5
[passado]
Em seu segundo verão na fazenda, Harry tinha ouvido Franklin tocar tanto a velha viola que sentiu vontade de ter uma para si mesmo. Ele não quis pedir ao vovô Tomlinson uma de presente, porque, mesmo que ninguém daquela família jamais pensasse algo assim, desde cedo Harry sentia que precisava provar não ter nenhum tipo de interesse vantajoso ou invejoso, quando todos os primos de sangue recebiam constantemente agrados e presentes.
Mas Franklin também dava dinheiro aos netos e filhos que ajudavam nas tarefas da fazenda. Não era visto como um salário porque eles eram família, mas na visão de Harry ainda servia como se fosse.
Então, já morando na fazenda com o padrasto e a mãe, Harry sempre chegava da escola rural na hora do almoço e corria para ajudar na plantação de algodão ou com o pomar de laranjas. Era cansativo, sua mãe não aprovou porque ele ainda era uma criança (apesar dos serviços que fazia não serem pesados), mas até que era divertido passar um tempo com Franklin, aprendendo com ele, para depois no fim da tarde tomarem banho no lago e se aproximarem como avó e neto postiço cada vez mais.
Com o dinheiro que ganhou e guardou, Harry comprou sua primeira viola. Um mês depois, Dayse quebrou acidentalmente o instrumento e Harry chorou, ficou arrasado, brigou muito com ela, mas Louis tinha reservas do seu próprio trabalho de verão e no natal voltou com uma nova e mais bonita viola para lhe dar de presente.
Essa mesma viola que Harry está tocando agora, três anos depois. Ele ama sua viola e tem muito apego a ela, como seu xodó. Tem a ver com o fato de amar seu som, mas principalmente por ser um presente do primo preferido dele.
Harry está sentado num canto específico do rio, que Louis apelidou de "nosso lugar secreto" e se sente muito bem em compartilhar algo só deles quando sempre precisam dividir tudo entre todos os primos.
Ele acabou de vir do almoço em família e foi um daqueles momentos de ter a sala e a cozinha cheia, com muito barulho de conversa, louças e panelas. Ele se sentia estufado pelo tanto que comeu, também preguiçoso. Pegou a viola, procurou por Louis, mas não o encontrando nem durante a refeição, resolveu ir ao lugar secreto sozinho.
Ele ama música, é uma de suas coisas favoritas no mundo. Na viola fica mais incrível ainda. Ele fecha os olhos, estica os pés descalços sobre a rocha na beira do lago e toca os acordes suavemente, num ritmo que ele mesmo criou e apesar de nunca ter anotado, já está gravado em sua cabeça, porque sempre gosta de tocar essa.
O farfalhar de galhos e folhas atrás de si chamou sua atenção, mas antes que abrisse os olhos para ver o que era, eles foram tapados por duas mãos pequenas. Harry sorriu. Só tem uma pessoa que costuma brincar com ele dessa forma e ele já conhece muito bem a textura dessas mãos para adivinhar no primeiro palpite.
– Quem será? – brincou porque é óbvio já saber.
A pessoa moveu os polegares em suas bochechas, para baixo, com carinho, mas não tirou a mão de seus olhos. Harry abandonou a viola no colo e cobriu elas com as suas.
– Deve ser o mesmo chato que me abandonou o dia inteiro.
– Ei – Louis protestou rindo e sentando ao seu lado – se me acha chato, por que queria minha companhia o dia inteiro?
– Eu sempre quero – sentiu as bochechas arderem pelo sorriso e o empurrou de leve com os ombros – você está cheirando muito bem.
– Então já descobriu onde estive.
Louis desfez o nó na camiseta larga e revelou cerca de uma dúzia de laranjas seguradas por ela. Harry ama as laranjas do pomar, então basicamente nesse momento ele tem quatro das suas coisas preferidas no mundo: o lago, a viola, laranjas do pomar e Louis.
– Posso pegar uma?
– Claro que pode, bebê.
Harry escolheu a mais madura porque sabe que Louis gosta das frutas mais novas. Ele abriu a laranja com o polegar e o sumo vazou por entre seus dedos e punho, então passou a língua para lamber o líquido a tempo. Harry ergueu os olhos encontrando Louis o encarando de um jeito estranho, inexpressivo.
– O que foi?
– Nada.
– Por que pulou o almoço?
– Eu fui levar o almoço para o lavrador, a vovó pediu porque, você sabe melhor do que eu, ela não gosta que eles comam comida que trazem fria. Aproveitei para buscar laranjas, mas também não estive com fome por todo o trajeto, então vim direto pra cá.
– Não sentiu fome? Você anda muito estranho, pensativo – Harry reparou – e parece até que está tentando manter distância da família.
– Pois é – Louis olhou para a água no lago enquanto descascava uma laranja para si mesmo – eu só preciso de um momento, é temporário.
– Tudo bem, mas sabe que se precisar conversar eu estou aqui, não sabe?
– Eu sei.
Harry deitou a cabeça nas pernas de Louis, cruzou um tornozelo apoiado pelo joelho e continuou tocando a viola, suavemente, de olhos fechados por causa do sol. Louis afastou as laranjas e passou os dedos secos entre os cachos em seu colo enquanto relaxavam.
– Você já vai fazer dezesseis anos em breve.
– E você quinze.
– O ensino médio aqui na escola rural é tão animado.
– Você não parece tão animado assim.
– Um pouco, vovô diz que sou muito dependente da companhia dos primos, mas não posso evitar querer que vocês estudem comigo. Odeio ter que esperar os verões chegarem para ver todos, especialmente você.
– Especialmente eu – Louis repete.
– Por que não vem morar aqui conosco? Tem bastante espaço, você vive brigando com seus pais em casa e odeia sua escola na cidade.
– Eu brigaria muito mais morando aqui com o Franklin, acredite em mim.
– Por que?
Louis demora a responder, mas meio que o faz, porque Harry e ele sempre conversam sobre tudo e as coisas às vezes só escapam naturalmente entre eles, até sobre assuntos que nem deveriam ser mencionados.
– Franklin não concorda com quem eu sou e ele finge que não sou quem sou, eu posso aguentar isso nos verões por vocês, mas não um ano inteiro.
– Como assim "quem você é"? – Harry parou de tocar a viola e abriu os olhos – Não entendi o que quis dizer, Lou.
Louis é salvo pelo barulho ecoando vindo do outro lado do rio, embora sua origem esteja bem afastada. Eram seus primos e alguns outros pré adolescentes vizinhos. Pareciam animados, mas não conseguiam os ver ali porque era realmente um ótimo esconderijo.
Louis e Harry gostavam de estar com os primos, mas tem alguns momentos em que os dois secretamente preferem estar sozinhos, juntos. Todos sabem que Louis e Harry são os preferidos um do outro, não seria nenhuma surpresa flagrar os dois a sós, mas eles ainda preferem guardar o local secreto deles, um refúgio de todo o caos que os Tomlinson produzem.
Normalmente, para fugir, eles iriam pegar suas coisas, suas laranjas e iriam para outro lugar sozinhos, mas neste momento a retirada veio mais a calhar porque Louis queria fugir de se aprofundar naquele assunto e eles poderiam fazer agora, se juntando aos outros, porque assim ele não precisaria explicar para Harry as coisas mais difíceis que nunca disse em voz alta para ninguém.
– Vamos nadar um pouco também?
– Não sei, eu acabei de almoçar.
– Vamos lá, bebê. Se você quiser um tempo só para nós dois, depois podemos fugir para outro lugar.
Harry estava desenrolando a barra da calça que estava erguida, mas parou o processo para erguer o rosto e encarar Louis. Eles sempre foram carinhosos um com o outro, desde criança, agora na adolescência ainda mais. Então por que parece tão diferente ultimamente? Por que toda vez que Louis o chama de bebê, coisa que sempre fizeram a sós, Harry se sente tão nervoso, tímido e com essa sensação fresca na barriga?
– Harry.
– Oi?
– Tá tudo bem? Você travou de repente.
– Desculpa, não é nada, nós podemos ir. Deixa eu te ajudar a levar as laranjas.
Eles deram a volta na trilha à beira do lago, depois passaram pela velha ponte de madeira quase destruída pelo tempo e a umidade. Louis sempre provoca os primos brincando de chacoalhar ela para assustar e causar transtorno porque ele é um garoto terrível, mas com Harry é totalmente o oposto. Ele caminha atrás, cuidando, devagar, de olho para que Harry não pise falso. Os dois correm quando terminam de atravessar, mas é só uma brincadeira porque escutaram barulho vindo do mato, que provavelmente era um pássaro e decidiram fazer um drama juntos.
Eles estão gargalhando quando chegam onde as coisas dos primos estão. Louis começa a tirar as roupas, mas Harry ainda dá um tempo. Ele fica ouvindo Louis falar sobre o musgo no fundo do lago enquanto se despia e Harry quase não ouve porque está pensando no quanto Louis está crescendo e ficando cada vez mais bonito. No verão passado ele não tinha nenhuma evidência de músculos, mas agora que já vai fazer dezesseis, Louis está criando uma bela forma. Harry se sente um pouco envergonhado com o próprio corpo agora. Ele ainda tem quatorze, em breve ele terá quinze, mas ainda não tem essas curvas bonitas que Louis tem. Estranhamente, ele pensa que gostaria de ter ao menos um pouco nas pernas para Louis o achar bonito também.
– Você não vem?
– Depois – Harry sorriu um pouco – posso pegar mais uma das suas laranjas?
– Quantas você quiser! – Louis respondeu gritando antes de correr e pular abraçando as pernas e espirrando água para todos os lados. Logo, Phil estava se juntando a ele numa bagunça e Harry gargalhou deles.
Ele continuou tocando sua viola, se divertindo à sua maneira, até o fim da tarde chegar, começar a esfriar e os primos saírem da água por fome. Primeiro vieram as meninas que se sentaram ao lado de Harry e puxaram assunto sobre qualquer coisa. Depois vieram os garotos, incluindo os que eram vizinhos e amigos dos Tomlinson. Harry conhece mais eles da escola rural, porque a maioria estuda junto, mas também são amigos de infância de todos.
– Eu quero uma laranja – Phoebe pediu enquanto prendia o cabelo molhado – Louis, me dá uma laranja, por favor.
– Não – ele terminou de descascar a que estava em sua mão e deu os gomos para Harry.
– Rude!
– Ei – Harry sussurrou e deitou a cabeça no ombro nu de Louis, suspirando, apreciando o cheiro de laranja e o cheiro fresco do primo – não seja cruel.
– Se Phoebe quiser, ela pode buscar por conta própria, o pomar é caminho de casa.
Harry riu, os outros também, Phoebe mostrou a língua, mas não era grande coisa, então eles levaram na brincadeira. Ficaram sentados por um tempo conversando e brincando. Um dos vizinhos é Alexander Ritz, ele é um dos garotos mais próximos de Harry na escola. Às vezes eles voltam da aula para casa juntos pela estrada de terra e às vezes se falam nos intervalos das aulas. Eles não são tão amigos, mas apreciam a companhia um do outro.
– E aí Harry, suas férias estão sendo boas? – Xander perguntou em seu sotaque acentuado.
– Como sempre, a melhor parte do ano. Você deveria aparecer aqui na fazenda do Franklin mais vezes pra brincar com a gente, Xander.
– Você também pode ir quando quiser, lá na nossa fazenda é melhor pra pescar.
– Com certeza eu vou – eles trocaram sorrisos e Alexander piscou.
– Só ele tá convidado? – o jeito que Louis questiona, um pouco irritado, faz Xander rir alto e Harry franzir as sobrancelhas – Oh, não, não quero atrapalhar se for um encontro, mas vocês também se vêem o ano inteiro, dá para Harry apenas aproveitar com seus primos nas férias de verão?
– Meu deus, Louis, você tá insuportável – Phoebe levantou para ir embora – vamos para casa antes que anoiteça de vez e a vovó fique preocupada.
Todos estão indo, Harry ainda não. Ele puxa Louis pela mão para ele se sentar ao seu lado de volta, mas Louis recusa irritado. Ele está emburrado, encarando Xander que já se afasta, como se fosse chutar a bunda do garoto.
– O que é isso, chato?
– Não me chame de chato.
– Eu sempre chamo, você gosta porque é nossa coisa – Harry riu – o que foi isso?
– Você tem um apelido para o Ritz também, eu percebi. Xander, né? Ele também te chama de bebê como eu?
– Não? Não – Harry finalmente entendeu – Deus, eu não acredito, você está com ciúme!
– Do que?
– Louis, você está com ciúme.
– Não tem nada a ver com ciúme. Eu só não gosto desse garoto. E quantos anos ele tem? Dezessete? Ou ele só é alto e musculoso desse jeito…
– Ele tem quinze e você não precisa ter ciúmes porque você é o meu preferido no mundo todo.
– Hum, sou? – Louis estreitou os olhos e manteve a pose até se tocar do mini ataque que acabou de dar.
Ele bufou e cruzou os braços, mas não deu o braço a torcer. Embora Harry saiba que também é o seu preferido, Louis não vai dizer de volta, porque está com ciúme demais e eles nunca dão o braço a torcer numa discussão.
– Sim, mas é um chato.
– Tanto faz, vamos embora logo, tá esfriando.
Harry pode até ficar chateado pela reação boba de Louis, mas essa atenção toda até que lhe faz sorrir, e mesmo sabendo que não deveria, ele não pode evitar essa sensação prazerosa enquanto segue seu chato ciumento preferido.
🌾🚜
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