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Capítulo 3 - Me diga o que você é...


    Alina deu um pulo assustada, horas mais tarde quando finalmente despertou. O quarto onde se encontrava estava praticamente escuro, exceto pela pequena fresta de luz que adentrava pela porta entreaberta. Rapidamente apalpou o bolso da calça, procurando inutilmente pelo celular, imaginando que o mesmo se perdeu na floresta. Receosa levantou e caminhou na ponta dos pés. A mão tremula sentiu o frio da maçaneta ao abrir a porta, a luz preencheu o cômodo e a garota fitou o grande quarto atrás de si.
Seus olhos brilharam, não sabia onde estava, mas se sentiu como quem viajou no tempo. Viu a sua frente um grande mosqueteiro branco de renda que envolvia parte da cama da qual acabou de levantar, a cabeceira era de madeira trabalhada à mão e continha o desenho de dois anjos se olhando, o lençol de seda vinho estava levemente desarrumado. Pendurado no teto o lustre de cristais fazia o chão de madeira brilhar, na parede o tom bege fosco predominava acompanhado de acabamentos brancos, o que dava um ar rústico ao local. Pendurado ao lado direito um grande espelho oval, e abaixo dele uma cômoda vintage marrom escura feita de carvalho, e só. Era tudo que via.
O quarto cheirava a poeira, embora aparentasse estar limpo. Ela voltou até a porta e ousou olhar para fora; vendo um grande corredor cheio de portas, no chão um largo tapete vinho, deu um passo e nesse momento ouviu a voz dele novamente.

— Finalmente acordou.

Ela soltou um leve grunhido e rapidamente se afastou.

— Se deseja me matar faça logo.

— Porque iria matá-la?

A respiração dela acelerou.

— O que mais um ser como você poderia querer de mim?

Ele riu, encostando-se na parede.

— Você é sempre negativa assim? — questionou.

— Você já tentou uma vez...

Ele interrompeu:

— O quê?! Isso é por causa daquela mordidinha de nada? — ele levantou uma das mãos fingindo estar ofendido.

Alina nada respondeu, e ele continuou.

— Aquilo foi uma mordida carinhosa — sorriu cínico —, se quisesse te matar já estaria morta, pode ter certeza.

Caminhou lentamente vendo Alina se afastar ainda medrosa. Com a mão direita ela tocou o pescoço na tentativa falha de encontrar com os dedos a mordida que levara mais cedo.

— Se está procurando a mordida, ela não está aí.

— Como não?

— Eu cuidei de você — respondeu.

Ela estremeceu em pensar na resposta, mas mesmo assim perguntou:

— Como?

Sério?  Por acaso nunca leu histórias sobre vampiros?

— Você me transformou?! — perguntou assustada.

— Claro que não, te dei um pouco do meu sangue. Apenas o suficiente para curar a ferida. Acho que depois disso você pode confiar em mim.

Alina o fitou com atenção, podendo graças a luz observá-lo. Ele era um homem alto e magro, seus cabelos curtos eram pretos e liso. Dono de ombros largos e traços perfeitamente desenhados ao rosto, parecia um anjo esculpido em vida. Vestia uma calça jeans, camiseta e bota Democrata Garage Stroke, tudo preto. Os olhos dele não eram apenas claros e chamativos, eram dominadores, cheios de veneno misturado com açúcar... O perfeito exemplo de bad-boy.

— Não confio em você — ela finalmente disse. — O que quer comigo?

— Te conhecer melhor, saber um pouco sobre você... Talvez algum segredo — disse ele languidamente.

— Não tenho segredos — retrucou rapidamente.

— Tudo bem, senhorita não tenho segredos  — ele se aproximou —, vamos começar de novo. Eu me chamo Derek Campbell — estendeu a mão que friamente foi ignorada. — Como se chama?

— Alina Donovan.

— Me diga, o que você é?

— O que eu sou... — repetiu confusa — Por que me pergunta isso?

— Vamos, colabore comigo. Que tipo de criatura é você?

Alina franziu a testa indignada.

— Sou um ser humano. Uma pessoa como outra qualquer!

— Não, você não é...

Ele encarava Alina de forma intensa.

— O que você quer que eu diga?

— A verdade — respondeu rude.

— Você é louco! Me mate ou me deixe ir embora...

— Você pode ir na hora que quiser.

— Quero ir agora — disse tentando não parecer desesperada.

— Tudo bem.

Alina deu as costas e começou a descer o lance de escadas de mármore sem olhar para trás, no último degrau diminuiu a velocidade bruscamente se deparando com a presença vistosa de uma mulher; o cabelo dourado e cheio de cachos dela vinha até o ombro, o cinto do casaco vermelho marcava sua fina cintura e destacava sua pele levemente pálida, os olhos verdes encaravam Alina.

— Quem é você? — A loira inquiriu hostil.

Derek desceu a escada vorazmente, intrometendo-se.

— Perdoe minha irmãzinha, Lissa. Ela não costuma agir assim...

Lissa desviou o olhar para o irmão.

— Quem é ela?!

— Aline... — Derek disse.

— Alina — a garota corrigiu sussurrando quase inaudível.

— Tanto faz — ele retrucou —, você já estava de saída, não é?

Alina assentiu, apressando-se a passos largos. Os olhos de Lissa seguiram a garota até não conseguir mais vê-la. Calada Lis encarou o chão por um curto período de tempo.

— Fale de uma vez.

— Certo... O que pensa que está fazendo Derek?

O que penso que estou fazendo?  Não me queria de volta? Estou aqui.

— Não estamos aqui para isso.

— Está aí... Gostaria de saber porque estamos aqui.

— A muito tempo nesta casa, tive os melhores anos da minha vida... Só quero que tudo volte a ser como era antes.

— Nada jamais voltará a ser como era antes.

— Dê...

— Estou cansado. Foi uma longa viagem até aqui, Lissa — afastou-se, deixando-a sozinha na sala.

Como num vulto Derek subiu à escada. No andar de cima, encarou a porta fechada no fim do corredor, onde costumava ser o quarto de seus pais, tal observação o fez divagar para um século distante; quando naquele tempo subira às pressas a mesma escadaria — após caçar um veado — e necessitava urgentemente de um belo banho, ainda sentia a adrenalina percorrer em seu corpo, a emoção corria em suas veias, o suor descia na testa. No exato momento que tocou a maçaneta fria, ouviu um breve sussurro vindo do quarto do pai. Caminhou mais um pouco até a porta entreaberta e parou. Seu pai, Hans, estava sentado ao pé da cama de costas para a porta, com um quadro em uma das mãos.

— Pai — chamou com receio —, está tudo bem?

— Perfeitamente.

Sabia que não estava nada bem. Derek observou quando o pai colocou o retrato na cabeceira da cama e se levantou. Ele mesmo sentiu um nó se formar na garganta. A imagem da mãe sorrindo no retrato preto e branco encheu-lhe os olhos de lágrimas; sentia falta dela, todos sentiam, e seu pai estava despedaçado.

— Eu podia ter salvado a mãe.

— Apenas Deus podia!

— Pai, sabe que não é verdade — insistiu. — Se o senhor tivesse permitido...

Sua voz grave cortou Derek.

— Permitido? Permitido que você a transformasse em um monstro?! — Hans o olhou com desdém. — Assim como fez com seus irmãos?

Derek abaixou a cabeça em desapontamento. Se sentia péssimo, queria falar algumas verdades, mas isso não mudaria o fato de sua mãe estar morta. Balançou a cabeça de um lado a outro, afastando seu devaneio. Não havia um lugar naquela casa que não lhe trouxesse lembranças. Rapidamente entrou em seu quarto e acendeu a luz; tudo estava exatamente como ele deixara, isso lhe deu um gosto amargo na boca. Sua visão embaçou, sentiu o cômodo rodar brevemente, mas não perderá os sentidos.

Aquela noite já havia sido longa demais, o passado havia dado o ar dá graça e o que quer que Alina fosse, ele iria descobrir... Precisava descobrir.

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