Capítulo 02
Então ele estava ali!
Sabrina nem conseguia pensar nisso sem ficar eufórica. Sentia todo o corpo formigar só de imaginá-lo por perto, sabendo que poderia se esbarrar com ele a qualquer momento.
Ela nunca se sentia assim. Nunca. Estava acostumada a esconder qualquer tipo de sentimentos de todo mundo, chegando a um nível em que ela nem criasse mais estes, tornando-se alguém fria.
A garota, que agora praticava luta e tinha uma carreira razoavelmente estável, se dava ao luxo de aproveitar da beleza, mas sem de fato curti-la. Usava todos os seus encantos para desafiar o mundo, mostrando a todos a sua volta, que o fato de se sentirem atraídos por ela, não lhes dava direito algum.
Por isso, vivia flertando e dançando, saindo ao máximo de noites que conseguia, sempre para atrair alguém e desistir no ultimo minuto. A sensação de poder, a possibilidade de negar algo, era inebriante. Sabrina só se sentia leve nesses curtos momentos em que voltava sozinha para casa.
Só que com Simon, tudo parecia mais complicado. Em primeiro lugar tinha o fato dele ser lindo. Um anjo de cabelos castanhos bem cortados e olhos azuis vivos. Alem de sempre bem arrumado e cheiroso, era sem dúvida de arrancar suspiros por onde passava. Em segundo lugar, tinha também o fato dele esbanjar autoridade e soberba. Parecia emanar de si o poder de mandar, acostumado a ter sempre tudo o que queria, na hora em que desejava. Características que o faziam se assemelhar de forma assustadora a todos os homens dos quais Sabrina andara fugindo por tanto tempo.
E o mais assustador de tudo isso era que... Era que ela não o achava assustador! Céus, ela sentia uma atração profunda por ele, misturada com outros sentimentos dos quais ela nem conseguia nomear. Todos positivos e raros. Sentimentos que ela não se permitia sentir por ninguém que não fosse suas duas melhores amigas, há muito tempo. Talvez desde sempre.
O lado positivo de tudo aquilo era que os dois mal conseguiam trocar cinco palavras sem estarem discutindo, o que servia para distrair Sabrina de seus pensamentos pecaminosos e deixava ele bem longe.
Distância. Era apenas isso que ela precisava, se distanciar dele e de tudo que ele pudesse representar. No momento, começaria entrando no aposento de sua outra melhor amiga, Alice, garantindo assim cerca de meia hora de segurança.
Ela chegou então finalmente ao quarto descrito por Michael e respirou fundo, tentando manter a postura natural e não demonstrar nenhum sinal de alteração. Sem bater na porta, usando da intimidade que apenas uma amizade de tanto tempo lhe acrescentava, ela entrou no quarto já dizendo.
- Eu juro que se tiver que ajudar Lucinda com os jogos em família, eu me mato. - Falou para descontrair, já que Lucy não seria louca o suficiente a ponto de delimitar tal função a ela.
Só que no segundo em que Sabrina fechou a boca e se concentrou no quarto que acabara de entrar, ela levou um susto.
O quarto estava perfeitamente normal, arrumado e cheiroso da mesma forma que os quartos dali costumavam ser há um ano atrás, quando ela estivera ali pela ultima vez. Só que agora. Diferente das outras vezes, ele vinha com um brinde musculoso, todo molhado e com uma única toalha enrolada a cintura.
Sabrina perdeu o fôlego enquanto encarava aquilo. Parecia uma visão do paraíso. A pele bronzeada que costumava sempre estar coberta por camisas ou ternos, agora estava completamente a mostra, com gotículas de água escorrendo por ali. Os cabelos molhados pareciam terem sido bagunçados recentemente e caiam ligeiramente a sua testa. Os olhos azuis vidrados nela estavam ainda mais hipnotizantes e a toalha branca enrolada na cintura era tudo o que impedia Simon de estar nu em frente a ela.
- Creio que ninguém pediria a você para liderar algo assim. - Ele respondeu da mesma forma insolente de sempre, sem mover um músculo se quer para se cobrir. Sabrina tentou se forçar a olhá-lo nos olhos e ignorar o corpo todo esculpido, mas demorou alguns segundos extras para conseguir fazê-lo e entender o que ele tinha acabado de dizer.
- O que é lamentável, aposto que minhas idéias deixariam a festa mais animada. - Decidiu responder, sabendo que por ser tão certinho e preocupado, ser irreverente era a melhor forma de irritá-lo.
- E mais promíscua. - Acrescentou numa arrogância quase palpável.
- Para compensar todo o tédio que sua presença causa. - Completou, abrindo um sorriso sem humor.
Simon então deu um passo a diante, fazendo Sabrina praticamente pular para trás, como reflexo. Ela já estava quase na porta, novamente, já que mal tinha entrado quando reparou quem habitava o comodo. A loira então olhou para trás, percebendo um corredor vazio e tranquilo, sentiu vontade de sair correndo dali.
- Vai fugir? - A voz de Simon a fez se virar novamente para ele e levar outro mini susto, percebendo que ambos estavam próximos demais.
- Eu não fujo. - Respondeu, erguendo o queixo para comprovar o que tinha dito. Mas por dentro, não tinha tanta certeza daquilo. Talvez fugir fosse uma boa opção naquele momento.
Ele pareceu perceber seu breve momento de inquietação e abriu um sorriso. Um rápido e fugaz, mas que lhe pareceu muito sincero e aquilo piorou ainda mais a situação. Sabrina não imaginou que sentiria todo o estomago revirar pelo simples som de um sorriso.
- Você deveria fugir, não é motivo de orgulho invadir a privacidade de um homem assim desse jeito. - Ele falou, dando outro passo para ainda mais perto. Estavam a cerca de dez centímetros um do outro e o cheiro de sabonete e creme de barbear invadiram as narinas dela.
- Eu não invadi nada. - Se defendeu, depois decidiu ser mais convincente, visto a cara do homem a sua frente. - Michael me disse que Alice estaria aqui.
- Tenho certeza que sim. - Disse irônico, fazendo ela se irritar ainda mais. - Sua aparição aqui é completamente inocente e ausente de interesses, não é? - Perguntou, curvando ligeiramente o tronco para deixar seu rosto a pouquíssimos centímetros de distancia.
- S-sim. - Ela tentou usar de toda a confiança que possuía. Desejou poder se matar pelo som estrangulado e gaguejado que sua fala saiu. Decidiu melhorar aquilo. - Você não possui nada que me interesse.
- Você tem certeza? - Ele falou baixinho, fazendo sua voz rouca acariciar o rosto de Sabrina, que odiou ter gostado tanto daquilo. - Eu tenho muito dinheiro.
E aquilo foi a gota d'água. Lá estava ele novamente insinuando que ela era interesseira. Que tivesse algum interesse estúpido em seduzir algum rico a disposição. Sabrina sentiu o rosto queimar e deu um passo a frente, erguendo o queixo e o encarando destemida.
- Eu não preciso do seu dinheiro. - Falou com toda a convicção que sentia. - E se você acha que ser rico lhe dá o direito de tratar todos como deseja, fique sabendo que comigo não é assim. Eu não preciso de dinheiro de ninguém e não ligo a mínima para o seu sobrenome estúpido.
Simon Hulten. O maldito nome que lhe dava a percepção de ser dono do mundo. Vindo de uma família poderosa de advogados, com cada geração mais bem sucedida e renomada que a outra, Simon tivera uma criação bastante diferenciada da de outras crianças. Sempre ouvira que era especial, que tinha no sangue todo o poder e a inteligencia de um Hulten. Por isso se tornara tão arrogante, pensava Sabrina.
- Você e o seu tipo de mulher não me enganam. - Ele disse simplesmente, a encarando com a mesma ferocidade que ela a ele.
- É claro que não, quem conseguiria enganar o dono da verdade? O sabe tudo. Senhor da razão. - Ela disse irônica.
- Que bom que entende, agora já pode se esgueirar para o quarto de outro homem. Mas certifique-se de encontrar alguém que seja estúpido o bastante. - Falou friamente, fazendo Sabrina praticamente sentir aquelas palavras a estapeando.
Ela então decidiu que não valia a pena discutir. Infelizmente, havia mesmo entrado naquele maldito quarto. Fechou então os olhos e respirou fundo, juntando toda a dignidade que lhe restava e girando para ir em rumo a porta, dando sua indiferença (totalmente falsa e forçada.) a ele como resposta.
- Feche a porta quando sair. - Ele ainda falou e aquilo destruiu todo e qualquer pensamento racional de Sabrina. Se a indiferença a faria parecer superior, que se danasse, agora tudo o que ela queria era bater nele até toda aquela arrogância abandoná-lo por inteiro.
Girou novamente em sua direção e adentrou no quarto, fechando a porta com força, para deixar ambos a sós dentro do comodo. Simon que já se encaminhava em rumo a cama se voltou surpreso.
- O que você... - Tentou começar, mas ela não tinha intenção alguma de deixá-lo falar.
- Você é um arrogante cretino. - Falou, sem pensar a respeito do que dizia. Não se importava mais se parecia uma adolescente descontrolada. - Acha que é melhor do que alguém? Melhor do que eu? - Perguntou exaltada, caminhando para mais próxima dele. - Só porque tem um maldito sobrenome estúpido? Só porque tem dinheiro herdado do papai, uma faculdade paga pelo papai, tudo o que eu não tive? - Ela continuou e surpreendentemente ele não fizera nada para interrompê-la. - Você está completamente enganado. Ser um filhinho de papai esnobe não te torna melhor do que ninguém. Eu podia ser uma interesseira, poderia ser até mesmo uma prostituta, que ainda assim teria direito a respeito... Você não é melhor do que eu. Não é melhor do que... - Ela parou de falar.
-
Simon estava tentando se controlar desde o momento em que a viu entrando em seu quarto. Sabia que ela estaria ali, que chegaria a qualquer momento na casa, mas não imaginou que sua presença seria tão inesperada e justo no seu quarto.
E com certeza também não imaginou que todo o seu corpo reagiria a sua presença. Não que tenha sido a primeira vez. Mas depois de tanto tempo imaginou estar imune aquilo. Até porque, tudo o que seu corpo desejava ia de encontro ao que a cabeça dizia. Desde o começo ele soube que ela seria encrenca. Podia fechar os olhos e voltar com exatidão ao dia em que chegara a beira do rio e a vira pulando de uma pedra totalmente nua com mais duas amigas.
Ele não era um puritano. Já tinha vivido bastante e aproveitado muitos prazeres que a vida tinha a dar, só que sempre nos momentos certos e com devidas precauções, não estava disposto a se envolver com nenhuma interesseira. E é claro que se sentir atraído por ela naquele dia teria sido perfeitamente normal, desde que ele não sentisse uma vontade quase incontrolável de se jogar naquela água também e tê-la. Ele nunca tinha vontades incontroláveis, e não gostou nada de quase experimentá-la uma vez.
Gostou menos ainda de todas as outras vezes que sentira o mesmo quando olhava a ela, ou quando discutia com ela. E ela discutia bastante. Por tudo. Tinha uma língua afiada e um jeito felino de ser que o irritavam e cativavam na mesma medida.
Só que naquele momento. Com ela ali o desafiando e gritando quase como uma amazona, dentro do seu quarto e com a porta fechada, todo o seu autocontrole tinha sido jogado ao ar e sem perceber, ele já tinha avançado até ela e a prendido contra a parede.
- Você não... Você não... - Ela começou a dizer, e tê-la ali em seu braços, com a respiração ofegante e sem conseguir falar, lhe causavam ainda mais satisfação. Era bom ver que ela era tão afetada por aquela situação quanto ele.
- Eu sim. - Ele disse baixinho enquanto aproximava o rosto da orelha dela, o que a fez arfar. Simon não parou, deixou um beijo ali e foi descenso, beijando toda a extensão de seu pescoço.
O gosto dela era tao bom quanto ele havia imaginado. Talvez até melhor. E quanto mais ele a beijava, mais desejava beijar. Quanto mais a tocava, apertava, mais queria. Ele sentiu que poderia se perder ali, nela, naquele momento. E o mais assustador era que não se importava. A primeira vez na vida que não estava colocando a prudencia ante seus desejos.
Sabrina não recuou, nem fez nada para impedi-lo. Pelo contrario, de forma inesperada ela envolveu seus braços no pescoço dele e começou a acariciar seus cabelos. Simon não podia mais resistir, nem queria tentar. Começou a subir os beijos, passando pelo queixo e canto da boca. Olhou nos olhos verdes dela e viu o desejo neles. Era isso. Ele se perderia nela...
Mas antes que ele finalmente a beijasse, antes que ele tomasse a boca dela na sua, um barulho enorme soou, interrompendo totalmente o clima.
Que diabos era aquilo? Uma ambulância?
A cabeça de Simon, que estava meio zonza graças ao desejo interrompido, demorou vários segundos a mais que o necessário para perceber que aquela sirene era provavelmente de polícia.
Sabrina pareceu perceber a mesma coisa ao mesmo tempo em que ele, já que aproveitou a distração e deu um pulo ao lado, arregalando os olhos, assustada.
- É a... É a... Polícia? - Ela perguntou, falando tão baixo que parecia não querer que ninguém ouvisse de fato. Simon a olhou, não gostando nada de vê-la tão fragilizada quanto parecia. Ela era a pessoa mais forte e destemida que ele conhecia, porque estava daquele jeito?
- Deve ser apenas um engano, não precisa se preocupar. - Sem saber o motivo, ele teve o impeto de acalmá-la. - Vou lá ver o que eles querem...
Sabrina pulou para trás apressada, parando encostada na porta, impedindo sua passagem. Simon arqueou uma sobrancelha confuso.
- O que está acontecendo? - Perguntou, dando um passo na direção dela. - Você sabe o que eles querem?
- Eu... - Ela começou, mas logo parou de falar. Simon continuou a encarando, esperando por o que é que fosse o que ela diria. Mas quando Sabrina finalmente ergueu seus olhos para encará-lo, o medo e a tristeza que ele percebeu neles, fizeram algo dentro dele congelar. Seu impulso era abraçá-la, protegê-la. Não queria vê-la nunca mais daquela forma. Só que ele não fez nada disso, apenas continuou parado a sua frente, olhando imóvel. - Não. Não sei. - Foi tudo o que ela disse.
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