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Quando atravessou a porteira na entrada para o casarão de Olivia 's Farm, Louis se sentiu nostálgico e saudoso.
É estranho como tudo na sua vida tenha mudado desde que se mudou para a cidade grande.
Tudo, menos esse pedaço de céu no Sun Belts, entre as planícies centrais e as montanhas rochosas.
Atualmente, ele trabalha em período integral na administração de uma grande empresa em Nova Orleans. Louis também não é mais aquele jovem travesso e cheio de sonhos, que corria pelo pasto da fazenda dos avós o dia todo, e que se metia nas plantações de algodão com os primos para brincar de pique esconde.
Louis já é um homem adulto, quase na meia idade com seus trinta e sete anos, viúvo e pai de duas meninas espertas.
Ele estacionou atrás de um Porsche vermelho próximo a porta principal para descarregar o porta malas. O carro de luxo na frente do seu pertence à prima Daisy Tomlinson. Louis sabe dessa informação porque recebeu a visita dela em Nova Orleans quatro ou cinco vezes, se contar quando se esbarraram num restaurante japonês no começo do ano e decidiram almoçar juntos.
Daisy construiu uma boa fortuna investindo na produção de cosméticos orgânicos. E é interessante notar que dos doze primos que cresceram juntos na fazenda, todos acabaram partindo para profissões ligadas direta ou indiretamente a Olivia 's Farm.
- Você não vai ajudar, mocinha?
Se inclinou para olhar dentro do carro e questionar Rose, sua filha mais velha. Louis segurava duas malas enormes e Elis, a caçula, fazia sua parte carregando uma pequena nécessaire rosa enquanto corria para dentro da casa, alegre por finalmente chegar ao destino. Ela ainda não conhecia a maioria dos parentes que viviam na fazenda, mas era desinibida o suficiente para se apresentar sozinha com o seu tradicional cumprimento: "Oi, me chamo Elizabeth Castillo Tomlinson, tenho cinco aninhos e sou filha do papai Louis."
É muito ao contrário de Roselin Castillo Tomlinson que está dentro do carro com o headphone defendendo seus ouvidos do chamado insistente de Louis. Ela está brava com ele por uma discussão boba que tiveram na estrada, mas nenhum dos dois vai dar o braço a torcer.
Rose estoura uma bolha do chiclete em resposta. Difícil de lidar, igualzinho a mãe dela costumava ser após qualquer discussão boba. Os ombros de Louis caem, ele respira fundo, vira as costas e segue para dentro de casa sozinho.
Ela sabe muito bem o caminho, ele não vai insistir para que entre.
Já na varanda, são muito bem recepcionados por dois dos seis tios e quatro dos onze primos além de seus filhos. Louis se sente agradável, é ótimo rever todos e conhecer as crianças. Eles trocam abraços, se cumprimentam, falam todos ao mesmo tempo, alguém lhe oferece café e outra pessoa pergunta se pode ajudar com as malas. Ele vê sua filha caçula passar de braço em braço e todos parecem muito felizes.
Se não fosse a euforia de um terço da gigantesca família Tomlinson presente, como o abraço apertado da tia Jeane e o tio Paul jogando Elizabeth para cima em troca de gargalhadas, Louis teria notado rapidamente a caminhonete barulhenta entrando pela mesma estrada de terra que veio, mas dirigida pelo atual administrador de Olivia' s Farm.
Quando ele estacionou, Louis tremeu.
Ver Harry depois de tantos anos o deixava inseguro sobre como agir porque muita coisa mudou desde que foram separados pela vida adulta. Louis acha que seria ridículo e muito patético fazer do reencontro um show constrangedor sendo que provavelmente ambos não são mais aquelas mesmas pessoas de dezessete anos atrás, mas é inevitável esse sentimento de nervosismo misturado à timidez.
Louis observa Harry descer do carro e pular na caçamba com o funcionário da fazenda para retirar a mercadoria leve, enquanto uma mulher mais jovem fazia a contagem dos produtos que chegavam. Harry veste botas de serviço, calça jeans sujas, camisa de manga comprida puxada até os cotovelos e o chapéu que pertencia ao avô deles, para se proteger do Sol. Ele dava ordens para levar as mercadorias para outro lugar e analisava concentrado as anotações da funcionária.
Exatamente como o chefe da fazenda deveria aparentar.
- Ele não se livrou da lata velha - Louis constatou sorrindo, quando percebeu que era Daisy ao seu lado sorrindo também.
A lata velha é a caminhonete que pertencia ao vovô Tomlinson. Essa guerreira já sobreviveu de muitas empacadas na lama, centenas de reparos e incontáveis dias de trabalho em carga e descarga. Apesar de xingar a coitada, Louis tem um grande apreço pela senhora.
Ela o faz lembrar de duas décadas atrás, quando oito dos doze primos eram jovens e inconsequentes demais a ponto de pegarem a caminhonete do vovô escondidos para irem aos bailes nas fazendas vizinhas e voltarem bêbados ao amanhecer.
Essa caminhonete foi palco das maiores aventuras de juventude dos Tomlinson.
Ela também é testemunha dos maiores segredos de Louis.
Foi na cabine quando deu o seu primeiro beijo e na caçamba foi pedido em namoro. Logo depois, no banco de trás ele teve a sua primeira noite de amor, mas foi no banco passageiro que Louis teve seu coração partido.
- Ele não vai se livrar dessa dinossaura, juro que às vezes Harry até age como o vovô - Daisy respondeu.
Harry olhou na direção da varanda como se soubesse que estavam falando dele e obviamente, como o patético que é, Louis se virou depressa para o outro lado e tentou disfarçar que antes estava lhe encarando, mas já era tarde demais.
Daisy riu da reação boba e o cutucou.
- Você não pode fugir dele o verão inteiro, primo.
Ela e Phoebe eram as únicas que sabiam a verdade sobre o passado deles. A família toda desconfiava, mas ninguém nunca tentou comentar a respeito. Daisy e Phoebe sempre foram as mais confiáveis para desabafos e Louis não escondeu nada delas, ainda mais naqueles tempos em que era bobo, eufórico, confuso e apaixonado.
- Eu posso - cochichou de volta - esse casarão enorme e quilométrico tem que servir pra alguma coisa além de juntar poeira e cupim.
- Com você crendo nisso, até parece que a nossa família não vai fazer mil refeições por dia com todos reunidos ou que vocês dois não são os padrinhos do casamento da Phoebe. Aliás, tente se lembrar que Harry agora é o chefe da fazenda. Vamos encontrá-lo em cada canto da casa, queira você ou não.
Ela foi interrompida pelo tio Paul, que se aproximou com uma caneca convidando Daisy para o café.
A atenção de Louis também foi roubada quando a barra de sua camisa foi puxada. Elis estendeu os braços pedindo colo e ele cedeu de bom grado.
- Papai, quero banho - ela pediu colocando a cabeça em seu ombro.
Ele afagou o cabelo escuro de Elis e suspirou. Estava cansado, provavelmente as meninas também estavam e para Louis a prioridade é sempre delas. Ele pediu licença e caminhou para dentro da casa com a filha no colo.
Na varanda, antes de Louis seguir para dentro da casa, descobriu que Roselin já havia levado as malas para o quarto em que ficarão hospedados com a ajuda de sua tia Jeane. Sua tia conta que tirou Roselin do carro prometendo a nova senha do wi-fi e doce de leite caseiro. Louis riu porque, realmente, essas são duas coisas que compram rapidamente a simpatia dela. Ele não se lembra de ser tão mau humorado na adolescência como Roselin está sendo agora.
Com exceção das dobradiças das portas trocadas por outras que rangem menos, tudo por dentro da casa ainda parece o mesmo. Os móveis de madeira envernizada, o piso limpo, os quadros velhos com fotografias dos bisavós, a sala enorme com cheiro de cera para piso vermelho e a linda vista da varanda para a fazenda. Louis pode apostar que lá na cozinha ainda estão o fogão a lenha funcionando e a mesa para trinta pessoas.
- Tudo exatamente como você deixou há dezessete anos?
Obviamente, o corpo de Louis reconhece a voz de imediato, reagindo de forma vergonhosa. Antes de se virar para enfrentar o inevitável, ele já sentia a pele esquentar em constrangimento.
- Quase tudo absolutamente igual - respondeu evitando os olhos de Harry, mas olhando na sua direção como conseguia.
Quase tudo igual, mas não tudo. Harry, por exemplo, agora tem alguns centímetros a mais e um pouquinho de barba, além dos cabelos curtos ao invés de cumpridos como costumava ser quando era jovem.
Louis estava torcendo para alguém aparecer nesse instante como sempre acontecia entre a família inconveniente, mas não teve sorte.
Para pular o silêncio embaraçoso, Harry notou a pequena miss sunshine dormindo em seus braços e comentou:
- Ela está linda.
- Obrigado.
- Elis se parece mais com a Laura do que com você.
O comentário pega Louis de surpresa porque não imaginava que Harry ainda se lembrasse da aparência de Laura porque a última vez em que a viu foi no velório, há quatro anos.
Provavelmente aquela tenha sido a única vez em que os dois se encontraram por vontade própria em quase vinte anos.
- Quer ajuda pra achar seu quarto?
- Pode ser - Louis só concordou porque não sabe mais o que dizer e também ainda não sabe qual quarto será o seu.
O casarão da fazenda possui nove quartos, um porão e um sótão, uma sala, a cozinha e infelizmente um único banheiro, mas apesar de grande, a casa é de estrutura simples e muito antiga.
Todos sabem que o motivo disso é pelo vovô Franklin ser teimoso demais e não aceitar que consertem sua casinha. Ele tem trauma de um tempo em que empreendedores tentaram convencê-lo a vender as terras e demolir a casa para construir um conjunto residencial. O vovô tem muito orgulho de ter lutado contra as propostas persistentes, mas também é muito desconfiado de qualquer ideia sobre derrubar uma parede.
O quarto escolhido para hospedar Louis e suas filhas neste verão fica no segundo piso ao lado do quarto de Daisy que dormirá com outros três primos deles. Louis está ansioso para encontrar todos porque os únicos que chegaram até então foram os dois, além de Harry que obviamente já vive ali.
Harry esperava na porta enquanto Louis deixava Elis adormecida na cama. Roselin já ocupou a parte de cima da beliche e estava tão concentrada no celular que nem reparou na presença dele. Ela está linda com o coque liso escorrendo e quase desmanchando em seus ombros. Rose usa um vestido verde longo e botas vermelhas de borracha.
Harry está encarando ela com os olhos arregalados e o queixo caído.
- Sim, Rose cresceu - disse Louis.
- Ela está enorme, quanto tempo passou?
- Um verão.
- Meu Deus - Harry cochichou - isso quer dizer que ela não é mais um bebê.
- Obviamente, ela já tem dezesseis anos.
- Dezesseis, poxa vida.
- Eu estou ouvindo vocês dois - Rose jogou o celular de lado e estourou a bolha de chiclete mais uma vez - Oi, Harry. Você me viu ano passado.
- Você cresceu muito.
- Eu parei de crescer com quinze.
- Parece um poste agora.
- Já chega, onde está René?
- Seu namoradinho está no celeiro.
Ela levantou depressa.
- Ele não é meu namorado!
- Uma paquera então, não entendo vocês jovens.
- Tchau, Harry - ela passa por ele sorrindo, apesar das provocações.
Louis não voltou para Olivia' s Farm nos últimos dezessete anos, mas enviou Rose para passar as férias dela ali em todos os anos e com o incentivo de Laura. É tradição da família Tomlinson ter todas as crianças reunidas no verão e Rose até gosta desse período longe de casa, com os primos. Louis só não pôde fazer o mesmo por Elis ainda porque ela se recusa a ficar longe do pai por muito tempo.
- Que história é essa de namoradinho? - perguntou para Harry.
- Só estou brincando. René tem a idade de Rose e é filho de um funcionário de confiança, não se preocupe.
- Toda brincadeira tem um fundo de verdade - Louis arqueou uma sobrancelha e cruzou os braços - me mostre quem é esse sem vergonha, vamos lá!
- Você deveria aproveitar que o restante da família não chegou ainda para usar o banheiro porque a partir de hoje vai ter fila.
- O vovô não quer derrubar paredes, mas construir umas novas não tem problema, não é? Por que em vinte anos você ainda não construiu outros três banheiros decentes por aqui?
Harry já se afastava pelo corredor rindo e deixando para responder gritando sobre os ombros:
- Porque eu adoro o caos dessa família competindo para usar o chuveiro.
Louis continuou parado na porta do quarto sorrindo e olhando para a escada onde Harry saiu.
É só um momento do gelo se quebrando entre eles, mas os dois sabem que ainda há um iceberg a se enfrentar.
E agora Louis respira fundo, batendo de propósito a testa na porta para se condenar porque sabe que vai ser muito, muito difícil mesmo a tarefa de conviver normalmente na mesma casa por trinta dias com o seu primeiro e mal resolvido amor.
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