12 de julho

Sinto como se décadas já tivessem se passado. É estranho olhar para o lado de fora e assistir o nada. É como se o mundo tivesse sido tomado por um silêncio infernal e interminável, e que todas as almas vivas tivessem sido erradicadas do planeta. O que antes era algo colorido pelo verde das árvores e o azul intenso do céu, hoje se resume apenas a uma cor: amarelo queimado. A população: reduzida em grande escala. E tudo isso em um período de tempo incrivelmente curto.

Eu ainda me lembro da televisão mostrando ao vivo todos os momentos. Eu tinha apenas 12 anos. A voz do âncora ecoou pela minha cabeça durante semanas, e foi como se tudo o que ele disse naquele instante apenas colaborou para tornar a situação pior ainda. Eu me lembro de assistir as imagens da explosão. O míssil radioativo que fora lançado devido um conflito governamental, claramente não havia atingido o alvo correto.

A radiação contida no míssil era forte o suficiente para transformar um continente inteiro em um continente fantasma. Era nítido o tamanho da ambição do governador de eliminar completamente os rivais de seu caminho, mas ele não contava que seu projétil 'perfeito' fosse dar incrivelmente errado.

Os primeiros seres vivos a morrerem foram as plantas. Não todas elas — algumas espécies se adaptaram às condições precárias —, mas o suficiente para fazer com que a respiração se tornasse uma dificuldade iminente na luta pela sobrevivência. Sem muito ar, as pessoas com problemas cardiorrespiratórios foram morrendo aos poucos. Logo após, veio a morte dos humanos. Dos adultos, na verdade. Por algum motivo bizarro, a radiação misturada com a quantidade de ar restante não se mostrava capaz de fazer mal a qualquer adolescente menor de 18 anos.

O número de mortes permaneceu aumentando conforme a radiação foi se espalhando. A produção de alimentos diminuiu, o que fez pessoas morrerem de fome. E o caos foi se espalhando até tomar todo o mundo. Em um mês e meio, todos os adultos foram erradicados da face da Terra. Algumas crianças ficaram órfãs e outras até morreram por não saberem se cuidar sozinhas, e os adolescentes que completavam 18 anos não conseguiam se manter vivos por muito tempo.

Então, algo surgiu como um milagre. Alguém cujas promessas diziam que havia uma salvação para todos deste mundo radioativo. Uma figura política e anônima, que se nomeada como Homem.

O Homem entrou em contato com todos os sobreviventes por via rádio em um dia que parecia comum. Disse a todos que havia achado a maneira perfeita para que se mantivessem fortes, vivos e seguros contra a radiação. Um chip.

Para mim, aquilo ficava cada vez mais insano. Mas me forcei a continuar ouvindo.

O Homem disse que todos os adolescentes que completassem ou já tivessem completado 17 anos, deveriam se apresentar onde era situada a antiga prefeitura. Lá, os jovens passariam por um processo chamado de Introdução, onde receberiam o chip. Em seguida, deveriam ficar em observação por um tempo, sendo liberados para viverem no mundo.

A princípio, a ideia me pareceu conveniente, mas parte de mim duvidava da verassidade da transmissão. Ele não disse em momento algum que houveram cobaias ou que o chip sequer funcionara. Apenas ordenou para que os jovens fossem para lá.  

Com o tempo, o Homem foi ganhando mais e mais atenção, e este, se autodeclarando governador da América, decretou como lei absoluta o processo de Introdução. Aparentemente o chip havia funcionado, e agora todos os adolescentes eram obrigados a tê-los quando a idade chegasse.

Você que está lendo isso deve se perguntar porque escrevi esta anotação explicando o que houve com o mundo. Bem, hoje completo 17 anos, e embora me recuse, sei que o Homem vai vir me buscar e que eu acabarei obtendo o chip, ainda que à força. Não sei o que vai ser de mim daqui para frente, mas, para você que está lendo isso, eu espero que o mundo em que viva hoje seja bom. Se ele for, eu lhe peço para que não permita que ele seja destruído pelos humanos, cegos pela ambição e sedentos pelo poder.

Com amor,

— BECCA.