Capítulo 14
(Ítalo)
— SAFIRA! — Grito no mesmo momento em que ouço um barulho alto e vejo minha melhor amiga caindo encima de mim. Por conta do susto acabo colocando mais força do que estou acostumado para carregá-la.
Ela caiu perfeitamente nos meus braços, portanto se torna mais fácil virar seu corpo e deitá-la no chão. Mas o que houve aqui?! Ela está desmaiada?! Assim, do nada?!
Mudo a direção do meu olhar por um momento e já vejo o aglomerado de pessoas se formando ao nosso redor. Todas falando muito alto e, assim como eu, sem entender ao certo o que aconteceu com ela. Algumas se abaixam e começam a tocá-la, passar a mão no seu rosto, cabelo, braços, tórax... E algo sobe à minha cabeça. Algo como um instinto protetor, como se nenhum desses jovens tivesse o direito de passar a mão nela, independente da circunstância.
— Saiam! Saiam de perto! Deixem-na quieta aqui! Se afastem! — Falo em tom alto o suficiente para que todos ouçam e, enquanto isso, empurro algumas pessoas de perto dela. — Safira! Safira, está me ouvindo?! — Pergunto enquanto aperto o seu ombro.
Oh meu amor, o que está acontecendo com você?! Me responde! Penso enquanto dou batidas leves no seu rosto. Um desmaio repentino?!
Uma onda de preocupação invade meu peito. Será que ela está passando por algum problema de saúde e não me contou?!
Aproveito que as pessoas realmente se afastaram e coloco o braço esquerdo por baixo do seu pescoço e o direito levantando suas pernas.
— Alguém leva um colchão para o salão. Rápido! Vou tirá-la do sol. — Falo sem tirar os olhos dela, mas percebo que a Samantha e a Amanda correm na direção do dormitório das meninas.
Faço força para levantar tanto o meu próprio peso quanto o dela, e ando rapidamente pedindo licença para os que estão na minha frente.
De alguma forma as pessoas querem ficar olhando para ela, por isso ficam me seguindo e acompanhando cada passo que dou.
Como a distância entre o campo e o salão é consideravelmente grande, quando eu chego com a Safira nos braços as meninas já haviam colocado um colchão de ar azul no chão e eu a deito sobre ele, cobrindo logo suas pernas com a malha do vestido que havia levantado no caminho.
Minha cabeça está a mil, assim como o meu coração, e eu simplesmente não sei explicar o que acabou de acontecer. Eu estava tranquilo, assistindo à partida de futebol e esquecendo por um momento da existência do Leonardo na minha vida, quando de repente a Safira chega até mim com os olhos vermelhos e inchados de chorar, e depois ela simplesmente desmaia! O que está acontecendo?! Será que ela passou mal?! Mas o que a teria feito ficar assim?!
Lembro de uma coisa. Ou melhor, de uma pessoa.
Eu prometo que se o Leonardo tiver feito alguma coisa para a minha Safira eu...
— SAFIRA! — Ouço a voz do Cauã se aproximando. Ele chega correndo e se abaixa ao meu lado, logo pegando no rosto dela. — Meu Deus! Filha! Safira, responde! SAFIRA! — Ele grita, parecendo desesperado.
— O que aconteceu aqui?! — Pergunto meio em pânico com as sobrancelhas franzidas. — O que foi, Cauã?! — Grito na tentativa de descobrir se ela estava passando por algum problema de saúde pra ter esse desmaio repentino. Eu realmente não sei o que acabou de acontecer com ela.
"Foi uma bolada?!", "Ela levou aquela bola que o Felipe chutou?!", "Gente, a bola veio muito forte!", "Caramba, aquele chute foi certinho na cabeça dela?!", "Foi! Ela estava de costas, eu vi!". São frases que ouço ao prestar atenção nas conversas, coisa que não tinha feito até agora pela minha cabeça estar meio revirada com a situação. Ninguém nunca desmaiou nos meus braços, muito menos a Safira!
— Meu Deus! Ela desmaiou?! — Ouço a voz do Felipe, da equipe Laranja, ao se abaixar de uma vez com o rosto vermelho e uma expressão de horror. — Eu juro que não foi intencional Cauã, a bola pegou de mau jeito no meu pé e foi para a direção errada. Meu Deus! Me desculpa Cauã, me desculpa! Safira! — Ele grita e a chama, balançando sua mão esquerda.
Meu coração está quase rasgando o peito e eu realmente não sei o que fazer. Ela está completamente apagada, sem nenhum sinal de vida. Mal vejo seu peito se mexer com a respiração.
Uma bolada?! Ela levou uma bolada na cabeça?! Como eu não vi essa porcaria de bola vindo na sua direção?!
Droga! Droga! Droga! Dou um murro no chão, mas acabo me arrependendo.
E se foi algo grave? Para ela ter desmaiado só pode ter afetado alguma parte da cabeça! Droga! Bufo. Não acredito que não consegui proteger a Safira de uma mísera bola! Caramba, Ítalo, que idiota, idiota, idiota!
As pessoas ao redor estão tumultuadas e falando muito alto. Felipe está gritando desesperado chamando a Safira e pedindo perdão repetidamente enquanto Cauã checa os batimentos dela. Logo em seguida a Sam chega, assim como a Sarah, meu irmão e o... Leonardo.
Ignoro todos eles, levanto e começo a pedir o celular de qualquer pessoa por perto, logo ligando para a ambulância. Consigo explicar meio desesperado e ofegante que uma jovem levou uma bolada muito forte na cabeça e perdeu a consciência, e enquanto aguardamos ansiosos a chegada dos paramédicos eu só consigo ficar sentado ao seu lado, acariciando sua mão e orando para que Deus cuide dela e não permita que nada sério aconteça.
Luto para não me concentrar no que as pessoas ao redor estão dizendo, como "Pancada na cabeça é coisa séria" ou "Isso pode até causar sequelas" e coisas parecidas. Luto para não me concentrar nas coisas pessimistas que eu mesmo estou pensando. Agora só quero me agarrar na esperança de que tudo isso está sendo só um susto.
Apesar de que por dentro meu coração aparente estar se quebrando por vê-la assim, consigo me manter firme e não deixar que nenhuma lágrima caia; eu sei que ela vai ficar bem.
Cauã retoma sua postura de líder e pede que todos se afastem e procurem fazer outra atividade para que ela não fique sufocada. Também diz que o jogo não vai continuar hoje e que será adiado para amanhã, pois ele tem certeza de que tudo ficará bem.
Depois que a maioria dos jovens sai ele coloca a mão direita no meu ombro e pede para que eu tome conta das "suas mulheres" (se referindo à Safira, que está inconsciente, e à Sam e Sarah, que estão se acabando de chorar) enquanto ele vai resolver algo com o restante da coordenação do acampamento, alegando que quando a ambulância a levar ele quer ficar com a filha no hospital, e que vai deixar outras pessoas cuidando dos jovens aqui enquanto tudo se resolve.
Dentro de uns vinte minutos a ambulância chega, e depois de fazerem algumas perguntas eles a levam, dizendo que querem apenas uma pessoa como acompanhante da vítima dentro do automóvel. A Sam acompanha minha Safira e eu vou correndo procurar o Cauã, dizendo que precisaremos ir de carro pois eles só permitiram um acompanhante. Ele então me dá as chaves e pede para que eu o busque.
Faço o que ele pediu e, assim que ele entra e já estou quase acelerando novamente ouço as batidas desesperadas da Sarah no vidro do passageiro, alegando que quer entrar e ir conosco.
— Sarah, melhor você ficar. Peça pra sua prima te dar uma água com açúcar. De desesperada basta a sua mãe!
— Pai, por favor! — Ela implora enquanto chora de forma mais desesperada que o normal, como se minha Safira estivesse a ponto de morrer. Reviro os olhos e bato apressadamente os dedos no volante, mas graças a Deus a Samantha chega por trás dela, a afasta do carro e diz para ficarmos tranquilos, pois ela vai tomar conta da Sarah. Acelero o carro, mas ainda consigo ouvir os protestos da minha ex-quase-cunhada.
Enquanto dirijo o carro a 85km/h tentando avistar algum resquício da ambulância, Cauã liga para a Sam perguntando para qual hospital estão indo.
Passamos o resto do percurso em silêncio.
⁂
Estou sentado em uma cadeira ao lado do leito onde minha Safira está deitada, acariciando seu rosto com as costas dos meus dedos. É incrível como ela é tão única no mundo, tão incrível, quase intocável. Ou pelo menos deveria ter sido.
Respiro fundo ao lembrar que eu nem mesmo deveria estar com tanta intimidade; meu plano foi por água abaixo e ela já está comprometida com outra pessoa.
Bufo e recosto minha cabeça na maca, fixando os olhos no seu rosto. Eu só queria que ela já tivesse acordado, isso está me preocupando.
Safira levou a bolada cerca de 15 horas da tarde, e ao olhar para o relógio fixado na parede do quarto constato que faltam apenas 15 minutos para a meia noite. Até agora ela não deu nenhum sinal: não se mexeu, não abriu os olhos e nem mesmo fez algum gemido, apesar de seus batimentos estarem normais.
Depois de pedirem detalhes do que havia acontecido os médicos a levaram para uma ressonância e em seguida a internaram, dizendo que a bola veio muito veloz em sua direção e que tinha acertado em cheio a região da nuca, afetando diretamente o sistema límbico, responsável por algumas funções do corpo como memória, emoções e aprendizado.
Também disseram que não houve nenhuma lesão grave, mas que casos como esse são muito relativos, então ela tanto poderá acordar logo quanto levar até mesmo dias para recuperar a consciência, e nos alertaram que ao acordar ela poderá sentir muitas tonturas, fraqueza, dores de cabeça, enjoo, ter perda de memória ou até mesmo uma crise de sentimentos - que explicaram como sendo uma mudança brusca de sentimentos ou ter emoções inadequadas para o momento, como ficar com muita raiva se alguém elogiar seu cabelo — entre outras coisas que não poderiam ser previstas de um modo geral.
Ela está no soro agora, mas eles falaram que se ela demorar mais para acordar eles precisarão introduzir uma sonda.
A Sam, como já era de se esperar, não parou de chorar um só momento e estava muito nervosa e ansiosa, o que fez com que sua pressão baixasse de forma brusca, ou seja, ela também foi parar na enfermaria; por isso, assim que ela melhorou, o Cauã decidiu levá-la de volta para o acampamento para que se distraísse um pouco, mesmo sendo contra a vontade dela, pois a última coisa que queria era sair do lado da filha.
Ele a acalmou dizendo que ficaria tudo bem e que eu tomaria conta da filha deles se algo acontecesse, então eles foram embora e até agora estamos a sós aqui.
Depois de quase uma hora o Cauã me ligou para perguntar como estavam as coisas e dizendo que só voltaria ao hospital amanhã por volta das 6 horas, pois os jovens estavam muito agitados com tudo o que aconteceu e não paravam de pedir informações . Disse também que eles tirariam um momento especial do culto para orar pela situação dela e pediu que eu fizesse o mesmo no quarto onde estávamos, por mais que estivesse sozinho. Disse também que qualquer novidade ou qualquer coisa que um de nós dois precisasse eu deveria ligar para ele e pedir, pois ele daria um jeito.
Depois que o Cauã ligou também comecei a receber várias ligações e mensagens de vários jovens do acampamento (tanto dos preocupados quanto dos curiosos), e já estava cansado de repetir o mesmo discurso toda hora.
Mas apesar da correria e do susto, e de estar me sentindo muito cansado, eu não consegui pregar os olhos em nenhum momento. Eu só consigo olhar para ela e ficar sonhando como um idiota com algo que deveria ter acontecido, mas acabou totalmente diferente do que planejei.
Peço ao espírito santo que cuide bem dela, que a faça acordar logo e recuperar a consciência, porque por mais que o meu plano de pedi-la em namoro não tenha dado certo e que ela já esteja namorando com o Leonardo, eu preciso revelar a ela o que sinto. É agora ou nunca! Eu não posso ficar parado vendo o Leonardo tomar conta do amor da minha vida, da minha Safira.
Então depois de ter ficado tantas horas olhando para o seu rosto, pensando em tudo o que já vivemos e no que ainda podemos viver, seja lá como melhores amigos ou namorados, e tendo em vista que eu tenho o apoio e a confiança dos pais dela, decidi que assim que ela recuperar a consciência e se recuperar do susto, quando já estiver calma, eu vou falar tudo o que tenho para falar e me declarar, então ela mesma decidirá com quem quer realmente ficar.
Meu coração parte em saber que aquele idiota do Leonardo já beijou a minha Safira. E mais: ele foi o primeiro beijo dela. O primeiro. Dá pra acreditar que isso aconteceu?! Que ele tocou a minha Safira, minha pequena Safira, a quem sempre fiz questão de cuidar e proteger?!
Pena que ela cresceu e já toma as próprias decisões, porque eu nunca concordaria com isso. Nunca!
Na verdade eu mal sabia dessa relação ridícula que eles possuíam há meses atrás. Sim, sabia que meu irmão gostava dela, mas nunca pensei que a conquistaria ou que chegaria primeiro que eu no seu coração. Pensar nisso me dá nos nervos! E ainda tive que suportar sua ligação perguntando como ela estava, como se eu merecesse isso!
Olho ao redor. Estamos sozinhos no quarto. O silêncio reina e a minha internet acabou por hoje. Eu queria um violão agora para tocar alguma música.
Continuo olhando para Safira e começo a pensar nos meus sentimentos, e em como tudo vêm mudando ultimamente. Éramos melhores amigos, irmãos, parceiros para tudo, mas depois de me decepcionar com algumas meninas das quais gostei, eu percebi que tudo o que eu procurava em uma garota para ser minha namorada eu só havia encontrado nela. Desde então comecei a imaginar mil cenas de nós dois juntos, dessa vez como namorados.
Eu não parava de pensar nela; comecei a ouvir músicas românticas; a pensar em como faria para que ela mudasse a forma que me via. Mas as coisas continuavam exatamente como sempre foram: eu era apenas o cara para quem ela mandava fotos fazendo caretas horríveis, a quem ela pedia a opinião sobre qual foto colocar no perfil, a quem ela contava os segredos, a quem ela ficava perto sem receio algum de que algo a mais pudesse acontecer, a quem ela comentava quando estava achando algum cara bonito, a quem ela batia, desabafava...
Talvez por conta disso nossa relação acabou mudando consideravelmente: eu me afastei um pouco e, sem dúvidas, ela percebeu que eu estava estranho, mas também não veio tirar satisfações, talvez porque já existisse outro alguém tomando o meu lugar.
Eu tentei, por muitas vezes, abafar esse sentimento e fingir a mim mesmo que ele não estava passando por um processo de transformação, mas foi em vão. E tive certeza disso no dia em que senti, pela primeira vez na minha vida inteira, vontade de beijar a minha melhor amiga. Eu já não podia mais mentir para mim mesmo. E só demorei tanto tempo tomar uma atitude por medo de perdê-la por completo e não ter nem mesmo a sua amizade. Mas eu cansei, cansei de tentar fingir que aqui dentro não estava crescendo um amor forte e verdadeiro pela Safira.
Estamos no terceiro andar do hospital. A noite está calma e a lua brilha do lado de fora da janela, assim como as luzes da cidade. E ao permanecer olhando para o rosto aparentemente tão calmo do meu amor, seguro sua mão direita e lembro de uma música.
Então desbloqueio meu celular e seleciono "What are words", de Chris Medina, mas ao invés de fechar os olhos e apreciar a música, eu os mantenho abertos e aprecio a coisa mais linda do mundo, do meu mundo: a garota que está deitada na minha frente com um roupão verde folgado no corpo e o meu coração nas mãos.
⁂
O que são palavras
Onde quer que esteja, estou perto
Em qualquer lugar que você vá, eu estarei lá
Toda vez que você sussurrar meu nome, você verá
Como mantenho cada promessa
Porque que tipo de cara eu iria ser
Se eu fosse embora quando você mais precisasse de mim?
O que são palavras
Se você realmente não acredita nelas
Quando você as diz?
O que são palavras
Se são apenas para os bons momentos?
Então elas não são.
Quando é amor
Sim, você diz em voz alta
Essas palavras, elas nunca vão embora
Elas vivem, mesmo quando partimos
E eu sei que um anjo foi enviado apenas para mim
E eu sei que eu devia estar onde estou
E eu vou estar
Permanecendo ao lado dela esta noite
E eu vou estar ao seu lado
Eu nunca iria partir quando ela mais precisa de mim
O que são palavras
Se você realmente não acredita nelas
Quando você as diz?
O que são palavras
Se são apenas para os bons momentos?
Então elas não são.
Quando é amor
Sim, você diz em voz alta
Essas palavras, eles nunca vão embora
Elas vivem, mesmo quando partimos
Onde quer que esteja, estou perto
Em qualquer lugar que você vá, eu estarei lá
E eu vou estar aqui para sempre.
Como cada promessa que eu mantenho.
Porque que tipo de cara eu iria ser
Se eu fosse embora quando você mais precisasse de mim?
Eu vou manter meu anjo perto para sempre! (1)
(1) Música "What are words", de Chris Medina (está na mídia do capítulo).
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