos e eu fui dormir. Nada aconteceu.
Elas me encararam por alguns segundos até que Madalena me contou:
— Ele foi até uma das empresas e só vai voltar no final de semana.
— Tudo isso de tempo fora? — perguntei, mais triste por sua saída do que deveria.
— Sim, foi o que ele disse.
— É que... bem, preciso de algumas assinaturas em documentos e tal.
— Logo ele volta, Bela — Viviane me consolou.
Mudei de assunto perguntando por Zipe, que Madalena disse que estava na escola naquele horário, mas que logo chegaria. No entanto, dentro de mim não podia negar que estava um pouco decepcionada por Félix ter viajado logo após termos nos beijado, para mim era como se estivesse fugindo.
Conversei mais algumas amenidades com as meninas, até que me despedi e saí para começar o dia de trabalho no escritório. Insistentemente no meu pensamento, apenas a lembrança de que ficaria três dias sem ver o Félix existia e apesar de chateada, inevitavelmente senti saudade.
Pensei na história do mau humor e imaginei que talvez o motivo dele estar mal-humorado, fosse por eu tê-lo afastado ou até mesmo por termos nos beijado.
Não seja ridícula, Arabela! Você não é tão importante assim, a ponto dele mudar de humor por sua causa.
Forcei-me a parar de pensar nele e foquei no trabalho, até mesmo contra a minha vontade, o nosso beijo invadia meus pensamentos, me fazia fechar os olhos em contentamento e sentir seu gosto e o toque dos seus lábios nos meus.
Dia após dia daquela semana sem ver o Félix foram um martírio.
Eu já sentia falta dele e tinha que admitir. Desde que cheguei à mansão foram dois dias intensos, principalmente o que passamos juntos durante a leitura e sem contar o momento de desespero em que ele me salvou.
Félix era meu amigo e eu estava começando a desconfiar que dentro de mim algo a mais que amizade começava a nascer depois do nosso beijo e a distância dele incansavelmente parecia confirmar ainda mais.
Eu pensava no nosso beijo e sentia saudade mesmo quando não queria sentir, não podia sentir e como doía pensar que ele talvez estivesse longe apenas para me evitar.
A nossa diferença financeira era gritante e eu nem precisava fazer esforço para notar isso. Apenas o banheiro de uma das suas casas era o valor da casa inteira que meus pais com esforço conseguiram comprar. Sendo assim, me perguntava o que um homem como Félix veria em mim se não uma diversão momentânea?
Durante a noite fui para a biblioteca atrás de uma leitura nova e acabei lendo um livro que já tinha lido há algum tempo, pois se eu começasse algo novo naquele momento, era certo que não prestaria atenção na história.
Deitei-me no sofá e foi inevitável não pensar na noite do beijo que vivi ali, fechei meus olhos e quase que sentia o perfume dele, o peso do seu corpo me prensando contra o sofá e do gosto do seu beijo com lábios macios.
Daria tudo para repetir e me xinguei mentalmente por ter parado por causa de medo bobo... Bobo, porém sensato. Xinguei-me de novo por permitir que um único beijo mexesse comigo daquela maneira.
Resolvi voltar para o meu quarto e encerrar a leitura depois de não ler nem dez páginas, mas voltaria ali nas outras noites para relembrar o momento, sofrer por ser uma medrosa e para, quem sabe, com muito custo ler e entre um pensamento e outro, lembrar de Félix.
Assim foram os demais dias, achei que ele voltaria naquela semana e não voltou, passou o final de semana em que prometemos ir à praia com o Zipe e fui sozinha com meu pequeno amigo, no domingo andamos a cavalo e eu apesar do medo, conheci a égua mais dócil e simpática de todas. Lua.
Depois a segunda-feira chegou e nada do Félix voltar, com isso reclamei para o Clóvis que vários documentos precisavam da sua assinatura e autorização, sendo que ele mesmo me orientou que nada ali era para ser feito sem seu aval.
Durante as noites daquela semana, aproveitei para ler e perdi as contas de quantos livros li da biblioteca imensa que tinha ao meu dispor. Começava um após o expediente e terminava de madrugada e assim a semana passou que eu nem percebi.
Com o passar dos dias a saudade que sentia por Félix virou raiva e a ausência da fera mais doce que conheci, me irritou.
Apesar do pouco tempo de convivência, Félix fazia uma falta tremenda no meu dia a dia e constatar isso me irritou ainda mais.
Félix
Não tinha nada para fazer na empresa nem nenhum compromisso profissional, mas achei melhor dar um tempo da mansão após ser rechaçado pela Arabela.
Enquanto isso hospedei-me na cidade, caí na bebedeira e voltei a ser o Félix irresponsável e mulherengo do começo do luto, tudo isso para matar a saudade que eu estava da minha administradora baixinha.
Eu não sabia lidar com problemas e cada vez que esbarrava em algo que me desapontava ou magoava, reagia de modo diferente, ficando calado, revoltado, mal-humorado ou bêbado mulherengo.
Muitas das noites daquela semana em que quando não estava bebendo estava trepando, não me lembro. Acabei marcando encontro com uma antiga amiga de foda, assessora de uma das empresas, e que eu não via há tempos.
Tatiana não tinha nada a ver fisicamente com a Arabela, foi mais como um sorteio na minha lista de contatos, o que depois pensei que até seria bom para esquecer aqueles olhos castanhos tão chamativos. Que engano!
Por mais cafajeste que pudesse soar, a cada estocada que eu dava na Tatiana, mais eu ficava puto por aquela ali gemendo na minha frente não ser quem eu realmente queria que fosse.
Até pensei em usar a Tatiana para o que eu precisava e até acho que ela aceitaria com alegria, mas eu me sentiria um merda.
Resumindo as noites que passei fora da mansão foram assim: uma orgia só e um grande porre. Foi então que na sexta-feira tive que voltar, pois recebi um áudio malcriado de Clóvis, que me repreendia da seguinte maneira:
"Menino Orsini, sinto lhe dizer isso dessa maneira pouco cortês, no entanto, o senhor está me parecendo um patife relapso com todos esses dias fora de casa. Sabemos que o senhor não tem motivos para agir como um garoto mimado. E a senhorita Bela precisa do senhor. Ou melhor dizendo: o senhor precisa dela"
Tive que rir do áudio e do seu modo arcaico de falar.
Ainda em um segundo áudio, lembrou-me que o meu tempo estava correndo e quanto mais eu enrolava na minha missão, menos tempo eu tinha.
Eu sabia que ele queria que eu focasse em Arabela e a namorasse. Gostou dela desde o primeiro momento que a viu e deixou isso claro para mim em muitas vezes, porém, eu não queria que fosse dessa forma.
Com Arabela era diferente, queria fazer com que ela se apaixonasse por mim.
Na noite da sexta-feira, dirigi para casa e quando passei pela portaria e olhei pelo retrovisor, me certifiquei de que o carro dos meus seguranças passou logo atrás de mim e revirei os olhos para isso.
Odiava ter que andar com cães de guarda à minha volta e isso em um futuro diferente seria algo que eu iria apreciar.
Estacionei o carro na porta da frente e rumei em direção à entrada da casa, deixando que os seguranças guardassem o veículo na garagem.
Já dentro da mansão andei em direção à biblioteca que como sempre era o meu canto preferido da casa, até mais que o meu quarto, principalmente depois dos últimos acontecimentos vividos ali.
Entrei na biblioteca e parei abruptamente quando vi que no sofá, deitada usando um vestido curto que deixava suas pernas a mostra, estava Arabela, com um livro em seu peito e com os olhos fechados de forma serena, dormindo calmamente.
Aproximei-me devagar para não acordá-la e sentei-me ao seu lado, em seguida observei o quanto ela era linda e sem que eu pudesse controlar, passei a mão de leve em seu rosto, o que consequentemente a despertou.
Arabela abriu os olhos devagar e quando viu que eu estava ao seu lado, juntou as sobrancelhas e semicerrou os olhos como se não acreditasse que eu estava ali.
— Oi — a cumprimentei.
— Oi. — Sentou-se e parecia chateada. — Desculpa por estar aqui, já vou sair. — Levantou-se e estava indo quando segurei delicadamente o seu pulso.
— Ei, o que é isso? Não precisa sair, pode usar como e quando quiser.
— Acho melhor não. — Se livrou da minha pegada e ia sair de novo, mas parou quando perguntei:
— Por quê?
— Não quero te afastar da sua própria casa, então é melhor que eu fique apenas no meu quarto e assim você não precisa fazer isso para evitar me ver.
Fiquei sem fala, pois eu tinha saído dali exatamente para não vê-la, mas não porque era um incômodo, mas porque Arabela era como um ímã e eu o ferro, facilmente atraído para perto dela sem que eu pudesse controlar e aí achei que ficar longe ao menos daria o espaço que talvez ela quisesse depois do nosso beijo.
— Não foi isso.
— Não quero te atrapalhar, senhor Orsini, então acho melhor mantermos tudo no campo profissional.
— Somos amigos e pode me chamar pelo meu nome. Você não me atrapalha.
Encarou-me e assentiu, parecia em dúvida do que dizer, mas por fim e para a minha alegria, soltou o ar que estava segurando e perguntou:
— Como foi sua semana?
Sorri quando notei que ela estava ficando flexível.
— Sem graça sem você. — Não era mentira.
Revirou os olhos.
— Deve ter tido muito trabalho considerando a demora do retorno.
Abri um largo sorriso.
— Sentiu saudade de mim?
Vi que segurava o sorriso.
— Não, só do trabalho que acumulou sem você aparecer para dar o aval.
— Sei...
— Tudo bem, senti falta da nossa amizade.
— Eu também.
Encaramo-nos e eu não sabia o que dizer, há tempos que não precisava ser legal com alguém.
— Agora vou dormir. Boa noite, senhor Orsini — me provocou com um sorriso faceiro nos lábios.
Não queria que ela fosse, mas respondi com uma sobrancelha arqueada, demonstrando desagrado por sua provocação:
— Boa noite, Arabela.
Com uma expressão peralta ela se foi.
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