Capítulo 74 - Mas onde estava o bendito churrasco?
Mas onde estava o bendito churrasco?
Marcela
Marcela: (imagem)
Marcela: (imagem)
Marcela: (imagem)
Quando você tem um irmão florista, qualquer flor que você encontrar no seu caminho é motivo para mandar uma foto para ele (fato). E a melhor parte, é que o Marcelo sempre (pelo bem ou pelo mal) é sincero com as suas críticas (nem sempre) construtivas.
Marcelo: Begônia rosa não combinou com a imagem da CPN
Marcelo: Deveriam ter ficado com as amarelas ou azuis
Marcelo: A rosa é para amor...
Marcelo: (figurinha)
Marcela: É pq a gente AMA a CPN
Marcela: Entendeu?
Marcelo: Hmm
Eu apenas dei risada dele, bloqueando meu celular antes de guardá-lo em minha clutch. Ok, era oficial, meu estômago estava praticamente rugindo pelo único copo d'água que eu consumi naquele dia, porque Romeu passou mais de duas horas arrumando minha maquiagem e depois mais uma hora e meia com o meu cabelo para que eu ficasse naturalmente impecável.
— Má, você já comeu o canapé de salmão defumado? — Sâmia se aproximou de mim com uma bandeja que ela provavelmente havia surrupiado da cozinha e a colocou na mesa ao nosso lado, fingindo plenitude enquanto mordia aquela comida como se fosse a sua última refeição — está divino!
Hum, só o cheiro já me deu água na boca...
— Ainda não, mas você leu meus pensamentos — eu peguei um canapé e enfiei inteiro na boca, porque fiquei com medo do molho pesto escorrer quando eu o mordesse e sujasse o meu macacão que havia custado o olho da cara, mas que, conforme Túlio havia me ensinado, era um investimento e não um custo.
Assim que a combinação da torrada com o salmão com o pesto tocou minha língua, eu entendi o olhar apaixonado da Sâmia por aquele pedaço de paraíso que eu estava mastigando e soltei um pequeno gemido ao pegar mais um, vendo que ela estava sorrindo para mim mesmo com a boca cheia — e eu tentei retribuir, mas nós duas sabíamos que parecíamos mais dois esquilos com nozes inchando nossas bochechas do que duas colegas de trabalho completamente profissionais atacando o bufê.
— Ei, o que vocês... meu deus! Sim! — Alice se juntou a nós e eu tenho certeza de que ninguém estava aproveitando aquele churrasco de maneira gastronômica como nós, porque ainda não havia aparecido nenhuma carne e sim apenas frescuras elegantérrimas de Fernando Nogueira.
Não que eu estivesse reclamando, porque eu definitivamente não estava — na verdade, manda mais canapé!
— O que vocês vão fazer no fim de ano? Natal e companhia limitada — Alice nos perguntou depois de pegar mais uma taça de vinho tinto enquanto eu pegava apenas uma água, porque ainda era uma festa da empresa.
Uma taça e um copo d'água, essa medida impedia qualquer fiasco de acontecer.
— Minha avó mora no interior de Minas e eu peguei férias, então vou ficar as duas semanas de fim de ano lá pra ajudar minha irmã com os gêmeos — Sâmia deu de ombros e acho que notou meu olhar de piedade mesmo que minha boca estivesse ocupada com salmão — é, eu eu também fiquei me perguntando se era uma boa ideia, mas família é família e ela é mais velha por cinco minutos, então...
— Você é gêmea, Sammi? — Alice indagou com surpresa.
— Claro, né? Ela tira foto com a irmã o tempo todo — eu retruquei e Sâmia começou a rir.
— Meu Deus, eu sempre achei que você estivesse fazendo montagem com roupas diferentes! — Alice replicou com a mão na frente da boca para não soltar farelo de torrada para todos os lados enquanto eu tentava recuperar meu ar.
E nós duas falhamos miseravelmente.
— Mas eu te entendo, sobre esse negócio de "família é família" — Alice comentou depois de limpar o cantinho dos seus olhos para ter certeza de que não havia chorado seu rímel para fora — minha tia é praticamente minha segunda mãe, e ela vive me cobrando e falando "quando você vem me visitar?", mas vocês tem alguma ideia de como é difícil ir pra Imperatriz do Maranhão? São tipo duas escalas e umas dez horas de voo. E custa mais do que o meu salário inteirinho.
— Mas quando você vai pra lá visitar? — eu perguntei, tomando um gole d'água para ajudar a torrada a descer pela minha garganta antes de comer mais um canapé.
— Normalmente a gente procura um lugar no meio do caminho, sabe? Bahia ou Brasília funciona bem e já serve como viagem de férias — ela deu de ombros e arrumou a alça do seu vestido que já havia caído umas quatro vezes nos últimos dois minutos — alguém consegue ajustar aqui pra mim, por favor?
Sâmia, que seria a escolha mais sensata, estava com as mãos sujas de pesto — exatamente como eu suspeitei que aconteceria se eu ficasse mordendo os pedaços de canapé ao invés de enfiar tudo na minha boca de maneira completamente competente e pouco fina —, então Alice apenas se virou de costas para mim e eu passei um guardanapo nos meus dedos apenas por desencargo de consciência, mesmo que eles estivessem limpinhos.
Aí eu olhei para aquela coisa meio trançada e meio presa com um alfinete e pedi socorro para Sâmia em pânico, porém, pela cara dela, aquilo não era um tipo de alça comum e eu não estava sozinha no desconhecido.
Depois de quatro tentativas e de furar Alice uma vez — que eu pedi um milhão de desculpas —, finalmente a gente conseguiu ajustar a alça e descobriu que havia uma trava por pressão um pouco abaixo da etiqueta e a Alice nem precisava ter colocado aquele alfinete.
Claro que, para quem estivesse vendo aquilo de longe, só me veria enfiando a mão dentro do vestido de Alice e Sâmia rindo feito uma condenada.
— E você, Má? Vai ficar por aqui? — Sâmia me perguntou depois de pedir para o garçom repor a nossa bandeja de canapés com o de steak tartar, prometendo uma experiência gastronômica incrível.
Mas onde estava o bendito churrasco? Pão de alho torrado? Linguicinha gordurosa? Carne de segunda? Frango que ninguém comia? Só eu queria aquilo?
— Vou pra Vitória no natal para visitar minha família e depois eu volto para cá, porque meu melhor amigo dá a melhor festa de ano novo de todas e ele me mataria se eu perdesse — eu contei para elas, comendo mais um canapé da nova bandeja antes de limpar minha boca e decidir se eu precisava comer mais devagar, porque meu macacão era meio justo na cintura e seria vergonhoso se ele explodisse de tanto que eu comi.
— Ah, que delícia! Eu sempre esqueço que você não é de São Paulo — Alice sorriu para mim e tinha um pouquinho de pesto entre seus dentes, algo que eu sinalizei discretamente para que ninguém mais visse.
Ainda bem que ela entendeu minha mímica e limpou ali rapidamente, me agradecendo com um sorriso sem pesto.
Ah meu deus, será que eu estava com pesto????
Mas eu acho que meus olhos esbugalhados delataram meus pensamentos, porque ela apenas meneou com a cabeça e eu respirei aliviada.
— Eu adoro quando a Marcela volta de viagem, ela volta com um sotaque gostoso — Gisele apareceu do nosso lado e eu senti minhas bochechas esquentando quando as outras duas concordaram imediatamente — e Alice do céu, resolveu ofuscar todo mundo hoje?
— Ah, sabe, tirei do fundo do guarda-roupa — ela abanou o elogio com graça, porém estava na cara que o seu vestido tinha até pedigree de tão elegante que era em um salmão de viscose longo com uma fenda discreta e nada vulgar.
E eu, que havia tido uma experiência extracorpórea tentando ajustar aquela alça, sabia que o estilista tinha quatro sobrenomes impronunciáveis, o que com certeza acrescentava no mínimo mais um zero no cheque que ela pagou.
— E Sammi, o que você fez no cabelo? Você morena era um absurdo de beleza, mas esse marsala ficou um espetáculo — Gi continuou a rasgar elogios para as duas e eu entendi muito bem o que ela estava fazendo, porque já havia experimentado o efeito Gisele na pele.
A Rainha do RH tinha um talento em fazer com que você se sentisse importante, em dizer coisas que pareciam óbvias, mas que você só estava esperando que alguém comentasse que reparou em você. Às vezes poderia ser uma roupa, um cabelo ou até uma unha, mas ela iria notar e te contar que notou.
Depois disso, aquela conversa se tornou uma batalha de elogios que eu não estava preparada, então eu não consegui acompanhar muito bem, e só sei que, no final, as três estavam alisando o tecido do meu macacão quando a Andreia chegou ao lado do Galileu, que tentou dar a volta e se afastar, mas ficou ali, porque ela não lhe permitiu essa fuga.
— Eu poderia morar nessa roupa — Alice comentou depois de ficar mais de cinco minutos passando a mão na minha barriga e acho que ela não estava mais reparando que estava fazendo isso, pois não parou mesmo quando eu limpei a garganta.
— Bem noiva, você, Marcela Noronha — Andreia brincou comigo e eu rolei meus olhos, tomando um gole da minha água e vendo que uma nuvem não muito simpática estava se aproximando do dia ensolarado e maravilhoso que nos iluminava.
— O tecido é pérola e não branco — eu a corrigi, mas sabia que essa tecnicidade não era interessante para ninguém além de mim mesma, porque, para todo mundo, se ele fosse pérola ou branco não mudava nada. No entanto, para mim se o macacão fosse branco, ele seria um sinal para alguém, mesmo que já fizesse um tempo que o branco também havia se tornado minha cor preferida.
E eu não conseguia deixar de pensar que às vezes a vida dava mesmo alguns sinais, tipo a parede de begônias que ele me deu no dia da minha promoção ou o fato de eu reconhecer de cor e salteado toda a playlist do seu carro. Mas o que de fato era uma coincidência e o que era um sinal? Será que ele ainda lembrava de mim, de nós, quando escutava Heaven? Porque eu me lembrava dele todos os dias quando meu despertador tocava Thank you for loving me.
— Sua cara — ela piscou para mim e eu a abracei pela cintura, enfiando um beijo muito bem dado em sua bochecha para marcá-la com o meu batom vermelho, da mesma maneira que ela havia me marcado quando fomos ao Bar dos Ardos algumas semanas antes.
— Marcela, você já assinou o termo de relacionamento com a dona Andreia? — Gisele nos perguntou com um sorriso brincalhão e eu tirei as mãos da minha amiga como se ela estivesse em chamas, fazendo com que as outras pessoas rissem.
— Por favor, não, todo mundo sabe que a Andreia só está esperando a Marcela assumir esse lance pra dar linha em mim — Gali gracejou e eu fiquei tentada a jogar a bolinha de guardanapo que eu tinha em mãos nele, porém eu estava indo muito bem sem atirar objetos, por mais inofensivos que fossem, nas pessoas.
Existia, sim, uma pessoa que eu toparia aquela loucura de contar pro mundo todo que a gente estava juntos. Só que nós não estávamos juntos. Não mais, pelo menos.
Nós tínhamos algo meio incerto e um tanto tênue e, finalmente, eu sentia que estávamos redescobrindo o que tínhamos antes da briga, aquela cumplicidade e amizade e sinergia. E eu não queria perder Eduardo. Nunca mais. Porque agora que eu havia tido uma amostra muito custosa do que era uma vida quando ele não estava lá, eu esperava nunca mais ter que viver naquele limbo.
— Eu ouvi dizer que eles fizeram uma maionese com ovo de codorna e eu estou salivando para comer um pouco. Você vem, mozi? — e Andreia enlaçou o seu braço com o meu para nós sairmos dali, deixando Galileu boquiaberto para ser consolado por todas as outras mulheres da empresa, porque todo mundo já havia se acostumado com aquele tipo de brincadeira.
— Você sabe que vai ter retaliação, não sabe? — eu indaguei, acenando para Valter e Joaquim, que estavam falando sobre algo com as feições sérias e nada convidativas — sobre o que você acha que eles estão falando?
— Hum, Valter está contando que adorou manusear a marreta para destruir blocos de concreto — ela sugeriu quando ele fez um movimento que parecia um malabarismo e eu tentei não rir alto demais, porque estávamos passando pelas pessoas em direção da maionese — meu deus, o Igor tem zero noção do que é esporte chique?
— Eu acho que ele tem zero noção. Ponto — eu esclareci, vendo que ele havia ido de tênis, jeans rasgado e uma regata.
Uma regata!
Repito: RE-GA-TA.
Nem se ele tivesse braços para aquilo, mas... uma regata? Quem usa regata, pelo amor do bom senso?
— Mas quem tem noção de esporte chique é o Edu — ela apontou com o queixo para o arquiteto, que estava conversando com o Isaac e o Lucas em um encontro ecologicamente correto. Ele gesticulava sobre algo com tanta animação que eu queria ir até ele, saber o que ele dizia, sentir o seu cheiro e ter suas mãos em mim de novo, exatamente como ele me tocou quando estávamos tirando a nossa foto.
Só que o problema é que eu não conseguia querer apenas um pouco de suas mãos em mim, porque o seu calor era cativante e eu queria me aproximar mais e mais e mais para envolver meus dedos nos seus, puxar o seu corpo para perto e afundar minha boca...
— Eu tive que fazer uma limpa nas camisas sociais do Gali outro dia, porque ele tinha umas cores meio estranhas que não deveriam ser nem ao menos comercializadas — ela estremeceu e eu continuei rindo da sua expressão.
Bem, não é como se o Eduardo precisasse de uma intervenção no guarda-roupa, porque ele sabia muito bem o que era estar bem vestido e eu sabia, por experiência própria, que ele tinha uma coleção de no mínimo cinco camisas azuis com pequenas diferenças entre elas para se garantir — e isso me levou para um mar de lembranças de um período que agora parecia um sonho distante, onde a possibilidade de abrir cada um dos seus pequenos botões era apenas questão de enlaçar meus dedos neles e começar. Um. Por. Um.
— E aquela camisa azul realça os seus olhos de cristal, não é? — Andreia indagou com calma e eu me deixei reparar, pela décima nona vez, que ele estava usando a sua camisa azul-sucesso com pequenos pontos brancos que fazia com que ela tivesse um tom mais claro do que as outras, deixando seus olhos tão brilhantes que era como se ele fosse o próprio sol.
— Ele nunca erra com essa camisa — eu comentei, sentindo o sorriso tolo e ingênuo me escapar quando eu olhei de soslaio para Andreia, que tinha uma expressão irritantemente entendedora.
Eu não precisava saber que ela esperou semanas para me jogar um belíssimo verde. E que eu havia caído feito um patinho.
No entanto, eu acho que não era necessário ser um gênio para entender aquilo que eu não conseguia mais esconder. Não depois de ter aberto meu coração para Eduardo em seu carro e saber que ele ficou comigo a noite toda, mesmo que não precisasse. E era tão bom saber que quando algo engraçado acontecia na empresa, eu poderia apenas buscar seus olhos que eles também estariam procurando os meus também. Ou o fato de que não era mais estranho ele parar ao lado da minha mesa para me chamar para almoçar e eu poder abertamente dizer sim. Ou que mesmo que nós não fôssemos mais uma dupla-dinâmica, ele ainda era a pessoa a quem eu recorria quando precisava de uma segunda opinião — o que deixava Lavínia, a minha nova arquiteta, louca de raiva. Mas logo passava e depois a gente pedia coxinha do Veloso para finalizar o projeto.
Ela era ótima, tinha que aprender algumas coisas e o desenho a mão livre dela deixava a desejar — assim como as suas habilidades com o Autocad ou o BIN —, mas para quem estava se virando sem, eu adorava tê-la ali, só não era a mesma coisa, porque... o Edu sabia exatamente o que eu estava pensando antes mesmo do pensamento surgir em minha mente. Ele sabia como eu gostava de conduzir um projeto, como a sua cabeça ia e voltava em um mesmo raciocínio até esgotar as possibilidades quando eu tentava pular direto para o resultado final e que eu precisava, no mínimo, de duas horas para aceitar o primeiro esboço antes de partirmos para a análise de encerramento.
Era diferente trabalhar com Lavínia e com Eduardo, porque com ela eu não tinha que pedir para repetir algo por ter me perdido na curva do seu pescoço.
Talvez eu estivesse sendo injusta com a Lavínia e tivesse que dar mais tempo para ela conseguir se acostumar com o meu ritmo de trabalho, mas eu acho que a arquiteta estava ficando levemente sobrecarregada e — pasmem — chegou a tacar uma borracha no Caíque um dia. Não que eu tivesse reclamado, porque ele era um babaca, mas eu me compadeci com a fama que ela recebeu, porque chegar na empresa como uma pessoa nova e reativa era bem desafiador. Sorte a dela que eu já havia desbravado aquelas águas misteriosas antes e estava pronta para guiá-la pelo Curso de Reatividade da Gisele.
Certo, eu poderia dar uma chance começando...
— Noronha! — a voz de Thales, como sempre, se sobressaiu dentre as demais.
Começando segunda, aparentemente.
Andreia me deu um sorriso de pena e tentou não rir de mim, porque nós duas sabíamos que aquilo significava que ele queria falar sobre trabalho no meio de um evento social.
Eu amo meu emprego, foi o que eu pensei antes de me desprender dos braços de minha amiga e olhar para o nosso Chefe-Supremo, que estava com duas taças de vinho branco em mãos e um olhar levemente desconfortável — e acho que isso foi o que me desarmou para a conversa séria que estávamos para ter sobre aspectos visuais versus ecológicos do projeto que montei para a ponte Bahia-Itaparica.
— Já volto — murmurei para Andreia, entregando-lhe meu copo d'água e me virando para Thales com o sorriso mais profissional que eu consegui encontrar dentro de mim — Thales! Ótimo churrasco!
Mesmo que não fosse, de fato, um churrasco, só que não seria eu a contar isso para o C da CPN.
— Depois do ano que tivemos, com certeza a gente merece — ele me ofereceu uma das taças e indicou com a cabeça para o canto da parede de flores que, agora, havia sido esquecido depois de tantas fotos de equipe e selfies, para que nos encaminhássemos até lá.
Tenho certeza de que a Sâmia escolheria a pior foto de todas para colocar no nosso portal corporativo, mas eu tinha certeza de que não seria a pior, porque o Alexandre espirrou a cada dois cliques.
— Foi um ano e tanto — eu concordei de maneira completamente genérica e impessoal.
Então eu tomei um gole de vinho antes que Thales me oferecesse sua taça para um brinde, o que me forçou a engolir rapidamente o líquido anterior para que pudéssemos brindar a sei lá o que, e eu tomei mais um.
E outro depois daquele, porque a expressão dele estava parecendo um maracujá mais murcho a cada segundo que passava.
— E como vai o filho? — eu indaguei antes que o silêncio estivesse incômodo demais, porque ele havia me chamado para conversar, então ele deveria tentar preencher os silêncios constrangedores, não é?
— Começando a dormir, mas um recém nascido acorda a cada três horas porque precisa se alimentar, né? — ele deu uma risada anasalada — o que significa que o pai dorme... uma hora se tiver muita sorte.
— Você arrasa nessa função, Thales — eu disse de maneira leve demais e olhei para minha taça quase vazia e para o meu estômago que havia apenas se alimentado de canapés de salmão e um de steak tartar.
Ok, hora da água e da comida.
Onde estava o bendito churrasco do Churrasco de aniversário da CPN?
— Eu queria... — ele limpou a sua garganta de maneira brusca e eu o olhei de volta, mesmo que meus olhos não quisessem se desprender da leva de picanha mal-passada que estava começando a circular bem longe de nós. E, pela cara do Thales, ele curtia a sua carne bem passada, o que era praticamente um ultraje — eu queria falar com você e acho que eu até demorei demais. Deus sabe como a Renata está me... enfim.
— Falar sobre o que? Se for sobre o andamento da ponte Navegantes-Itajaí estar menos dinâmico do que havíamos esperado, eu te garanto que ainda está dentro do cronograma. Assim como o Porto de Vitória, que devemos começar as obras em breve, só falta fechar no compras o fornecedor de aço estrutural — eu dei de ombros, secando as últimas gotas da minha taça para notar que ele estava ainda mais desconfortável do que antes e isso não fazia o menor sentido — e eu sei que estou te devendo uma revisão no projeto da ponte Bahia-Itaparica, mas eu ainda acho que se nós usarmos resíduos plásticos na tabulação, podemos ganhar em economia de tempo e publicidade mesmo que...
— Marcela, não estamos aqui para falar de trabalho. Ou melhor, não esse tipo de tópico — ele me parou e eu respirei fundo, recuperando meu fôlego ao mesmo tempo que ele colocou a mão no meu ombro, tentando desacelerar o meu raciocínio.
Ele me chamou de Marcela?
O que eu estava perdendo?
— Eu vim aqui me desculpar com você — eu senti seus dedos mais fortes contra minha pele e o encarei, provavelmente com uma expressão completamente confusa, porque eu não fazia ideia de que Thales Carvalho conhecia essa palavra e que ele poderia dirigi-la a minha pessoa — por aquele dia.
Eu poderia perguntar sobre o que ele estava falando, mas me bastou um leve vislumbre do seu olhar culpado para que eu soubesse exatamente de qual dia ele se referia.
E eu tentava não pensar mais nessa época.
Só que, pelo jeito, Thales queria desenterrar alguns esqueletos.
— Eu não fazia ideia do que estava acontecendo com você, do que aconteceu com você, e eu te encontrava todos os dias. Nós conversávamos todos os dias e o máximo que eu pensei foi que... eu não sei mais, mas eu pensei em tudo, menos no que realmente estava acontecendo — ele passou a mão que não estava segurando a sua taça pelos seus cabelos, bagunçando o seu perfeitamente alinhado topete — e eu acho que isso é a merda de ser um homem, sabe? A gente pode até pensar que somos pra frentex e que estamos do lado da liberdade e de um futuro melhor, mas... a gente nunca vai entender tudo o que vocês passam todos os dias. Não de verdade.
— Thales, eu estou bem. Agora, pelo menos — eu dei um meio sorriso nada convincente para ele e coloquei uma mão na sua que ainda tocava meu ombro — você não precisa me pedir desculpas, porque não tinha como saber...
— Mas eu deveria, Marcela, como seu gestor. Eu não estou aqui só para mandar e desmandar nos seus projetos. Eu estou aqui pra ser seu alicerce, para te ajudar e te apoiar quando algo não estiver certo. E não apenas na engenharia. Na vida. Se você não puder contar comigo, então será que eu realmente estou fazendo um bom trabalho? — ele cerrou seus lábios e eu senti que... ok, acho que nesta altura do campeonato, ele precisava daquilo mais do que eu.
Às vezes, mesmo quando você achava que não era necessário escutar ou dizer mais nada, as pessoas precisam daquilo para seguir em frente. E Thales precisava que eu dissesse que eu o perdoava, algo que eu havia feito já fazia muito tempo.
— Eu sei e você é. Obrigada por se preocupar comigo, mas eu estou bem agora. Não foi uma das minhas melhores épocas e eu não gosto de pensar nisso, mas o importante é que quando eu precisei do seu apoio, você me deu — eu inclinei meu rosto para o lado, sentindo o vento bagunçar os meus cabelos — eu sei que você foi uma das primeiras pessoas a votar pelo distrato dos Kaiser e eu sei todo o transtorno que vocês tiveram com isso, então eu só posso te dizer muito obrigada. Por acreditar em mim.
— Você é do caralho, Noronha, a CPN não pode te perder. E você não pode pensar que é menos do que realmente é — ele me confirmou e eu sorri, porque agora eu sabia disso.
E, por mais que ouvir estas palavras de Thales Carvalho fosse algo muito impactante (em um nível tão impactante que eu tinha certeza de que jamais escutaria aquelas palavras de novo), eu ainda preferia quando elas saíam dos lábios de um certo arquiteto...
Então eu escutei um baque alto, como se alguém tivesse batido a mão na parede, seguida de um grunhido agudo.
E depois vozes desesperadas / indignadas / horrorizadas.
Então eu olhei para trás para entender de onde vinha toda essa comoção e vi que Igor estava com os dedos na frente do nariz, completamente sujos de sangue, e havia uma pessoa à sua frente, abrindo e fechando a mão como se tivesse acabado de...
— Edu? — eu sussurrei, mais para mim mesma, esquecendo-me de tudo o que eu estava falando com Thales para andar até onde ele estava, porque mesmo na nossa época mais sombria de briga, eu nunca vi Eduardo Senna com um olhar tão cheio de ódio.
Ódio.
Nunca imaginei que ele sequer soubesse que sentimento era este.
Aí o Igor se jogou em cima do Eduardo e nem mesmo o Sandro conseguiu parar os dois.
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A sexta é da paixão, mas hoje Edu tá sentindo ódio (quem imaginou que esse dia poderia chegar????????)
O que será que aconteceu para o nosso arquiteto perder completamente a cabeça com o Igor? Teorias! Teorias!!!
Agora vamos voltar um pouquinho no tempo para amar as mulheres da CPN!!!! Nessa empresa só tem ícone em forma de mulherão!!!!
E o Thales, finalmente, finalmente, pedindo desculpas para a Má pelo dia do erro de projeto! Pelo jeito não é apenas a Renata que se preocupa com a nossa engenheira preferida!
Esperamos que estejam curtindo a história! Momento para depositar seu surto aqui e expectativas para os próximos capítulos! Não esqueçam da estrelinha <3
Beijinhos,
Libriela <3
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