Capítulo 17 - Crimes do Desejo
Durante o jantar, nem Zelda nem Alessa estava com apetite. Enquanto as duas apenas beliscavam o rosbife com batatas assadas, Damon sentia-se culpado por saborear tão gulosamente a deliciosa comida de Maria. Mas ele se sentia rigorado e com um apetite enorme quando ficava diante de um bom desafio. Havia herdado isso de sua mãe naturalmente.
— O advogado com quem você falou por telefone acha que poderá livrar Ronny sob fiança? — Zelda perguntou a Alessa.
— Ele disse que vai tentar e prometeu vir de São Paulo amanhã para ver as acusações que pesam sobre Ronny.
Damon achou-se no dever de aliviar um pouco a atmosfera.
— O advogado não terá muita dificuldade. Afinal, não foi assassinato premeditado.
— Acha que devíamos ligar novamente para o advogado? Talvez... — Zelda interrompeu a frase e olhou espantada para a porta. — Ronny! — Gritou, correndo ao encontro do homem que entrava na sala de jantar.
Alessa e Damon seguiram-na e os três começaram a fazer perguntas ao mesmo tempo.
Parecendo exausto, Ronny ergueu uma das mãos.
— Direi tudo o que quiserem saber, mas primeiro eu queria uma coisa.
— Fale, Ronny. O que é que você quer? — Gritou Zelda aflita por agradá-lo.
— Uma cerveja gelada.
— Vicente! — Chamou a atriz. — Vamos para o salão. Leve uma cerveja para Ronny, sim?
No salão, os três agruparam-se ao redor do coreográfo.
— Pagou uma fiança para sair? — Perguntou Damon.
— Não. As acusações que pesam sobre mim não bastam para me manter preso.
— Não entendo!... — Declarou Alessa.
— Que acusações são essas? — Indagou Damon.
— Nem Feliciano sabe.
Quando Vicente entrou com uma bandeja, Ron desprezou o copo e pegou a garrafa e o guardanapo. Sorveu um grande gole, pelo gargalo, deixando-se cair no sofá, ao lado de Zelda.
— Feliciano exigiu que eu repetisse várias vezes de que modo matara Senador. — Contou, olhando para Damon e Alessa, que haviam permanecido de pé. — Expliquei até cansar, mas a detetive não parecia satisfeita. Só perguntava onde eu atingira Senador e como ele caíra.
— E você... — Damon incentivou-o a continuar.
— Eu repetia que dera um murro no queixo dele e que o homem caíra, talvez fulminado por um ataque cardíaco. Então Feliciano e a detetive, junto da delegada declaram que eu não matara o senador.
— O quê? — Exclamou Zelda com expressão radiante.
— Disse que a necropsia não revelara ferimentos no rosto. — Continuou Ronny, sem poder desviar o olhar de Alessa. — E que o senador fora morto por um golpe recebido na parte de trás da cabeça. O... o assassino usou um instrumento pesado.
— Então que acusações ainda podem pesar sobre você? — Perguntou Zelda com ansiedade, mas sorrindo, acreditando que tudo acabara.
O sorriso murchou quando Damon expôs o que pensava do assunto.
— Acho que a polícia o acusa de interferir nas investigações e de querer proteger o verdadeiro assassino.
Alessa sentou-se numa poltrona, empalidecendo. — Morinette tem ideia de quem possa ter matado Ferraz? — Perguntou.
Ronny baixou os olhos.
— Não sei. Ela me revelou que frequentemente, em casos de assassinato, aparece alguém querendo proteger o verdadeiro culpado, mas que isso nunca funciona. Aconselhou-me a dizer a verdade. E eu disse.
— O que disse a ela? — Perguntou Damon, notando a expressão tensa no rosto de Alessa.
Ronny colocou a garrafa de cerveja numa mesinha ao lado do sofá e começou a esfregar as mãos.
— Pensei que fosse Zelda, saindo com o carro, naquela noite. Segui-a e quando cheguei perto vi que era Alessa. Continuei a seguir o Mercedes, achando que havia algo errado. Quando chegamos à casa de Senador Ferraz, fiquei esperando na estrada, até que Alessa saiu.
— E aí você entrou?... — Continuou Damon.
— Não. Voltei atrás de Alessa, mas no meio do caminho decidi retornar e ter uma conversa com Ferraz.
— Por quê, Ronny? — Indagou Zelda perplexa.
— Não sabe que tipo de reputação cercava aquele homem? Fiquei preocupado com Alessa. O que ela foi fazer na casa dele, no meio da noite?
A atriz olhou para a filha.
— Querida, o que você foi fazer na casa dele afinal?
— Eu não queria preocupá-la, mas Ferraz me avisou que o Beto estava tendo alguns problemas no mercado de ações e ele precisava saber se nossos investimentos não tinham sido afetados.
— E foram?
— Não.
— Isso é bom!... — Respondeu Zelda, pegando Ronny pelo braço.
— Encontrou Ferraz morto, querido?
— Sim. E pensei que Alessa o tivesse matado.
— E entregou-se para protegê-la... — Exclamou Zelda juntando as mãos. — Oh, Ronny, você tem um coração de ouro! Mas devia saber que Alessa seria incapaz de assassinar alguém.
Damon desejou ser capaz de provar tal coisa, mas sabia que no momento seria impossível.
— A detetive Morinette não pensa assim, Zelda. — Observou Alessa recostando-se na poltrona. — Devo ser a maior suspeita em sua lista.
— Talvez não! — Ponderou Damon. — Se fosse assim, ela já estaria aqui. Contudo, tenho certeza de que vai querer falar com você novamente e conseguir que o vizinho a identifique. — Olhou para Ronny. — Pense bem. Lembra-se de ter visto alguma coisa perto do corpo, algo que possa ter servido de arma?
O homem sacudiu a cabeça. — No momento em que o vi lá, estendido...
— Onde?
— Atrás do bar. Dava a impressão de que estava mexendo no armário onde guardava as pastas quando foi atingido.
— Que armário?
— Um pequeno, no balcão do bar. A porta estava aberta. Precisei fechá-la para remover o corpo.
— Por favor! — Gemeu Zelda. — Não vamos falar mais disso. Alessa, não acha que devia ligar para São Paulo e avisar ao escritório de advocacia de que Ronny foi solto? e que vamos precisar ainda dos serviços deles.
— Farei isso já! — Respondeu ela, dirigindo-se para a biblioteca.
Percebendo o olhar terno que Zelda lançava a Ronny, Damon acompanhou Alessa para fora do salão.
— Ronny... — Disse a atriz com voz suave. — Que coisa maravilhosa você fez por Alessa! Correu um grande risco, procurando protegê-la.
— Não fiz por Alessa, mas por você. Sei o quanto gosta dela e que sofreria se algo lhe acontecesse.
Apesar das palavras generosas, havia um tom de amargura na voz dele que Zelda não deixou de captar. — Não fique com ciúme de Alessa, por favor. — Ela pediu. — Quero que vocês sejam amigos. Sabe que isso é muito importante para mim!
— Como posso não ficar enciumado? Ela dirige sua vida, planeja seus dias e até decide que roupas deve usar.
Não querendo discutir ali, onde poderiam ser ouvidos, Zelda convidou-o a acompanhá-la aos seus aposentos. Quando chegaram à sala da suíte, ela fechou a porta.
— Ouça bem, Ronny... — Avisou. — Não quero que fale de Alessa. Sim, gosto dela. Mais do que você possa supor, porque foi ela quem ficou a meu lado quando me transformei num trapo. Se pensa que eu estava em péssimas condições quando me viu pela primeira vez, Ronny, é porque não.me conheceu durante os dois anos em que Alessa cuidou de mim quase sozinha.
Ela deu dois passos na direção da lareira e voltou-se para encará-lo.
— Você vê como ela me protege. — Continuou em tom mais suave. — Sem essa proteção eu já estaria na lata do lixo. Alessa me fez continuar a olhar para cima, quando eu só queria desabar no chão. Não permitiu que aceitasse as poucas ofertas de trabalho que apareceram naquela época. Comerciais de televisão e pequenos papéis em filmes de segunda categoria. Evitou que eu me matasse, tomando pílulas o tempo todo, regadas a uísque. Portanto, não permito que falem mal dela.
Exasperado, Ronny ergueu-se do sofá e agarrou-a pelos ombros. — Entendo que Alessa foi boa e dedicada, mas se realmente gostasse de você, desejaria dar-lhe mais do que fama e fortuna.
— Fama e fortuna!... — Repetiu a atriz sem emoção. — Um dia julguei que o sucesso resolveria todos os meus problemas. Não resolveu. Fama e riqueza não valem nada quando a vida perde o significado.
— Exatamente. Ainda bem que aprendeu. Eu amo você, Zelda. E você me ama. Não podemos permitir que a presença de Alessa seja uma sombra eterna em nosso relacionamento. Ou damos um jeito nessa situação ou irei embora. Para sempre.
— Não diga isso. Preciso de Alessa, mas também preciso de você.
— Não é a única a precisar de alguma coisa, Zelda. Eu tenho necessidades e, acredite ou não, Alessa também tem. Não entendo como vocês duas ficaram tão agarradas uma outra, mas esse é um fato que não consigo aceitar. Você me ama ou não?
— Sim, Ronny, eu te amo.
— Então, case-se comigo. Sairemos deste museu e levaremos uma vida normal numa casa normal, com gente normal à nossa volta.
— Ronny... eu não...
— Por quê? Há algo errado comigo? Diga o que é e tentarei me corrigir.
Ela tomou-lhe o rosto entre as mãos. — Não diga isso nem brincando, querido. Não há nada errado com você. Eu é que estou confusa. Dê-me um pouco de tempo. Ajude-me a começar e acabar o filme.
— E depois?
— Depois faremos o que você quer. — Zelda declarou sem ter certeza de que poderia cumprir a promessa.
Ele sorriu de leve e beijou-a. A seguir, abraçados, caminharam lentamente para o quarto.
1538 Palavras
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