Capítulo 42 - Terapia reversa
"A quem interesse minhas dores e sonhos mórbidos no meio da noite, eu tentei te contar o que acontecia" - capitulo dedicado a A.
17/09/2022 - 438 dias antes do assalto a Florence Joalheria
Sadie Sink
— Natalia? — chamei-a devido seu silêncio.
Ela balançou a cabeça negativamente e sorriu sem graça. — Ah, me desculpa. — pausou. — Como assim, "armado"? Do que está falando, Sadie?
— Oras, armado, no sentindo literal. — falei. — Sabe algo sobre isso? — insisti.
— Sadie, como chegou nessa conclusão? — ela questionou um tanto receosa com minha pergunta. — Ele te disse algo?
Eu debrucei a cabeça sobre a mesa por alguns segundos. — Eu vi uma arma, hoje, no apartamento dele. — contei, olhando em seus olhos novamente. — Foi totalmente sem querer, estava em uma gaveta, ali, exposta. — gesticulei ansiosa.
— Esteve no apartamento dele? — essa pareceu ser a coisa mais importante para ela.
— Isso não vem ao caso. O fato é: ele tem uma arma em casa, porra. — espalmei as mãos sobre a mesa.
— Bom... — ela se remexeu na cadeira. — Ele nunca disse nada sobre isso para mim. — declarou e eu suspirei. — Mas o Charlie tinha uma, eu confesso que não consegui me desfazer dela. — coçou a nuca. — E particularmente, me sinto mais tranquila sabendo que ela está comigo.
Eu não consegui dizer algo de imediato. Natalia parecia tão tranquila dizendo aquele tipo de coisa, fazia-me questionar se eu estava sendo racional e/ou justa em pensar em algo a respeito de Dacre; talvez eu estivesse exagerando.
— Acha que pode ser pelo mesmo motivo do Charlie? — questionei ainda um pouco aflita. — Por segurança?
Talvez eu quisesse uma resposta plausível e poderia, quem sabe, não ser a verdadeira, mas particularmente, esperava somente ter em mente algo que me fizesse confirmar que tudo estava bem e que aquilo não passava de uma suposição idiota devido minha ansiedade. Eu queria acreditar em algo que me fizesse ainda considerar Dacre perfeito.
— Acho que sim. — ela disse, sorrindo fraco em seguida. — Talvez ele sinta que precisa de algo para se sentir seguro, talvez seja até por você. — completou.
Puta merda; como não pensei nisso? Desde que conversamos sobre o inferno que Nicholas vem sendo em minha vida, Dacre tinha feito das tripas a coração para que eu me sentisse melhor quanto a isso. Havíamos viajado, sem qualquer planejamento, só para que eu esquecesse tudo aquilo. Além é claro, de frisar que estaria por perto sempre, uma vez que o problema agora era nosso.
Se houvesse uma competição de pior pessoa em um relacionamento, eu seria a campeã com certeza.
— Faz sentido... — suspirei, sentindo-me idiota por ter começado uma conversa tão besta; mas receosa em pensar nessa possível capacidade do loiro. — Deve ser por isso mesmo.
— Acho que ele não seria burro o bastante para fazer alguma idiotice, mas... Tenho certeza que é bom motivo.
— É sim. — afirmei, massageando a tempura com a mão esquerda a fim de relaxar. — Aconteceram algumas coisas nos últimos dias e, não sei, acho que ele está preocupado com isso. — dei um riso nervoso ao lembrar. — Mas de qualquer modo, acredito eu que ele não esteja puto o suficiente para meter uma bala naquele idiota. — ri pelo nariz, olhando para meus dedos ansiosos batendo contra a mesa. — Ou estaria? — questionei subitamente, encarando os grandes olhos de Natalia.
A morena riu e sentou mais aliviada na cadeira. — Não... Acho que é preciso mais do que isso para fazê-lo pensar em se sujeitar a fazer uma coisa tão séria quanto essa. — disse. — Mas sei que faria de tudo para vê-la bem.
Eu ri de seu comentário, lembrando-me do acontecimento do bar. — É, sem dúvidas. — afirmei.
— Ele tem um jeito estranho as vezes de demonstrar que se importa, mas não faz por mal. — riu levemente e eu assenti concordando.
Nós duas sabíamos exatamente como era a personalidade de Dacre; sabíamos como se comportava na maioria das vezes, principalmente quando uma de nós estava envolvida.
Era um tanto cômico para mim pensar que, até meses atrás, eu pensava que homem nenhum fosse bom o bastante - até mesmo os exemplares executivos, que falam mais de uma língua, tem PhD e que usam paletó -, mas aparentemente, eu estava bem errada.
(...)
Eu tirava a travessa de vidro do forno quando escutei a porta da frente se abrir e Pandora latir.
— Esperando por mim? Cadê a Sadie? — pude ouvir a voz de Dacre um tanto abafada.
— Cozinha! — gritei, ao colocar o refratário com a lasanha sobre a mesa.
— Não acredito que está cozinhando. — ele disse aproximando-se. — Qual a novidade? — perguntou, já que ele havia ligado boas notícias a todas as vezes que eu cozinhava; o que aconteceu apenas uma vez.
— Nada. — dei de ombros. — Eu só quis fazer algo e não comer comida pronta. — completei ao ir até o armário e pegar as pratos. — Achei que fosse chegar mais cedo. — comentei ao nota-lo atrás de mim, esperando pela louça para a colocar na mesa.
— Eu perdi a hora. — riu nervoso. — E eu estava ocupado atrás de umas coisinhas.
— Fui na Natalia hoje, ela adorou o presente. — sorri e então sentamos à mesa.
— Por isso deixei isso sob responsabilidade sua, eu sabia que não me sairia bem nisso.
— Talvez tenha sido o melhor. — dei de ombros rindo. — Mas você não vai poder fugir para sempre.
Dacre balançou a cabeça negativamente, ajeitando-se ao meu lado, colocando um embrulho de papel sobre a mesa.
— Sabe onde eu fui encontrar seu vinho? Naquela loja quase próximo a rodovia. — comentou. — Podia ter me dito que era longe, assim eu não me atrasaria tanto para vir. — seu tom de voz tinha uma leve ironia.
— Ah meu Deus, não acredito que você encontrou! — falei ao parar de servi-lo e pregar a garrafa rosa clara de Freixenet. — Não precisava se incomodar com isso. — olhei-o sorrindo; particularmente, eu queria me estapear por pensar tantas bobagens a seu respeito.
— Pensei que fosse gostar. — ele sorriu de novo.
— Eu adorei. — afirmei, dando um breve beijinho no canto de sua boca.
Ele me serviu o vinho, enquanto eu colocava um pedaço generoso de lasanha em seu prato. Dacre parecia um tanto contido, acho que minha atitude de mais cedo talvez o tivesse feito pensar que algo me incomodava - o que era um fato -, mas isso não era algo que estava diretamente ligado ao seu comportamento; eram só coisas da minha cabeça e eu precisava parar de ficar as remoendo.
Ele bebeu do vinho comigo, mas não passou da segunda taça, enquanto eu já estava na quinta ou sexta, não me lembro exatamente. Tínhamos terminado de comer há pelo menos vinte minutos e ainda estávamos à mesa conversando.
— Deus, depois você julga a tequila... Minha cabeça já está começando a doer. — ele comentou ao se levantar e ir em direção a sala.
— Você não sabe apreciar o que é bom. — fiz uma careta e o acompanhei. — Não me incomodo de rodar Sacramento para encontrar esse vinho rose italiano, ele é incrível. — afirmei.
— Um dia, nosso destino de viagem tem que ser a Itália. — declarou sentando-se no sofá.
— Acho que não seremos bem-vindos lá. — eu ri ao sentar-me ao seu lado e deitar a cabeça em seu colo.
Minha visão estava levemente embasada e tudo parecia girar, mas eu estava tão confortável ali, que não me atrevi levantar. Eu conseguia sentir um afago em meu cabelo, o que me fez sorrir, mas não sei exatamente o porquê.
— É só mantermos em segredo aquele nosso ato de rebeldia. — ele finalmente disse algo depois de alguns segundos de silêncio.
— É engraçado lembrar disso, já que nunca fiz nada de emocionante. — ri levemente. — Ah não, uma vez eu tentei fazer algo assim. — ri outra vez, nervosa. — Mas não deu certo, o filho da puta viu.
Era constrangedor para mim ter em mente o fato de já ter ido contra meus valores, talvez expurgar esses meus pecados com Dacre ajudasse mais do que terapia. O rapaz suspirou e manteve-se em silêncio; muito provavelmente se arrependia de ter trazido a garrafa de vinho, mas eu particularmente tinha adorado.
— Pode me achar louca, não tem problema. — declarei, passando a unha nas fibras de seu jeans na altura de seu joelho.
Ele pareceu rir nasalado. — Eu não a acho louca. Eu não acho nada, na verdade. — disse.
— Talvez eu posso ser algo diferente do que pensa. — dei de ombros, esfregando minha bochecha levemente em sua coxa.— Eu posso ser alguém horrível, Dacre. Já pensou nisso? — era bom alertá-lo dessa fatalidade.
— Sadie, nós já conversamos sobre você beber vinho. — o rapaz riu. — Dúvido que seja alguém tão terrível assim. — pude sentir sua mão em minhas costas.
— Mas eu sou. — levantei um pouco a cabeça, apoiando o queixo em sua perna. — Eu não sou exemplar. — suspirei. — Tem coisas que eu não me orgulho.
— Todos nós temos isso.
— Você não está entendendo. — balancei a cabeça. — Já fiz algo muito errado. — pausei, respirando fundo.
Eu conseguia lembrar-me perfeitamente do dia do assalto, de todos os detalhes: dos meus batimentos cardíacos acelerados, do suor nas mãos, da sensação que me arrepiava, como se um calafrio me tomasse, enquanto meu corpo fervia. Era algo excitante e denso, que me fazia questionar se eu estava consciente. Eu amei aquilo.
— Tipo o que? — perguntou simplesmente.
— Eu tentei roubar, Dacre. — declarei. — E eu gostei para caralho disso. — completei.
Os olhos do rapaz ficaram pregados em mim, como se me questionasse se eu estava realmente sã e, feliz ou infelizmente, eu estava.
Talvez eu não devesse ter dito nada sobre isso, mas a minha vontade de vomitar aquilo para alguém era muito maior. Tenho certeza que Maya não entenderia o que eu estava querendo dizer, jamais; Joe menos ainda, já que éramos quase estranhos agora.
— Sadie... — Dacre se remexeu no sofá, fazendo-me levantar de seu colo.
Ele coçou a nuca e deu um riso nervoso; acho que eu não poderia ter esperado que entendesse. O fato de ter uma arma em casa não queria dizer que era necessariamente um criminoso. Se eu não quisesse que ele fizesse suposições sobre mim, creio que eu não deveria fazer sobre ele também.
— Tudo bem se achar isso péssimo. — assenti. — Eu realmente não queria que_ — ele me interrompeu.
— Tudo bem, ruiva, tudo bem. — riu com gosto, pegando minha mão e puxando-me para encostar em seu peito. — Chega de vinho para você, estamos combinados?
— Não vai dizer nada sobre o que eu falei? — perguntei confusa, não era exatamente essa reação que eu imaginava que teria.
— Ninguém é santo, Sadie. Não se martirize. — comentou, afagando minhas costas novamente.
— Oras, eu sei que não. — ri levemente. — Mas não deixa de ser ruim.
— Uns fazem coisas piores do que os outros, só isso. — deu de ombros. — Acho melhor mudarmos de_ — interrompi-o.
— Alguns são mais injustos, talvez. — levantei a cabeça para encarar seus olhos e isso a fez latejar. — Tem gente que não sabe o quão merda é.
Dacre desviou o olhar de mim por alguns breves segundos, talvez estivesse pensando se valia realmente a pena estar ali comigo.
— Tem gente que não sabe o que faz. — suspirou. — Vamos mudar de assunto, você está melancólica demais. — riu.
— Eu não estou melancólica, estou sendo sincera. — recostei-me no sofá e voltei a encarar seu rosto. — Eu não quero que pense que eu seja alguém que, na verdade não sou, pois é muito melhor você saber quem sou, do que se frustar em pensar que sou outro alguém.
— O que? — ele finalmente me olhou com uma feição de confusão e riu de novo. — Sadie, acho que podemos encerrar por aqui essa conversa.
Eu ri fraco diante da sua incompreensão. — Talvez eu seja mesmo louca como eu pensei. — encaro a televisão desligada. — Acho que eu deveria dizer ao delegado D'Almas que eu quis pegar algumas notas para mim. Não acha? — perguntei, mas ele não respondeu; o que me fez rir de novo. — Eu deveria dizer a verdade, admitir que quis roubar a porra da empresa em que eu trabalhava, enquanto, ironicamente, ela estava sendo roubada. — acrescentei, intensificando meu tom de voz a cada sílaba.
Tudo que eu queria é que ele dissesse algo para eu tirar essa ideia estúpida e não parecer tão idiota.
— Não, não acho. — respondeu simplesmente. — Você não é uma criminosa, Sink. — balançou a cabeça negativamente. — Você só estava com problemas demais.
— É, mas ninguém nunca tentaria algo assim. — virei-me no sofá para ver seus olhos azuis e me sentir mais confortável; minha cabeça ainda girava e parecia que tudo em volta era uma mera ilusão. — Eu peguei, senti o cheiro, o peso, a textura. — gesticulei antes de respirar profundamente. — Porra, já sentiu isso? Essa sensação foda. — questionei-o.
— É claro que já. — Dacre finalmente me olhou nos olhos. — Mas eu prefiro pensar que isso é algo que eu, não sei, talvez possa evitar.
Eu sorri levemente ao balançar a cabeça negativamente. — Não dá para evitar, Montgomery. — olhei-o novamente. — É uma merda de adrenalina e dopamina maravilhosa.
(...)
Dacre Montgomery
Não sei em que momento exatamente a nossa conversa passou a ser uma confissão. Muito provavelmente fosse loucura da minha cabeça, mas tenho quase certeza de que ela tinha algo mais em mente do que apenas álcool.
Sadie estava, literalmente, desmaiada no sofá da sala, com as pernas sobre as minhas, impedindo-me falhamente de sair dali. O seu rosto estava sereno, como se estivesse tendo um ótimo sonho e definitivamente, eu não queria atrapalhar isso.
Eu sentia algumas pontadas periódicas de dor de cabeça; com certeza era fruto da noite mal dormida e dos problemas que insistiam em se fazer presentes. Até tentei pensar em outras coisas, como por exemplo na minha atitude idiota de contar a Sadie algumas coisas que me afligem, mas até isso eu consigo estragar. Não que eu não quisesse que ela soubesse de algo, eu só acho que ela não precisava carregar algo tão pesado quanto isso; a ruiva já tem os seus próprios demônios e não tem necessidade de eu piorar ainda mais.
Levantei-me o mais cauteloso possível, torcendo para que o menor ruído não a fizesse despertar; eu realmente não estava afim de ouvi-la falar sobre mim indiretamente ou que fosse do roubo. Preferia manter em minha mente o fato de que ela não pensava nisso com frequência ou que nem ao menos se lembrava da sensação; porém, ela pensava e lembrava, e era impossível controlar isso.
Certifiquei de que as luzes estavam apagadas e principalmente que a porta que dava acesso ao quintal estava fechada; não era exatamente esse o meu plano - deixá-la sozinha -, entretanto, eu não iria conseguir dormir olhando-a e imaginando o que se passava em sua cabecinha ruiva.
Fechei a porta torcendo para que Pandora não desse o menor resmungo e entrei no carro. Eu não queria admitir a mim mesmo que sentiria falta da sua companhia ao deitar, todavia, não poderia quere-la para sempre. Acho que não estava pronto para aceitar que eu era um merda suficiente para tê-la feito crer que eu poderia ser alguém possível de se relacionar; não havia tantas diferenças assim entre Nicholas e eu se pensássemos bem.
Contudo, era satisfatório para mim saber que ela não me odiava diretamente. Talvez quisesse que o Dacre que a apontou uma arma queimasse no inferno, e tudo bem, eu aceitaria ser consumido pelo fogo, mas não sem antes concertar sua vida.
18/09/2022 - 437 dias antes do assalto a Florence Joalheria
— Eu falei para deixá-la em paz, caralho.
— Foi você quem a convidou para ser madrinha do William. — dei de ombros. Natalia me olhava como se fosse me estrangular a qualquer momento, porém, nós dois sabíamos que estávamos errados. — Foi você que estreitou ainda mais os laços. — completei.
— Não foi eu quem passou uma semana com ela, fingindo ser alguém com caráter. Porra Montgomery, você parece que tem prazer em foder com a vida das pessoas. — ela suspirou, sentando-se na cadeira da mesa de jantar.
— Acho que isso é quase uma habilidade, mas não vem ao caso. — balancei a cabeça negativamente. — Eu realmente entendo que esteja irritada, mas agora é um pouco tarde para voltar atrás.
— Ela me perguntou sobre você ter a merda de uma arma e você me diz que "agora é tarde"? — Dyer bateu a mão sobre a mesa. — Está se ouvindo? — quase gritou.
— Nunca imaginei que ela fosse mexer em minhas costas. — retruquei. — Eu não poderia prever.
— Você poderia é desaparecer de Sacramento, é isso que deveria. — ela afirmou.
Eu ri com certo sarcasmo, Natalia não estava pensando direito. — Eu não vou embora de novo. Não vou dar as costas para ela agora, no momento que precisa de mim.
— Você já parou para pensar que ela precisa de você longe dela? — Natalia cruzou os braços.
Eu não disse nada; talvez ela estivesse certa ou apenas sendo implicante, porém, ainda assim, talvez dissesse a realidade que eu não via.
— Ela estava super preocupada, pensando milhares de coisas. — ela suspirou. — A Sadie realmente se importa muito com você e meio que ignora que você seja um desequilibrado. — riu um tanto nervosa. — Você chega a ter azar de tê-la.
Eu revirei os olhos com isso, mas não porque achava entediante seu discurso ou por já estar cansado de ouvi-la bater na mesma tecla; mas sim porque eu só estava tentando me negar a aceitar os fatos: Sadie era boa demais para tanta desgraça.
— Eu entendo que tenha ficado preocupada e que até pensou em contar para ela a verdade. — comentei.
— Eu não iria contar nada a_ — ela dizia, mas eu a interrompi.
— Mas pensou, Dyer. — declarei, deixando um riso nervoso escapar. — Eu não a julgaria tanto assim se dissesse, mas... Por favor, só não me fode atoa, obrigado. — ironizei.
Ela balançou a cabeça negativamente. — E correr o risco de ser presa por mentir para a polícia? Não, estou bem assim.
Eu assenti; de fato, querendo ou não, ela e eu estávamos - mesmo que indiretamente - nas mãos de Sadie. Natalia não conseguia fingir costume mentindo, enquanto para mim era quase uma arte, todavia, não com a ruiva. Tinha algo no seu olhar que sempre me fazia questionar a minha sanidade e quase vomitar tudo que eu omitia. Era uma droga de sensação de culpa.
— Eu acho que você deveria conversar com ela. Dizer de alguma forma que você não é um idiota completo, por mais que seja. — ela deu de ombros com um sorriso esnobe.
— Acho que a Sadie não precisa ouvir nada de mim agora, ela está lidando com os próprios problemas, Dyer. — afirmei, levantando-me e desistindo de almoçar com a mesma. — Então se você pudesse não comentar mais sobre isso, agradeço.
Ela riu pelo nariz. — Você tem um problema sério de bipolaridade. — resmungou, sem ao menos me acompanhar com os olhos.
— Talvez. — admiti, indo em direção a porta.
— Não vai poder enganar ela para sempre, Montgomery. — ouvi ela gritar quando saí.
Preferi não pensar nas verdades escancaradas por Natalia; achei melhor pensar que fosse seu temperamento forte e teimosia comigo; pensar que fosse tudo, mas menos que eu estivesse errado.
(...)
Era engraçado ver a feição otimista de Sadie, uma vez que eu me lembrava muito bem da sua melancolia na noite passada. Ela comia com toda paciência do mundo um pedaço de torta de frutas e eu me perdia muito fácil olhando para isso.
Estávamos no lugar onde a vi pela primeira vez, sem nem imaginar que meses depois, estaria com ela sentada a minha frente e imaginando qual seria o gosto do seu beijo depois de comer a calda de morango açucarada.
Até tentei me justificar por estar ali, já que eu sabia muito bem que era uma puta burrice. Ela pensava que eu era um criminoso - e eu ra mesmo -, que mataria seu ex-namorado - e eu faria isso se pudesse - ou a si mesma enquanto dormia. Não era algo muito cômodo de se ter em mente, mas era melhor do que supor que ela me odiasse.
— Como foi o dia com a Lily? — ela perguntou, fazendo meus pensamentos silenciarem.
— Foi ótimo, ela perguntou de você. — comentei e Sadie sorriu. — Ela comentou sobre o aniversário no fim de semana, acho que um simples passeio não vai ser lá o melhor presente. — torci o nariz.
— Você a subestima demais, Dacre. — ela balançou a cabeça negativamente. — Ela gosta da sua companhia, isso basta para ela. Leve ela para passar o dia com você. — sugeriu por fim.
Eu não a respondi, já que preferia fazê-la pensar que Scott e eu não nos mataríamos apenas por trocarmos olhares. Aparentemente, era quase uma compulsão mentir para a ruiva.
— Prefiro não pensar que sou uma má pessoa por não ser tão presente. — admiti.
Ela sorriu levemente, colocando a colherinha sobre o prato agora vazio.
— O que eu terei de fazer para tirar essas coisas da sua cabeça, hein? — questionou; usando minhas próprias palavras, claro.
Eu ri nasalado. — Que merda, Sink. Não tente a terapia reversa, por favor.
Ela arqueou a sobrancelha, cruzando os braços sobre a mesa e manteve o sorriso convincente; seus lábios estavam mais avermelhados do que de costume devido a torta.
— Não custa tentar. — deu de ombros.
Ela sorriu, mas logo desviou seus olhos de mim ao ver a tela do telefone ascender sobre a mesa. Sadie esticou um pouco o pescoço para conferir se era algo importante o suficiente para interromper aquela conversa um tanto silenciosa nossa. e aparentemente era, já que pegou o telefone nas mãos.
Eram ainda sete da noite, o que me fazia pensar que poderia ser literalmente qualquer coisa ou qualquer pessoa. Podia ser sua mãe pedindo para que ligasse, talvez Maya a convidando para fazer algo, ou até o idiota a incomodando como de costume, e até más notícias.
— Merda... — ela murmurou, depois de suspirar.
— Está tudo bem? — era obvio que não, mas eu não pude evitar de perguntar.
— Está... — respondeu um tanto desanimada. — É o Joe, ele disse que provavelmente vamos ser chamados para ir a delegacia de novo. — disse. Eu a olhei um tanto perdido, já que não sabia exatamente a quem se referia. — Um ex-colega de trabalho. — completou, fazendo um gesto como se essa informação não fosse importante, mas para mim era, pois eu sabia que era aquele engomadinho que sempre a acompanhava.
— Não se preocupe com isso, talvez seja algo bem idiota. Sabe como eles são. — comentei ao me recostar na cadeira; era um tanto difícil dizer que não precisava se preocupar com algo que me perseguia.
— Pode ser, mas ainda assim, isso me deixa um pouco aflita.
— Talvez eles só façam perguntas estupidas sobre a sua ex-chefe, só sorria e acene. Acho que se sai bem nisso. — afirmei. — Só não conte que você é do tipo de pessoa que sai sem pagar do restaurante. — brinquei no intuito de fazê-la parar de pensar nisso.
— Obviamente não diria a eles que sou uma criminosa. — riu muito levemente, finalmente me olhando outra vez. — Mas não é exatamente sobre a Marie. — suspirou. — É sobre o assalto, eles tem mais um suspeito. — acrescentou, mostrando-me a tela do telefone e consequentemente a mensagem do tal Joe.
— Que ótimo. — declarei assentindo.
Eu tinha certeza que ela ouviria meu nome saindo da boca do delegado; o que me faz pensar que seria ótimo, já que eu não iria precisar admitir a ela quem eu realmente era. Eu seria poupado desse martírio.
Sadie riu nervosa. — Não acho que seja algo ótimo. — bloqueou o telefone o colocando sobre a mesa novamente. — Acho que não estou pronta para ver a cara de mais um filha da puta que acabou com meu emprego.
Corrigindo: ela não estava pronta para saber que transava com quem lhe apontou uma arma e a fez entrar em pânico. Definitivamente, eu deveria aceitar que eu não tinha duas versões minhas como pensava, mas sim apenas uma, a qual era péssima e independente de qualquer coisa, ambas queimariam no inferno.
— Talvez seja algo bom, Sadie. Quem sabe assim você se vê livre dessa merda toda. — de mim no caso, comentei.
— Ou me afundo ainda mais. — refutou.
Eu sabia que ela se lembrava das besteiras que disse na noite passada, e ela sabia que eu também lembrava. Sadie não queria admitir para mim ou para si mesma que algo corrompia sua alma doce e inocente; creio eu que ela não gostava de saber que a adrenalina era algo viciante.
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