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II | cobranças

— Só faltava essa!

Marcelo praguejou enquanto estacionava o automóvel, um Mercedes-Benz Classe C cinza-claro que atraía a atenção dos pedestres e causava admiração em notórios apreciadores de carros esportivos. A princípio, a sexta-feira amanhecera prometendo um dia ensolarado e vibrante. Agora, a chuva batia contra o para-brisa do carro de Marcelo, lembrando-o de que não havia trazido um guarda-chuva para emergências climáticas como esta.

A culpa é toda minha, ele admitiu mentalmente. Não era nenhum migrante desavisado sobre a loucura que era a meteorologia naquele estado. Cansara de vivenciar situações em que fora surpreendido pela mudança abrupta de clima. E, no entanto, ali estava ele. Pego de surpresa mais uma vez, só para não perder o hábito.

Enquanto estudava os grossos pingos de chuva escorrendo pelo vidro, raciocinava fervorosamente para encontrar uma saída para seu problema. Sair correndo pelo amplo estacionamento era uma solução. Entretanto, até que tivesse chegado à entrada do prédio, já teria se encharcado mais do que gostaria.

Não que fosse de ligar para coisas desse tipo. Mas desde que assumira o comando da presidência da empresa de brinquedos de seu pai, estava ciente de que aparecer com as roupas de trabalho molhadas não seria bom para sua imagem pública. Especialmente quando estava prestes a ter uma importante reunião com potenciais investidores.

Mais imprecações escaparam-lhe da boca quando se deu conta de que havia se esquecido de providenciar mais cobertura para aquela área externa.

Consultou seu relógio de pulso. Não podia esperar mais. O tempo esgotava-se. Com um suspiro determinado, pegou a pasta executiva de couro e o paletó preto. Antes de abrir a porta do carro, fez uma curta contagem regressiva para se preparar. Então saiu em disparada, segurando com uma mão o paletó aberto sobre a cabeça, apenas parando quando alcançara o ambiente interno do prédio.

— Que dia! — exclamou Marcelo para o guarda que ficava perto do balcão da recepção. — Bom dia, Félix.

— Bom dia, sr. Avilar — cumprimentou o guarda sisudo. Fracassou em disfarçar o espanto assim que constatou o resultado da exposição de Marcelo à chuva torrencial.

— Está caindo um temporal e me esqueci de colocar a sombrinha no carro.

— Minha esposa sempre me faz andar com uma.

— Sorte sua! Estou em via de ter uma reunião. Tenho certeza de que me acharão muito respeitável quando eu chegar lá parecendo um pinto molhado.

O humor no comentário arrancou um sorriso do guarda. Marcelo não sabia direito com quem havia aprendido a expressão, mas achou-a engraçada e resolveu acrescentá-la ao seu dicionário.

Satisfeito, seguiu para o elevador. Estava lotado. Geralmente as pessoas ignoravam seus arredores quando estavam com pressa, ansiosas para chegarem ao seu destino final. Mas em questão de segundos, Marcelo se encontrava conversando animadamente com o grupo.

Sim, fora nomeado presidente da Brinquedos Avilar, porém jamais negligenciaria sua educação. Crescera no meio de pessoas expansivas, que adoravam calor humano. Sua família era pequena, mas sabia ser barulhenta. Seus familiares eram sempre sua prioridade. Era capaz de fazer qualquer coisa por eles.

Ao sair do elevador, Marcelo deparou com Sara, sua assistente pessoal. Cumprimentaram-se rapidamente. Sara era uma mulher de 28 anos, confiante, sempre de aspecto impecável e que jamais deixara de ser profissional com ele. A qualidade do trabalho que vinha realizando falava por si mesmo. Tornar-se uma funcionária indispensável fora apenas a consequência de sua dedicação.

— Já preparei a sala de reuniões, Marcelo — informou ela, acompanhando o patrão até o escritório interno.

Marcelo entregou o paletó úmido à assistente. Em seguida, sentou-se atrás de sua mesa, pousando a pasta de couro que pingava ao seu lado no chão.

— Não seja tímida. Estou aceitando sugestões.

— Lamento não ter nenhuma.

Marcelo franziu o cenho, nem sequer querendo imaginar que teria que ceder ao inevitável. De repente, uma ideia ocorreu a Sara, fazendo-a desaparecer e reaparecer com uma toalha de rosto em mãos. Passou-a a Marcelo, que se pôs a secar as faces e os cabelos castanhos que, mesmo umedecidos, davam pistas de seu corte meticuloso.

— Que cheiro de cachorro molhado é esse?

Ao ouvir a familiar voz, Marcelo ergueu o olhar. Um brilho divertido perpassou seus olhos azuis assim que avistou o cunhado parado em seu escritório, com as mãos metidas nos bolsos da calça.

— Sara, por que deixou esse sujeito entrar na minha sala? Tu não sabes que esse aí é o primeiro na minha lista negra? — entoou Marcelo com o sotaque gaúcho que não conseguira perder completamente. — Ele chega aqui insinuando que pertenço à raça canina, sem nem me cumprimentar... Veja que falta de respeito! Minha irmã devia estar louca quando aceitou casar com ele.

— É exatamente por causa dela que estou aqui. — Daniel se sentou em uma das cadeiras diante da mesa. — Não precisa se levantar. Nem ferrando que vou abraçar você. Pularei essa parte do tapinha nas costas e irei direto ao assunto: semana que vem será o aniversário de Juliane e estou querendo fazer uma festa surpresa para ela.

— Quando?

— Quinta-feira mesmo, às sete da noite. Na casa da sua mãe. Será algo simples. A ideia é que os convidados apareçam antes da hora marcada, para que possamos dar aquele susto básico nela quando chegar. Resolvi avisar com um pouco de antecedência porque sei como você é todo enrolado com sua agenda.

Marcelo fez um sinal para a assistente, que prontamente registrou o compromisso na agenda do chefe.

— Algo mais?

— Era só isso mesmo. Agora vou indo... você parece apressado.

Marcelo observou-o enquanto o cunhado se despedia. Daniel e Juliane se conheceram quando ele ainda era um subalterno trabalhando no setor de contabilidade. Iniciaram um relacionamento às escondidas, pois Daniel tinha medo de que o envolvimento com a filha do dono da companhia em que trabalhava pudesse alimentar os mexericos e influenciar o tratamento que recebia no local de trabalho. Pressões vindas de todos os lados levaram-nos a tornar público o relacionamento. Cerca de um ano teria se passado até que tivesse se casado com a irmã de Marcelo. Devoto ao seu ofício e com uma incrível capacidade de liderança, Daniel tornara-se chefe do departamento alguns anos depois.

Era incrível ver de perto como nove anos de casados e dois filhos não apagaram a empolgação e o amor que o cunhado tinha por sua irmã. Será que algum dia conseguiria encontrar alguém que exercesse tamanho efeito sobre ele? Uma mulher que lhe despertasse sentimentos cuja força o deixaria de joelhos por ser tão absurdamente grandiosa? Uma paixão avassaladora que se prolongaria pelo tempo... na qual apenas a morte seria capaz de colocar um fim?

Marcelo baniu a fantasia da mente e recostou-se na poltrona de couro, antes de perguntar:

— Que tamanho você veste?

Daniel, que estava prestes a cruzar a soleira da porta, recuou alguns passos para dentro do escritório.

— Por que diabos está me perguntando sobre o tamanho das minhas roupas? — Ele encontrou o olhar do cunhado atrás da mesa, examinando-o atentamente, medindo-o da cabeça aos pés. A resposta para sua pergunta acertou-lhe como um raio. — Ah, não. Nem pensar!

— Será por pouco tempo — argumentou Marcelo com a voz macia, já se levantando e atirando a toalha na direção de Sara. — Só até a reunião acabar. Ninguém notará.

— Os empregados do meu departamento notarão.

— Tu preferes que a companhia acabe em bancarrota por falta de investimento?

— Sabe muito bem que não.

— Então me ajude nessa. Por favor?

Encararam-se por mais algum tempo. Marcelo manteve-se calado, como se só a força de seu olhar obstinado pudesse convencer o cunhado a aderir à sua ideia.

De início, Daniel procurou resistir ao poder de persuasão do Avilar. Depois suspirou, derrotado.

— Mas que droga!

Cinquenta minutos depois, Marcelo acompanhava um grupo de executivos para fora da sala de reuniões. A pequena comitiva que lotava o corredor encontrava-se engajada em um empolgado debate sobre o futuro no mercado de brinquedos.

A reunião fora um estouro e conseguira atrair mais investidores para a Brinquedos Avilar com êxito. Acompanhava o diálogo do grupo, emitindo seu ponto de vista cuidadosamente. Tratava-se de rigorosos executivos de meia-idade que exigiam de Marcelo bastante tato e formalidade para lidar com eles.

Estava terminando de expressar um pensamento, quando foi interrompido por alguém com uma repentina pergunta.

— Pelo amor de Deus, o que aconteceu com suas roupas?

Marcelo virou o rosto na direção em que todos olhavam e se defrontou com Daniel. Ele carregava no rosto uma expressão amuada, e, no corpo, as roupas úmidas e visivelmente amarrotadas do cunhado.

— Está caindo um dilúvio lá fora... e eu deixei a sombrinha em casa.

— Não se fazem mais homens como antigamente — comentou um dos engravatados em tom de desprezo. — Hoje em dia essa garotada anda toda despreparada!

Encostando sutilmente o punho à boca, Marcelo conteve a risada. Aquele olhar homicida dizia tudo: Daniel queria estrangulá-lo!

Minutos mais tarde, o restante dos executivos liberou a passagem do corredor. Marcelo não saiu do lugar enquanto observava o único homem que restara ali.

— Preciso das minhas roupas. Se eu continuar vestido com as suas, pode ser que eu pegue uma pneumonia.

— É verdade. Venha, vamos ao banheiro dar um jeito nisso logo.

Depois de terem feito a troca, Marcelo dirigiu para o luxuoso condomínio fechado em que morava, para vestir roupas e sapatos secos. Desta vez, apanhou o guarda-chuva e o colocou debaixo do braço antes de deixar o imóvel.

Percorreu todo o trecho de volta para a Brinquedos Avilar. À medida que os minutos passavam, a chuva diminuía, até que cessou por completo num curto intervalo de tempo.

Chegando à companhia, Marcelo saiu do veículo e levantou o rosto para o céu, onde o sol agora brilhava gloriosamente. Inconformado, abriu o guarda-chuva mesmo assim. Fez questão de utilizá-lo por todo o estacionamento até a entrada do prédio.

Não o livrou da chuva mas pelo menos serviu para proteger do sol, pensou ele. Já era alguma coisa.

*******

Quando Marcelo encontrou seu pai para um churrasco no sábado à tarde, foi tomado por um súbito arrependimento. Não porque tivessem um péssimo relacionamento. E os frequentadores do clube em que estavam eram, em sua grande maioria, migrantes sulistas que tinham como hábito reunir os amigos para um bom bate-papo regado a pratos típicos da região sul do país.

O problema mesmo era que seu pai o levava à beira da loucura.

Roberto Avilar não se conformava com o estado civil de seu primogênito. Transparente do jeito que era, tampouco sabia dissimular suas preocupações. Não podia conhecer uma mulher solteira que já visualizava nela uma potencial candidata à nora. Incontido, apresentava a seu filho o máximo de mulheres que encontrava, na esperança de que ocorresse uma química entre eles.

Era o que acontecia no clube. Como de costume, Marcelo terminava de cara fechada, mal-humorado.

— Seu velho bisbilhoteiro e assanhado — murmurou Marcelo, enquanto observava a mais recente candidata afastar-se da mesa deles. — Esse negócio de tu ficares bancando o casamenteiro para cima de mim só me fará ficar com raiva de ti. Pare enquanto ainda há tempo — admoestou, lançando a seu pai um olhar que seria capaz de congelar o inferno. — É meu último aviso.

— Que é isso, tchê! — exclamou Roberto, com os olhos arregalados. — Agora tu vais usar de ameaças só porque teu pobre pai deseja garantir o nascimento da próxima geração dos Avilar?

— Juliane deu conta do recado.

— Falta você.

— Isso pode esperar.

— Até quando?

— Não tenho a mínima ideia. Até alguma mulher me cativar irremediavelmente, talvez. Além do mais, não preciso estar casado para tornar-me habilitado a ser pai. Posso adotar, ter filhos antes do casamento... As opções são tantas!

— Barbaridade! Estás seriamente considerando essas alternativas?

— Ora, e por que não? Estamos no século XXI. Ou tu te esqueceste desse pequeno detalhe?

Varrendo o ambiente com os olhos, Marcelo relaxou ao perceber que não eram alvo de olhares curiosos. Os nativos daquela região geralmente estranhavam quando abriam a boca para dizer alguma coisa. Sentiu-se um pouco mais livre ali, de modo que pai e filho não se preocuparam quando continuaram a falar com a característica entonação gaúcha. As pessoas daquele círculo não davam a menor importância para isso.

Quando partiu de Roraima para cursar a graduação em Administração na terra natal, o sotaque de Marcelo já não estava tão forte. Engatara uma pós-graduação no sul, e, ao retornar para Boa Vista seis anos depois para trabalhar na empresa do pai, dera-se conta de como seu tradicional modo de falar havia voltado com toda força. Agora, aos 33 anos, considerava-se alguma espécie de aberração resultado do choque entre duas culturas tão distintas.

Seu pai, por outro lado, jamais perdera o sotaque carregado. Ficara imerso na cultura gaúcha durante a infância, adolescência e a fase adulta. Além disso, desde que se separara da ex-esposa, ficava indo e vindo do Rio Grande do Sul para visitar os parentes de sua família que ali permaneceram. Antes de se aposentar, convidou o filho para assumir a presidência da Brinquedos Avilar e a frequência das visitas aumentou.

Roberto era o típico gaúcho que gostava de chimarrão. Suas falas eram regularmente permeadas pelo "bah" e "tchê". Marcelo, pelo contrário, escassamente fazia uso dessas palavras, por ter se acostumado com outras formas de se expressar verbalmente.

Em determinado momento, Roberto deleitava-se enquanto tomava seu chimarrão e socializava com um grupo de pessoas. Contrariando a tradição seguida à risca por seu pai, Marcelo serviu-se de uma deliciosa tigela de açaí.

Como de praxe, o sr. Avilar não deixou o fato passar em branco.

— Bah! Ele está tomando aquele treco de novo. Aquele guri só pode ter nascido com defeito de fábrica. Em que mundo é concebível ser gaúcho e detestar chimarrão?

Marcelo quis rir. Uma vez seu pai lhe contara que já pensou em ser ator de novela. Quem quer que tivesse sido o diretor que deixara a oportunidade passar, não sabia da exímia habilidade de Roberto Avilar para encenação.

— É uma fatalidade imperdoável — alguém da roda concordou, entrando na brincadeira.

— Não precisa repetir esse teu discurso — disse Marcelo, dirigindo-se ao pai. — Já sei que tu vais me deserdar, velhote. Ficas falando do que tu não conheces, sem nem sequer ter provado uma única vez na vida... — apontou ele, de propósito.

O truque surtiu efeito imediato. Em poucos minutos, Marcelo avaliava as reações do pai que acabara de tomar uma colherada de açaí.

— Bah, que troço ruim! Tem gosto de terra! Como é que tu consegues tomar uma coisa dessas sem fazer careta?

— Da mesma forma que tu tomas teu chimarrão como quem bebe água. Parece que concordamos em discordarmos, afinal.

Na volta para casa, Roberto acompanhou o filho para recuperar um antigo CD em sua posse. A primeira coisa que avistou, tão logo a porta abriu-se, fora o gato de Marcelo miando e passeando pela sala climatizada.

— Você é seletivo demais. Por isso mora com um gato!

— Qual é o problema com meu gato? — revidou Marcelo, prevendo a iminente discussão. Sem esperar por uma resposta, apressou-se para seu quarto e retornou com o CD em mãos.

Roberto ficou agitado, quase eufórico. Não era de sua natureza ficar calado, então despejou tudo o que lhe vinha à cabeça.

— Tu tens namorada? Há alguém em tua vida no momento? Nunca mais te vi com ninguém... Não entendo! O que está acontecendo? Com certeza o problema não são as mulheres, pois todas que te apresentei já se interessaram por ti.

— Pai, por favor — disse Marcelo, na intenção de fazer o sr. Avilar parar de falar.

O que não adiantou.

— Tens 33 anos. Pensei que envelhecer fosse te atrapalhar, mas continuas com uma boa aparência. És bonito, alegre, divertido. De espírito jovem. Devias estar gastando todas essas qualidades com uma esposa, e não com um gato. Não sei mais o que fazer...

— Qual é a dificuldade em entender? — explodiu Marcelo, revoltado. — Não cabe a você fazer alguma coisa, pai! Dúzias de mulheres já passaram pela minha vida, é verdade. Mas qual o sentido em apresentá-las a você, se sei que isso não levará a lugar algum? Ser solteiro não deveria ser um problema! O que tem se quero ficar escolhendo um pouco mais antes de dar um grande passo? Qual é o problema em querer me precaver de que meu casamento não seja um fracasso igual foi o teu com minha mãe?

O comentário deixou o sr. Avilar profundamente afetado.

— Tu te tornaste excessivamente rígido em teus relacionamentos.

— Não à toa, pai. E não se esqueça de que minha vida amorosa diz respeito a mim, e somente a mim.

Respirando fundo, Roberto capturou o estojo do CD que o filho lhe apontava. Então, transferiu sua atenção para os móveis da sala na tentativa de disfarçar a culpa que o abalava.

— Tudo nessa vida acaba algum dia, até mesmo o amor — disse ele, devagar. — Meu amor por tua mãe e o dela por mim infelizmente acabaram mais cedo do que esperávamos. Mas só porque não demos muito certo como casal não significa que o mesmo vá acontecer contigo e tua parceira, filho. Não tenhas medo de se relacionar com alguém, de apostar todas as fichas em uma mulher.

Marcelo enrugou a testa, sentindo-se confuso, desorientado. Quantas vezes eles discutiram por causa de casamento? Quantas vezes não ouvira "Você tem 33 anos e precisa se casar. Os negócios da família não podem parar, e isso só será possível se me der netos. Se demorar demais para escolher, vai acabar ficando sem ninguém ao seu lado"? Dezenas de vezes, contava.

Para sua surpresa, o pai iniciou o tipo de conversa que não tinham em anos. Acabara de tocar no assunto sob uma perspectiva diferente...

— Não é medo o que sinto. Eu só não quero firmar um compromisso dessa seriedade com qualquer uma. — Ele não queria casar-se pensando no divórcio. Que trágico seria se assim o fosse! Conhecia seu temperamento e seu gênio. Sabia que quando amasse, seria para valer. A mulher que decidisse se unir a ele teria de estar bastante segura do que queria. — Estou errado por pensar assim?

— Claro que não, meu filho.

Parecia uma fantasia imaginar que algum dia encontraria uma mulher especial. Uma que tem desejado com frequência que se tornasse realidade.

Crescera namorando mulheres interessantes de uma beleza sem igual que nunca, no entanto, chegaram a fazê-lo pensar na possibilidade de mudar seu estado civil. Ou melhor, houvera uma... mas fora um amor na juventude que não tinha certeza se teria sobrevivido à transição para a fase adulta.

Olhando para baixo, Marcelo deparou com o gato enroscando-se em uma de suas pernas. Ao erguer a cabeça para fitar o dono, o bichano miou, como se pedisse por carinho. Marcelo curvou-se para pegá-lo nos braços.

— Não gosto de desperdiçar meu tempo com coisas que sei que não vingarão — disse distraidamente, enquanto afagava o gato branco. — Sabe, pai, tu perceberás quando eu encontrar essa pessoa. Não é algo que os Avilar consigam esconder. Somos péssimos em ocultar sentimentos. Nossa família não leva jeito para a coisa.

O sr. Avilar não ousou protestar frente a verdade indiscutível. Após ter se despedido do filho, caminhou em direção à porta.

— Quinta-feira será o aniversário de sua irmã.

— Eu sei. Daniel me avisou que quer fazer uma festa surpresa para ela.

— Estaremos todos lá?

— Se depender de mim, sim.

A porta fechou-se. O coração de Marcelo foi preenchido pela indesejável dor de encontrar-se mais uma vez sozinho. Se estava sendo sincero, tivera sido angustiante, nos últimos anos, enfrentar os momentos de solidão que seu estilo de vida lhe acarretava.

Como se adivinhado o rumo dos pensamentos de seu dono, o gato emitiu um miado queixoso.

— E eu sou louco de reclamar da companhia que tu me fazes? — questionou Marcelo, mantendo o insistente olhar do animal de estimação.

*******

A quinta-feira foi atribulada.

Daniel preparara a festa surpresa pensando nos mínimos detalhes. Com a ajuda de alguns parentes e amigos, encomendara salgadinhos fritos e assados e um bolo enorme de um andar que Verônica, sua mãe, calculara ser suficiente para o pequeno grupo de convidados. Alguns colegas de trabalho ajudaram-no com a decoração e outras pessoas incumbiram-se de arrumar a mesa.

Em menos de uma hora e meia, tudo estava organizado. Juliane estava na rua fazendo compras com o filho mais velho, cuja participação na festa surpresa consistia em distrair a mãe até a hora combinada. Então, seguiriam para a casa da avó.

Quando o relógio marcava trinta para as sete, todos já haviam chegado. Com exceção de Marcelo, que correu para sair da Brinquedos Avilar tão logo verificara haverem no celular mais de sete chamadas não atendidas de Daniel.

Faltando três minutos para as sete, Marcelo estacionava o Mercedes na rua lateral do quarteirão de sua mãe. Era um bairro que lhe trazia muitas recordações, mas não era hora para isso. Estava com pressa.

Reuniu-se com os convidados no interior da casa. Gritaram "surpresa!" em uníssono, ao chegar o momento certo. Fora tudo realmente agradável e engraçado. Os Avilar se davam bem com a família de Daniel. Assisti-los interagindo com tanta descontração reportou Marcelo à época em que os Ribeiro faziam parte de seu círculo de amizades.

O rompimento com sua primeira namorada afastara drasticamente as duas famílias, até perderem totalmente o contato. A ironia nisto tudo? Era que os Ribeiro seguiam morando no mesmo lugar, exatamente em frente à casa com a qual sua mãe ficara após o divórcio.

Vizinhos de frente. Ainda assim, comportavam-se como totais estranhos...

Sentado na calçada, fugindo do barulho lá dentro, Marcelo divagava enquanto contemplava a movimentação em sua antiga vizinhança. Longas horas de trabalho haviam-no deixado exausto e considerava dizer boa noite aos convidados, quando um veículo parando defronte à casa dos Ribeiro chamou sua atenção.

Uma mulher deslizou para fora, fechando a porta, e rodeou o automóvel até alcançar a campainha. De compleição esguia, vestia uma blusa marfim que lhe destacava as curvas e calças jeans que se ajustavam às pernas bem-feitas, notou ele.

Curioso, Marcelo prosseguiu observando em silêncio o que se desenrolava a seguir.

Ela ergueu a mão, com claras intenções de tocar a campainha. Contudo, parecia relutante em apertar o botão. Recuou, deu alguns passos para longe do portão. Caminhou pela calçada em círculos, como se tentasse achar a solução para algum impasse. Somente quando virou na direção de Marcelo e levantou os olhos foi que a luz do poste mais próximo banhou o rosto feminino.

Reconhecera-o imediatamente.

E ela o vira no mesmo instante.

Marcelo sentiu o coração bater violentamente. O impacto do susto intensificou-se ao perceber que ela atravessava a rua para se dirigir a ele.

— Marcelo?

— Sabrina. — Ele ficou de pé. — Já faz algum tempo desde a última vez que nos falamos.

— Tem razão. Posso ter uma palavra com você?

— Comigo? — Estava surpreso com o pedido.

— Por favor — insistiu ela, o rosto dominado pela tensão. — Se eu não conversar com alguém agora mesmo, acho que vou enlouquecer.


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