Capítulo 18
2757 Palavras
Em meio a um ritmo lento, nos aproximamos do restaurante onde todos nos aguardam. Pelo que vejo a primeiro momento, esse lugar é bem amplo, tanto na parte interna quanto externa.
O espaço social interno transmite uma sensação de conforto e simplicidade bem grande, bem arejado graças a presença de pouquíssimas paredes. A única parede é larga, contendo estantes adornadas com plantas criando um visual harmônico, e tendo diversos vinhos expostos em seu interior.
O espaço externo conta com duas áreas diferentes. A primeira sendo no deque do restaurante, com vista para um grande campo de videiras, tendo ao fundo um galpão onde, acredito eu, devem ser produzidos os vinhos deste restaurante.
A segunda, está espalhada em um jardim que rodeia parte do restaurante, ligado por uma trilha de pedras e vários arcos repletos de plantas trepadeiras e flores, e tendo como vista parte da plantação e também parte do jardim com flores bem cuidadas.
Não vou negar que é um lugar bem relaxante, mas...
Algo aqui me parece muito errado. Não sei ao certo o que, mas algo está errado.
Isso sem contar o fato que atraímos vários olhares assim que colocamos os pés dentro do restaurante.
- Ali estão eles. – Nicole diz de repente, me puxando de leve na direção ao deque sem largar meu braço.
- Acho que não demoramos, eles não tem nada na mesa ainda. – Respondo, olhando para meu braço envolvido com tanta firmeza por ela, e para completar, agora ela também resolveu segurar minha mão. Nem adianta tentar me soltar.
Até tentei romper toda essa proximidade que Nicole tem tentado manter comigo a todo momento, mas toda vez que me afasto, ela dá um jeito de acabar grudando novamente em mim, com ainda mais vontade.
Isso está me incomodando, não gosto de tanta proximidade assim... Pelo menos, não com todo mundo. São pouquíssimas pessoas que tenho confiança de deixar se aproximar de mim, menos ainda quem deixo me tocar ou abraçar.
Já devia ter imposto limites a essa cidadã a muito tempo.
- Chegamos! – Nicole diz animada, já pegando uma cadeira e sentando-se, e logo sento-me bem ao seu lado.
- Mas já? – Sarah questiona com surpresa.
Sento e olho para todos, sem me incluir na conversa – Já, por que? – Nicole questiona, recebendo um cardápio de Mari.
- Porque chegamos não faz nem cinco minutos. – Talita diz, olhando da irmã a mim por algumas vezes – Vocês vieram de jato por acaso?
- Eu disse que tinha meus métodos. – Respondo, tendo a atenção de todos.
- E que métodos são esses? – Sarah questiona me olhando fixamente.
- Sinto muito, isso é segredo de estado. – Respondo com um sorriso e que Nicole corresponde com cumplicidade, e logo olho ao cardápio que ela tem em mãos – Já escolheram algo?
- Ainda não. – Henrique responde – Só demos uma olhada rápida, mas não decidimos nada. Inclusive, estamos esperando mais alguém chegar.
- O Lucca já está perto daqui. – Talita responde, olhando seu celular. – Daqui a pouco ele chega.
- Nossa, esqueci que precisava levar as caixas de roupas para a loja dele. – Sarah responde com uma careta. – Era pra ter levado ontem...
- Ele vai te cobrar por isso, já fique ciente. – Talita responde a mais velha aos risos.
- Quando sairmos daqui do restaurante, podemos passar em casa e já entrego para ele. Acho que vai dar tempo... – Sarah diz pensativa.
- Lucca é o namorado quase marido da Talita, e também sócio da Sarah. – Nicole me sussurra discretamente. – Enquanto ele administra uma loja aqui e outra em Rezende, minha irmã faz a pesquisa de preços e monitora a confecção de novas peças.
Assinto a olhando de canto – Espera, por que "quase marido"?
- Porque a Talita e ele provavelmente casam esse ano. – Nicole responde, com um tom bem sonhador.
Não leva muito tempo de espera até Lucca chegar. Ele é um rapaz alto, de cabelos loiros bem encaracolados, olhos escuros bem marcantes, muito bem arrumado, e com uma presença leve.
É perceptível como toda a energia que Talita demonstrou até agora se volta totalmente a Lucca. Ele tem toda a atenção dela voltada apenas para si, e vendo a forma como ele é bem amável com ela, faz certo sentido estarem para casar.
Além disso, todos aqui o tratam de uma maneira bem receptiva, tornando cada vez mais claro como gostam dele. A família de Nicole o abraça bastante, e percebo que quase o mesmo acontece se tratando de Henrique.
- O que acham de fazermos nossos pedidos? – Henrique sugere, depois de algum tempo de conversa.
- Tenho uma sugestão. – Lucca diz, apoiando um braço sobre a mesa e passando os olhos por todos – Primeiro quero adivinhar, a ideia de vir especificamente a esse restaurante foi da Mari?
- Acertou, ela quer impressionar nosso visitante. – Talita aponta para mim com um gesto de cabeça.
- Tá bem... Como aqui tem o costume de uma degustação de vinhos, sugiro algo mais introdutório. – Ele se levanta, garantindo a atenção de todos, e com um sorriso carregado de certezas, Lucca continua – Uma tábua de queijos, seguido de macarrão com almôndegas para cada. Isso nos garantirá diversidade de sabores, e o melhor, a degustação de variados vinhos.
- Adorei a ideia, tem meu apoio. – Nicole responde animada.
- Concordo também. Experimentar vários me interessa. – Henrique diz, e tanto ele como Nicole ganham um aceno positivo de Lucca.
- Por mim tudo bem. – Sarah diz, abaixando o cardápio que tinha em mãos.
- O que você tinha dito mais cedo Sarah? – Mari provoca a mais velha com um sorriso travesso no rosto – Só uma taça?
- Se todo mundo vai experimentar vários sabores, eu é que não vou ficar na vontade, né? Não vou ser a chata do passeio. – Sarah rebate o comentário da mais nova tentando conter as próprias risadas.
- Sei, você também quer e não quer dar o braço a torcer, isso sim. – Mari continua provocando a mais velha, causando risos em todos à minha volta.
- Me erra Mari, que saco! – Sarah gargalha sacudindo uma mão.
Henrique chama o garçom e, com todos concordando com a ideia de Lucca, fazemos nossos pedidos, e continuamos com a conversa... Ou melhor, com várias perguntas sobre como São Paulo é.
Sarah é a única da mesa que já visitou a capital algumas vezes, seja a trabalho ou em passeios com o noivo. Ela é uma das mais entusiasmadas em saber minhas opiniões sobre a cidade.
Mesmo com o clima descontraído, as conversas e cada uma das risadas, continuo mantendo em mente o que vim fazer. Em nenhum momento deixei de analisar a todos, seus comportamentos e o que transmitem.
Cada um deles, até então, não demonstrou nada estranho. Cada vez mais tenho a sensação de que são pessoas normais, mas não estou convencido. Por enquanto, tudo continua sendo suspeito.
Discretamente corro meus olhos ao redor, fitando mesas próximas, clientes transitando abaixo do deque, garçons. A primeira vista, nada muito estranho, mas sempre que vejo, parece ter alguém olhando em nossa direção.
Nosso primeiro prato chega, três tábuas de queijos acompanhados de três vinhos diferentes junto de taças para cada um. Os garçons deixam tudo habilmente sobre a mesa, e unindo um sorriso a um aceno com a cabeça, afastam-se tão rápido quanto chegaram.
Nesse instante, decido deixar meus pensamentos de lado e focar na degustação, pelo menos por enquanto. Sei que não preciso mais me alimentar, mas ainda posso experimentar alguns pratos de vez em quando, e por via das dúvidas, é sempre bom manter as aparências.
Lucca se dispõe a abrir os vinhos e servir cada um, enquanto que Talita faz indicações de por onde devemos começar para fazer a combinação certa de sabores. Por não ser um conhecedor, apenas sigo as instruções ditas.
A todo momento Mari segue brincando com Sarah sobre os vinhos, Talita e Nicole acompanham as irmãs aos risos, enquanto que Henrique e Lucca conversam animados sobre as lojas e como as coisas estão fluindo.
De repente escuto alguns passos pesados bem perto de nós, mas simplesmente ignoro a princípio, porém reparo como eles ficam cada vez mais próximos, até atrair a atenção de cada um na mesa.
- Nicole, podemos conversar por um momento? – Ouço uma voz familiar atrás de mim. Devagar olho sobre o ombro, vendo Jackson parado, com os braços cruzados, tendo uma expressão fechada.
A garota olha pasma para mim, e logo em seguida para cada um da mesa. Mesmo assim, ela se levanta – Claro, precisa ser em particular? – Responde com um sorriso e voz seca.
- Preferencialmente, por favor. – Ele responde, e Nicole assentindo, Nicole passa por ele, e o rapaz segue com ela para fora do restaurante.
Assim que saem da nossa vista, Sarah passa uma mão pela testa – Essa Nicole... Isso não vai dar certo.
- Agora que Nicole não está aqui, posso perguntar. – Digo, pescando um dos queijos com um palito e o fitando por um momento – Aquele é o namorado dela, não é?
Nenhum deles me responde a princípio, até que encaro Mari fixamente. Ela é a única a qual sei a opinião a respeito de Jackson, e também é quem eu imagino que me dará uma resposta válida.
- Não exatamente o namorado... – Mari começa a falar, deixando sua taça sobre a mesa e me olhando – Mas os dois já tem um envolvimento que dura muito tempo.
Apoio o queixo na mão, atento em cada palavra – Continue.
- Eles já estão juntos desde a adolescência. – Ergo uma sobrancelha, já que Mari disse fazendo aspas ao dizer "juntos". – Os dois são cheios de idas e vindas. Um mês estão juntos, e no outro separados.
Aliás, um detalhe acabou de chamar minha atenção. Eles estão juntos desde a adolescência? Mas... A família dela não chegou na cidade a pouco tempo?
Mal começaram a falar, e já sei que tem alguma coisa errada nessa história.
- É complicado até pra gente entender eles. – Talita diz num suspiro – Da última vez que esse assunto surgiu, ela disse que estava namorando sério com Jackson.
- E quando foi a última vez? – Fito Talita de canto de olho.
- Já faz cinco meses, não é? – Mari questiona a Henrique.
Ele confirma com a cabeça – Mais ou menos isso. Quando Jackson me contou que os dois tinham se acertado, foi na mesma semana que o Lucca e a Talita voltaram daquela semana lá em Paraty.
- Quando tiramos férias, verdade... – Lucca assente de leve com a cabeça – Se me lembro bem, ele também veio falar comigo pouco depois disso.
- É, por ai... Já faz uns cinco meses que assumiram o namoro. – Talita continua, sacudindo uma das mãos – De lá pra cá, não teve mais problemas, e ela ficou firme com o Jackson. Não falava mais de outras pessoas, estava satisfeita, parecia que os dois realmente se acertaram em definitivo, até que...
- Até que...? – Questiono.
- Até que você apareceu. – Mari responde me encarando.
Aiaiai, e essa agora...
A mais nova das irmãs respira fundo, pegando sua taça e dando um longo gole, a devolvendo vazia para a mesa – Do nada, ela chegou em casa falando sobre um estranho que queria comprar o quadro encomendado dela.
- Espera um pouco, o cara da história do quadro era você? – Sarah pergunta, me olhando com as sobrancelhas no alto. Apenas confirmo. – Nossa...
- Tá, mas até então eu não sabia, só havia gostado do quadro e quis comprar. Quando a Nicole apareceu falando que era dela, escolhi outro. – Me encosto na cadeira e cruzo os braços – Não fiz nada para tentar chamar a atenção dela.
- Mas nossa irmã é assim. – Mari volta a falar – Eu não sei o que acontece que ela apaixona tão fácil. Quando ela chegou nos falando de você com toda aquela animação, já tinha entendido que começaria tudo de novo.
- E é sempre com alguém de fora... – Talita suspira, mas ela parece ter dito isso mais para Lucca do que para nós.
- Mas como são pessoas de longe, isso eventualmente passa, não é? – Respondo já cogitando o óbvio. – O mesmo acontecerá quando eu for embora.
- Nicole sempre gostou de se divertir. – Sarah fala com o olhar fixo na taça em sua mão. Ela a move de forma circular algumas vezes, dando um gole devagar, e logo abaixando a taça e a descansando sobre sua perna – Ela vê nos turistas uma oportunidade de se entreter com algo novo... Sempre foi assim.
Penso por um instante, refletindo sobre o que ouvi – Se isso acontece sempre, significa que sou apenas mais um na lista de interesses passageiros da Nicole... De certa maneira, não sou nada mais que um entretenimento para ela.
Uma boa parte de mim fica extremamente aliviado por saber disso... Já outra parte, por algum motivo, fica incomodada.
- Eu não sei, tem alguma coisa diferente dessa vez. – Mari diz num sussurro.
- Nunca conhecemos nenhum dos interesses da Nicole antes. Ela sempre contava as histórias e mostrava fotos das pessoas depois que elas foram embora... Conheço praticamente todos os rolos da Nicole, mas nunca conheci nenhum deles. – Sarah abaixa o olhar por um instante, e volta a me olhar – E você é o primeiro que ela nos apresenta. Ela está olhando pra você de um jeito muito diferente o tempo todo. De alguma forma, você é especial para Nicole.
- A sabedoria da mais velha... – Talita ironiza.
- Eu conheço muito bem cada uma das minhas irmãs... E a única que conhece vocês melhor do que eu, é a mãe. Você sabe disso. – Sarah rebate o comentário, deixando a taça de volta sobre a mesa.
- Só uma pergunta... – Henrique começa a falar, atraindo toda a atenção para si – Sou só eu, ou mais alguém está achando a conversa da Nicole demorada?
- Não tenho tanta certeza Henrique, os dois saíram faz poucos minutos... Mesmo assim, irei lá ver como que está indo essa conversa... – Sarah diz já se levantando, e por um segundo seu olhar vem a mim.
- Eu vou com você... – Digo preguiçosamente, já me colocando de pé e seguindo pela mesma direção que Nicole seguiu com o até então namorado.
Nos afastamos da mesa em passos largos, quando Sarah me para segurando meu braço. – Só quero saber uma coisa, você tem alguma intenção com minha irmã?
- Ela não me interessa em nada mais do que uma amizade. Minha vida é muito conturbada e tenho coisas demais para lidar, por isso me envolver com alguém está fora de cogitação. – Respondo de imediato, e Sarah me solta. – E não estou afim de perder meu tempo atrasando relações alheias.
Não sei se ela acreditou no que eu disse, mas parece ter aceitado a primeiro momento, já que voltou a caminhar para a saída do restaurante em passos largos, e torno a segui-la.
- ... E você tem que entender de uma vez por todas, nós não temos nada sério Jackson. – Escuto Nicole falando em um tom pouco amigável, e Sarah ergue a mão de leve sinalizando para pararmos de andar.
Pelo que ouvi, tenho esperança que ela esteja se referindo a mim.
- Como não Nicole? Até ontem estávamos namorando, estava indo tudo bem entre a gente, e de repente você muda comigo... – E minha esperança acabou de ir pelo ralo, como sempre. Nem sei porque ainda tento.
- Sim Jackson, eu cansei. Não quero mais. – Nicole diz bufando.
- Me explica como uma pessoa se cansa da outra, literalmente, de um dia para o outro, porque eu não estou entendendo. – Ouço ele questionar.
- Acontece ué, uma hora a gente acorda, cansa e simplesmente não quer mais, assim, estalando o dedo... E você tem que entender e aceitar isso. – Nicole diz simplesmente.
Sarah e eu trocamos um olhar ao ouvir o desenrolar da conversa, quando por fim avançamos nos revelando aos dois.
Jackson caminha devagar de um lado ao outro, passando uma mão nervosamente pela testa. Já Nicole, está encostada ao lado da porta mantendo seus braços cruzados e uma feição fechada. Os dois nos percebem quase ao mesmo tempo.
O rapaz me olha, e com a decepção tomando conta de seu rosto, volta sua atenção para Nicole – Tudo bem, eu entendi... – Ele diz.
- Você já estava demorando. – Sarah diz, medindo as palavras. – Está tudo bem?
- Está sim, não se preocupe. – Nicole se volta para o rapaz que está atônito. – Já terminamos por aqui e ele está indo embora... Não é Jackson?
- Sim, já vi e ouvi o suficiente... Só quero te pedir uma coisa Nicole. – Jackson solta um suspiro – Não volte a me procurar, estou farto disso.
Dito isso, o rapaz vira-se e vai embora sem olhar para trás por nenhuma vez. Encaro Nicole de soslaio, que permanece impassível diante do que o seu agora ex acabou de dizer, e torna a entrar no restaurante, acompanhada de Sarah.
Permaneço onde estou por mais algum tempo, acompanhando Jackson até que ele entre em um carro e vá embora, e só então retorno para a mesa.
O lado ruim disso tudo, é que com certeza, essa história toda ainda não acabou.
O lado bom disso tudo, é que com certeza, hoje terei muito assunto com minha irmã.
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