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𝟭𝟬. A PIOR DAS MULHERES.

CAPÍTULO 10 | A PIOR DAS MULHERES

O som da máquina de costura ocupava os ouvidos de Edith Preston quando o sol nasceu, conforme costurava os últimos detalhes de uma leva de ternos para os malditos Peaky Blinders a mando de Thomas, que dizia que estavam se aproximando de uma data importante e, por isso, precisavam estar bem-vestidos. Ela imaginava que não deveria ser nada muito bom; uma data importante para aqueles homens nunca seria algo mais ordinário do que um casamento surpresa, e com Shelby demonstrando tanto interesse nas roupas, ela podia apenas imaginar o pior.

Ele havia mencionado, alguns dias antes, pendências para resolver. Ela não sabia quais eram, e nem desejava descobrir; o breve conhecimento acerca das armas roubadas já havia lhe causado problemas suficientes, e Edith Preston desejava ficar o mais distante da polícia possível. Dizer que ela estava psicologicamente preparada para lidar com qualquer outro caso envolvendo a família Shelby seria uma mentira; após os últimos dias cheios, ela sentia que precisava, com urgência, de férias de todos eles. Desde Arthur Shelby Sir., até o pequeno Finn Shelby.

Entre todos eles, principalmente Thomas.

Era apenas complicado. Aquela era a única palavra que ela conseguia encontrar para os descrever.

Thomas era, também, aquele mais difícil de afastar; ele sempre estava por perto — às vezes, perto demais —, não importava a razão. Mesmo quando ela não o via, era como se sentisse sua presença pairar sobre o local, porque Thomas Shelby era como um fantasma em Small Heath, e era sempre um assunto sobre o qual as pessoas sussurravam o tempo todo. Ao mesmo tempo que o queria longe, detestava não tê-lo por perto, e se detestava ainda mais por se sentir assim.

Ela revirou os olhos em silêncio quando ouviu o som da tranca da porta dos fundos se abrindo, sabendo quem era a única pessoa que detinha a chave. Quando ouviu seus passos se aproximando, olhou por cima dos ombros de forma despreocupada.

━ Você precisava passar pela parte onde eu moro? ━ ela questionou, com a voz entediada. ━ Não podia entrar pela porta da frente do ateliê, como uma pessoa comum?

━ Eu não sou um homem comum ━ ele retrucou, levantando as sobrancelhas levemente, mantendo o rosto sério. ━ Os ternos estão prontos?

Com um simples movimento de ombros, Edith respondeu:

━ Estou dando os últimos ajustes no último terno.

Ele a observou, concentrada na máquina de costura, e sorriu levemente ao perceber seus olhos semicerrados e sobrancelhas unidas, enquanto tomava cuidado com a agulha que trabalhava freneticamente. Não era mais tarde do que seis da manhã, mas Edith Preston já estava impecável, com seus cabelos ondulando-se sobre os ombros e o batom vermelho intacto, com as vestes perfeitamente passadas e vestidas de forma meticulosa. Um de seus pés, calçados com sapatos de salto, descansava sobre o pedal, movimentando-se de acordo com a necessidade, e foi algo que Thomas admirou.

━ Pensei que fosse encontrar você de camisola, com bobes no cabelo ━ ele comentou, após alguns segundos, e ela comprimiu os lábios em uma linha reta, ignorando-o. ━ É cedo demais, mas você já está pronta.

━ É o que as pessoas fazem quando esperam uma visita, Tommy ━ respondeu, evitando seu olhar, com a voz entediada. ━ Elas se vestem.

Ele assentiu lentamente, estudando com calma seu rosto impaciente.

━ É por isso que prefiro chegar de surpresa.

Edith não sabia exatamente como agir perto de Thomas após a noite que passaram juntos, e o problema maior havia sido sua tentativa de fuga, em um ato de desespero, quando ele ameaçou deixar Birmingham. Parecia que estava daquela forma por causa da ausência do homem, quando na verdade temia apenas ficar sem proteção e na mira da polícia. Aquela era a última humilhação que Edith precisava, e ela estava absolutamente indignada consigo mesma por permitir, mesmo que por meio minuto, que Thomas pensasse que tinha tal efeito sobre ela. Paixão era para mulheres tolas, e certamente não era seu caso.

Para tornar tudo pior, Thomas agora a provocava o tempo inteiro, parecendo sempre se divertir com a situação, embora nunca tivesse liberado uma risada de verdade. Ela via em seus olhos o brilho da diversão, embora ele ainda estivesse ocupado e preocupado com outros problemas que tinha para resolver.

━ Você é tão engraçado, Thomas ━ ela resmungou, ajeitando uma das mangas do terno sob a agulha na máquina, concentrada nos próprios movimentos. ━ Acho que estou começando a entender agora o motivo de não ter me deixado casar com John. Você queria me ver de camisola, e não ele.

Thomas riu pelo nariz, encarando uma parede. À altura do casamento de John e Edith, que nunca chegou a acontecer de verdade, tudo o que ele sentia por aquela mulher era desprezo absoluto. Não que aquilo tivesse mudado por completo; ele certamente continuava achando Edith desprezível — ela nunca tentou mudar sua opinião —, mas também achava muitas outras coisas.

━ Eu queria casar você com Johnny Dogs, na verdade ━ ele retrucou, fazendo a mulher franzir o cenho levemente, antes de balançar a cabeça para os lados.

━ Eu passo sua oferta. Não me traria muitos benefícios.

Assentindo devagar, Thomas completou:

━ E você só faz as coisas quando há algum benefício.

━ É claro. Um casamento não é meu maior interesse, Thomas. Eu tenho preocupações maiores ━ falou, olhando-o por um segundo, e desligou a máquina de costura. ━ Acho que sou uma mulher ruim.

Ele não desviou seus olhos da mulher, tombando a cabeça para o lado brevemente ao responder, com a voz mansa:

━ E eu sou um homem pior.

Levantando-se para pendurar o terno finalizado em um cabide, Edith o observou por um momento, com o mesmo julgamento que sempre trazia no olhar.

━ Você é tudo o que um homem deveria ser, na verdade.

Ninguém se surpreendia ou se ofendia quando os homens eram ruins. As pessoas podiam fingir ultraje ao saberem das coisas crueis feitas por eles, mas o desgosto forçado jamais poderia se comparar à verdadeira repulsa absoluta que sentiam por uma mulher que não tinha o sonho de se casar e formar uma família.

Thomas a olhou inexpressivo conforme ela caminhou até ele e estendeu o terno em sua direção, apenas para que ele visse o resultado final. Não tirou os olhos de Edith, que então se virou para levar o terno até os outros, pendurados em uma arara e endereçados aos Peaky Blinders, e sorriu levemente quando a viu arquear uma das sobrancelhas.

Edith Preston não mudava, Thomas concluiu. Ele talvez estivesse amolecendo, tornando-se mais paciente e gentil para aqueles que conseguiam reconhecer, mas ela continuava tão afiada quanto uma faca. Olhava para ele como quem olhava para uma pedra nos sapatos, como se fosse apenas mais um inconveniente em sua vida, e falava com ele da forma que desejava, sem se esconder ou disfarçar, ignorando o status do homem. Shelby ousava dizer que acreditava que ela o tratava ainda pior do que tratava as outras pessoas, o que, de uma forma absolutamente peculiar, o confortava.

Ela não se escondia como os outros.

━ Não pagou adiantado dessa vez ━ ela lembrou. ━ Disse que era uma encomenda urgente e que acertaria comigo depois.

━ Eu disse ━ ele confirmou, com as mãos unidas em frente ao corpo.

Edith o encarou com as sobrancelhas levantadas e os braços cruzados, como se aguardasse, e Thomas sustentou seu olhar, como sempre fazia. Naquela ocasião, pela primeira vez, a mulher abriu um leve sorriso após alguns segundos, logo se corrigindo e pressionando os lábios juntos para conter o ato. Percebendo aquilo, o homem ergueu as próprias sobrancelhas suavemente, e olhou para baixo ao colocar uma das mãos em um bolso do sobretudo.

Seguindo seus movimentos com o olhar, Preston franziu o cenho ao vê-lo tirar dali uma pequena chave prateada, tentando compreender o que aquilo significava, e Thomas mentiria se dissesse que não se divertia vendo a confusão crescer em seu rosto; ele quase se esquecia, naquele momento tão calmo e silencioso, que logo ele e seus Peaky Blinders se envolveriam em mais problemas, no que ele esperava ser sua batalha final contra Billy Kimber pelas pistas de corrida.

━ Não é a chave extra que Curly deu a você. Que chave é essa, Tommy? ━ ela indagou, com as sobrancelhas unidas. Então, semicerrou os olhos e o olhou com desconfiança. ━ Se disser que é a chave para seu coração ou qualquer idiotice do tipo, eu vou puxar a minha arma e matar você.

━ Eu agradeceria você por isso, se fosse a porra da minha resposta ━ ele retrucou, entregando-a a chave, permitindo que a mulher examinasse mais de perto. ━ É a chave para o andar de cima.

Era raro que Edith Preston ficasse sem palavras; ela costumava se calar apenas sob ameaças. Naquele momento, porém, ela apenas não soube o que dizer diante da resposta de Thomas. O andar de cima do Mundo das Agulhas estava desocupado desde muito antes dela se mudar para Small Heath, mas era caro demais para que ela o comprasse ou, ao menos, alugasse, afinal, o dinheiro de Albert Wilson não era tão abundante — ele não pôde lhe dar nem mesmo a alegria de ser rica —, e ela precisava se manter por algum tempo.

━ Você matou alguém por essa chave?

━ Não. Eu paguei.

━ Você comprou o andar de cima, e agora está dando para mim ━ ela disse, quase pausadamente, ainda tentando acreditar que aquilo estava mesmo acontecendo. Balançando a cabeça para os lados, ela estendeu a chave para Thomas mais uma vez. ━ Você não vai me comprar com seus presentes.

Aceitar algo tão grandioso do homem não poderia ser uma boa ideia, especialmente após a noite no ateliê que Edith desejava poder esquecer. Ela não planejava fazer uma dívida que não podia pagar e, muito menos, assumir qualquer tipo de compromisso que não existia; Thomas Shelby não era nada seu. Nada diferente do que era antes das horas em que foi seu amante. Ele era apenas um homem que não deveria lhe dar imóveis e esperar algo em troca.

Thomas não parecia minimamente preocupado ou ansioso com a situação. Não pensava como Edith, mas ela não percebia. Ele não se opunha a comprar pessoas; comprava aliados, espiões e informantes, mas jamais tentaria comprar o amor de uma mulher. E não era o que estava tentando fazer; ele ainda não compreendia o que sentia por Edith, mas acreditava que já não era capaz de amar. Duvidava que ela fosse, também; era tão quebrada internamente quanto ele, e o amor já havia falhado em sua vida antes.

O sabor da dúvida, no entanto, era amargo, porque Thomas e Edith sabiam que existia algo bem distante do ódio que os cercava e envolvia. Não sabiam o que era, mas sabiam que não gostavam.

━ Não é um presente ━ ele respondeu, ignorando a chave estendida em sua direção. ━ É uma troca. A partir de hoje, você não cobra mais por meus ternos.

Com um breve murmúrio, ela recolheu a mão de volta para si, com a chave envolta por seus dedos, e relaxou a expressão em seu rosto. Por alguns segundos, considerou a proposta, concluindo que ele sairia em um prejuízo muito maior que ela; era impossível que ele precisasse de ternos o bastante para quitar um imóvel, e Edith sabia que Thomas não era nenhum idiota, e sabia daquilo tão bem quanto ela. Talvez fosse sua teimosia falando mais alto; ele precisava se lembrar de que perdeu para ela toda vez que lhe entregava notas de dinheiro, e daquela forma, não precisaria repetir a ação.

Edith riu pelo nariz, brincando com a chave entre os dedos, e virou o rosto para observar a escada no canto do ateliê, que levava ao inexplorado andar de cima. O fantasma de um sorriso brincou nos lábios de Thomas, e ele seguiu seu olhar.

Esperava que Edith se mudasse para o andar de cima; a pequena porção do andar debaixo em que vivia era perigosa, de fácil acesso para qualquer bêbado que estivesse determinado o bastante para arrombar uma porta. Não que aquilo fosse um perigo para a mulher, que dormia com uma arma debaixo do travesseiro; mas poderia encontrar mais problemas e, àquele ponto, era algo que Thomas tentava prevenir. Era o que ele fazia por todos os seus: ele os defendia e protegia.

Edith Preston pegou em armas para ajudá-lo e era algo que ele não permitiria passar em branco.

━ Vou precisar dos seus Peaky Blinders ━ ela comentou, e ele a observou com curiosidade. ━ Para levarem as minhas coisas para o andar de cima.

━ Não é com o que trabalhamos. Contrate alguns homens.

Ela negou com a cabeça.

━ Eu sei que vai mandar os seus.

Thomas suspirou, sem poder negar. Ele mandaria quantos homens fossem necessários para levarem os móveis de Edith para o andar de cima. Os mandaria para levarem seus móveis para onde ela precisasse, desde que aquilo significasse que ela não receberia homens desconhecidos estando sozinha em casa.

Mas ela não deveria saber.

━ Se sobrarem muitos, você pode os esperar na segunda-feira ━ ele disse, e ela franziu o cenho.

━ Está planejando funerais?

━ Nenhum do qual eu precise participar ━ Thomas retrucou. ━ Mas não posso prever o futuro.

Edith não se comoveu minimamente. Ao invés disso, revirou os olhos e lhe deu as costas, voltando a se sentar atrás da máquina de costura.

━ Bom, eu não sei que porra você e os seus malditos Peaky Blinders estão indo fazer hoje, mas preciso de cinco homens aqui na segunda-feira, às nove da manhã ━ ela exigiu, e Thomas achou graça da forma com que Edith parecia acreditar que estava no comando. ━ Avise a eles que eu não cozinho com frequência, mas depois que montarem a minha cozinha lá em cima, eu vou servir a eles um banquete.

Thomas assentiu. Talvez fosse esse o motivo de Edith pensar que os Peaky Blinders eram seus funcionários.

━ Todos estão convidados para o banquete?

━ Não você ━ ela disse, cruzando as pernas e abrindo seu caderno de entregas finalizadas. ━ Eu não vou cozinhar para você, porque ainda me deve um jantar.

━ Não se passa um dia sem você se lembrar disso ━ ele respondeu, vendo-a subir o olhar para encará-lo. ━ Quando eu falei sobre te levar para jantar, você disse que tinha planos melhores.

━ É claro que disse. Eu não te daria a satisfação de ficar esperando você resolver qualquer porra que tiver para resolver e só então me levar para jantar ━ Edith falou, com a voz tranquila, voltando a observar o caderno de entregas. Com um lápis, riscou a página que falava sobre os ternos que acabara de fazer, sinalizando que estavam prontos. ━ Não estamos brincando de casinha, Tommy, e eu não sou sua esposinha adorável que vive para te fazer feliz e facilitar sua vida.

Thomas levantou as sobrancelhas, desacreditado, e pela primeira vez em algum tempo, Edith ouviu sua risada baixa e rouca, conforme ele balançou a cabeça para os lados em negação.

━ Você nunca facilitou a minha vida, senhorita Preston.

Ela piscou.

━ E nem quero, senhor Shelby ━ retrucou, e apontou a ponta do lápis em seus dedos para a arara com os ternos. ━ Você pode levar a arara, se quiser. Mas preciso que traga de volta, porque é onde eu penduro todas as encomendas. Sei que você tem a mão leve.

Ele assentiu, puxando a arara e ouvindo-a ranger levemente conforme as rodinhas deslizavam pela madeira do piso.

━ A minha mão leve não pareceu incomodar você.

Edith segurou o lápis com mais força entre seus dedos, respirando fundo, e contou até dez mentalmente.

Em sua opinião, Thomas Shelby estava ficando confortável demais em sua presença para fazer tantas piadas ridículas. Era algo que ela esperava de John, e não dele. Edith preferia quando os homens ficavam desconfortáveis; aquilo tornava sua vida muito mais fácil.

━ Vá para o inferno, Tommy ━ ela murmurou, revirando os olhos, vendo-o passar pela porta com a arara e os ternos. ━ Mas só na semana que vem. Ainda preciso dos seus homens para fazer a minha mudança.

Ao se ver na rua, Thomas ajeitou a boina na cabeça, encarando a mulher com os olhos semicerrados para protegê-los da luz do sol.

━ Não abuse da sorte, Edith ━ ele alertou. ━ Não trabalhamos para você.

Levantando-se de onde estava sentada, Edith caminhou até a entrada do ateliê, cruzando os braços e encostando-se à batente da porta.

━ Se eu pedir para John ou Arthur, eles mandam quantos homens eu precisar. Você precisa parar de se fazer de difícil.

A vida de Thomas Shelby era mais simples quando todos à sua volta odiavam Edith Preston e John e Ada eram os únicos que não a repudiavam. Não era como se ele desejasse que a mulher fosse julgada e maltratada, mas ele e Edith estavam em constantes embates, e era bom sentir que alguém estava do seu lado quando aquelas coisas aconteciam.

Mas Edith havia, de alguma forma, enfeitiçado toda sua família. Conseguiu conquistar Polly, de algum jeito, e encontrou mais um forte apoiador quando impediu Arthur de atentar contra a própria vida. Finn, como todas as outras crianças de Small Heath, era apaixonado pela moça bonita que dava roupas às bonecas de Katie. O fato de Arthur Shelby Sir. ser o único Shelby que a odiava àquela altura do campeonato não era um bom sinal; Thomas não desejava se assemelhar em nada ao pai.

━ Você brinca com fogo, Edith.

━ Não, eu apenas sei das regras do jogo que estamos jogando. Sei como as coisas funcionam e sei como conseguir o que eu quero ━ ela explicou, dando de ombros, e antes que Thomas pudesse responder alguma coisa, Edith continuou: ━ Você tem um compromisso para segunda-feira a noite.

Thomas levantou as sobrancelhas.

Edith o cansava. Todos os dias.

━ Eu estou te informando agora. Você irá me levar para jantar ━ ela voltou a dizer, sem esperar por uma pergunta do homem confuso. ━ Eu estarei pronta às sete.

━ Johnny Dogs buscará você às oito.

Edith permaneceu inexpressiva, e deu de ombros ao responder:

━ Então faça o favor de morrer hoje.

Quando ela deu as costas e fechou a porta do ateliê, Thomas encarou a fachada do estabelecimento por alguns breves segundos, quase desacreditado, antes de soltar uma risada para si mesmo.

Se Edith Preston o mandava ir para o inferno quando ela era o próprio diabo, aquilo talvez fosse um convite.

✒️

Quando soube que Grace Burgess era a espiã que contava sobre seus assuntos à polícia, Thomas Shelby foi inundado por um sentimento de raiva que apenas ele mesmo poderia entender; sabia que muitos assuntos haviam sido compartilhados com a garçonete, e muitos outros foram ouvidos por ela enquanto servia doses de uísque no balcão do bar em que sempre se reuniam. Ele sabia que ela havia contado sobre as armas, e sabia que ela havia contado sobre a localização de Freddie Thorne; sabia, também, que Edith Preston havia sido a única a desconfiar da moça que enganou todos os outros.

Ele não sabia, até então, que Grace havia causado mais estrago do que ele imaginava. Naquela tarde, seus planos se resumiam em seguir com seus Peaky Blinders até a corrida de cavalos em Worcester, onde encontrariam os Lee e derrotariam, finalmente, Billy Kimber, tomando seu lugar na Associação Nacional de Agentes de Apostas de Corridas de Cavalos. Mas agora, Kimber e seus homens estavam indo para Small Heath, enquanto os Lee já estavam em Worcester, e estavam em um número maior do que a gangue de Birmingham naquele momento, o que preocupava Tommy e o obrigava a mudar seus planos.

Ele se sentia um pouco mais estúpido a cada vez que se lembrava de um dia ter confiado na mulher, sendo avisado repetidamente por Edith que havia algo de errado com sua história de boa moça. Thomas Shelby odiava estar errado, e tudo era ainda pior quando seus erros se convertiam em situações que ameaçavam a segurança de sua família e de seus Peaky Blinders.

Então, Thomas teve que recalcular. Instruiu Polly e Ada - que agora já não o odiava mais - a não saírem nas ruas, mantendo-se protegidas em casa, e avisou aos moradores de Small Heath para que não deixassem suas crianças soltas. Armou seus homens como pôde e tentou os motivar; convenceu Jeremiah a pedir que Deus lhe permitisse pegar em armas novamente, e então, retornou à casa de Edith, sabendo que a rua de trás de sua casa seria o local em que o conflito ocorreria. Dessa vez, bateu na porta e aguardou para que ela o atendesse, o que não demorou muito para acontecer, e ela elevou uma das sobrancelhas ao vê-lo ali.

━ Perdeu a sua cópia da chave?

━ Estava sendo educado, Edith ━ respondeu, com um meio sorriso, e ela permitiu sua entrada. ━ Nós tivemos uma mudança de plano, e os conflitos que preciso resolver acontecerão bem aqui, em Small Heath.

━ Desde que não me peça para pegar em armas por você mais uma vez… ━ ela murmurou, cruzando os braços ao vê-lo fechar a porta atrás de si. Por um breve momento, Thomas observou o local, encontrando algumas folhas com vestidos desenhados sobre a mesa da cozinha e um cigarro apagado no cinzeiro; por um momento, odiou atrapalhar seu momento de paz, mas logo voltou a atenção para a mulher, que continuou a falar: ━ Qual é a situação, Tommy? Qual é a porra do problema em que você se meteu dessa vez? Você não muda seus planos, a menos que te façam mudar.

O homem assentiu com a cabeça, aproximando-se da mulher e brincando gentilmente com um de seus cachos que caiam pelos ombros. Ela franziu o cenho, encarando-o, até que descruzou os braços e usou uma das mãos para segurar a de Thomas suavemente. O contraste do comportamento clemente do homem com o comportamento frio que costumava apresentar não lhe era confortável; mudanças sempre significavam que algo estava errado, afinal, não havia motivo para alterar o que estava certo.

━ Um homem chamado Billy Kimber está vindo para Small Heath, quando o combinado era de nos encontrarmos na corrida de Worcester, em que a família Lee e nós, os Peaky Blinders, iríamos derrotá-lo. Alguém o contou, Edith. Você já sabe quem foi ━ ele contou, vendo-a assentir devagar. Para sua surpresa, não sorriu; ela apenas o lançou um olhar de superioridade, de quem sabia, desde o início, que algo ruim iria acontecer, e Thomas, como sempre, odiou a si mesmo por não ter descoberto a verdade antes. ━ Ele está vindo agora, e nós não estamos em uma grande quantidade. Ele sim. Eu não quero que saia na rua hoje, está me ouvindo?

Enquanto o primeiro pensamento de Edith ao ouvir inicialmente sobre ele estar em problemas tivesse sido sobre ele lhe pedir, mais uma vez, para empunhar uma arma em seu nome, Thomas Shelby não poderia estar mais contrário àquela opção. Batalhas como a que travaria em alguns minutos não eram o ambiente correto para mulheres; apenas os homens haviam encarado a verdadeira guerra, e enquanto Tommy estava pronto para arriscar a vida mais uma vez, desejava que a mulher a sua frente estivesse protegida.

Encontrar o afeto de uma mulher, por mais incomum que fosse a forma com que esse sentimento se apresentava, ajudava-o a enxergar com ainda mais clareza a brutalidade dos homens, que já era conhecida por Edith.

Ela estava sempre dois passos à frente, ele acreditava. Sempre tinha uma surpresa, um plano extra para caso o primeiro desse errado. Era uma mulher inteligente, bem mais do que qualquer homem, e ele sabia que Edith não sairia de sua casa uma vez que os tiros fossem iniciados, mas ainda assim, ele sentia a necessidade de pedir para que ela se escondesse.

━ O único suicida que conheço é o idiota do seu irmão, Thomas ━ ela retrucou, unindo as sobrancelhas, e olhou por uma das janelas, vendo os Peaky Blinders se organizando enquanto John parecia dar um discurso motivacional para gangue. ━ Não atirem nas minhas janelas. Se vocês as quebrarem, vão ter que me comprar novas, e eu vou querer janelas mais caras e bonitas.

A ganância que brilhava nos olhos de Edith era motivo de desprezo para muitas pessoas que conseguiam enxergar aquele detalhe, mas de certa forma, Thomas a admirava. Não porque considerava um comportamento exemplar ou agradável, mas porque sabia que Edith tinha uma visão clara do que queria e de quem era.

Sem disfarces, sem teatros: uma mulher ruim, talvez a pior delas. A mais certa para Thomas.

Ele descansou a mão áspera contra seu rosto macio brevemente, vendo-a tombar a cabeça para o lado com cuidado, descansando o rosto em sua palma de forma leve, quase imperceptível.

━ Vá para o andar de cima e não chegue perto das janelas.

━ Porque você odiaria ver um rostinho tão bonito machucado? ━ ela indagou, em um tom sarcástico, e riu sozinha. ━ Não se preocupe comigo, Tommy. Eu não sou estúpida.

Ele assentiu em concordância, com a mão tão leve acariciando sua bochecha, e ela fechou os olhos por alguns segundos. O contraste de sua palma calejada contra seu rosto suave era confortável; seu toque era gentil, de uma forma que Edith nunca havia experimentado antes, e pela primeira vez naquele dia, ela permitiu que suas muralhas caíssem e deixou o medo a atingir. Abriu os olhos, olhando para Tommy, e temeu por ele. A modista sabia que Thomas Shelby estava acostumado a travar guerras, e acostumado a vencê-las; ele não estaria ali se perdesse, porque aquilo significava o fim de sua vida, e embora antes ela sempre desejasse vê-lo perder, agora torcia para que Tommy vencesse mais uma vez.

Uma mulher ruim e um homem pior. Era o que eles eram, e não tentavam esconder um do outro. Apenas eles podiam se entender, no fim das contas, porque eram, ao mesmo tempo, tão diferentes e tão semelhantes. Entendiam o caos que se alimentava entre os dois, compartilhavam dores e segredos enquanto insistiam que a confiança era algo caro demais para se conceder ao outro; mas no fim, Edith confiava em Thomas, e Thomas confiava em Edith. Viviam em lados opostos de uma zona de guerra e se encontravam em um paraíso particular sagrado demais para ser algo além de secreto, e embora não compreendessem por completo o sentimento que alimentavam, entendiam.

━ Tome cuidado ━ ela pediu, com a voz baixa. ━ Não morra. Não hoje.

━ Não se preocupe comigo ━ ele respondeu, ainda sentindo sua pele macia sob o toque cuidadoso de sua mão.

━ Não me diga o que fazer ━ ela retrucou, fazendo-o rir levemente. ━ Volte vivo, Tommy.

━ Por que? Vai estar esperando por mim? ━ ele indagou, levantando ambas as sobrancelhas, e ela semicerrou os olhos levemente. ━ Eu preciso levar você para jantar, não preciso?

Edith riu, assentindo devagar, e aproximou seus rostos com cuidado, encostando sua testa contra a de Thomas. Fechou os olhos mais uma vez, respirando fundo, e aproveitou aquele momento raro de quietude entre os dois. Sentiu sua respiração misturando-se a dele, e o mundo ao seu redor pareceu pacífico, ainda que uma guerra estivesse sendo travada há tempos do lado de fora.

A guerra acabaria logo. Um dos dois homens que a iniciaram encontraria seu fim naquele dia, e só assim o conflito entre Kimber e Shelby acabaria. Não havia um lado certo ou errado; eram homens gananciosos em uma briga motivada por poder, e estavam dispostos a fazer qualquer coisa para vencer.

Eram homens ruins, os dois, mas apenas um deles era seu homem ruim.

━ Não se esqueça disso, Tommy.

Ela permitiu que seus lábios tocassem os de Thomas brevemente, antes de se afastar, e o deu as costas em silêncio, caminhando para longe dele. Tommy ouviu cada um de seus passos conforme ela subiu as escadas para o segundo andar, e apenas quando ouviu a porta se fechando e teve a certeza de que ela estaria em segurança, o homem saiu do local para ir ao encontro de seus malditos Peaky Blinders.

Eles já o aguardavam, com suas armas e ternos, e Thomas se sentiu grato por vê-los ali. Sabia que a confiança não era algo a se distribuir com facilidade, mas confiava naqueles homens, seus companheiros de guerra, que muitas vezes o mantiveram vivo ao longo de anos de confrontos. Naquele dia, arriscariam-se por ele mais uma vez, ainda que soubessem que suas chances de vitória eram baixas se comparadas às de Billy Kimber após sua armação.

Thomas torcia para que vencessem juntos mais uma vez.

No segundo andar do ateliê, Edith tentou se manter afastada das janelas, mas não conseguiu. Algo a atraia para perto dos vidros, implorando para que não deixasse sua atenção escapar do conflito que acontecia naquela mesma rua; talvez fosse a necessidade de ter certeza de que os blinders estavam bem, vivos, ou talvez fosse apenas a curiosidade que a mulher nunca aprendeu a reprimir, como damas adequadas eram ensinadas a fazer. Ela envolveu o próprio corpo com os braços, angustiada e ansiosa, quando viu a gangue de Small Heath indo de encontro à caravana de Billy Kimber; esse, por sua vez, trazia quase que o triplo de homens a disposição de Shelby, e o resultado daquele embate parecia mais do que óbvio.

Criaturas estúpidas, eram os homens. Ela desejou poder ouvir o que diziam, mas suas vozes não eram suficientemente altas, e as janelas fechadas abafavam os sons do lado de fora. Então, Edith imaginou; imaginou que Thomas saudou o adversário de forma fria, e imaginou que John encontrou alguma forma de insultá-lo, mas a mulher não conhecia Billy Kimber, e não foi capaz de imaginar sua reação. Seu jogo acabou rápido demais, e novamente, ela foi tomada pelo nervosismo.

Edith não era hipócrita o suficiente para se dizer contra derramamentos de sangue após todos os eventos que a levaram à Small Heath, mas era descarada o bastante para se encolher como um animal assustado diante da visão de tantos homens armados e fazer um pedido silencioso para que não houvessem muitas mortes naquela rua. Ela sabia que não faria aquilo se os Peaky Blinders estivessem ali em sua totalidade, mas dessa vez, em seu próprio território, eles eram minoria.

━ Ternos tão bonitos para serem manchados de sangue… ━ ela observou, com desgosto, meio escondida por uma parede enquanto continuava a assistir. Apertando as próprias mãos, ela sentiu brevemente os calos em seus dedos, e balançou a cabeça em negação. ━ Dias do meu trabalho, e nunca é para a porra de uma celebração importante.

Ela tentava se convencer de que era aquela sua maior preocupação.

Mas temia por John, que era um bom amigo, e impulsivo demais. Temia por Arthur, que se assustava com sua presença, mas tinha coragem para enfrentar tantos homens armados. Temia por Thomas, a quem ela desejava matar com suas próprias mãos a todo o tempo.

Quando mais dois homens surgiram ao lado dos Peaky Blinders, Edith estreitou seus olhos para tentar vê-los melhor; com muita dificuldade, reconheceu Danny, que ela tinha certeza que estava morto há alguns meses, e Freddie Thorne. Ela soltou uma risada pelo nariz, desacreditada, e se aproximou mais da janela, abrindo-a cuidadosamente. A surpresa logo se dissipou; ela devia saber que Thomas Shelby sempre tinha uma carta na manga.

Ele havia trazido os mortos de volta à vida, afinal.

━ Que inferno de família! ━ a modista exclamou, num murmúrio, quando viu uma figura feminina se aproximar da aglomeração de homens. Estava vestida de preto dos pés à cabeça, e empurrava um carrinho de bebê decididamente. ━ Porra, Ada…

Edith fechou a janela rapidamente, caminhando até a janela da outra parede, a alguns metros de distância, e a abrindo, na esperança de ter uma visualização melhor da cena. Ela pensou em ir até lá, puxar Ada e seu bebê para dentro do ateliê e sacudir a outra para tentar fazê-la recobrar o senso; os Shelby tinham aquele problema, em que se viam tão acima dos outros que pensavam ser imortais. Talvez eles fossem, porque mesmo quando tentou se matar, Arthur não conseguiu. Ainda era impossível ouvir o diálogo que acontecia entre o grupo, mas a modista sabia que a presença de Ada e Karl havia surpreendido todos os homens.

Mas surpreendê-los era diferente de acalmá-los, e fosse lá o que Ada Thorne tivesse os dito e tentado fazer, não deu certo, e não demorou para que dois tiros fossem ouvidos.

Os dois saíram da mesma arma, empunhada pelo homem que liderava o grupo opositor dos Peaky Blinders. Edith sentiu um calafrio percorrer seu corpo quando Billy Kimber desferiu duas balas na direção de Thomas, acertando-o da primeira vez. A segunda bala, no entanto, atingiu Danny, que pulou em frente ao amigo, e Edith não soube dizer se, quando caiu, ele estava morto ou apenas ferido.

Tommy estava de pé. Ela respirou aliviada.

Mas Ada e Karl, indefesos, ainda estavam no meio do campo de guerra, e ela precisava fazer alguma coisa antes que também fossem vitimados. Edith engoliu em seco, sentindo a adrenalina percorrer por suas veias, e antes que pudesse pensar duas vezes, tirou a arma que escondia na cintura e a destravou. Com cuidado, tocou o gatilho e a apontou em direção ao alvo, apoiando o antebraço ao pé da janela para conter a tremedeira que a atingia.

Apertou.

Billy Kimber caiu morto após ser atingido por dois tiros, mas só um deles veio da arma segurada por Tommy. Todos atribuíram a ele a vitória daquela tarde, mas ele viu, enquanto a dor o consumia, a silhueta de Edith desaparecer por trás da janela.

Talvez estivesse alucinando após ser baleado. Talvez ela fosse o anjo da morte que foi enviado para lhe buscar.

Ou talvez, fosse a mulher que o traria de volta à vida.

✒️

Thomas Shelby se sentia desnorteado pelos próprios sentimentos; havia, de forma simultânea, uma euforia por ter contrariado o que já era esperado e ter derrotado Billy Kimber, que se misturava ao cansaço e à dor que sentia após ser baleado. Havia o luto por Danny Whizz-Bang, que tomou um tiro para protegê-lo e foi o único homem que Tommy conheceu a morrer duas vezes, e alívio por aquela ser a única morte em seu lado da guerra. Por último, havia uma urgência crescente em seu âmago, que gritava para que fosse de encontro à Edith Preston.

Era tudo o que conseguia ouvir por longos minutos, enquanto Jeremiah e Arthur cuidavam de seu ferimento, e enquanto ele e seus Peaky Blinders trocavam condolências pelo companheiro perdido. Tudo o que ouviu quando vestiu, mais uma vez, a camisa suja de sangue sobre o peitoral enfaixado e deixou o pub para trás, caminhando pela rua vazia até alcançar o ateliê. Não precisou bater na porta; a encontrou aberta, com a mulher sentada no degrau único e um cigarro pendendo dos lábios carmesim, observando o homem atentamente durante todo seu percurso.

━ Você obedeceu ━ ela disse, inexpressiva, soprando um pouco de fumaça ao falar. Um sorriso pequeno surgiu em seu rosto, e ela descansou a atenção sobre o sangue em sua camisa. ━ Está vivo, como eu mandei.

Ele assentiu.

━ Outros não tiveram a mesma sorte.

━ É o que se espera quando homens armados entram em combate ━ ela retrucou, e levou o cigarro aos lábios novamente, dando um longo trago. ━ Ao menos, Danny morreu duas vezes. Vamos torcer para que Billy Kimber não volte a vida como ele voltou.

Thomas soltou uma breve risada pelo nariz, observando-a em um momento de silêncio. Não se gabava, nem demonstrava culpa ou curiosidade; mantinha-se inexpressiva, tratando o assunto com uma casualidade quase absurda, e fumava seu cigarro tranquilamente enquanto se sentava de frente para a mesma rua que ainda estava suja com o sangue do homem que morreu por seu tiro.

Mas ele sabia que ela se incomodava. Não demonstrava, mas ele sabia que sim. Havia um vazio no fundo de seus olhos, e ele se lembrava da reação da modista ao ver os corpos mortos dos irlandeses no pub algumas semanas antes. Thomas se perguntou, em silêncio, se ela imaginava Albert Wilson no lugar de Billy quando atirou; talvez tornasse as coisas mais fáceis, ao seu ver.

━ As duas balas na cabeça devem garantir que ele não vai voltar ━ Thomas respondeu, após alguns segundos, e ela ignorou seu olhar, focada em dar um fim ao cigarro que fumava. ━ Eu pedi para não se envolver.

━ Deveria ter pedido o mesmo para a idiota da sua irmã, Tommy ━ ela murmurou, franzindo o cenho, e apagou o cigarro no chão. ━ Alguém tem que manter a porra da sua família viva.

Thomas havia dedicado uma parte considerável de seu dia tentando manter aquela maldita mulher em segurança; deu-lhe a chave para o andar de cima, pediu para que ficasse lá e não saísse nas ruas onde a violência era prometida. Disse para que se escondesse, e aguardasse até que tudo chegasse ao fim para voltar a sair.

Quando ela disse que não mais pegaria em armas por ele, ele sentiu alívio; ela estaria a salvo e longe de problemas. No entanto, confiar nas palavras de Edith Preston era um erro que ele não deveria cometer, e quando o corpo de Kimber caiu morto, ele soube que um dos dois tiros que tiraram sua vida havia sido disparado pela arma que John presenteou à mulher meses antes.

━ Como você está? ━ ela indagou, após alguns segundos de silêncio.

━ Isso não é importante, é?

Como Thomas se sentia não era minimamente significante; a dor em seu peito não importava quando ele estava vivo e havia saído vitorioso em uma guerra particular. Ninguém queria saber sobre aquilo; apesar das perdas, era um dia a se comemorar, afinal, os Peaky Blinders venceram e continuariam a prosperar, agora mais do que nunca.

━ Eu estou perguntando porque quero saber a resposta ━ ela disse, olhando-o como se dissesse algo óbvio. ━ Jeremiah fez um trabalho bem porco, pelo que eu estou vendo. Você ainda está sangrando.

━ Ele tirou a bala e Arthur limpou o ferimento. Eu vou sobreviver ━ ele respondeu, e ela assentiu, ainda sentada sobre o degrau. ━ Por que atirou, Edith?

Dando de ombros, Edith desviou a atenção para a rua mais uma vez. Descansou o olhar sobre o chão manchado por sangue ao mesmo tempo em que algumas gotículas d'água começaram a cair sobre Small Heath, e torceu para que elas levassem embora os vestígios de violência que marcavam o local.

Edith agora teria dois fantasmas assombrando-a durante as noites. Ela já conhecia o de Albert Wilson; viveu com o homem por sete anos antes de decidir que não desejava viver com ele um oitavo aniversário. Nunca conheceu Billy Kimber, mas sabia que ele a assombraria da mesma forma; ficaria em silêncio, assistindo-a trabalhar, e talvez nunca fosse embora por tempo o suficiente para que ela o esquecesse.

Ela pensou se estava arrependida, mas arrependimento era algo que aquela mulher não conhecia bem; era um sentimento para mulheres boas, que se sentiam mal por fazer coisas ruins e que não repetiriam suas ações se pudessem, algum dia, voltar no tempo. Não era o caso de Edith. Quando se imaginava tendo a oportunidade de voltar ao passado e fazer algo diferente, só conseguia se imaginar fazendo coisas piores.

━ Se vai morrer pelas mãos de alguém, eu espero que seja pelas minhas, Tommy ━ ela falou, finalmente se levantando, na intenção de se proteger da chuva. Thomas levantou as sobrancelhas devagar, com um sorriso mínimo, e ela cruzou os braços. ━ Mas ainda não chegou a hora.

A chuva continuou a cair, mas os dois não se moveram. Parcialmente protegida pela proximidade ao ateliê, Edith observou com os olhos semicerrados enquanto o homem, atingido incansavelmente pelas gotas fracas, levou as mãos aos bolsos.

━ Por que está aqui, Tommy? ━ ela perguntou, após alguns segundos. ━ Por que não está descansando?

Thomas Shelby não descansava há anos. Era uma palavra cujo significado já havia sido esquecido por ele há mais tempo do que era capaz de dizer, e Edith sabia daquilo; sabia que nenhum daqueles homens atormentados pelas guerras conheciam a palavra “descanso”, porque mesmo quando estavam sozinhos e tentando cair no sono eram atormentados por memórias que jamais iriam os abandonar.

Finalmente, ele deu um passo à frente,  aproximando-se da mulher. Mas ainda estava distante, mais do que gostariam, e quando respondeu, sua voz foi abafada pela chuva.

━ Porque você estava aqui, sentada, esperando por mim.

Ela o encarou em silêncio, e olhou para cima quando a chuva passou a cair mais forte. Não se moveu, e Thomas também não.

━ Como disse que estaria ━ ele continuou, com a voz um pouco mais alta, recebendo a atenção da mulher mais uma vez.

Confiar em Edith talvez fosse um erro. Suas palavras eram, muitas vezes, mentirosas e manipuladoras e suas promessas eram vazias. Ela ignorava as mesmas ordens que dizia que iria obedecer, e se envolvia em seus problemas quando ele pedia para que ficasse longe.

Mas Edith pediu para que voltasse vivo. Disse que o esperaria. E mesmo sem uma garantia de que ele iria ao seu encontro, ela estava ali.

Esperando por ele.

━ Eu não sabia que era tão sentimental, Tommy ━ ela zombou, adentrando o ateliê e se protegendo por completo da chuva. Não fechou a porta; esperou que o homem a seguisse, e após alguns segundos, ele o fez, e Edith fechou a porta atrás dos dois. ━ Levar um tiro o obrigou a enxergar as coisas através dos olhos de um homem comum?

Ele balançou a cabeça para os lados em negação.

━ Não há um homem de verdade no mundo que poderia deixar uma mulher bonita, que matou por ele, esperando sozinha ━ retrucou, vendo-a levantar as sobrancelhas, e continuou: ━ Especialmente quando precisa lhe levar para um jantar.

━ Nem um homem ruim?

Thomas voltou a balançar a cabeça negativamente, aproximando-se da mulher, e olhou no fundo de seus olhos ao responder:

━ Nem o pior deles, Edith.

Ela riu pelo nariz, assentindo devagar. Sentiu-o se aproximando mais, e fechou os olhos quando sentiu sua mão em seu rosto e suas testas descansando juntas. Não moveu seus braços; ela os manteve cruzados, sem desejar movê-los de qualquer forma que pudesse, mesmo que acidentalmente, atingir o ferimento de Thomas, e correspondeu devagar quando ele, cuidadosamente, encostou seus lábios nos dela.

Trocaram um momento de quietude que não parecia pertencer aos dois; um suspiro de alívio, um beijo doce e sem pressa. Um toque de esperança que não era familiar a qualquer um deles. Era secreto e sagrado; um refúgio para ambos, uma fortaleza impenetrável para qualquer outra pessoa e que jamais seria compreendida por alguém além daquela mulher ruim e seu homem pior.

Entre suas agulhas e navalhas, os fragmentos dos corações quebrados de Thomas Shelby e Edith Preston haviam se encontrado.

Aquele homem era um especialista em apostas, e sabia que talvez aquela fosse uma aposta perdida; ele já havia incendiado bares suficientes para saber que algumas chamas queimavam mais forte justamente porque estavam destinadas a se apagar

oii! demorei a atualizar porque passei por uns momentos difíceis que acabaram drenando minha criatividade/vontade de escrever por um tempo, mas voltei! peço desculpa pela demora, e já aviso que o próximo capítulo já começou a ser escrito!

hoje encerramos a parte da fanfic que cobre a primeira temporada da série! espero que vocês tenham gostado, e não esqueçam de comentar bastante sobre o capítulo e suas opiniões, porque eu ainda amo ler e si divirto horrores com vocês falando mais atrocidades do que nossa diva edith preston.

mais uma vez, peço desculpa pela demora, e também se tiver algum erro no capítulo! tava ansiosa pra atualizar a fic e fiquei com preguiça de revisar ✨️ vejo vocês no próximo capítulo!

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