Pai
O último passo daquela viagem, um caminho menos árduo, contudo, mais pesado. Os galhos se fecham formando a copa da árvore, de suas folhas algo verdejante resvala no ar, flutuando e embelezando a paisagem.
Naquele momento os insetos e riscos de queda não preocupavam mais os alunos voadores, apenas a ansiedade os matava. Apertados, um contra o outro, Alladin podia sentir os palpitares intensos do coração da colega, que não erguia as pálpebras desde que saíram da fenda. Ali é visto, sobre os galhos fechados como uma gaiola natural, retorcidos e aplumados pelas folhas. No meio, um enorme campo de madeira lisa era avistada.
Eles contemplam alguém repousando.
A última etapa da viagem estava a sua frente, de maneira delicada penetraram a gaiola de madeira, e pousaram suavemente no ambiente templário celestial. Era como um paraíso natural após toda a perdição e desafios. Um homem meditava em seu meio, assim como nos rumores. Com uma das mãos dentro de um buraco feito no tronco.
Os alunos podiam sentir o poder fluindo sobre o homem.
Aurora desvincilhou de seu amigo, desta vez, acordada. Mantinha-se extasiada com a cena. Assistia aquele corpo que parecia uma estátua. Os olhos dela lacrimejaram a cada passo que dava.
Alladin não se sentiu no direito de dizer algo.
— P... — A voz falhou em sua boca, ela sentia secura na garganta, uma dor que ardia e machucava seus sentimentos. — Pai? — Questionou com dor.
O homem parou de ceder magia para a fenda da árvore, dando atenção a voz que o chamou. Se ergueu calmamente, virando o corpo de modo letárgico. Aurora pode detalhar aquela barba preta e rosto chupado, com olheiras pesadas e o cabelo sujo. Os lábios do homem tremeram, principiando um sorriso.
— A-A-Auro-Aurora? — Sua voz opaca e quase morta pronunciou.
Sem conseguir se conter, a maga deixou as lágrimas descerem seu rosto. O homem abriu os braços, pronto para abraçá-la. Ela caminhou acelerada em sua direção.
Quando chegaram próximos, Aurora ergueu com força sua mão desferindo um forte tapa no rosto do ancião. Ele ficou atordoado, seu corpo congelou devido à reação dela.
Aurora comediu outro tapa.
— Por que está vivo!? — A pergunta confundiu a todos. — A vovó sempre disse que você havia desaparecido — As lágrimas desciam — Aceitei que estava morto, porque é bem melhor para uma filha crer na morte dos pais do que aceitar que eles não queriam tomar conta de nós!
Os gritos de Aurora silenciavam Driihey.
— Me desculpe...
— Desculpas!? — Ela gritou — Posso perdoar mamãe por ter morrido, ou os vovós por me protegerem. Mas você? Como aceitar alguém que me largou? — Recuou alguns passos — Meu colega disse que tu era um dos mais poderosos magos. Contudo, apenas consigo visualizar um homem medroso, que não sabe encarar a própria filha.
O silêncio reinou.
— A morte de Abigail foi envolta por uma política que nem eu, ou seus avós, podíamos ter controle. — Driihey caminhou até um dos galhos retorcidos — Sua mãe, avós, e você, são nobres. Abigail era a antiga rainha, ela reivindicou o trono rejeitado por Sophia, que ficou como parlamentar em Myan. A notícia de falecimento deu brecha para que parlamentares iniciassem um processo de usurpação, tentando por culpa na morte de Abigail em mim. Seus avós, com medo, se afastaram de Myan, até mesmo por você ser uma aberrante, temiam o pior contra ti. A criminalização da minha esposa caiu sobre mim, então resolvi me isolar. Não tinha mais forças para lutar contra nada.
— E você deixou a todos por medo? — Aurora não recuava. O fluxo dela começava a ficar violento, resfriando a espinha de Alladin — Deixando a reputação, honra, e sentimentos de todos nós serem pisados... Não fez isso por mim, Driihey, ou por vovó, menos pelo vovô. Fez por si! Se é esse o pai que possuo, então posso viver fingindo que está morto.
Aurora... Alladin sentiu o pesar das palavras.
Driihey a olhou, e caminhou cabisbaixo em sua direção, porém ela se afastava, ampliando o vazio sentimental.
— Filha.
— Você quis se isolar por medo Driihey... Pois, morra sozinho... Por medo.
Ele abaixou a cabeça — Talvez seja meu destino, morrer solitário por meus pecados. — Driihey caminhou até o centro — Essa árvore era comum, desde que cheguei aqui ponho meu poder nela a todo momento. Creio que seja a única forma de redimir meus erros, dos assassinatos que cometi. Das decisões que tomei, retornando tudo a natureza. Como Gasoc me ensinou.
— Está de brincadeira! — Alladin espantou-se, arregalando os olhos. — Você está dizendo, que com seu poder fez essa árvore ficar desse jeito?
— Basicamente. — O homem olhou com desdém. — Venham cá. — Os chamou até ele.
Esse cara é absurdo!
Alladin avançou, mas vendo a recusa de sua amiga acabou pegando na mão dela para puxá-la. Driihey pôs as mãos dentro do buraco, tirando dele a seiva da árvore. Delicadamente passou no antebraço de Alladin, formando um símbolo tribalista com letras místicas.
Pegando mais um gomo, tentou fazer o mesmo em Aurora.
— Não quero... — Ela recuou os pulsos.
— Não é uma regra universal, mas os mais poderosos magos possuem tatuagens de liberação de fluxo, por facilitar a ampliação do poder. Essas tatuagens rasgam o fluxo, sem agredir seus corpos. — Explicou.
Aurora se recordou da tatuagem nas costas de seu professor.
— Ei! — Alladin a tirou do transe — Dê a ele essa chance, aparentemente é a única forma que encontrou para pedir seu perdão.
Mesmo chateada, considerou as falas do amigo, e com receio estendeu seu braço.
A tatuagem concluída, sumia na pele. Sendo ativada apenas com o uso da magia.
— Você tem pacto com Gasoc... — Driihey sorriu — Ele é um bom Deus, tente aprender tudo sobre o livro dele. — O símbolo deixou o fluxo de entrada e saída nos corpos dos jovens mais sensíveis, podendo conceber a fluidez da magia ao redor. — És poderosa filha, espero que algum dia possa ter seu perdão.
Aurora não o encarou, apenas se virando e esperando seu amigo para saírem de lá.
— Senhor Driihey? — A voz de Alladin mudou a tonalidade da conversa — Durante a antiga guerra, como cortesia, um mago chamado Humberto Linscen foi torturado na sua frente — O olhar seco pasmou o antigo lorde — Poderia me dizer quem o torturou?
— Quer vingá-lo? Por que não me mata?
— Sinceramente? — O albino deu uma rápida olhada para Aurora, que prestava atenção na conversa — Era minha intenção, mas vendo-o agora, não posso dizer com certeza que está vivo.
— Entendo... O homem que procura é um dos magos mais fortes da guerra, e de Danagor — Driihey respirou fundo — Rex, o filho da fênix. É o homem que torturou seu avô.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro