O início do fim ( Parte dois )
* Recomendo leitura com o fundo preto para melhor aproveitamento do capítulo *
Uma cidade em ruínas.
Um cenário pós apocalíptico.
Gritos.
Súplicas.
Fogo.
Sangue.
Morte.
Destruição.
Esse era o resumo da paisagem caótica que agora cercava Scarlett. Um mundo destruído, onde a morte era o aroma principal, pairando como um aviso falho sobre a cabeça da adolescente que caminhava pela trilha de destruição; não penas uma trilha qualquer, sua trilha de destruição.
Flashes relâmpagos de um pesadelo doloroso e muito realista se formavam em sua mente confusa. Os portões do inferno, os portões do paraíso, os celestiais, os sobrenaturais e os demônios; todos eles habitavam de forma diferente seus pensamentos confusos, mas ela tinha uma única certeza em meio a toda aquela informação.
Aquelas eram suas vítimas. Ela sentia em seus poros a culpa por toda aquela morte e uma parte de si parecia satisfeita com o fato. Uma parte que até então ela jamais havia visto. Uma Scarlett cruel, destrutiva e imbatível; a cria infernal.
— A primeira de suas conquistas, filha. Estou muito orgulhoso. —aquela voz máscula carregada de ódio, se vangloriou.
Filha.
Scarlett não tinha ideia de como, mas conhecia exatamente quem era o homem de olhos azuis, frios e cruéis que a acompanhava. Seu pai adotivo. Aquele que a havia acolhido em um momento tão crítico e tempestuoso de sua existência, alegando saber lidar com seus demônios, com sua parte ruim e terrivelmente destrutiva. Ele lhe prometera o mundo e fora paciente ao ensiná-la a descobrir dentro de si mesma a chave para abrir os portões infernais; para muitos, ele era conhecido como O Príncipe das Trevas, mas não para Scarlett; pai, era como ela o chamava agora. De alguma forma inexplicável, a presença dele proporcionava uma confiança perigosa a jovem, uma paternidade distante, como se enquanto ele estivesse ali, nada que ela fizesse teria consequências ou seria considerado errado; um mundo sem limites.
Em meio ao fogo ardente em altas labaredas avermelhadas e um céu escuro, coberto por cinzas e fumaça, centenas de corpos carbonizados e em decomposição ocupavam a superfície pela qual a incógnita ambulante caminhava tortuosamente; todos eles desprovidos de vida ou mesmo pele para firmar uma face.
Ossos corroídos e carne humana putrefada saudavam e abriam um caminho mórbido e hostil para aquela que os havia destruído sem o mínimo de piedade.
A filha do fogo celestial, ou seria infernal? Naquele momento, ela não sabia distinguir mais quem era e quem havia se tornado.
Scarlett notou tardiamente que o sangue quente das vítimas de sua fúria destrutiva ainda escorria por todos os seus membros, pingando demoradamente no chão pintado de sangue seco e cinzas, manchando sua alma e enriquecendo suas propriedades infernais; a mancha negra do inferno ganhava espaço considerável em seu cerne segundo a segundo, rapidamente.
Ao passar por um carro abandonado, foi capaz de contemplar na lataria suja do veículo, o seu reflexo. Uma satisfação desconhecida se apoderou de seu corpo e ela se viu sorrir, orgulhosa de seu feito, poderia dizer. Além do sangue impregnado em sua pele, fogo vermelho orbitava ao redor de todo o seu ser e um par de excepcionais asas douradas de penas pontiagudos tinha espaço em suas costas, arrastando suas extremidades pelo solo destruído.
O Príncipe das Trevas e sua horda demoníaca continuavam acompanhando-a por todo o trajeto. A presença dele era reconfortante, ao mesmo tempo que amedrontadora.
Scarlett ainda tentava entender como tinha provocado tudo aquilo. Suas memórias em relação aquela catástrofe iminente eram falhas e forçar-se a lembrar os detalhes causava extrema dor, parecia que sua mente havia adquirido um mecanismo de defesa para proteger a si mesma de sua crueldade impiedosa. Entretanto, de uma coisa ela tinha certeza; havia sido protagonista de um massacre descomunal e desumano que fora seu divisor de águas. A partir dali, era fato que não tinha mais volta.
As lembranças vagas e tenebrosas, aos poucos iam se firmando, conforme o quebra cabeça se ajustava em sua mente conturbada.
Para completar sua visão macabra e mortífera, a adolescente tinha em mãos uma espada longa e prateada coberta por runas demoníacas por toda sua extensão. Esta, também estava impregnada com o sangue alheio e emitia uma estranha luz azulada que ondulava ao redor de toda a lâmina continuamente.Apenas olhar para aquele objeto lhe causava arrepios, lembrando-lhe de todos que aquela lâmina havia ceifado drasticamente.
A adolescente continuava a observar todo aquele cenário chocada, sentindo medo de si mesma, sem saber para onde ir ou olhar, afinal tudo se resumia a destruição e agonia. Ela ansiava em descobrir, ainda que amedrontada, qual o propósito de sua caminhada em meio à destruição; seus pés não pareciam obedecer suas ordens de retroceder e fugir. Tinha algo que eles queriam que ela visse. O círculo de fogo destrutivo que a cercava estava cada vez mais próximo, se fechando, encurralando-a, como se tivesse que obriga-la a escolher prosseguir pela trilha de corpos dispostos assimetricamente pela superfície macabra daquele antro destrutivo.
O odor podre de carnificina, o enxofre que pesava no ar, a proximidade com as chamas e o olhar suplicante no rosto daquelas vítimas carbonizadas que ainda rastejavam pelo solo amaldiçoado faziam a adolescente querer gritar, correr e nunca mais voltar. Mas ela sabia que não poderia fazer aquilo, que tinha que lidar com a consequência de seus próprios atos, mesmo que o medo se aflorasse cada vez mais em seu cerne tão debilitado.
Seus demônios nunca foram tão reais como naquele momento.
— Ariella...Não os deixe controla-la. Não deixe-os dominá-la. Você não precisa disso...— vozes arrastadas de dor e sofrimento foram ouvidas pela garota não muito longe de sua posição.
Scarlett tremeu ao ouvir aquela voz, sabendo que pertencia a sua primeira vítima de todos os tempos: Phillip. Ela queria tirá-lo imediatamente, poder livrá-lo de toda aquela agonia, mas algo dentro de si não concordava com o ato e simplesmente lhe disse "não". Algo forte que a dominava gradativamente, impedindo-a de se aproximar e ajudá-lo, assim como o resto das vítimas.
Para seu completo horror e desespero, os rostos sem face ganharam a forma de pessoas que ela um dia havia jurado proteger, mas que agora não passavam de corpos carbonizados pela sua fúria, agonizando e suplicando uma piedade nula aos olhos daquela forma humanoide cruel que caminhava entre eles.
Kaellyn, Amara, Joe, Phillip, Elisabeth, Naomi, Dave e Nicholas. Todos eles agonizando lentamente ao redor de Scarlett, suplicando por misericórdia. Mas ela não podia lhes dar isso. Algo forte, repuxava dentro de si, arrancava toda a piedade de seu cerne e consumia seus olhos verdes, transformando-os em duas íris de um azul tão claro que beirava a cor do gelo e sem o mínimo de humanidade. Ela podia sentir a falta do fogo ardente dos céus correndo em suas veias, sendo substituído rapidamente por algo tão gelado e duro que a preencheu dolorosamente e corrompeu todas as suas células, átomos e terminações nervosas; o fogo infernal. Frio e doloroso como era suposto ser.
Apesar de estar com o corpo envolto por chamas, ela sentia-se tão fria quanto uma geleira. Tudo em seu ser gritava morte, dor e destruição.
Scarlett já não era mais a mesma. Travava uma batalha interna em seu próprio cerne, seu inferno contra o seu paraíso; precisava se libertar do tóxico domínio infernal. Libertar aqueles que lhe eram tão importantes e via sofrer através daqueles olhos que ela não reconhecia e não eram seus.
Chorou, se debateu, gritou, mas nada disso fora ouvido em outro lugar que não sua mente confusa. Seu eu físico continuava desumano e sem vida, castigando qualquer um que rastejasse a seus pés. Olhos cor púrpura e sorriso podre observavam com satisfação a garotinha tão frágil acorrentada e impotente dentro de sua própria mente.
Scarlett havia se tornado apenas uma espectadora de sua própria maldade.
Seu eu maléfico lhe dera como um passatempo cruel as imagens de seu massacre. Segundo a segundo, flashes sangrentos da guerra caótica se apossavam de seus pensamentos, como se estivessem em câmera lenta. Ela vira sua ascensão, vira a si mesma escolher o inferno que habitava seu cerne sem se importar com as consequências, escolher libertar todos os demônios do inferno e trazê-los para a terra, dando-lhes total poder para instalar o caos nessa dimensão.
Obviamente, Lúcifer estava no centro de tudo.
Ela gritou ainda mais em seu interior, quando vira a memória de si mesma, caminhando ao lado de Samael e sua beleza cruel, enquanto dizimavam cidades, países e até mesmo o paraíso. Se desesperou ainda mais dolorosamente quando sua própria e catastrófica imagem torturando Mikhael lhe veio à mente; ela o havia matado, torturado cada mísera célula de seu corpo lentamente e exibindo um sorriso satisfatório . E pior de tudo, era que ele havia deixado, e não se cansara em momento algum de dizer o quanto a amava e que tudo ficaria bem quando ela descobrisse seu propósito, quando ela se libertasse completamente. Seu coração – se é que ainda possuía um – sangrou por seu verdadeiro pai naquele momento, por toda a dor que lhe proferiu e não pudera evitar.
Scarlett assistira toda sua jornada sangrenta, tentando encontrar o caminho para tomar controle de seu próprio corpo. Aquela não era ela. Não poderia ser. Mas no fundo ela sempre soube que era capaz de tudo aquilo e muito mais. Seu maior anseio era se libertar da prisão obscura que havia se tornado sua mente e consertar seus erros. Pelo menos, alguma parte deles.
— Ariella, não faça isso. Eu posso te consertar, eu juro que posso. Me escute, meu amor, me escute. Você precisa enfrentar a si mesma. Você precisa vencer essa batalha com as mãos limpas. Eu estou aqui com você. Eu sempre estive aqui com você e sempre estarei aqui. Eu sei que em algum lugar aí dentro você está me ouvindo, então por favor, eu te imploro, seja luz! Seja minha luz, Ariella! — o eco da voz esganiçada de Nicholas fez a adolescente se contorcer de dor, escondida no canto mais escuro de sua mente.
Os demônios que a observavam ali, em posição fetal e sofrendo, gargalharam gloriosos.
Ela podia observar, através dos olhos impiedosos do monstro que habitava seu ser, como o arcanjo estava destruído, como ele estava humano e como ele ansiava que tudo aquilo acabasse. O azul de seus olhos que a adolescente tanto admirava estava sem vida e toda a imponência que o arcanjo sempre transmitia havia se evaporado, deixando apenas a dor sendo jorrada de todos os seus poros e a súplica subliminar no fundo de suas íris. Naquele momento, enquanto observava aquela cena cortante, proporcionada pelo seu eu cruel, lágrimas dolorosas escorriam por seu rosto e então ela pôde finalmente afirmar para si mesma o quanto o amava e o quanto a destruía vê-lo ali sofrendo e não poder dizer-lhe tudo o que sentia, não poder salvá-lo da agonia e da morte certa.
Estava sendo torturada por si mesma.
— Mate-o, filha. Este imundo me desonrou. Escolheu o paraíso, ao invés de me seguir. Ele é um amaldiçoado. Indigno de nossa soberania. Mate-o, Scarlett. Agora. — O príncipe das trevas ordenou, cruelmente.
Pena a pena, as antes tão majestosas asas do arcanjo estavam sendo arrancadas de suas costas, onde ele sangrava e sangrava sem parar; os caídos que concluíam o trabalho pareciam extremamente felizes em o fazê-lo.
Ela nunca imaginara que fosse possível ver Nikki sofrendo daquela forma e agora mais do que nunca ansiava poder diminuir toda a dor contida em seus olhos.
Meu amor, meu amor.
Scarlett queria lutar por aquilo, mas também por todos os outros que amava e não conseguia ajudar. Ela nunca havia sido capaz de dizer realmente o que sentia pelo arcanjo, o que ele a fazia sentir sempre que se encontravam e essa fora motivação suficiente para que ela não desistisse.
A mesma mão que um dia havia servido para matar criminosos asquerosos, agora, naquele mundo pós apocalíptico, se erguia diante daquele que tinha tanto espaço em seu coração, empunhando a grande espada, pronta para matá-lo de uma vez. Ultrajante. Ela não era Deus, nem perto disso, mas uma parte de si se sentia como se fosse a dona do mundo que queimava sob seus pés.
Nicholas fechou os olhos, orando uma última vez para um criador tão longe. E Samael sorriu apreciando seu sofrimento.
Observando aquela cena como uma mera espectadora de seus próprios atos destrutivos, Ariella despertou. Disse não ao seu eu maligno e começou a se impor mais uma vez. Uma última vez. Uma última tentativa de consertar seus erros e de salvar aqueles que amava.
— Eu quero sentir! — ela gritou no fundo de sua mente.
As paredes escuras de seu confinamento estremeceram; tamanha fora a potência de sua voz se fazendo ouvir.
— Eu quero amar! — mais forte. Uma das correntes que rodeavam seu pulso se rompeu.
Seus demônios se afastaram, assustados.
— Eu quero salvá-los! — ela se impôs novamente, abalando todas as estruturas de seu ser.
Do lado de fora, era possível notar o olhar cruel vacilando, deixando uma brecha para seu verdadeiro eu se libertar.
— Eu não sou um monstro. Eu não tenho medo de quem eu sou e sei que posso lidar com isso. — determinada, ela se levantou.
No mesmo instante em que ceifaria a vida de Nicholas, ela se libertou. O gelo infernal em sua íris novamente deu lugar ao verde tão determinado que sempre lhe compunha. Ariella havia finalmente tomado o controle de todo seu ser, mas o mundo ainda estava um caos, e ela iria pôr um fim a isso. Pelo canto do olho notou Lúcifer furioso, correndo em sua direção, assim como a horda de demônios e caídos que o idolatravam.
Só restava uma coisa a ser feita. Aquele gesto tinha nome e um objetivo muito maior do que qualquer um ali pudesse entender.
— Eu sinto muito. — sussurrou culposamente, não apenas para o arcanjo debilitado que a encarava aflito e suplicante, mas também para todos aqueles que ela amava e assistiam o mundo ruir sob sua ira.
A espada que tiraria a vida das pessoas que um dia jurou proteger, girou no sentido oposto, como uma roda da fortuna invertida, selando o destino de todos quando ela cravou a lâmina brilhante no centro de seu próprio peito, rasgando sua própria carne desumana, no mesmo instante em que era agarrada por Lúcifer nas costas.
A espada os transpassou; cortante e certeira em ceifar a vida daqueles que haviam trazido o inferno a terra.
Naquele momento todo o caos se dissipou, o sangue e os corpos sumiram, os demônios viraram pó e os caídos foram aprisionados, ao mesmo tempo em que Ariella caía de joelhos no chão, acompanhada pelo corpo inerte da estrela da manhã, enquanto ambos de olhos vazios e sem vida caíam no esquecimento.
Scarlett abriu os olhos com um pouco de dificuldade e respiração irregular. Felizmente para seu total alívio, a paisagem que a cercava era imponente floresta amazônica. Levou a mão ao peito, apenas para constatar sua vitalidade, antes de lidar com o problema que ela sabia que estaria a sua frente.
O dia começava a amanhecer na floresta. Fortes raios solares infiltravam-se através das copas das árvores, iluminando todo o local. Mas o fato de que estava claro, não diminuía a realidade; o demônio maior ainda estava ali.
— Maldita criança! Como conseguiu sobreviver? Isso não é possível. Não era pra ser assim. — Timortis gritava furioso, enquanto tentava falhamente se recompor.
Sua forma humanoide estava em chamas. A carne podre que compunha seu ser despencava pedaço por pedaço enquanto carbonizava rapidamente.
Eram chamas douradas e potentes do mais puro fogo celestial que corria nas veias daquela que o havia feito entrar em combustão, apenas sendo forte o suficiente para sobreviver ao tão doloroso teste; seu maior medo.
Timortis estava desacreditado. Durante milhares de anos havia matado tantos outros humanos e não-humanos com aquela mesma prática: viajar no subconsciente de suas mentes frágeis, colocando-os frente a frente com seus maiores medos. Era paticamente impossível que alguém pudesse escapar de uma emboscada como aquela, mas ali estava ele, em chamas e presenciando o inacreditável. A garota a tão poucos passos de sua presença catastroficamente demoníaca não apresentava nada mais que uma respiração irregular e um olhar determinado sobre ele; uma mistura de alívio e um ódio primitivo. O demônio sempre soube que a garotinha dos céus era diferente, só não imaginava que fosse tão corajosa mesmo antes de sua ascensão.
Enquanto o demônio maior tentava evitar ser consumido pelo fogo dos céus, a adolescente alcançou sua adaga celestial rodopiando o objeto calmamente entre seus dedos e caminhou lentamente até a figura maligna criadora de seus maiores tormentos. O pesadelo de anos acabava ali.
— Eu descobri meu propósito e o que preciso fazer para concluí-lo. E acredite, eu posso lidar com isso. — seu olhar sobre a criatura era impetuoso, carregado de uma coragem descomunal recém descoberta.
Era real, ela estava enfrentando seu maior medo e a única coisa que conseguia sentir era coragem e um orgulho legítimo de si mesma. Uma parte de si queria que alguém estivesse presenciando aquele passo tão importante em sua existência.
Eu queria que você estivesse aqui, Pai. Ela confessou no silêncio de sua mente. Não chamava pelo pai de seus pesadelos, mas sim pelo responsável por dar-lhe a vida; Mikhael. Duvidava muito que ele fosse ouvi-la, onde quer que estivesse agora, mas a esperança de que um dia o encontraria continuava florescendo dentro do seu peito.
— Você vai se arrepender de escolher aos céus, criança. Você acha que eles são os mocinhos dessa história? Pergunte ao Nicholas. Ou deveria dizer Akriel? Chame-o como preferir, mas a verdade nunca muda. Os mocinhos deixaram de existir há muito tempo e a era da escuridão se ergue gradativamente sobre seus pés. — com a voz esganiçada, o demônio tentou plantar a semente da dúvida na mente da adolescente.
Por um milésimo de segundo, Scarlett vacilou ao ouvir a menção do arcanjo, mas tão rapidamente quanto veio, a dúvida se dissipou parcialmente, apenas o suficiente para que o demônio maior concluísse seu último feito naquela terra que ele tanto repudiava; a semente da discórdia estava plantada.
— O único lado que eu escolho é o meu e daqueles que amo. Vá para o inferno, Timortis. — com uma fúria contida e um golpe certeiro, Heavenly Feuer brilhava quando transpassou a figura maligna em chamas.
Timortis gritou, uma última vez, algo inconclusivo; sua última praga. Scarlett não compreendeu, apenas apreciou sua carne podre se transformar em um montante de poeira negra no solo amazônico.
Na lâmina coberta de líquido negro e viscoso, a filha do fogo celestial observou seu reflexo. Havia algo diferente em seus olhos e não era apenas o fato de que o verde era quase inexistente em suas íris. Havia coragem e um sentimento de obrigação preenchendo seu cerne; o dever de salvar os seus.
Estava chegando a hora e com ela viria a responsabilidade da tão dolorosa mudança. Ela sabia disso, mas não poderia evitar, não queria evitar. Não após ter enfrentado seu medo. Scarlett precisava ascender.
— Scarlett! Scarlett!
A adolescente foi tirada de seus devaneios quando a voz familiar de Joe preencheu sua audição atenta. Enquanto ele corria desesperado até ela sozinho e com apenas o arco celeste em mãos, ela soube que algo estava errado.
Imediatamente tratou de limpar a lâmina da adaga na manga da sua jaqueta, para evitar questionamentos. Jamais contaria ao irmão o que tinha passado naquele período em que estavam separados. Aquele era seu fardo e ela o carregaria sozinha pelo tempo que precisasse.
— Joe, respira fundo. O que aconteceu? — ela segurou nos ombros do menino enquanto ele parecia ter dificuldades em normalizar sua respiração.
De segundo em segundo, ele olhava para trás, como se temesse estar sendo seguido. Scarlett engoliu em seco, esperando o pior.
— Eu...Eu...Preciso de água. — O nephilim tremia, enquanto sustentava o peso de seu corpo em seus próprios joelhos.
Scarlett rapidamente alcançou sua mochila jogada no chão não muito longe e levou a garrafa de água até as mãos do irmão. Estava apreensiva enquanto esperava que ele ingerisse todo o conteúdo para começar a falar.
— Joe, por favor, o que aconteceu?
O nephilim olhou para trás mais uma vez antes de engolir em seco e se pronunciar:
— Ele foi...capturado, Scarlett. Eu sinto muito, eu não consegui evitar. Eu não pude ajudá-lo e eles capturaram-no. Eu sei disso porque não foi de forma amigável e a culpa é toda minha. — o desespero na voz do nephilim era tamanho que atordoada, Scarlett simplesmente o abraçou forte enquanto tentava assimilar as palavras do irmão.
— Você os viu? Quem levou Nicholas? — indagou com medo da resposta.
O nephilim prontamente assentiu.
— Os anjos. Muitos anjos, Scarlett. — Scarlett congelou mais uma vez, com aquela menção. — Eu sei porque eles emitem vibrações fortes. — explicou.
Scarlett se afastou do irmão e começou a andar em círculos, pensando em seu próximo passo; tamanha era sua ansiedade. Ela não entendia porque eles simplesmente levariam-no. Sua missão não era ajudar a filha fogo celestial? Evitar uma guerra apocalíptica? Alguma coisa não se encaixava naquele quebra cabeça.
— Você ouviu algo? Eles disseram algo quando capturaram-no? — questionou, estrategicamente. Precisava entender o que levaria os anjos a virem a terra simplesmente para capturar um dos seus.
— Não, eu não entendia a língua em que eles conversavam. Mas Nicholas me viu, antes que eu saísse correndo de lá e me mandou dar-lhe um recado.
— E então? — a expectativa da adolescente era quase palpável.
O nephilim pareceu pensativo por alguns segundos.
— "Em hipótese alguma, ascenda. Isso não é um conselho, Ariella. É um pedido desesperado. Eles vão tentar de tudo para ter você, mas não ascenda. Não permita que eles cheguem aos seus. Salve a si mesma e quem você ama o mais rápido que puder. Fuja! Eu te encontrarei assim que possível no nosso lugar." — Joe recitou arduamente cada palavra proferida pelo arcanjo através de seu pensamento.
Scarlett engoliu em seco. Por que ele lhe pedia para não ascender quando era exatamente isso que ela sabia que precisava fazer? Por um momento, chegou a pensar que Nicholas fosse egoísta, que não seria capaz de lidar com todo seu poder, mas a realidade era ainda mais cruel. Ele a havia abandonado quando disse que sempre estaria ao seu lado. Era um fato que fora contra sua vontade, mas ainda assim, doía e muito.
— O que nós fazemos agora? — a voz apreensiva de Joe afastou os pensamentos da jovem e ela se permitiu voltar a focar no que realmente era relevante no momento.
Salvar os seus. Mesmo que para isso, ela precisasse ascender. Nicholas não fazia ideia do que a garota tinha passado nas últimas horas para querer exigir algo. Seguir seu "pedido", mesmo que fosse desesperado, estava fora de cogitação.
— Agora nós salvamos nossos amigos. — determinada, ela alcançou sua mochila e começou a retroceder seu caminho em direção à saída da imponente floresta amazônica.
Não precisou olhar para trás para ter certeza de que Joe a seguia, pois sabia que sim.
Em sua mente agora tão clara, apenas um pensamento se fazia presente; estava na hora de um segundo encontro com Astrid.
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E aí, algum palpite do que vai acontecer a partir de agora?
Lembrem-se de que estamos na reta final e TUDO pode acontecer. Fiquem espertos!
Beijinhos e que Scarlett esteja sempre a seu favor. ❤️
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