Capítulo 43 - Réu primário
20/09/2022 - 435 dias antes do assalto a Florence Joalheria
Sadie Sink
O juízo final bem que poderia ter acontecido, assim eu não precisaria estar lá.
Eu quase podia sentir o peso sobre meus ombros dentro daquela sala da delegacia. Aquela não era a última vez que eu estaria ali, mas eu gostava de pensar que fosse.
Joe balançava a perna freneticamente, enquanto Jenna enrolava os cabelos lisos nos dedos e eu, ao menos tentava, não roer as unhas ao encarar meu reflexo na porta de vidro a nossa frente. A minha respiração estava irregular como sempre, mas eu preferia me concentrar no gosto metálico que invadia minha boca, por estar mordendo o interior da bochecha direita.
Era estranho pensar que a minha liberdade seria advinda da privação da de outra pessoa; talvez eu é quem devesse ser presa. Até pensei em me levantar e simplesmente ir embora, ou fingir uma dor insuportável na barriga, mas não... A droga da minha consciência me impedia de fazer isso ou talvez só fosse o policial parado ali próximo, que estava com os braços cruzados.
Dacre infelizmente não pode ficar para me ajudar a aliviar s tensão da espera e muito menos Maya, uma vez que o delegado D'Almas não achava que ela fosse tão importante assim para algo.
- Será que vão perguntar algo sobre o Sr. Harbour? - Jenna quebrou aquele silêncio com um sussurro.
- Não faço ideia, mas torço para que não. - Joe respondeu, por mais que a pergunta tinha sido para mim.
- Sadie? - ela o ignorou e me chamou. - Está tudo bem?
Não a respondi com palavras, apenas assenti e desviei minha atenção a grande porta de vidro à frente. Havia uma movimentação do outro lado e ainda que o vidro fosse texturizado, eu podia ver plenamente um rapaz com as mãos para trás - algemado talvez? -, acompanhado de um policial, já que facilmente reconheci a farda.
- Minha cabeça está até doendo com essa demora infeliz. - o rapaz resmungou.
Tanto Jenna quanto eu nos abstemos de qualquer comentário a esse respeito; também estávamos esgotadas e não precisávamos de um crachá corporativo para confirmar isso. Particularmente, eu até preferia a demora, assim podia pensar em respostas boas o suficiente para eu não parecer uma idiota completa ou até quem sabe, suspeita de algo, eu tinha ciência que devia muita coisa no cartório.
"Tenho certeza que vai se sair bem, não se preocupe, ruiva. E, por favor, fique atenta ao decote, eu me desconcentrei com ele hoje de manhã, então... Quando terminar, me ligue."; era a mensagem de Dacre, que eu encarava já há pelo menos três minutos.
Eu estava começando a me acostumar com a presença e a sensação de proteção que Dacre me trazia. Era como se eu fosse uma menina de 12 anos novamente, quando se sentia segura sempre que Spencer segurava minha mão como o bom irmão maís velho que era. A diferença agora era que eu não usava tranças e sim, salto alto.
- Faz tempo que estão juntos? - Jenna me chamou a atenção outra vez. Eu a olhei brevemente e ela sorriu de forma discreta, indicando meu telefone.
- Não, poucos meses, na verdade. - respondi bloqueando o aparelho. - Mas que quase parecem ser anos. - suspirei.
- Isso é bom, eu acho. - pausou. - Ainda que faça pouco tempo.
Eu dei de ombros. - Acho que estaria pior se estivesse sozinha. - ri pelo nariz, lembrando-me dos ocorridos dos últimos dias.
- Não necessariamente, Sadie, mas, bom, eu tenho certeza que logo estaremos livres disso. - ela colocou a mão sobre meu joelho e sorriu outra vez.
Às vezes, sentia-me culpada por ter tido pré-conceitos com relação a Jenna; nós tínhamos nossas diferenças, era evidente e a ideia de que fui substituída por ela também não ajudava. Entretanto, nós nos parecíamos muito quando o assunto era toda essa confusão da Conceptum: estávamos quase desistindo de tudo e mandando a merda.
- Senhorita, Sink, por favor. - a voz do delegado me despertou dos meus pensamentos.
Passamos juntos pela porta de vidro, eu sentia perfeitamente o olhar de um dos policiais sobre mim, como se estivesse se certificando se eu não deveria estar algemada, assim como o rapaz no fim do corredor sentado.
Meu olhar trombou com o do garoto; ele pareceu dar uma risadinha e depois fitou o chão como se quisesse disfarçar nosso contato visual. O cabelo bagunçado e a camiseta extremamente larga davam a impressão que ele não tinha tido uma manhã muito agradável.
- Sente-se, Sadie. - o homem disse com a sua simpatia de sempre, mesclada a uma intimação. Ele fez menção de que eu entrasse na sala primeiro e logo me acompanhou. - Como tem passado? A investigadora Hermann disse que você a procurou há alguns dias.
Eu suspirei depois de sentar em uma das cadeiras à sua frente. - É, eu a procurei no último dia 30. Eu fiquei um pouco pilhada com algumas coisas. - balancei a cabeça negativamente. - Eu não ligo de ter parecido louca. - dei um riso nervoso. - Mas eu tinha certeza de que o vi, o tal Ryan... Eu o vi aquele dia.
Sr. D'Almas assentiu. - Você não estava louca, Sadie. - ele apoiou os cotovelos sobre a mesa. - Realmente era ele. Nós pedimos as câmeras de segurança para o estabelecimento, mas apenas as internas estavam funcionando, então não sabemos se ele saiu de lá sozinho, de carro, se dobrou a esquina ou seguiu a avenida. E isso é algo que faria diferença, mas... - suspirou.
- Fico feliz com isso. - falei entrelaçando meus dedos e apertando minhas próprias mãos. - Acha que um dia tudo isso acaba? - ousei perguntar.
Ele sorriu levemente. - É claro, só não sabemos como e quando. - retomou a postura depois de perder alguns segundos procurando algo na pasta sobre a mesa. - Mas o foco é: nós temos um novo suspeito. - esticou a ficha para mim. - O acha familiar?
Eu respirei fundo antes de me ajeitar na cadeira e olhar o papel sobre a mesa. Até pensei que o rapaz do lado de fora da sala fosse importante em algo, porém o suspeito em questão era bem diferente, fosse pelos olhos mel, o cabelo um pouco longo ou os lábios finos; todavia, ainda assim, não era familiar.
- Eu deveria saber quem é? - perguntei erguendo os olhos em sua direção.
Ele riu nasalado. - Era o que eu esperava que dissesse. - cruzou os braços ao se recostar na cadeira.
- Olha, eu vou ser muito franca com o senhor. - suspirei, devolvendo a ficha a ele. - Eu não me lembro de nada e nem de ninguém, e ainda que eu lembrasse, já teria dito, só para não ter que vir aqui quase toda semana.
- Entendo, mas é realmente importante que colabore conosco.
- Eu não fiquei no saguão, eu tive que entrar na merda de um elevador com uma arma engatilhada, torcendo para que um estranho não atirasse em mim só porque respirei de um jeito que não o agradava. - acabei não sendo capaz de controlar as palavras.
O delegado D'Almas me encarava calado, talvez agora realmente eu fosse presa. Eu suspirei diante da minha atitude estúpida; não era do meu feitio ser grosseira ou tão explosiva, porém, ultimamente, eu não estava controlando muito minhas ações ou até pensamentos. Merda; eu só queria sumir dali.
- Eu sei que está nervosa ainda com tudo isso, mesmo que já tenha quase cinco meses do assalto, mas ainda precisamos da sua colaboração, Sadie. É importante. - o homem disse ponderado. - Não quero deixar os responsáveis impunes ou muito menos que aconteça de novo.
Eu assenti um tanto mecanicamente; eu não era burra, sabia que estar ali era preciso, mas a pressão colocada sobre mim para eu me lembrar de algo era o que me dava dor de cabeça.
- Entendo tudo isso. - afirmei, respirando fundo.
- E também tem o caso com a Marie Gambidh. - completou. - Não esquecemos dela, caso esteja pensando nisso. Só queremos resolver tudo e, infelizmente, você é fundamental para isso, Sink. - contínuou. Nos olhamos nos olhos brevemente, ele parecia estar sendo sincero; e Nicholas também me pareceu meses atrás. - Você pode não ter sido uma escolha aleatória, e nós vamos descobrir o porquê.
(...)
- Não acha que ainda deveríamos pensar naquela possibilidade? Porque eu acho. - Jenna me questionou assim que me viu sair da sala do delegado.
- Já falei que não concordo com isso. - respondi ríspida.
- Mas é uma boa opção, quem sabe assim eles não fazem algo de verdade, ao invés de enrolar a gente. - ela insistiu, seguindo-me até a saída; Joe não estava mais na recepção.
- Acho que diante de tudo isso, se eles no mínimo prenderem o cara que matou a Marie, já está de bom tamanho. - comentei, parando na porta de saída e mandando uma mensagem para Dacre, como ele mesmo havia dito. - Não acho que isso vá acabar. - acrescentei sem nem olha-la.
- Você jamais esteve tão pessimista. - ela riu levemente.
- É que tem muitas outras coisas acontecendo além dessa merda. - contei, finalmente passando pela porta.
Jenna ainda me seguia. - Está falando do tal Nicholas? - perguntou. - A Maya me contou, meio por cima é claro...
- Com o fato de não ter emprego, dinheiro e nem paz. Tem a ver com tudo. - respondi-a erguendo as mãos inconformada. - Acho que ferrar com a vida do David é minha última preocupação. - suspirei.
A morena estava parada no topo da escada, enquanto eu me aproximava do meio fio, esperando por minha carona conveniente.
- Sei que não está fácil, mas_ - ela dizia e eu a interrompi ao ver Dacre dobrar a esquina.
- Eu já estou indo. Quer carona? - perguntei antes de ajeitar a bolsa rente ao corpo e ver a Equinox estacionar próximo a mim, olhei-a uma última vez.
- Não, eu ainda não fui chamada, estou esperando. - disse, desviando seus olhos de mim.
- Boa sorte então. - disse a dando as costas. - E tira essa ideia da cabeça. - completei, indo até o carro. - Eu só vou aparecer na merda da televisão quando eu também for criminosa, Jenna. - conclui em alto e bom som antes de entrar e ver um Dacre um tanto confuso.
- Está realmente empenhada em cometer crimes, não é? - ele disse e riu assim que bati a porta.
Eu balancei a cabeça negativamente ao finalmente vê-lo seguir pela avenida e assim, fazer a imagem de Jenna desaparecer aos poucos do meu campo de visão.
- Acho que a polícia acredita nisso também. - comentei ao levar um dedo a boca e pressionar a unha entre os dentes.
- Ah, talvez eles achem que você roubou balinhas da recepção da delegacia. - deu de ombros e uma leve risada. - Eu falei que ia se sair bem, não sei porquê se estressa tanto.
- Adoro como você acredita no meu potencial. - revirei os olhos e dei um riso irônico. - Mas tudo bem, vou admitir que estava certo para poupar energia. - virei o rosto em direção da janela.
Ainda eram 13h, o que significava que Dacre não ficaria comigo quando me deixasse em casa; ele iria fazer algo de útil, enquanto eu, não faria nada mais do que companhia para Pandora.
Eu ainda não tinha me adaptado totalmente a essa vida atoa. Sentia-me quase como imprestável; Maya tinha seus afazeres - tanto que estava nesse instante no trabalho - e Joe, bom, esse já estava vivendo como se nada tivesse acontecido. Jenna ainda me perguntava se eu sabia sobre alguma vaga, ela estava tão desesperada quanto eu, mas creio que sua especialização em relações internacionais a ajudaria em algo.
Já eu, não tinha mais que dois mil dólares na carteira que eu nem sabia de onde veio, um cachorro e uma garrafa de vinho no armário, ou seja: nada.
- E como estão as coisas? Acharam mesmo outro suspeito? - Dacre perguntou, fazendo-me voltar a realidade que não era tão diferente dos meus pesadelos.
- É, parece que eu não estava tão louca quanto pensei aquele dia. - dei de ombros.
Ele finalmente olhou em meus olhos. - Mesmo?
Assenti, buscando meu telefone dentro da bolsa. - Isso ainda está longe de acabar, mas pelo menos é um começo, não é. - suspirei.
- Deixa o pessimismo para mim, Sadie. - ele bateu o cotovelo levemente em meu braço para me chamar a atenção, fazendo-me dar um sorriso bobinho. - E então, Canon ou The Melting?
Dacre aparentemente decidiu mudar de assunto, perguntando sobre onde iríamos almoçar; todavia, não era essa a minha verdadeira vontade.
- Acho que eu passo. - fiz uma careta o olhando. - Parece que ainda estou dentro daquela sala horrível. - completei.
Ele balançou a cabeça negativamente. - Adoro quando insiste em ser teimosa, ruiva. - riu pelo nariz ao continuar seguindo a avenida principal, e assim acabei aceitando sua intimação para o almoço.
- Com o tanto que possamos comer em casa... - olhei-o na esperança que compreendesse meu pedido silencioso. Dacre não respondeu, apenas deu um dos seus sorrisos mal intencionados.
(...)
"Ah Sadie, eu espero que isso acabe logo. Não consigo nem imaginar como está sendo, mas fico feliz que o Montgomery esteja com você"; Maya respondeu-me depois de quase dez minutos.
"É, ele não estava literalmente ao meu lado na delegacia, mas é como se estivesse... ", comentei.
Fazia mais de quinze minutos que Dacre havia descido para buscar o nosso almoço e eu estava implorando para que voltasse logo; eventualmente não era a fome que me incomodava, mas sim a sensação de estar sozinha, o que definitivamente era uma grande estupidez.
"Ele tem se esforçado, não vamos negar", disse ela em contrapartida.
Eu iria respondê-la se minha mente não tivesse viajado novamente para o que eu havia encontrado em suas coisas. Muito provavelmente eu estava sendo uma tola em insistir pensar nisso, já que era um tanto quanto impossível; era fácil sentir aquele arrepio de novo.
"Com certeza", decidi por concordar com Maya. "Ele faz o que pode", acrescentei ao recordar um pouco da conversa com Natalia.
Por mais que eu quisesse concordar com minhas próprias palavras, eu ainda mordiscava minha própria unha como meio de alívio da ansiedade. Tentei limpar a mente e me concentrar em outra coisa, assim, optei apenas por encarar o "digitando" de Maya no telefone.
"A gente tinha que tentar_", não consegui terminar de ler a mensagem da garota, uma vez que meu telefone apagou.
- Droga. - murmurei.
Sentei-me mais ereta no banco e decidi por vasculhar no porta luvas um carregador; eu com certeza faria de tudo para evitar ficar sozinha com meus próprios pensamentos, ainda mais os atuais.
Respeirei fundo involuntariamente ao abrir o compartimento, eu não estava pronta para encontrar outra coisa indesejada.
Evitei revirar muito as coisas, olhando apenas por cima dos papéis e dos óculos escuros. Suspirei um tanto quanto derrotadoa e tirei apenas alguns dos papéis dobrados ali e de fato, nada de encontrá-lo.
Devolvi as folhas para o porta luvas sem nem ao menos desdobrar uma delas; poderia ser apenas uma nota fiscal, um documento importante ou um recibo, que fosse uma receita médica, não importa; eu não olharia. Todavia, algo mais interessante do que os papéis brancos chamou-me a atenção, e eu queria morrer por dentro por estar curiosa.
A pequena sacola, que na verdade era a lixeira do carro, estava cheia, provavelmente de detritos que iriam para o lixo, mas acho que não era bem essa a intenção. O embrulho improvisado parecia "recheado", já que nem fechada estava, permitindo-me ver plenamente um picote de papel colorido.
Minhas mãos coçaram, como uma alergia, porém, eu sabia que era apenas minha vontade de ver o que era, e eu cedi. Olhei brevemente na direção do restaurante a frente e nem sinal do Dacre, o que só me impulsionou a pegar a droga da sacola.
Eu dei um riso sincero ao ver que era apenas um desenho picotado, provavelmente de Emilly. Os pedaços estavam amassados, mas dava para ter um pequeno vislumbre do que se tratava. Até peguei mais dois pedaços do desenho de Lily, para tentar adivinhar o que tinha desenhado, mas acabei desistindo disso quando vi Dacre passar pela porta do restaurante.
Guardei os pedacinhos de papel onde estavam e fechei o porta luvas; acho que ele não se convenceria com a minha desculpa mixuruca da busca pelo carregador.
- Acho que tenho que lhe agradecer por sugerir não comer fora. - ele disse ao abrir a porta do carro.
- Me agradeça mais tarde. - afirmei sorrindo, recebendo um riso abafado em troca.
(...)
Dacre Montgomery
Era no mínimo incômodo pensar que na cabeça de Sadie eu era uma pauta e tanto de discussão; as palavras de Natália voltavam facilmente a minha mente.
Talvez eu devesse mesmo sair de sua vida, afinal, já havia a estragado o suficiente. Eu podia inventar uma desculpa, falar que Lily precisava de mim e o melhor era sairmos de Sacramento - o que era uma boa possibilidade -, ou quem sabe dizer que Natalia optou por se mudar por conta do bebê. Ou eu poderia simplesmente me levantar de sua cama e ir embora; mas com certeza a terceira opção era impossível, pelo menos com ela tão próxima.
Observar Sadie morder a caneta, enquanto olhava concentrada para o notebook em seu colo, ao meu lado, era de longe uma cena banal, porém, na minha mente de merda, eu era capaz de pensar em muita coisa; e nem todas ela estava vestida.
"Você sabia que seu concorrente não tem carro e nem sequer carteira? Caralho, o cara é pior que você"; a mensagem de Caleb me fez desviar a atenção da ruiva e consequentemente suspirar.
"Não sei porque não estou surpreso com isso", respondi logo.
"Não está surpreso porque sabemos que ele é um merda como a gente, só que pior...", eu detestava concordar com ele, mesmo que internamente. "Ele usa o carro de um amigo, que é famosinho no centro e bebe Corona, e acho que não transa com ninguém que não lhe cobre menos de 150$. Ótimo partido, a concorrência é boa, hein".
"Vai se foder, McLaughlin"; respondi sua ironia; como ele ousava questionar as escolhas de Sadie?
"Foi você quem pediu por informações...".
Respirei fundo diante daquilo, eu tinha uma sensação de quase morte por aceitar que o moleque estivesse certo. Eu pedi por isso, não? Pedi para saber sobre o ex de Sadie e eu não poderia me sentir incomodado com isso agora, não é? Ainda que ele fosse um cretino.
- Vão mesmo liberar o Sr. Harbour. Acredita nisso?! - Sadie chamou minha atenção, fazendo-me bloquear o telefone. - É o cúmulo.
- Sinto muito por isso, ruiva. - disse, ainda incomodado com a conversa com Caleb.
- E agora? Eu faço o que? - questionou, virando seu olhar preocupado para mim. - Acha que eu deveria fazer o que a Jenna disse? - ela ainda mordia a tampa da caneta.
- Não sei, Sadie, realmente não sei. - respondi-a, simplesmente, levantando-me de sua cama e seguindo para sua cozinha.
A porta dos fundos já estava até trancada, mas a abri, já que não seria de bom tom ascender um cigarro dentro de sua casa; mesmo que eu já tivesse visto ela fazer isso antes.
Era só mais uma terça-feira a noite, mas uma terça-feira que eu passaria com ela e que Caleb tinha conseguido estragar, como fez no sábado passado; merda. O ruído do cigarro queimando foi um pouco reconfortante diante do meu sentimento de desgosto, porém não o suficiente para me deixar tranquilo.
"Não precisa dizer literalmente tudo, caralho", mandei para o rapaz por fim.
- Dacre? - pude ouvir a voz de Sadie logo atrás de mim à porta, entretanto, não a olhei. - Está tudo bem? - perguntou em um tom baixo.
Respirei fundo, não sabia exatamente o que respondê-la e isso estava começando a ser frequente, especialmente depois que voltamos de Malibu.
- Nada, é coisa de trabalho. - eu não estava sendo totalmente falso.
Ela não disse nada, fazendo aquele silêncio se perdurar e me possibilitando escutar novamente o ruído do filtro do cigarro queimar quando o tragava.
Era fim de setembro e consequentemente fim do verão, tanto que o vento fresco era notável, mas não era necessariamente incomodo para mim, muito pelo contrário; a brisa gelada contra meu rosto me dava até um certo alivio.
Sem qualquer aviso, Sadie aproximou-se de mim e ainda calada, senti-a apoiar sua cabeça em minhas costas e envolver seus braços ao meu redor, apertando-me contra si ao segurar em seu próprio pulso para estreitar mais nossa distância; era quase um abraço, em uma espécie de demonstração forçada de apoio emocional. Isso me fez fechar os olhos brevemente e suspirar, eu ainda não estava acostumado a receber qualquer demonstração de acolhimento.
- Não se preocupe. - comentei para de alguma forma não fazê-la pensar que estava alheio a ela ou a sua preocupação de minutos atrás.
- Sabe que pode conversar comigo, não precisa ser o único ouvinte. - disse ainda em um tom ameno. - Os problemas são nossos agora. Lembra? - completou.
- Isso se aplica aos seus apenas, ruiva. - ri nasalado; jamais a faria ocupar-se com o que me incomodava ou afligia.
- Ah Dacre, por favor. - ela riu fraco e senti-a esfregar levemente o rosto contra mim, ainda que minha camisa não permitisse sentir sua pele contra a minha. - Não seja bobo. Eu acho que ainda sirvo para algo, ainda que não para muita coisa.
- Sadie... - respirei fundo antes de tragar outra vez. - Não_ - ela me interrompeu.
- Estou falando sério. - sua voz estava mais firme agora, como se quisesse que eu realmente a levasse a sério, e eu podia prever o motivo disso. - Já lhe disse que pode_
- Eu sei que está a disposição, e gosto disso. - interrompi-a ao afagar seu braço esquerdo que ainda estava ao meu redor. - Mas também gosto de_ - cortou-me novamente.
- De cuidar de tudo e todos, eu sei. - deu um risinho nervoso. Sadie se desprendeu de mim e confesso que queria ter continuado a sentindo. - Sabe, eu estive pensando e, confesso que conversei com a Natalia sobre isso. - parecia um tanto apreensiva ao ficar de frente a mim.
Eu sabia exatamente o que queria dizer ou pelo menos insinuar, já esperava por isso na verdade. Assenti, ainda sem dizer-lhe nada, não queria influenciar seu posicionamento sobre isso, ainda que eu já tivesse uma ideia de qual era devido a conversa com Dyer no domingo. Queria ouvir de sua boca o que pensava sobre mim, mesmo que fosse algo ruim ou no mínimo duvidoso.
Ofereci a ela o cigarro, o qual ela aceitou e cruzou os braços ao tragá-lo, fazendo-me divagar um pouco em suas feições e suas curvas marcadas no casaco fino que vestia sobre a regata um pouco curta. Pude ver nitidamente seu peito inflar ao tomar fôlego; lá estava ela ansiosa.
- Eu particularmente não sei como dizer isso. - riu nervosa e eu assenti como incentivo para que dissesse logo o que passava em sua cabecinha ruiva. - Eu sei que quer muito resolver tudo, especialmente a situação merda com o Nicholas, mas... - entregou-me o cigarro ao fazer uma pausa. - Não quero que isso complique você.
Continuei mudo, cruzando os braços como ela e olhando em seus olhos como se não fizesse a menor ideia do que queria insinuar com aquilo; logo, limitei-me a apenas fumar, enquanto ela decidia se contaria, com todas as letras, que sabia que eu tinha uma merda de arma em casa.
- Eu realmente não quero que me entenda mal. - desviou os olhos de mim, procurando talvez a melhor forma para dizer que eu era um idiota. - Eu amo muito sua preocupação, como eu disse, mas eu... - suspirou de novo, coçando a nuca.
Eu estava começando a ficar angustiado com seu nervosismo, isso porque aquele assunto não era novidade. Dei um passo em sua direção, descartando o cigarro.
- A Natalia me contou, Sadie. - decidi acabar com seu sofrimento.
Ela fechou os olhos. - Merda. - pude ouvi-la sussurrar e um rubor tomou conta de seu rosto; o que era engraçado, já que não era ela quem deveria estar com vergonha.
- Eu não queria que_ - ela me interrompeu.
- Desculpa. - disse ansiosa. - Não foi por querer. Caramba, eu só.... - riu nervosa, passando as mãos pelo rosto e pelos cabelos.
- Sadie. - ela novamente não me deixou falar.
- Juro que não foi minha intenção. Eu estava só_
- Sadie...
- Caralho, eu nunca iria vasculhar as suas coisas ou_ - ela ainda insistia.
- Sadie, calma. - eu ri nervoso ao dar mais um paço e segurar seu braço levemente. - Sou eu quem lhe devo explicações, não você. - admiti, enquanto ela mantinha seus olhos de um azul intenso sobre mim. - A Dyer me contou o quanto você estava preocupada com_
Ela balançou a cabeça negativamente. - Não queria que ela tivesse lhe contado. - suspirou, ainda um tanto constrangida.
- Foi eu quem insisti. - declarei. - Ela não queria, aparentemente vocês mulheres tem um código de fidelidade do caralho. - ela riu depois de um suspiro. - Enfim, não quero que interprete errado aquilo. - falei o que realmente temia, soltando seu braço vagarosamente e, felizmente, Sadie não se afastou. - Particularmente, queria que não soubesse disso, mas tenho meus motivos e, muito provavelmente você não compreenda, mas_
- Ela me falou sobre isso, está tudo bem. - ela comentou e me fez evidenciar uma certa surpresa involuntária; essa parte Dyer não me disse.
- Falou? - questionei-a instintivamente.
Sadie assentiu. - E é por isso que eu estou dizendo que entendo sua preocupação, mas Dacre, não quero que tenha problemas só por conta de um ex idiota meu. - abaixou a cabeça brevemente.. - Caramba, eu não sei o que dizer... Mas acho que depois daquele dia da cafeteria, o Nicholas não tem mais tanto interesse em encher minha paciência. - ela riu da situação, fazendo-me rir com certo alivio.
- Assim eu espero. - comentei. Puta merda, Dyer; eu nunca pensei que te agradeceria por algo em toda minha vida.
- Se for inteligente não. - riu fraco. Minha respiração estava mais leve agora, era bom saber que eu ainda não era um merda em seu ponto de vista; pelo menos torço para que estivesse sendo sincera. - E particularmente, diante da situação atual, é até reconfortante. - riu de novo.
- Sinto muito que tenha visto aquilo. - comentei. Sadie balançou a cabeça negativamente, o que me fez querer provar que ainda poderia confiar em mim, logo, segurei levemente seu rosto e a dei um breve beijo. - E eu não vou atirar no seu ex-chefe. - brinquei e ela sorriu ao passar seus braços de novo ao meu redor. - Prefiro manter meu réu primário intacto. - acrescentei, mesmo que aquilo estivesse longe de ser verdade.
- Talvez eu tenha perdido o meu já. - murmurou ao escorar a testa em meu ombro e foi minha vez de rir, retribuindo o abraço. Estava certo eu sentir conforto naquela situação?
- Isso é pauta para outro dia quando estiver bêbada.
- Eu estava torcendo para que tivesse esquecido disso. - ela riu envergonhada novamente, mas finalmente olhou em meus olhos; não parecia a Sadie apreensiva de minutos atrás.
Balancei a cabeça. - Eu tenho prazer em lembrar do que me diz em momentos inoportunos. - confessei ao manter uma mão na lateral do seu corpo e subir a outra para sua nuca. - Mas gosto mais de quando é com você na minha cama. - acrescentei.
Ela corou obviamente. - Estava demorando para dizer algo assim. - suspirou em um riso contido. - Mas fico até um pouco contente de saber disso. - completou em um tom baixo ao apoiar as mãos em meus ombros, como uma confirmação de que eu poderia apertá-la contra mim.
- E eu posso ouvir algo assim hoje ou acha que sou perigoso demais para isso? - perguntei, ignorando que estava brincando com algo sério ao dizer aquilo.
Porém, ao senti-la pressionar meu ombro ao simplesmente encostar minha boca em seu pescoço, tive certeza de que aquela questão não era algo da qual eu precisava me preocupar, pelo menos por enquanto.
Sadie deixou um suspirou breve escapar, quase como se tivesse fantasiado algo com minhas palavras; aquilo tinha a excitado?
- É claro que não. - respondeu em um sussurro, quase confirmando meu achismo; o que particularmente me interessou.
- Ótimo, eu tenho algumas coisas em mente. - falei por fim ao segurar firme em sua nuca e puxar levemente seu cabelo, fazendo-a erguer um pouco o rosto.
Sadie deu uma leve risada com aquilo. - Pensando bem, é bom. - disse simplesmente, mas não o suficiente para que me fizesse tirar minha boca de sua pele quente. - O David não é o único agora que me preocupa, tem outro.
- Outro? - perguntai, continuando com aquilo que a fazia se arrepiar.
- É, eles tem outro suspeito, lembra? E eu juro que rezo para isso acabar logo, porque... Puta merda. - suspirou de novo; mas não sei se foi por conta das suas próprias palavras ou por eu ter apertado sua cintura e, consequentemente, pressiona-la contra mim.
Eu até tinha me esquecido desse infeliz detalhe, que ela já havia comentado no almoço quando a busquei na delegacia, mas toda a irritação que Caleb me causou me fez esquecer isso.
- Esquece isso, ruiva. - falei, como se estivesse dizendo a mim mesmo.
Detestava me lembrar que eu era causador de muitas das suas preocupações e problemas. Ela suspirou de novo e agora sim tenho certeza de que não foi por tocá-la.
- Então me faz esquecer isso, Dacre... - suas palavras me fizeram encará-la. - Por favor. - completou, o que me fez sorrir levemente como se concordasse em atender seu pedido, praticamente irrecusável.
Ainda que suas feições estivessem relaxadas, eu presumia que sua mente não estava da mesma forma. Logo, grudei minha boca na sua, sentindo cada milímetro de seus lábios e o leve gosto do cigarro. Involuntariamente minha mão desceu para sua bunda, fazendo-me subitamente querer que ela tirasse o short que usava.
Definitivamente, eu não poderia mudar o que já havia feito e lidar com as consequências era algo que eu já sabia que teria de fazer. Entretanto, mesmo que não pudesse resolver nada por hora, fazê-la esquecer desses problemas já me bastava; ainda que fosse de uma forma apelativa como fazendo-a sentir-se tão excitada quanto eu.
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