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44 - Réquiem para um romance

Notas da Autora: Este capítulo relata a história de um relacionamento tóxico e abusivo. Temas sensíveis como: ódio, assédio moral, abuso sexual e violência doméstica estão presentes. Também há algum nível de metalinguagem =) - Boa leitura! 

Luigi Bertonelli, sentenciado a quinze anos de prisão por tentativa de assassinato em segundo grau, isto é, quando o perpetrador não premedita o crime. Teria sido condenado à prisão perpétua, se seu advogado não tivesse conseguido persuadir o júri de que o crime havia sido passional. Privilégio de ser um homem branco, rico e de boas relações sociais...

Boas relações sociais... que ironia.

Luigi era uma daquelas pessoas que elevavam as profissões extremamente burocráticas ao nível da arte. Empreendedor e inteligente, rapidamente transformou a humilde empresa dos pais em uma referência na área de marketing. Implacável, não havia quem pudesse pará-lo quando queria algo para si. Aos trinta e cinco anos, tinha uma remuneração mensal de cerca de cem mil dólares. Valor impensável para a maior parte dos americanos.

Seus talentos, porém, não se resumiam a capacidade para fazer bons negócios. Tocava piano, escrevia poesias, pintava quadros, estudava idiomas, era realmente abençoado pelos deuses do conhecimento. Sua genialidade, contudo, também se revelava como maldição: por estar, quase sempre, à frente dos demais, poucos eram aqueles que se dispunham a acompanhá-lo. Assim, tinha poucos amigos e ainda menos relacionamentos amorosos.

E isso não seria, de fato, um problema, caso Luigi não fosse absurdamente ciumento.

Foi assim durante toda a vida. Quando criança, se indignava quando seus amiguinhos queriam brincar com outras pessoas. Genioso, exigia que tudo fosse feito de acordo com suas vontades. Quando não concordavam, os adultos acabavam tendo que remover um pequeno Luigi furioso de cima de algum infante desafortunado tomado por hematomas causados por tapas, chutes e beliscões.

Na adolescência, vivia involuntariamente isolado, já que ninguém queria ser amigo de alguém autoritário e ciumento. Em termos de romance, acostumou-se com a interferência de seus pais. Principalmente, para protegê-lo da má reputação trazida pela homofobia - já que era gay - e das consequências das agressões que cometia contra aqueles com quem namorava.

Quando se tornou adulto, quis fugir dos problemas causados pela associação de seu ciúme e o compromisso de um relacionamento sério. Rico, de boa aparência e grande eloquência, conquistava rapazes ávidos por alguma aventura temporária. Seus parceiros de negócios riam, chamando-o de "papa anjo", já que preferia homens muito mais novos.

Aos quarenta e três anos, quando participava de um evento que buscava premiar os melhores alunos da escola de fotografia da qual era sócio, conheceu Alexander, um dos premiados.

— Quantos anos ele tem? — Luigi perguntou ao dono da escola.

— Tá querendo mais um? Aqui não é fazenda de criação de viado para o abate. — respondeu o sócio em tom de deboche. — Tem vinte anos, e é uma das apostas da escola. Garoto esperto e esforçado, paga o curso sem a ajuda dos pais e ainda tira as melhores notas.

Ao ouvir as palavras do sócio, Luigi sorriu. Tinha decidido que Alexander Lucius Cavanagh seria seu.

E foi.

Não foi difícil fisgar o rapaz. Bastou demonstrar interesse pelos hobbies que os pais dele depreciavam, tratá-lo com algum respeito e uma pitada de sugestividade. Considerando a aparência de modelo de Alexander, convidou-o para posar em um retrato. O quadro nunca ficou pronto, mas o sexo foi maravilhoso.

Alguns meses depois da primeira transa, Luigi se pegou surpreso por desejar compartilhar mais de seus dias com o jovem que tinha idade para ser seu filho.

E, infelizmente, muitas foram as vezes nas quais ele realmente precisou ser mais pai do que namorado. Talvez, tenha sido aí que o senso exacerbado de autoridade sobre Alexander nasceu.

Mesmo sendo muito inteligente e proativo, Alex ainda era um garoto e precisava de alguém que o guiasse. Foi com Luigi que ele aprendeu que não valia a pena fingir que era hétero, foi com o homem mais velho também que teve um encontro de verdade, com direito a passeio de mãos dadas e todo o clichê romântico. Era Luigi que o parabenizava pelas boas notas, que dizia admirar a forma com a qual o jovem fotógrafo via o mundo. Dizia que ele era lindo com suas roupas coloridas, bordadas, de renda. Dava-lhe anéis e pulseiras para se adornar. Luigi compartilhava com o homem mais novo informações sobre seu trabalho, o apresentou para sua família e até tentou convencer os pais de Alexander de que tinha boas intenções para com ele.

A família Bertonelli se surpreendeu ao ver Luigi verdadeiramente apaixonado. Naqueles dias, tiveram a esperança de que tudo iria melhorar.

Ledo engano.

Alexander era uma pessoa boa e, naquela época, via Luigi não apenas como um amante, mas um amigo e até família. Era ainda muito carinhoso e sorridente, sempre ficando vermelho quando escutava o homem mais velho falar palavrões com tanta naturalidade. Longe do filho drogado do pastor da igreja, não pensava mais em festas, tampouco usava drogas e encontrava no amor de Luigi um alento contra a melancolia que o acometia de vez em quando.

Tudo mudou quando Alex foi contemplado com uma bolsa na faculdade.

Novas amizades surgiram naturalmente quando ingressou na turma de calouros. Alexander era todo sorrisos na universidade que era bem mais tolerante com pessoas LGBTQIAP do que sua escola secundária jamais foi. Com os trabalhos acadêmicos, formaram-se os grupos e com eles vieram os convites para festas em que, obviamente e infelizmente, rolava todo o tipo de coisas.

Sendo desde sempre muito bonito, Alex atraía a atenção de todos os tipos de pessoas. Se sentia lisonjeado, não deixava de admitir, mas estava muito satisfeito com o homem que encontrava ao voltar para casa, já que tinha deixado a residência dos pais no mesmo dia em que ganhara a bolsa de estudos. A hipótese de trair Luigi jamais havia passado pela cabeça de Alexander e, por isso mesmo, foi com imensa surpresa e decepção que, certa noite, foi acusado de "dar mole para todo mundo".

Era a insegurança e o ciúme falando. Principalmente, porque, em comparação a Alexander, que se tornava cada vez mais independente e se aproximava do auge de sua vida em todos os aspectos, Luigi, com seus quarenta e poucos anos, enxergava o início do declínio de tudo o que era.

De repente, tudo o que fazia do jovem fotógrafo a pessoa incrível por quem Luigi havia se apaixonado, tinha se tornado motivo para o mais velho ficar mais e mais irritado.

Não gostava que Alexander se reunisse com colegas para estudar, principalmente, se tais colegas fossem homens. Fazia questão de ir às festas com ele, temendo ser traído. Reclamava quando o mais jovem se arrumava, questionando sua motivação para fazê-lo. Não aprovava que Alex sequer fotografasse outras pessoas.

No começo, Alexander esbravejava e retrucava cada uma das reclamações infundadas. Inseria palavrões no próprio vocabulário e não abaixava a cabeça. De vez em quando, ameaçava partir e, nesses momentos, Luigi caía em si, vendo que suas atitudes eram erradas e injustificáveis. O mais velho chorava e implorava. Prometia mudar. E mudava. E depois mudava de novo e o ciclo recomeçava.

A toxicidade daquele relacionamento crescia e nenhum deles parecia notar. Alexander, carente de um amor verdadeiro, se sentia valorizado com as crises de ciúme de Luigi. Este último, por sua vez, tinha um prazer estranho ao se reconciliar com o mais novo que, sendo incrivelmente fogoso, ficava faminto por sexo e só parava quando se sentia completamente saciado.

Isto, com o tempo, também viraria um problema.

O estopim para o ciúme de Luigi inflamou quando, durante uma viagem de negócios, recebeu a ligação de um Alexander empolgado, dizendo que tinha ido à Miami para ser fotografado a serviço de uma agência de modelos. Luigi, empresário de marketing que caminhava no limiar da legalidade para atender completamente às demandas de seus clientes, tinha total consciência do que certos profissionais do ramo da moda exigiam que jovenzinhos aspirando à fama fizessem para se manter no mercado. Inclusive, já havia conversado com Alex sobre a questão, assim, considerando que somente más intenções justificariam o ato do rapaz.

Interrompendo os próprios planos de negócios, Luigi voou para Miami e lá, sucumbiu novamente diante da própria agressividade, erguendo a mão contra Alexander que, desorientado, jurava que não havia feito nada errado. Arrastou-o para casa, brigando com ele durante todo o trajeto até o apartamento que compartilhavam. Dessa vez, não apenas o acusava, mas o insultava e o humilhava.

Para qualquer outra pessoa, teria sido fácil entender porque o tesão de Alexander havia diminuído. Contudo, Luigi não compreendeu.

Quando o sexo de reconciliação não pareceu interessar o mais jovem, o de mais de quarenta concluíu que estava mesmo sendo traído.

Sob agressões físicas e verbais, Alexander deu ao companheiro acesso aos seus e-mails e redes sociais. Passou a ter a própria vida monitorada e tinha que dar explicações a respeito de tudo o que fazia. Não podia mais se vestir como queria. Foi obrigado até a cortar os cabelos. Luigi Bertonelli queria garantir que todo o brilho de Alexander Lucius Cavanagh não fosse visto por qualquer um além dele.

Aos olhos de Fredrick Warren, Alexander era um deus, mas não porque demandava adoração, e sim porque o doutor tinha prazer em reconhecer suas qualidades. Luigi, em contrapartida, exigia ter seus bons feitos relembrados e queria que Alex se curvasse humildemente perante a sua glória. O desgaste cada vez maior do relacionamento, no entanto, impedia que o jovem fotógrafo se sentisse disposto a dar elogios a quem quer que fosse, fazendo com que a insegurança do companheiro crescesse ainda mais.

Foi aí que as ameaças começaram. Luigi dizia que tinha contatos na universidade (e tinha mesmo) e que poderia fazer com que Alexander perdesse sua bolsa de estudos. Quebrava as câmeras dele apenas para mostrar que o mais jovem não era capaz de pagar por novos equipamentos. Certa vez, livrou-se das roupas de Alex, deixando-o apenas com um par de calças e camisas.

Sua família interviu em favor de Alexander quando este foi estapeado na mesa de jantar, diante de todos. Ninguém tinha a coragem para enfrentar Luigi, e ele não possuía a menor vergonha de mostrar para o mundo o seu pior lado. Às vezes, contudo, parecia se arrepender e, como antes, prometia mudar, melhorar... Pedia para que Alex considerasse todas as coisas boas que tinham vivido juntos... tudo o que ainda poderiam viver. Dizia que não achava justo que o rapaz perdesse os recursos de quem poderia o ajudar a realizar seus sonhos. Nesses momentos, enchia o companheiro de presentes, mimos e promessas...

Por um ano, depois de prometer ser um homem melhor, Luigi se comportou bem. Aos poucos, um Alex que tinha a autoestima menor que uma partícula de poeira voltava a acreditar que poderiam dar certo. No entanto, um pedido de casamento fora de lugar acabou abalando ainda mais as ruinosas estruturas daquele amor em frangalhos.

Os casais LGBTQIAP ainda não tinham permissão para casar legalmente em muitos estados americanos e essa foi a primeira desculpa que Alexander deu para recusar o pedido.

— Vários estados já aprovaram a união de gente como a gente... — Luigi insistia.

Mas o silêncio do jovem fotógrafo reverberava nos ouvidos do mais velho como os sons de mil trovões. Em sua visão, Alex deveria estar feliz. Não era capaz de entender qual era o problema. Com o passar dos dias, Luigi cansou de esperar e, magoado, foi tentar entender o que estava impedindo sua propriedade ingrata de dizer sim.

Quando o primeiro golpe foi desferido, Alexander revidou. Da mesma forma com que golpeou a face do pastor, anos antes, no lar de seus pais, Alexander cerrou os punhos e atacou Luigi, arrancando-lhe sangue dos lábios.

— Ah, a bichinha decidiu agir que nem homem! — Luigi sentiu a dor em seus lábios e gengivas. — Cê vai ver o que é apanhar agora! Já que a putinha decidiu ser homem, vai apanhar que nem um! — Riu de um jeito louco enquanto avançava como se fosse uma locomotiva contra um Alexander que, primeiro, tentou escapar e, depois, apenas se defendia e implorava para o outro parar.

Luigi não parou.

Ele queria que Alexander aprendesse de uma vez por todas que não podia desafiá-lo. Que era propriedade dele, que, como ele dizia enquanto o espancava, Alex não passava de uma putinha. Em sua loucura, falava que tudo nunca havia passado disso, que todo o romance era apenas uma brincadeira para atrair o jovem, que na verdade, Alexander nunca possuira qualquer valor, que era apenas um brinquedo, um boneco para ser fodido... uma putinha...

Luigi não parou.

Apanhou no colo a pessoa com a face inchada e a levou para o quarto. E se alguém pensasse que os socos não tinham desonrado o corpo de Alexander até aquele momento. Ali o fez de um modo ainda mais funesto. Corrompendo-o de dentro para fora.

De dentro para fora...

Em um abominável vai e vem...

A mitologia contava que somente a esperança havia restado no interior da Caixa de Pandora. Na história de Luigi Bertonelli, a esperança foi a primeira a fugir. Ele mesmo a expulsou com suas mãos hediondas. E o resto... bem...

Se Luigi esperava controlar o jovem Cavanagh com sua violência, morreria decerto esperando. Pois, o rancor que nascera no peito de Alexander não conhecia limites e era insano... insano...

Como um íncubus infernal, seduzia seus colegas de faculdade e professores, agarrando-se com qualquer um sempre que tinha a chance. Bebia até vomitar e se entupia de cocaína, ecstasy, LSD e o que mais encontrasse, degenerando-se em festas e orgias. Quando voltava para a residência em que morava, apanhava e teria morrido nessa época, de apanhar ou de overdose, caso não tivesse, finalmente, concluído a graduação.

Se tivesse morrido, não teria se importado.

Até começar a exercer a profissão de maneira independente, Alexander foi encerrado em seu quarto. Não podendo sequer visitar a cozinha do apartamento. Era a punição de Luigi para seu promíscuo e ensandecido amante. Depois, conheceu Lucas e, com ele, conseguia drogas para usar quando era forçado a fazer sexo com o homem que, mais e mais, passava a odiar.

Alex precisava das drogas porque não aguentava mais fingir que ainda sentia algum tesão. Pois não sentia...

Sentia nojo.

E Luigi descobriu e o agrediu, ofendido por estar transando com, como ele dizia, uma puta chapada. Alexander quase o esfaqueou naquela noite e fugiu, mas como (como Luigi dizia) não passava de uma puta chapada, ninguém, nem mesmo a polícia, quis ajudá-lo. Como punição, foi levado para casa, para ser sexualmente abusado somente quando estivesse sóbrio.

Consciente, Alexander não aguentou outra sessão de tortura: vomitou.

Pois, a cada dia odiava Luigi mais e mais.

Ódio. Um dia, após chegar mais cedo do trabalho, Luigi encontrou o quarto que dividia com Alex excessivamente arrumado. Não haviam utensílios fotográficos largados sobre as cômodas, nem sapatos do mais jovem espalhados pelo chão. O guarda-roupa estava vazio, a escova de dentes jogada no lixo. Alexander não possuía muitas coisas, mas era incrível como elas faziam falta quando não estavam à vista.

Se esforçando para não ser tomado pela raiva, Luigi caminhou até a sala de estar. Tentava encontrar outra explicação para aquilo. No entanto, sabia que não conseguiria. Seu jovem amante não era do tipo que armava surpresas, que fazia joguinhos, não... Se parecia que Alexander estava indo embora, era porque ele realmente estava. E se Luigi não quisesse acreditar após encontrar seu quarto vazio de tudo o que representava o rapaz, seria obrigado a fazê-lo quando visse uma das chaves do apartamento apoiada sobre a mesinha na ante sala. A outra (com a qual Alex trancou a residência ao sair), foi achada em posse do síndico do prédio.

Alexander não apenas havia partido. Ele tinha deixado com que todos soubessem que estava abandonando o companheiro. Que vergonha! Que vergonha Luigi sentiu. E que ódio! Todos diriam: — O viado velho não conseguiu dar conta do garotão! Deve ser brocha! — E ririam: — Imagine só que um molecão daqueles iria se contentar com um velhote de pau mole! Deve ter arranjando um "sugar daddy" que faça uma comida boa!

A face de Luigi queimava de irritação. Apanhou o bastão de beisebol. Maldita putinha desgraçada! Alexander não tinha o direito! Não tinha! Não quando finalmente podiam ficar bem e voltar a ser o que eram!

Cego!

Luigi estava cego! Que outra explicação poderia haver para o fato de ele não ser capaz de enxergar que sua loucura era a única razão pela qual Alex estava partindo? Por que mais não veria que jamais teriam outra chance? Que nunca voltariam a ser o que eram? Que o amor que um dia existiu foi assassinado a pancadas e que seu cadáver em avançado estado de decomposição apenas apodrecia tudo ao redor de ambos?

Arrebentou os copos da cozinha e os jarros da sala de estar. Ligou para Alexander um milhão de vezes e, sem resposta, jogou o celular na parede... e quanto mais coisas destruía, mais seu ódio crescia, mais fome sentia e mais queria se vingar.

Então era assim que ele queria? Era assim que tudo iria terminar? Luigi acelerava o carro pelas ruas da cidade. Alexander achava mesmo que podia simplesmente partir? Não, ele não tinha esse direito! Ele morreria antes. Sim, morreria.

Luigi sequer percebeu quando arrombou a porta do estúdio. Foi logo entrando e nem esperou Alex se virar para identificar a origem do estrondo. Meteu o bastão nas pernas dele com toda a força, derrubando-o de imediato. — Seu desgraçado! Como ousa fazer isso comigo? Achou mesmo que te deixaria ir embora? Achou que poderia me humilhar assim e fugir de mim? — Deu com o bastão nas costelas de Alexander. Então, de novo e de novo. — A gente tá junto nessa, sua puta maldita! Cê vai morrer hoje! Eu vou te matar! Depois... — Luigi falava com uma voz trêmula e desvairada. — Depois... eu vou me matar e todos vão ver que... que eu sempre te amei e você, você é que sempre foi um ingrato! Um ingrato que queria me abandonar depois de tudo o que fiz por você... — Seus ouvidos não conseguiam captar os sons do choro abaixo de si. Não conseguiam interpretar aqueles gemidos de dor como os urgentes pedidos de ajuda e misericórdia. — Eles vão me dar razão...

A cabeça de Alexander sangrava e as pancadas em seu abdômen rapidamente geraram hematomas. Quando tentava falar, o sangue enchia sua boca e ameaçava sufocá-lo. Os próximos golpes de Luigi estavam sendo mirados em seu rosto. O homem louco queria desfigurá-lo. Queria arrancar dele a beleza, queria que ficasse irreconhecível, repugnante de se olhar. Se Lucas não tivesse entrado no estúdio e intervido, Alexander teria sido assassinado e seu algoz teria fugido para se matar em seguida... talvez, deixasse até um bilhete dizendo que tudo o que fizera, havia feito por amor.

Amor porra nenhuma!

Na cela fria da delegacia, a razão retornou ao corpo de Luigi, que duvidou da realidade, acreditando que tudo o que estava vivendo era um grande pesadelo. Imagens de um Alexander sorridente se misturavam às lembranças de seu corpo retorcido, encolhido de horror e dor. Como haviam passado de amantes esperançosos para vítima e perpetrador? Como o amor deles havia se transformado em assassinato? Como?

— Hoje é seu dia de sorte, senhor Bertonelli. — disse o advogado. — Alexander Lucius Cavanagh recobrou a consciência no hospital. Os médicos disseram que ele não corre mais risco de morte. — O homem, que falava em uma entonação de indiferença, revirava as páginas de um processo. — A boa notícia é que o senhor não será processado por assassinato. A má é que, agora, as alegações que o sr. Cavanagh vier a fazer podem complicar muito o seu caso. Isso e o fato de que o Estado, provavelmente, irá exigir uma indenização de sua parte.

— É aí que se engana, doutor, — disse Luigi, sorrindo — o dia de hoje não trouxe más notícias. Meu Alex acordou e vai ficar bem. Quero que entre em contato com ele e diga que vou pagar todo o tratamento que ele precisar. E deixe claro que não pedirei nada em troca... Que ele me acuse e me jogue na cadeia pelo que fiz, Deus... pelo que fiz à ele por todo esse tempo... Eu ainda quero cuidar dele, quero que ele melhore e siga em frente, eu quase destruí tudo, doutor... quase perdi a minha alma, quase fiz uma besteira irreparável, incomensurável... E Deus não deixou. Ele mandou aquele rapaz para me impedir. Deus não salvou Alexander naquele dia, doutor. Ele me salvou. Me salvou e eu vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance para mostrar a minha gratidão. Doutor... sim, eu vou pagar tudo. O tratamento, o advogado, a casa nova, tudo... tudo o que ele quiser, porque Deus não deixou que eu fizesse uma grande besteira.

— Se é o que deseja... — disse o advogado ainda indiferente. — Irei avisá-lo.

Os depoimentos de Alexander, relatando todos os abusos que sofreu nas mãos de Luigi, trouxeram imensa tristeza e vergonha para a família Bertonelli que, até então, estava acostumada somente com os acessos de raiva que levavam o filho a, vez ou outra, dar um soco ou empurrão em alguém. Apesar de tudo, por cegueira ou maldade, jamais haviam considerado a hipótese de Luigi tentar matar uma pessoa. Nunca imaginaram que as coisas piorariam tanto.

A criança com problemas comportamentais se tornou o adulto que seria condenado a quinze anos de prisão. Seu advogado se aproveitou da falta de legislação que contemplasse casais homoafetivos para que Luigi não tivesse sua pena aumentada por conta da violência doméstica, do assédio moral e dos estupros. Tendo vivido junto dele por quase uma década, Alexander sequer foi reconhecido como esposo de Luigi. E, como se a tentativa de assassinato pela qual passou não tivesse sido flagrada, o jovem fotógrafo ainda teve que ouvir parte do júri declarar Luigi inocente, justificando-o por conta das ações imprudentes do mais novo. Suas traições e abusos de drogas.

A pior parte para Alex, no entanto, foi o silêncio de seus iguais. Seus colegas de faculdade e profissão, muitos da comunidade LGBTQIAP, como ele, se negaram a testemunhar, mesmo tendo visto os hematomas no corpo do Cavanagh tantas vezes.

Amigos o caralho.

Comunidade o escambau.

Quando apareceram em sua porta com rosas nas mãos, Alexander mandou que enfiassem os espinhos das flores em seus cus. O garoto sorridente e que evitava palavrões tinha perdido a paciência.

Meses após a própria condenação, Luigi se surpreendeu ao saber que Alex tinha saído de Dakota do Sul. Além disso, também havia recusado receber qualquer tostão de seu antigo companheiro. No fundo, o mais velho ainda tinha esperança de que Alexander iria visitá-lo. Que daria à ele a chance de implorar por perdão...

Contudo, Alexander Lucius Cavanagh jamais retornou.

Por isso que, agora, Luigi Bertonelli havia voltado. Novamente em um estúdio. Mas sem um bastão. Sem qualquer arma. Sem qualquer intenção violenta. Não. Ele era grato a Deus. Não jogaria fora a sua chance. Enquanto esteve na cadeia, perdeu seus pais. Um para a velhice e outro para a depressão. Dos abusos que sofreu naquele hediondo lugar, contraiu HIV. Carregava em suas costas as cicatrizes de facadas. Acreditava que, se ainda estava vivo, era por uma razão, uma apenas: implorar por perdão.

Contudo, não exigiria de Alexander nem mesmo isso. Não precisaria ser, de fato, perdoado, mas não poderia seguir em frente sem pedir.

— O que quer de mim? — A voz de Alex tremia e ele olhava para os lados de forma incessante. Sentia que todos haviam parado para prestar atenção no que ele fazia. — Por que veio atrás de mim? — Começou a soar desesperado.

Luigi se ajoelhou e, agora sim, os transeuntes os notaram. — Vim porque precisava te dizer que me arrependo. — O homem de cabelos grisalhos foi direto. — De tudo... de todo o mal que lhe fiz. — Não ousou olhar para a face de Alexander. — Teria lhe dito isso no dia seguinte aquele em que enlouqueci. Mas não tive a chance. Então quis aproveitar que fui libertado em condicional para vir aqui e deixá-lo ciente de que reconheço o absurdo de minhas ações. Quero que saiba que me arrependo, que me arrependerei pelo resto da minha vida e...

— Eu queria que estivesse morto... — A fala de Alexander o interrompeu. — Esperava que você tivesse morrido na cadeia. Por muito tempo, pensar em você morrendo foi uma maneira de me acalmar. — Se o ódio não estivesse sendo explicitado em conteúdo, estaria claro no tom com o qual o fotógrafo falava. — Meu assistente foi agredido pela polícia... ele é um menino bom... ele não merecia o que sofreu, mas você... eu queria que eles te espancassem do jeito que você fazia comigo, eu...

— Não! Você não quer isso! Nunca quis. — Luigi se ergueu, alarmado pela fala do mais jovem. Passou uma mão na face e então entre as mechas do cabelo esbranquiçado. Rugas profundas marcavam o desgaste físico causado pelas doenças oportunistas para as quais o HIV abrira as portas. — Não porque eu não mereça, mas porque você não tem ideia, não tem ideia do que acontece... você é uma pessoa boa e eu sei que não quereria essas coisas para ninguém.

— Eu mudei... você me fez mudar... O que esperava? Encontrar um garotinho puro para corromper?

— Está falando da boca para fora... — Luigi respirou fundo e falou.

— Quem é você para questionar a validade do que digo? — Alexander indagou extremamente irritado, dando um passo em direção ao mais velho que buscou se afastar. — Acha que vir aqui e dizer algumas palavras bonitas enquanto se ajoelha é suficiente para apagar o que fez? Acredita que seu arrependimento de merda vai me impedir de te odiar? Como ousa vir aqui? Como se atreve a me encarar? Você deveria saber, deveria saber melhor do que todo mundo que eu não quero te ver, não quero nada que venha de você! Não quis o seu dinheiro no passado e não quero os seus sentimentos. Eu tô pouco me fodendo se você está arrependidinho, seu pedaço de merda! Lixo humano, estuprador maldito! Eu te odeio e sim, eu queria que estivesse morto, que estivesse apodrecendo numa cova!

A raiva do fotógrafo se manifestava também através das lágrimas e um homem que os observava de longe se aproximou de Luigi, segurando-o pelos ombros e pedindo para que ele desistisse de falar com Alexander.

O tal homem era muito mais novo que o de cabelos grisalhos.

— Eu não acredito que alguém teve a coragem de ficar contigo sabendo de tudo o que fez! — Alex vociferou incrédulo, tomado de rancor.

— Julian é meu enfermeiro, agradeceria se não o insultasse. Isso é apenas entre nós... eu aceito o seu ódio, Alexander, mas...

— Lu, sabe muito bem que não somos só isso... — O tal Julian disse orgulhoso. — Eu lhe disse que vir aqui era uma má ideia. Veja, ele sequer consegue se controlar e ter uma conversa coerente com... — Parou de falar quando Luigi subitamente o puxou para trás.

— Se esse filho da puta não se calar, eu vou arrancar a língua dele! — Alexander ameaçou com furor extremo. Tinha avançado contra o rapaz mais novo e agora se encontrava agarrado à gola da camisa de Luigi.

— Julian, eu deixei que me acompanhasse sob a condição de que não se intrometesse em meus assuntos com Alexander. — O mais velho ergueu as mãos e esperou até que o fotógrafo soltasse sua camisa. — Por favor, tenha mais respeito... ele tem o direito de estar com raiva.

Alex começou a rir.

— Comovente... Mas o seu novo brinquedo está certo. Foi uma péssima ideia vir aqui. — disse, parando de sorrir. — Volte para o buraco de onde saiu e me deixe em paz. Não quero te ver nunca mais, Luigi Bertonelli. E você... — Olhou para Julian. — Quando ele passar a te espancar, você vai lembrar de mim... e de como eu sequer consigo me controlar e ter uma conversa coerente... você vai se lembrar de mim... e, assim como eu, você vai desejar que ele morra... Agora, façam ambos o favor de ir para a puta que pariu!

O rapaz entre Luigi e Alexander fechou a cara e cruzou os braços. Não ousaria retrucar as palavras do fotógrafo. — Vamos, Lu... — chamou e segurou o braço do homem que era cerca de trinta anos mais velho que ele.

— Não te procurarei mais, Alexander, eu prometo. Não quero que se sinta mal de forma alguma. — Luigi prometeu. — Espero que a noção de que não sou seu inimigo lhe ajude a encontrar a paz. — Passou um braço atrás da cintura de Julian e virou as costas, seguindo para o lado oposto ao qual Alex iria.

Notas Finais: Esta obra está chegando ao fim. Obrigada por ler, espero, como sempre, que esteja curtindo. Vote e comente, se estiver. Abraços!

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