Capítulo um
Capítulo um
Cinco anos depois
Ricardo
Eu era viúvo há cinco anos e pai de primeira viagem desde então.
Depois que minha esposa Rebeca partiu, tão precocemente, foram momentos difíceis. Minha mãe havia falecido anos antes e eu não tinha ninguém da minha família a quem recorrer quanto a minha filha e também nunca tinha tido contato com bebês, ou seja, eu era mesmo, com toda certeza, um pai de primeira viagem, como dizia o dito popular.
No início foi tudo tão difícil que achei que não fosse conseguir, me cobrava como pai e me perguntava se estava fazendo a coisa certa a cada dia, mas o meu amor pela minha filha me deu forças nos momentos de desespero e me ensinou que eu sabia sim cuidar dela.
A ajuda da madrinha da minha filha, a Talita, que era a melhor amiga da minha falecida esposa, foi crucial para que eu aguentasse o luto e cuidasse da minha vida. Talita, Rebeca e uma outra amiga que já não morava na mesma cidade que nós, a Marilia, eram como irmãs desde a infância e por isso quando Rebeca descobriu que estávamos esperando uma menina, logo disse que se chamaria Talia Maria, em homenagem às duas amigas e convidou Talita para ser madrinha da nossa bebê.
Eu vivia em uma confusão de sentimentos que variavam de gratidão, por minha filha estar bem, e revolta pela partida da minha esposa, no entanto, em vários momentos de angústia eu tinha a Talita, que se fez presente e esteve comigo como uma verdadeira amiga, me ajudando no que eu precisava.
Alguns meses depois, minha vida começou novamente a mudar e deu uma reviravolta, quando o meu relacionamento de amizade com Talita foi se tornando algo mais e um sentimento começou a surgir entre nós.
Lutamos fortemente para que o sentimento fosse apagado dos nossos corações, já que a culpa que carregávamos e a sensação de estar desrespeitando a Rebeca foi maior do que qualquer coisa que pudéssemos sentir.
Passei noites em claro dividido entre o que eu queria e o que eu não deveria fazer.
Eu via que Talita também sofria e enfrentava o mesmo dilema que eu, em uma noite em que ela passou para ver como Talia estava, conversamos de forma superficial e, por respeito à Rebeca, decidimos nos afastar.
Foi o certo a fazer apesar de ter doído em ambos. Nunca assumimos nada ou dissemos algo um ao outro, nossa conversa foi toda nas entrelinhas, mas sabíamos pelas trocas de olhares e pela grande vontade que tínhamos de ficar um perto do outro, que não era mais amizade.
Na semana seguinte, em que ficamos distantes, Talita apareceu com a novidade de que a Marilia, a terceira amiga, tinha conseguido um emprego muito bom no estado em que ela morava e com isso Talita teria que se mudar.
Em menos de um mês ela se mudou e na despedida trocamos apenas um abraço apertado, demorado, dolorido e cheio de culpa. Ela não deixou endereço ou telefone que eu pudesse entrar em contato, apenas foi.
Com o tempo, Marilia passou a ligar semanalmente para se manter atualizada sobre o crescimento da Talia e fazia perguntas que eu sabia que quem as estava fazendo era na verdade a Talita. Eu senti vontade de pedir para falar com ela, mas não fiz isso.
Em todas as datas comemorativas Talita mandava um presente com um cartão para a Talia, assinado como fada madrinha e quando Talia foi crescendo ela esperava ansiosamente por cada data para que a fada a mandasse um presente. Às vezes, os presentes chegavam sem data nenhuma, apenas como modo dela dizer que se lembrava da minha filha.
Nunca soube onde Talita morava, a procurei nas redes sociais e não achei. Foi o jeito dela dizer que era melhor não termos contato e eu também pensava que era o melhor mesmo a fazer, porém, eu queria a sua companhia e pedia perdão a Rebeca por isso sempre que desejava a presença da Talita e tinha pensamentos impróprios com ela.
Cinco anos se passaram...
Eu sentia saudade da minha esposa, mas não doía mais como antes, já quanto a Talita... ainda sentia falta da sua companhia e amizade, e nesse caso ainda me doía, pois não tínhamos tido um final e quando eu pensava nela, era como caso inacabado.
Com isso, vivi os últimos anos da minha vida com um sentimento de que me faltava algo e como um eterno pai solteiro, cobiçado pelas mães da escola da Talia, mas nunca me interessei por nenhuma delas e vivi para a minha filha.
Pai solteiro e totalmente perdido novamente, já que no momento, eu estava na primeira semana na nova vizinhança e sem saber por onde começar a organizar a vida nova que estava começando.
Tinha acabado de me mudar, eu era Engenheiro Ambiental, sempre trabalhei para a mesma empresa de tratamento de água da minha cidade, mas fui obrigado a mudar de casa, de cidade e de rotina, quando essa empresa me transferiu de estado e precisei aceitar a transferência ou eu ficaria desempregado, já que a minha antiga cidade era pequena e não tinha muitas opções para a minha área de atuação.
Com isso, ali estava eu: em uma casa nova paga pela empresa, com estabilidade financeira, com muitas caixas para desempacotar e o principal: com a minha filha comigo.
Talia era uma criança esperta, faladeira e alegre, fiz de tudo para que ela não sentisse falta da mãe e eu me orgulhava do meu papel de pai, apesar de lutar com cabelos, porque penteados não era algo que eu fazia com destreza.
Na cidade nova a semana passou voando e só consegui enfim levar a Talia para a escola na sexta-feira. Pensei em deixar que ela faltasse e começasse apenas na segunda, mas sexta era dia de brinquedo e talvez fosse mais fácil para ela interagir com os novos amigos nesse dia.
— Vamos lá, gatinha, primeiro dia na escolinha nova e eu tenho certeza que você vai tirar de letra — falei, enquanto colocava a mochila rosa nas costas da minha filha.
— Não quero ir, papai.
— Você não quer aprender a ler todos os livros que a fada madrinha te deu? — Talia assentiu. — Então você tem que ir para a escola.
Ela me olhou com seus olhinhos castanhos, com cílios pretos e cheios como os da mãe e disse:
— Mas a minha melhor amiga não estará nessa escola.
— Você fará outras.
— Mas não é igual.
— Eu sei, mas essas também serão legais iguais à Maria Manoela — falei o nome da sua melhor amiga, que ela deixou para trás, e Talia me lançou um sorriso apagado.
Saímos em direção à escola e Talia estudaria não muito longe de onde morávamos, o que era bom, pois eu ainda não tinha comprado um carro e na volta eu poderia aproveitar para fazer uma corrida para me exercitar.
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