Capítulo 15
2845 Palavras
Após alguns minutos descemos do ônibus, e seguimos em direção a uma esquina. Nicole está checando seu celular por mais uma vez, logo passando os olhos ao redor, parecendo procurar por alguma coisa.
Quando estou para perguntar o que ela está procurando, a garota acena para alguém logo à frente. Vejo uma grande caminhonete parando na esquina, sendo Henrique quem a dirige.
- Consegui uma carona para nós. – Nicole diz em meio a risos.
- É, estou vendo. – Responder isso foi a única coisa que me passou em mente.
O rapaz faz um gesto para entrarmos, e assim fazemos. Sem perder nenhum segundo, ele acelera e manobra a caminhonete de volta pelo caminho de onde surgiu, com uma velocidade e facilidade tão grande que eu não imaginava ser possível com um veículo desse tamanho.
- Obrigada por nos dar essa ajuda, Henrique. – Nicole comenta de repente.
O rapaz nos olha pelo retrovisor – Não precisa agradecer, já estávamos por lá mesmo.
- Então todas já chegaram? – Ela questiona e a olho com uma sobrancelha erguida.
- Já sim, vocês são os últimos. – Os últimos? Do que eles estão falando? Antes que possa pensar sobre isso, ouço Henrique soltando uma risada e nos olhando sobre o ombro – Fala a verdade Nicole, você fez de propósito, não é?
- Está tão óbvio assim? – Henrique assente com a cabeça, tornando a olhar para frente. Apesar da rua ser muito bem asfaltada, é tanta vegetação fechada que ele está dirigindo em baixa velocidade. – Tá bem, foi de propósito sim.
- Imaginei. – Os dois trocam risos em cumplicidade. – Faz sentido serem os últimos.
Nicole me olha e num sussurro junto a um gesto com as mãos, diz que depois me explica. Com uma sobrancelha erguida, acabo concordando, e me distraio com algumas placas improvisadas nas beiradas da estrada.
Diferente do que imaginei, não demoramos muito para chegar. O tal santuário tem um sítio como entrada, e apesar de ser de manhã, já tem algum movimento.
Descemos da caminhonete sem demora, e Henrique nos diz que irá encontrar uma vaga e logo irá nos encontrar.
Ele parte, enquanto que observo Nicole já seguindo na frente – Espere!
A garota me olha sobre o ombro, e novamente enxergo a semelhança que me deixa momentaneamente desorientado. Por que essa semelhança continua me abalando tanto? Já tá ficando ridículo! Foco! Mantenha o foco! – Algum problema?
- Não está esquecendo de nada? – Me aproximo com os olhos cerrados.
- Com certeza não, você já vai entender. – Ela envolve meu braço e me puxa para acompanhá-la, sem me dar opções de resistir.
Não gosto disso. Toda essa proximidade me incomoda, mas nem adianta tentar me soltar, já que ela segura meu braço com firmeza.
Apesar que isso dura muito pouco. Mesmo não me soltando, a garota pelo menos me dá algum espaço, para meu alívio. Nicole está me levando para um grupo com três garotas, onde reconheço apenas Mari.
Olhando melhor, noto uma grande semelhança entre todas elas. Será que...
- Olha só quem chegou. – A mais alta delas diz nos olhando.
- Esse é o "rapaz sem-nome" que nos comentou? – Outra diz, me olhando de cima a baixo com um sorriso nada discreto.
- Sim, ele mesmo. – Nicole responde – Vou te apresentar, essas são Sarah e Talita, minhas irmãs mais velhas.
Sarah é a mais alta, e também quem possui o semblante mais calmo dentre as quatro irmãs, e algo em sua presença deixa claro que ela é a mais velha. Sua principal diferença é que seus olhos são profundamente escuros, os lábios mais finos, e a única de cabelo preto liso entre elas.
Já Talita é a mais baixa dentre elas, e também parecendo ser a mais energética. Ela tem olhos no mesmo tom de Nicole, mas os cabelos sendo pouco ondulados e com um castanho bem escuro.
Elas são quase cópias umas das outras.
- Nicole nos disse que veio de São Paulo... – Talita começa, continuando a me olhar, claramente analisando cada pequeno detalhe meu – O que está achando daqui?
- Um lugar calmo e agradável, sem dúvidas. – Faço um gesto positivo com a cabeça, enquanto olho ao redor com um pequeno sorriso – E quanto mais vejo, melhor fica.
- Até quando pretende ficar? – Sarah diz em seu tom calmo e um sorriso amigável.
- Ainda não sei. – Ergo os ombros levemente – O planejado inicial era ficar apenas por um fim de semana, mas decidimos estender pelo tempo necessário para relaxarmos.
- "Decidimos"? Veio com alguém? – Sarah cerra o olhar.
- Sim, estou em viagem com minha irmã. – Olho para Mari, que até o momento permaneceu calada, e tem sua atenção voltada a algo que não sei o que é.
- Ela não quis vir? – Talita finalmente parou de me avaliar tanto, pelo menos por hora, e está me olhando nos olhos.
- Minha irmã preferiu tirar a manhã para descansar... Desde que chegamos, estávamos indo de um lado ao outro para conhecer tudo das vilas. Não tiramos um único dia para descansar de verdade. – Levo as mãos aos bolsos, tentando escapar dos três pares de olhos voltados a mim – Em compensação, pretendo tirar muitas fotos e mostrar a ela mais tarde.
Um a um, os olhares das mulheres se voltam a alguém, e percebo se tratar de Henrique, que se aproxima em passos apressados. – Desculpem a demora.
- Não demorou nada. – Mari finalmente se pronuncia, abraçando seu namorado de lado – Vamos? Logo o santuário ficará bem movimentado.
- Verdade, já estamos todos aqui, então não vamos perder tempo. – Sarah demonstra certa animação em sua voz, gesticulando para todos irmos logo atrás dela. – Aliás Talita, o Lucca confirmou se vai vir?
- Agora cedo não. – A irmã responde – Ele vai precisar ir até Rezende agora cedo para fazer algumas compras, e lá pela hora do almoço ele virá me encontrar.
- Almoço de casal? – Nicole pergunta aos risos divertidos, logo compartilhado por todas as suas irmãs.
- Não, hoje não. Nós vamos almoçar com todos. – Talita responde animada.
Todos começam a andar, e me permito seguir o ritmo ditado por Sarah. Fito Nicole de soslaio, e é possível ver como ela está radiante. É inacreditável como apenas olhar para ela me causa uma sensação estranha no estômago.
Quando dou por mim, estou segurando a mão de Nicole, e nós paramos nosso caminhar de imediato. Seus olhos estão voltados para mim, e enxergo perfeitamente uma interrogação surgindo em seu rosto surpreso.
Não a julgo... Esse gesto foi uma surpresa até mesmo para mim.
Não posso me permitir distrair com sensações como essas, por mais que revivam certas coisas dentro de mim... Preciso manter meu foco no que vim fazer aqui.
E agora, como fazer isso de forma convincente?
Vamos lá, pense em alguma coisa.
- Vamos deixar com que eles sigam na frente... – Sussurro bem próximo.
Nicole me olha levemente surpresa, mesmo assim assente tendo um sorriso no rosto, e nós dois deixamos que tomem uma certa distância. Por fim quando estamos longe o bastante, tornamos a andar.
- E por que isso mesmo? – Ela murmura, me olhando num sorriso travesso.
- Bem... – Paro de falar ao ser confrontado por esse olhar tão intenso. Aiaiai, que situação é essa que estou me enfiando cada vez mais? – Digamos que... Eu... Eu quero passar um tempo a mais com você.
Por um segundo, tenho a impressão de ver o semblante de Nicole se iluminar com minhas palavras.
Espero não me arrepender por isso.
- Você me convidou, então... né? – Ergo os ombros, tentando justificar essa circunstância tão maluca que acabei criando. – Acredito que essa pode ser uma boa oportunidade para conversarmos melhor, não concorda?
- Concordo sem nem precisar pensar muito. – Responde, envolvendo meu braço e se aproximando bem de mim. Mais uma vez tento me soltar dela sacudindo meu braço, porém de nada adianta.
Ok, estou começando a achar que essa foi uma péssima ideia.
- Escuta, isso não vai te causar problemas com o tal Jackson? – Questiono virando o rosto de lado.
- Isso te incomoda? – Questiona.
- Sim, um pouco... Na verdade, também penso que pode te causar problemas. – Vou olhando ao redor, enquanto vamos entrando na trilha – Mari já falou sobre ele uma vez, e quando estávamos naquele rancho ontem, notei que vocês pareciam bem próximos.
- Não precisa se preocupar com isso. – Me responde tranquila. – Não tenho nada sério com ele. É apenas um lance... Minhas irmãs acham que namoro ele.
Aperto os olhos por um instante – E nunca tentou nada com ele?
- Não vou mentir, já tentamos algumas vezes... – Nicole suspira – Mas não deu certo, nós não somos compatíveis. Decidimos ficar na amizade.
- E pelo visto, o carinho entre vocês permaneceu. – Digo esticando o braço e passando os dedos pelas folhas mais próximas.
- Não terminamos com mentiras e ressentimentos, por isso permaneceu. – Nicole exibe um sorriso sincero no rosto – Diferente de muitos por aí, não somos inimigos vestindo sorrisos falsos e fingindo se importar um com o outro.
- Se continuarem nesse ritmo, vão acabar ficando para trás. – Ouço a voz de Talita, e percebo os olhares de todos voltados a nós.
- Sabem que podem ir na frente, não é? – Nicole rebate aos risos. – Se ficarmos muito para trás, podemos alcançar vocês depois.
- Definitivamente não. – Mari é quem diz, nos olhando com certa cautela – Muito melhor se estivermos juntos. Evita de nos perdermos.
- É uma trilha. – Nicole insiste. – Só tem como se perder se sairmos da trilha.
- Nos perdermos uns dos outros. – Mari rebate nos olhando sobre o ombro. – Imagina a chatice para nos encontrarmos depois?
- É só seguirmos o mesmo caminho que uma hora nos encontramos. – Nicole devolve o argumento outra vez. – Se alguém ficar muito na frente, é só parar pra esperar.
- E se alguém ficar muito pra trás, o grupo todo vai precisar parar pra esperar? – Mari continua firme com seu ponto.
- É obvio que não, é só seguirem na frente. Uma hora a gente se encontra. – Nicole continua tentando, mas a irmã parece bem decidida a não ceder.
- Tá legal vocês duas, já deu! – Sarah repreende ambas – Inclusive, se todo o problema é esse, então vamos ficar todos juntos. É mais fácil desse jeito.
As duas irmãs concordam com a cabeça e aquietam a seguir. Mari nos olha sobre o ombro por alguns instantes, mas não diz nada.
- Sempre você, hein Mari? – Nicole sussurra fechando a cara, e num gesto puramente automático, acabo afagando seu cabelo levemente tentando acalmá-la. Mais um dos gestos que eu costumava ter antes...
A partir daí, Nicole acaba se calando. Seu olhar é fixo para frente e mantém uma expressão dura, mas em nenhum momento ela faz menção de me soltar. Em contrapartida, suas irmãs conversam sem parar.
Dou mais atenção aos sons da natureza ao redor, ao longe posso ouvir bem o som da água, indicando a presença da primeira das várias cachoeiras logo a frente. Algumas pessoas estão espalhadas, dedicando suas atenções para o lugar.
Nicole se desprende de mim e, em passos lentos, vai se afastando de nós. Por um lado agradeço por finalmente estar livre, já por outro, vou a acompanhando com o olhar, refletindo como ela se calou e principalmente, pensando se devo ou não falar qualquer coisa que seja.
Percebo uma presença se aproximando, e logo então alguém para ao meu lado, ali permanecendo – Ela ficou quieta de repente.
- É... – Respondo olhando Mari de canto.
Um curto momento se passa sem que nenhum de nós se pronuncie, mas é tempo mais que suficiente para que o clima fique estranho, afinal foi ontem que ouvi o que Mari pensa a meu respeito.
- Sei que exagerei, e fui dura sobre você. – Ela começa a falar de repente – Mas como irmão mais velho, acho que você deve entender meu lado.
Encaro a garota, curioso em como esse assunto vai se desenrolar. – Por tudo que escutei ontem, tenho minhas dúvidas sobre qual seja seu ponto.
- Minha irmã mais nova se interessando por alguém que nem daqui é, e que não sabemos nada. – Mari vira-se para mim, com os braços cruzados – E vamos concordar, você não tem a melhor das aparências, nem passa a menor confiança, você é estranho... Estou preocupada com o bem estar da minha irmã caçula desmiolada com alguém tão estranho, esse é meu ponto.
- Certo... – Deixo um sorriso escapar – Sendo esse seu ponto então sim, a entendo muito bem. Penso o mesmo em relação a minha irmã... Mas pode ser sincera, você não gostou nenhum pouco de mim.
- Não, não gostei mesmo. – Ela me encara, e solta um suspiro – Mas... Decidi em dar uma chance.
Levo as mãos aos bolsos – E o que te fez dar essa chance?
- Não sei, mas quis fazer isso. Pareceu o mais certo... – Balanço a cabeça em concordância – Pode falar com ela?
- Sim, deixa comigo. – Murmuro a olhando de canto de olho e já me afastando.
Agora, o que falar é uma outra história... Terei que improvisar alguma coisa.
Meus passos são cautelosos, e conforme me aproximo, mais uma vez minha mente divaga. Sei que são pessoas diferentes, mas mesmo assim tamanha semelhança mexe comigo, cada vez mais me lembra aquela pessoa...
Talvez essa semelhança esteja fazendo com que eu me afeiçoe demais a essa garota.
Tenho que parar de pensar nisso o quanto antes.
Paro ao seu lado, fitando as quedas d'água bem à nossa frente. Levo alguns segundos para finalmente decidir o que falar – Essa é a primeira de quantas?
- O santuário tem mais dezenove dessas cachoeiras. – Me responde, e de sua voz, não consigo identificar nada a princípio.
- São muitas... Será que dará para ver todas hoje? – Questiono.
- Provavelmente não, é um caminho longo... – Responde ainda neutra.
Suspiro erguendo a cabeça, fitando os ramos das árvores acima de nós enquanto o som da água inunda meus pensamentos – Não fique irritada... Sua irmã só está preocupada com você.
- Às vezes ela parece que quer estragar meu dia... Todas elas... – Volto minha atenção a ela. Nicole está com o olhar baixo, acompanhando o ritmo da água no pequeno lago formado abaixo da cachoeira.
- Eu sei... Às vezes, nós mais velhos fazemos isso. Sei que, provavelmente, já fiz o mesmo com minha irmã... Na verdade, coisas assim são irmãos. – Digo com cautela, a olhando fixamente – Algumas vezes fazemos por pirraça, outras vezes não temos a intenção de irritar.
Ela assente em silêncio.
- Não é como se apenas isso fosse estragar seu dia inteiro, não é? – Digo em um novo sussurro, e ela confirma com a cabeça – Não vale a pena levar coisas assim para o pessoal, ainda mais sendo algo tão irrelevante. Dar importância demais vai fazer sua cabeça explodir... Só relaxa e deixa pra lá.
Ela vira para mim, semicerrando seu olhar – Você é sempre assim, tão bom com as palavras?
Arqueio as sobrancelhas e salto os ombros – Nem sempre... Só quando me convém.
Ela cruza seus braços, e me dou por satisfeito ao notar que ela já parece um pouco mais leve que momentos atrás – Sei, e agora esse momento te convém...
- Talvez sim, quem sabe? – Dou um suspiro – Sabe... Também me deixei levar por coisas pequenas antes. Na época levava muitas coisas para o pessoal, me incomodava fácil, tive muitos problemas e perdi muita coisa graças a isso.
- E hoje? – Pergunta curiosa.
- Hoje já não me importo com quase nada. – Ergo os ombros novamente.
- Foi de um extremo ao outro? – Balanço a mão sinalizando um "mais ou menos" como resposta – Não acha que essa pode não ter sido a melhor das escolhas?
- Talvez. Mas costuma funcionar melhor do que antes... – Pouso uma mão levemente em seu ombro – O que quero dizer, é para não se deixar abalar com coisas tão pequenas. Daqui alguns minutos, isso já não fará mais nenhuma diferença...
Sem me olhar, ela aperta um pouco seus lábios, e concorda com a cabeça – Tá bem...
- E também Nicole, este não é seu lugar favorito? – Digo pegando suas mãos e a puxando devagar, ergo seu rosto para que me olhe. Faço questão de lembrar o que ela me disse quando nos encontramos hoje cedo. – Vai ser um porre se você ficar tão pra baixo logo aqui. Como irei achar este lugar legal desse jeito?
- E a responsabilidade de você achar legal é minha? – Ela me olha curiosa.
- É claro que sim, a ideia de vir pra cá foi sua. – Dou uma risada – Você é minha referência aqui. Se não estiver se divertindo no seu lugar favorito, então como eu poderei me divertir?
- Você tem razão, não tem porque ficar desse jeito... Eu irei me animar. – Nicole me responde sorrindo.
Confirmo com a cabeça ainda sorrindo – Ótimo, espero por isso.
Ela se afasta de mim em passos animados, reunindo-se com suas irmãs. Observo ela abraçando Mari de lado e, propositalmente, fazendo graça com a irmã, que apesar de relutante, acaba rindo.
Bom, minha tentativa de animar ela deu certo.
Independente do que vim fazer aqui, acho que será melhor para todos eles se os ânimos estiverem bons.
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