A Honra de Dávila
Maahes desviou do badalar de lança feito próximo a sua cabeça, o seu adversário girou parte da arma como se fosse um grande pedaço de madeira. Por consequente o guarda real brandiu aquele cabo de ferro através de suas costas e mãos, dando um espetáculo de manuseio, até que pudesse ao fim lançá-lo em direção aos pés do leão albino. Ambas tentativas falhas.
O leão branco deu uma cambalhota para a lateral, chegando próximo ao rei decrépito. Furioso e voraz, deu uma estacada com a ponta de sua espada. Como o filete de luz que adentra o fino furo de uma cortina escura no sol da tarde, Leonis impediu que algo de terrível ocorresse ao rei. O fio da lâmina travou no cabo de ferro da lança vermelha.
— Leonis! — Cuspiu suas palavras — Por favor! Pare de salvar esse desgraçado! — Suas mandíbulas expunham os dentes raivosos e uma baba grossa.
— Não posso pai — A resposta como sempre, vinha de um tom melancólico e calmo — matá-lo é um crime, e como minha última função como guarda real, impedirei que isso ocorra. — O garoto cego mirava o horizonte — Ele matou minha mãe, e assistiu os espetáculos de assassinato nesse coliseu durante décadas. — Os olhos brancos encontraram os furiosos de Maahes — Você carrega a mesma culpa que ele, por que está tão furioso?
Maahes, esbanjando fúria, tirou a ponta da lâmina daquela que parecia uma parede de contensão. Ele alçou a espada o máximo que pode, para que a descesse com raiva, na vontade de rasgar o crânio do rei. Novamente parado pelo baloar da lança fina e vigorosa na mão de seu filho.
Os movimentos de ambos eram incríveis contrapontos, os instintos de um, contra a fluidez das técnicas do outro.
— A mãe morreu não por causa do rei, das tragédias ante sequentes. — Seu braço tremia segurando a força do pai — Ela morreu por amor, por dar vida a minha irmã. Julgo que és o único que não compreende isto.
Leonis girou sua lança para cima, contrapondo a força ali feita, deixando seu pai sem base para que então pudesse acertá-lo em cheio com a parte inferior do cabo. Um golpe carregado de Ki, doloroso e bem pontado, que fez o albino recuar algumas centelhas no solo arenoso.
Maahes perdeu a cabeça, não focando mais os ataques contra o rei, sua intensão atual era desestabilizar o próprio filho. Movimentos rápidos da espada, junto a um poderoso Ki emanado, acertavam as defesas da lança de Leonis.
O garoto não sentia tamanho poder.
— Por que filho? Por que sempre que te olho você está tão triste? — Outra estocada. Leonis fez a espada do pai deslizar sobre o cabo da lança, em seguida, trazendo sua arma para extensão do punho, deixando a garganta de Maahes no encontro do toque afiado do metal vermelho.
— Por que Leonis? Por que está fazendo isso? — Maahes estava entristecido.
O lanceiro ficou um tempo parado, apenas com suas feições voltadas para o nada. — Você matou o filho dele pai... — A frase chocou Maahes. — Creio que se lembre disto, durante um evento do coliseu, executou o primogênito dele sem nenhum motivo... O rei não assassinou nenhum de seus filhos por mais cruel que tenha sido seus atos. Nossa mãe morreu dando à luz, e não assassinada pela lâmina de algum guarda. O que matou Dávila foi sua vontade de nos conceber a vida, mas parece que naquele momento, você morreu com ela.
Maahes não quis se levantar, aceitando as palavras dolorosas e verdadeiras do filho. Sabendo que, no fundo, ele não queria matar mais alguém, apenas almejava um motivo para não viver.
No alto da sacada Rubi chorava. Amedrontada o patriarca abeirado da morte na sua frente. A felicidade e tristeza de encontrar seu pai batia forte em seu corpo de uma forma escandalosa, fazendo sua cabeça doer num misto de ideias. Contudo, não conseguia se movimentar, sentir ódio de Leonis ou pena de Maahes.
— Vá para casa Rubi... Skraz me disse que há outra guerra a caminho... Use de tudo que aprendeu aqui, para proteger Aurora — Rodrigo mantinha seus olhos focados em seu irmão e pai.
— Irei... — Limpou o choro em seu rosto — E você?
— Terei de ficar... — Rodrigo a olhou, em seguida fez um leve carinho no canto de seu rosto. — Infelizmente não percebi que meus atos culminam a esse momento.
— Rodrigo. — Ela amassou o rosto do irmão com suas mãos. Balançando a cabela em negação. — Você não precisa fazer isso!
O demônio azul a olhou, recordando-se da última conversa que teve com Leonis e Skraz. — Tudo foi um plano de Morgiana. Rodrigo, caso se volte contra aquela mulher, não tenho certeza de se Rubi continuará viva. — As últimas palavras do irmão doíam no centro de seu peito.
— Vá Rubi... — tirou delicadamente as mãos dela de seu rosto. — Proteja Aurora.
Rubi deu alguns passos para trás, olhando para a arena, em seguida encarando por uma última vez o seu irmão, o mercenário que ela odiou e amou. Sem culpas, sem mágoas, deixou o recinto com as lágrimas caindo.
Perdoe-me irmã...
Rodrigo voltou seus olhos para a arena, o grito de Maahes pode ser ouvido — talvez por todo o reino.
A lança estava cravada em seu tórax, o sangue escorria pelo cabo até pingar como um recanto de água furado na ponta da lança, que quase beijava o chão. Leonis manteve-se ao lado do pai, fazendo-o carinho em seus momentos derradeiros.
— Eu te amo filho... Diga a seus irmãos que também amo-os... Promete? — Maahes pediu, com a voz fraca e falha.
— Sim... — Leonis chorava — Pro-prometo pai... — Sua boca balbuciava em adorno.
— Sua mãe deve estar orgulhosa do guerreiro que se tornou...
O ar de Maahes sumiu por sua boca, enquanto ele olhava para a iluminação radiosa dos céus.
Minha Dávila... Estou indo...
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