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Capítulo 18 - Um Elo de sangue


    Havia uma grande tensão naquela sala pequena e mal-cheirosa, algo tão pesado que comprimia o ar. Alina tinha medo de perguntar (embora no fundo já soubesse a resposta), contudo ousou e deixou que as palavras saíssem de sua boca:

— Eu sei que feiticeira é essa — falou parando rapidamente. — Ela esteve nos meus pesadelos.

— Não foram pesadelos — a velha respondeu, mexendo-se  na poltrona —, foram espécies de projeções do passado que estavam gravadas em sua mente...

— Não importa — Alina retrucou, interrompendo-a. — Mas, isso faz de mim, o quê?

— Uma híbrida — Derek respondeu sem delongas.

— Não! — Alina murmurou arqueando as sobrancelhas.

— Sim, é isso mesmo — a mulher disse seriamente.

— Não, você não está entendendo. Sua velha louca! Eu era normal, até ele me morder e dar seu sangue, entende? Eu era normal — replicou alarmada. — Tive uma vida normal...

— Sossegue! Isso é o que você é — a velha respondeu séria. — Ele só fez quebrar a magia, pois existe um forte elo entre vocês. E essa vida que diz? Ela não pertencia a você!

— Eu sou uma... Uma... Loba e também vampira? — inquiriu completamente perplexa.

A velha apenas balançou a cabeça, confirmando. Alina então dirigiu seus olhos acusadores para Derek.

— Por que eu? —  questionou amargurada. — Por que teve que morder a mim?

— Você estava lá — respondeu rapidamente.

Naquele momento Alina odiou sua resposta, odiou o fato do Derek ter se aproveitado e de ter ficado só, em seguida odiou Marina por tê-la arrastado até a floresta naquela noite. Por fim odiou o destino.

— Garota — a velha chamou alterando a voz —, você ainda não entendeu que isso iria acontecer uma hora ou outra? Se não acontecesse você em breve estaria morta — disse gesticulando. — Sim, pois logo a vida cobraria caro o empréstimo que lhe deu, não de livre e espontânea vontade. Sem o vampiro astuto aqui, você na verdade nada saberia sobre si mesma.

Não era a intenção da velha mística defender ele; longe disso, detestava vampiros, no entanto era seu dever dizer a verdade.

— Isso... Isso é demais para mim! Não posso lidar com isso... É realmente demais — Alina fitou Derek, parado no canto da sala. — O que eu faço? — questionou-o com lágrimas nos olhos.

Ele se aproximou em silêncio. Ela estava em pânico, muito embora não se movesse ou gritasse. O vampiro apenas lhe estendeu a mão e a puxou para cima, abraçando-a velozmente. Assim longos minutos se passaram; com a garota envolvida em seus braços, e totalmente inerte.

— Esse sempre foi o seu destino — a velha falou seriamente. — Não é algo que se possa escolher, é algo que se herda e você nasceu para ser única.

Alina fungou diante daquelas palavras.

— Então agora o que está exatamente acontecendo comigo?

— Você está morrendo — a senhora falou, depois de um longo silêncio meditativo. — Lilite usou uma magia negra poderosíssima, que até aquele momento nunca havia sido usado antes, e agora é totalmente proibido. Isso garota lhe impediu de poder usufruir do que você era de verdade — a velha fez uma rápida pausa, colocando ar para dentro dos pulmões. — Por muitos anos você esteve petrificada como uma estátua, escondida entre um véu... Eu não sei como, mas você saiu de lá. E aquela feiticeira maldita, mas genial, tratou que o resquício da bruxaria fosse totalmente quebrado com sangue, ou então você ainda não poderia ser quem deveria.

— Isso nos leva ao dia em que eu e a Alina se conhecemos, não é? — Derek inquiriu.

Alina se afastou dele, enquanto a mulher respondia que sim apenas balançando a cabeça em silêncio.

— O seu sangue quebrou o resquício que sobrará da magia como eu já havia dito, por conta do elo entre vocês — a velha falou. — Tudo que você sentiu depois disso Alina, é só a consequência do seu próprio passado, a vida pouco a pouco se esvai de você. Precisa deixar que ela se vá e só então será o que sempre deveria ter sido.

Alina a fitou com olhar intrigado. Então a velha continuou:

— Eu posso te ajudar, acabar com isso. Evitar a dor física.

Derek sabia o que aquilo significava, morte e vida não-humana para sempre, no entanto Alina ainda acreditava no fundo do seu coração que poderia existir uma forma de tudo voltar a ser como era antes.

— Como pode me ajudar? — a garota perguntou curiosa.

— Você quer minha ajuda? — a velha questionou seriamente. — Saiba sinceramente que é a única escolha que tem neste momento.

Alina respirou fundo, ela desviou o olhar para Derek esperando que ele lhe dissesse o que fazer, mas ele nada falou. Não poderia ser uma decisão dele.

— Se aproxime de mim — a senhora pediu calmamente.

Sem pensar mais Alina se abaixou, ficando cara a cara com a velha que apenas tocou em sua testa e disse algo em voz baixa. Nem mesmo Derek pôde ouvir, pareceu que ela apenas havia mexido os lábios sem nenhum som advir. A princípio a garota pareceu estar apenas paralisada, em algum transe que durou alguns segundos, mas depois seu corpo caiu pesadamente para o lado, como se estivesse oco por dentro.

Naquele instante, em torno dos olhos de Derek veias grossas surgiram rapidamente e também em sua boca as presas afiadas.

— O que você fez com ela? — ele questionou irado.

— Você sabe... Eu apenas quebrei a pequena linha tênue que a impedia de ser quem sempre deveria ter sido.

— E quando ela acordar?

— Bom, eu não posso dizer como será — a velha falou com sinceridade. — Mas por sorte hoje não é lua cheia.

O vampiro tratou de vasculhar com os olhos algum lugar que fosse ao menos confortável para colocar Alina, e fitando o cômodo achou bem no canto um sofá repleto de jornais em cima dele. Rapidamente ele jogou tudo no chão sem se importar com nada e em seguida colocou a garota ali. Pela primeira vez a pele dela estava completamente gelada, e aquilo fez o coração de Derek apertar dentro do peito, como se murchasse demasiadamente. Ele a olhou mais uma vez e sentiu medo por ela.

— Ora, não precisa disso — a velha falou de supetão. — Ela irá acordar, mais cedo ou mais tarde.

— Eu tenho que sair um pouco — Derek respondeu. — Acredita em mim quando digo que farei você sofrer horrores se ela não acordar? — ele fitou a mulher friamente.

— Ela vai acordar — afirmou.

— Ótimo!

Derek caminhou em direção a porta, saindo da casa. Precisava falar com Tara, dizer que estava tudo bem, que podia ir embora. Ficou surpreso ao notar que ela trouxera o carro até a frente da casa. Descendo os degraus pôde vê-la deitada no banco de trás, encolhida. Ao se aproximar do veículo, o vampiro bateu de leve no vidro, repetidas vezes, até que ela se levantou e abriu a porta, convidando-o para entrar.

— E então? — ela perguntou, vendo-o sentado ao seu lado em silêncio.

— Alina é a Herdeira Sanguínea  — ele disse, fitando-a, sério.

— E agora?

— Ela está lá dentro, morta — ele falou cabisbaixo. E Tara pôde perceber na fala dele, que aquilo lhe afetava.

— Derek, você precisa se afastar dela — ela falou, fitando-o nos olhos. — Sua vida está em jogo. Existe uma lenda sobre os cavaleiros de Orgni.

— O quê? — ele perguntou, olhando-a confuso.

— É uma seita antiga que foi criada para deter a Herdeira Sanguínea. Isso era só uma história assim como a existência dela, mas se ela não é uma lenda, eles também não são...

— O que ele são? — Derek perguntou tenso.

— São caçadores.

— Isso não me assusta, Tara — respondeu sorrindo, nitidamente aliviado.

— Pois deveria, eles foram criados por bruxas. Sabe-se lá o que elas fizeram, mas não são caçadores comuns — disse tocando no ombro dele. — Dizem que eles não morrem.

Nesse momento Derek se lembrou do caçador astuto que dias atrás matou, e que misteriosamente sumiu do necrotério. De repente uma aflição tomou conta de si, não sabia explicar, mas não era por ele, era por Alina.

— Derek, estou indo embora — Tara falou, chamando a atenção dele.

As mãos dela já estavam na maçaneta da porta quando ele a segurou pelo braço e disse:

— Eu levo você.

— Não precisa — ela sorriu. — Eu já estou em casa praticamente.

— Tara — murmurou.

— Escute... Se afaste da garota, antes que seja tarde. Está bem? — ela pediu, saindo do carro.

Antes que ela fechasse a porta e se fosse, Derek falou:

— Eu agradeço e sinto muito por não...

— Poder me amar? — ela o interrompeu. — Eu sempre soube que não poderia — falou com os olhos marejados e se foi, perdendo-se de vista na escuridão.

O vampiro ainda ficou ali por mais alguns segundos, pensativo.


Horas antes:

   Miguel parou o carro no posto para reabastecer, depois de horas dirigindo sem destino, apenas se deixou levar para longe. As rodas do veículo estavam cobertas de terra o que o fez praguejar baixinho. Alguns metros de distância uma jovem morena clara de cabelos pretos e Chanel, maquiagem forte acompanhado de um vestido curto — chamou a atenção dele —, ela tinha uma mochila nas costas e parecia impaciente.

— Precisa de ajuda? — ele perguntou.

Ela o fitou por um tempo, séria, antes de responder:

— Pode me dar uma carona?

Ele sorriu.

— Claro, pra onde?

— Fortilen City — ela falou, aproximando-se dele.

— Aquele lugar não é muito divertido — retrucou.

— Tudo bem, estou indo atrás de alguém.

— Um namorado — ele riu. — É bonita demais, para isso.

Ela o encarou por um tempo.

— Na verdade estou procurando uma garota que é muito importante para mim — respondeu colocando a mochila no chão. — Você é de lá, não é? Talvez conheça ela...

— Duvido muito — falou prontamente.

— O nome dela é Alina Donovan.

Miguel rapidamente franziu a testa e disse seriamente:

— Se não for apenas coincidência do destino, acho que é seu dia de sorte.

Ela gargalhou e falou em meio ao riso:

— E então, vamos?

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